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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE – UNESC CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EDUCAÇÃO ESTÉTICA: ARTE E AS PERSPECTIVAS CONTEMPORÂNEAS MARIA SAL...
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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE – UNESC

CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU EDUCAÇÃO ESTÉTICA: ARTE E AS PERSPECTIVAS CONTEMPORÂNEAS

MARIA SALETE CARRADORE FERNANDES

A ESTÉTICA DO BORDADO: REFLEXÕES A PARTIR DAS MÃOS BORDADEIRAS QUE COMPÕEM A ASSOCIAÇÃO DOS CLUBES DE MÃES DA CIDADE DE FORQUILHINHA

CRICIÚMA, DEZEMBRO 2010

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MARIA SALETE CARRADORE FERNANDES

A ESTÉTICA DO BORDADO: REFLEXÕES A PARTIR DAS MÃOS BORDADEIRAS QUE COMPÕEM A ASSOCIAÇÃO DOS CLUBES DE MÃES DA CIDADE DE FORQUILHINHA

Monografia apresentada à Diretoria de Pósgraduação da Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC, para a obtenção de título de especialista em Educação Estética: Arte e as Perspectivas Contemporâneas. Orientadora: Profª Me. Silemar Maria de Medeiros da Silva

CRICIÚMA, DEZEMBRO DE 2010

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Dedico ao meu marido, que ficou pai de toda a minha família composta por meus seis irmãos que ficaram sem pai. Super-pai de minhas filhas e filho, genros, nora e netos. Que quando reclamava por eu estar no computador ou em volta de livros para escrever

esta

monografia,

me

dava

a

entender que sentia a minha falta e me queria perto dele.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todas as pessoas que gentilmente cederam entrevistas para essa investigação. As mãos bordadeiras que ouviam e respondiam as minhas insistentes conversas sempre querendo saber mais, além de suas atividades, sobre seus sentimentos bordando emoções. Aos professores que me olhavam surpresos, e às vezes sem entender que o meu foco fugia um pouco do lugar comum. Agradecimento mais carinhoso ao meu marido que apesar de reclamar a minha falta em casa, nunca me impede de buscar os conhecimentos que desejo. A minha mãe que pouco sentou em bancos escolares, mas inteligente o suficiente para dar a mim e a meus irmãos uma educação que muito nos honra. Agradecimento especial à orientadora Profª Me. Silemar Maria de Medeiros da Silva, que pacientemente bordou comigo linha por linha: oito rascunhos, onde o primeiro teve sete páginas, o segundo: oito; terceiro: vinte e uma; quarto: trinta e duas; quinto: trinta e cinco; sexto: quarenta e oito; sétimo: cinqüenta e três; oitavo: sessenta e cinco, para chegarmos a este resultado final. Paciência de bordadeira. Muito Obrigada.

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“Mãos que trazem as linhas da vida traçadas na palma, cujos dedos ganham nomes de brinquedo

nos

jogos

infantis:

dedo

mindinho, seu vizinho, maior – de – todos, fura – bolo, cata – piolho. Mãos humanas, mãos divinas, mãos que completam a criação do mundo”.

Oswaldo Barroso

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RESUMO

O presente desafio se constrói com relatos e observações das atividades produtivas em diferentes grupos, e também de integrantes dos clubes de mães do município de Forquilhinha. Parte do problema: “de que forma a estética do bordado dialoga com o trabalho das bordadeiras que compõem a Associação dos Clubes de Mães da cidade de Forquilhinha?” Com o intuito de dar cientificidade ao tema, a estética do bordado é trazida à visibilidade. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, contemplando pesquisa de campo com aplicação de um questionário, o qual é respondido pelas pessoas integrantes dessa associação e pessoas entrevistadas nas diversas feiras e eventos de trabalhos manuais visitas por ocasião desta pesquisa. A cientificidade dessa proposta exige um corpo teórico pertinente, portanto – apesar das dificuldades que encontrei em deixar parte das minhas revistas antigas de lado – trago para cena Ivone Mendes Richter (2003), José Luiz dos Santos (1996), Doralécio Soares (2002), Jorge Coli (1981), Martha e Parc (2001), Vera Maria Candau (1995), Marilsa Passos e Rita Pereira (2009), Tarcísio Mattos (2008), Melissa Leventon (2009), entre outras contribuições que foram iluminando os olhares sobre cada ponto desse bordar. A relevância dessa investigação encontra-se na visibilidade do objeto pesquisado – falo aqui dos bordados, das bordadeiras, dos olhares outros que buscam uma relação de fruição, de encantamento, de memória, de educação estética que é do que proponho o tempo todo. Palavras-chave: Bordado. Estética. Arte. Bordadeiras.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 – Condessa de Montfor..............................................................................14 Figura 02 – Personagem do século XVI usando rufo.................................................15 Figura 03 – Elisabeth I usando rufo com técnica e bordado......................................15 Figura 04 – Renda Renascença das bordadeiras do estado de Pernambuco...........18 Figura 05 – Renda Renascença das bordadeiras do estado de Pernambuco...........18 Figura 06 – Vestes bordadas do século XV...............................................................20 Figura 07 – Obra em Patchwork.................................................................................23 Figura 08 – Obra em Patchwork e Fuxico..................................................................23 Figura 09 – Vestido de menina...................................................................................24 Figura 10 – Sapatinho de bebê..................................................................................24 Figura 11 – Vestido de casamento.............................................................................25 Figura 12 – Mesmo vestido, anos depois...................................................................25 Figura 13 – Bordados de ponto cruz, bordadeira Novelina........................................26 Figura 14 – Toalha bordada pela bordadeira Ivonete................................................26 Figura 15 – Bordados da Eliete C. Zanatta................................................................27 Figura 16 – Bordados em ponto cruz – Eliete............................................................27 Figura 17 – Bordado pela senhora Novelina..............................................................27 Figura 18 – Bordado com fita – Angelina...................................................................34 Figura 19 – Rejane mostrando seu trabalho..............................................................35 Figura 20 – Bordado de Crivo....................................................................................35 Figura 21 – Bordado de Crivo....................................................................................35 Figura 22 – Meninas aprendendo a bordar no ateliê ETI ARTE................................37 Figura 23 – Meninas aprendendo a bordar no ateliê ETI ARTE................................37 Figura 24 – D. Ana Maria Magg Ricken.....................................................................40 Figura 25 – D. Ana e seu bordado.............................................................................40 Figura 26 – Logotipo do clube de mães.....................................................................41 Figura 27 – Feira no centro da cidade........................................................................43 Figura 28 – Feirarte – abril de 2010...........................................................................43 Figura 29 – Evento em Cuiabá...................................................................................47 Figura 30 – Arraial Fest..............................................................................................47

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Figura 31 – Exposição de bordados Paragominas.....................................................48 Figura 32 – Stael respondendo a pesquisa................................................................49 Figura 33 – Toalha com renda de Frivolié..................................................................49 Figura 34 – Navete: instrumento usado para executar Frivolié..................................50 Figura 35 – Monitora Tecla bordando........................................................................52 Figura 36 – Bordado em cânhamo, em ponto reto.....................................................55 Figura 37 – Bordado em tecido xadrez......................................................................55 Figura 38 – Título Honorífico dado à D. Ana..............................................................59

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 9 2 A ESTÉTICA DO BORDADO ............................................................................... 13 2.1 O Artesanato e o bordado ................................................................................ 16 2.2 Bordado: que história é essa? ........................................................................ 20 2.3 O bordado e a Arte ........................................................................................... 28 3 O BORDADO NO CLUBE DE MÃES DE FORQUILHINHA: UM DIÁLOGO COM A ESTÉTICA ................................................................................................................ 33 3.1 O bordado e a cultura local ............................................................................. 36 3.2 Histórico – Clube de Mães ............................................................................... 38 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS DA PESQUISA ................................................ 45 5 ANÁLISE DE DADOS: O QUE DIZEM AS BORDADEIRAS? ............................. 49 5.1 Sobre a Cultura ................................................................................................. 51 5.2 Sobre o Artesanato........................................................................................... 53 5.3 Sobre o bordado ............................................................................................... 54 5.4 Sobre a Arte ...................................................................................................... 55 5.5 Sobre a Cidade.................................................................................................. 57 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 60 ANEXOS .................................................................................................................. 66

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1 INTRODUÇÃO

Argumentar sobre a estética do bordado me é prazeroso. Encanta-me a complexidade ou a simplicidade, a variedade de pontos e de cores bem colocadas. Nos trabalhos com linhas e agulhas encontramos demonstrações de talento, carinho, capricho e inclusive paciência. Paciência que algumas bordadeiras têm para bem executar seus bordados, e outras que buscam encontrá-la (a paciência), e nesta tentativa se aproximam cada vez mais da prática do bordado. Meu envolvimento com agulhas, linhas e fios vem desde a pré-adolescência, a intimidade é grande, mas ainda estou sempre em busca de novidades, as quais podem estar contidas em revistas novas, ou antigas, esquecidas, que sob um novo olhar, ganham outro significado. Nessa pesquisa, optei por tratar da Estética do Bordado porque vejo uma oportunidade, uma possibilidade de colocar o assunto em evidência por meio de uma escrita acadêmica – a qual auxiliará na ampliação do conhecimento do tema em questão – , e tê-la disponibilizada a uma gama de interessados ou simpatizantes deste. Buscarei evidenciar também, a importância dos trabalhos manuais como terapia e melhorador da renda familiar, mas, meu interesse maior é a discussão estética a partir do bordado e o que o cerca. Quando vemos nos bailes de formatura, os vestidos brilhando tanto ou mais que o olhar feliz das formandas, cabe lembrar que aquelas pedras foram colocadas uma a uma por mãos muito habilidosas, quase sempre anônimas. Não é possível realizar um trabalho desses sem muito carinho, conhecimento e dedicação. A arte vinculada à estética dos bordados será o fio condutor de reflexões sobre diferentes estratégias para ampliar a valorização de mãos bordadeiras. O foco dessa investigação se acresce de informações obtidas junto à Associação de Clubes de Mães do município de Forquilhinha, cidade do sul do Estado de Santa Catarina, que atua há mais de vinte anos nas comunidades do centro e do interior da cidade, como instrumento capacitador. Embora trabalhando como professora de trabalhos manuais nos Clubes de Mães de Forquilhinha, até então, os meus estudos pouco contribuíram para elucidar cientificamente o papel do bordado na vida das pessoas. A primeira impressão me leva a concluir que pouquíssimo tem-se falado sobre este assunto ou

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mesmo a respeito dos trabalhos manuais. Partindo desse prisma, o desafio passa por juntar argumentos que nos ajudem a dialogar sobre o bordado, o artesanato, a arte e a estética contida nos trabalhos produzidos pelas mães integrantes da associação, e por tantas outras pessoas que produzem bordados apresentados e (ou) comercializados nas feiras e eventos. Com esta pesquisa busco respostas para questionamentos que trago à algum tempo, mas vejo surgir com mais significância a partir de um olhar para a cientificidade, depois das aulas do curso de Pós-Graduação em Educação Estética “Arte e as Perspectivas Contemporâneas”. O presente desafio se constrói com relatos e observações das atividades produtivas em diferentes grupos, e também de integrantes dos clubes de mães do município de Forquilhinha. Além de utilização das respostas obtidas em questionários respondidos pelas pessoas integrantes dessa associação e pessoas entrevistadas nas diversas feiras e eventos de trabalhos manuais visitadas por ocasião desta pesquisa. Pontuo a busca constante de um corpo teórico pertinente como algo necessário para atingir o objetivo proposto. As hipóteses que auxiliaram na definição do problema investigado se apresentam assim definidas: •

Como beneficiar mais pessoas pela atividade e convivência de grupo

oferecido pela Associação de Clubes de Mães? •

Como atrair um público aquisitor, com a discursiva da utilidade e estética

contida na produção das mulheres que integram os grupos? •

De que forma incentivar a atividade para melhoria da renda familiar?



Como oportunizar maneiras de chegar ao valor venal das peças de

trabalhos manuais produzidas por integrantes da Associação de Clubes de Mães e também orientar outras pessoas dedicadas a este tipo de trabalho? •

Qual a relação com o bordado e a cultura local? Estas hipóteses surgiram a partir da observação nas ocasiões de

trabalhar com essas mulheres. Muitas delas não conseguem ver essa atividade como uma fonte de renda, como uma atividade produtiva possível de agregar valor ao tempo disponível entre suas atividades de donas-de-casa, e assim possibilitar melhora na renda familiar. Nesse contexto surge o problema dessa investigação, qual seja: “de que forma a estética do bordado dialoga com o trabalho das

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bordadeiras que compõem a Associação dos Clubes de Mães da cidade de Forquilhinha?

As aulas de bordar são oferecidas e – constantemente, como professora de trabalhos manuais – tento expor a necessidade de oportunizar a essas pessoas capacitação que as posicione como vendedoras de seus trabalhos, evidenciando a importância dos mesmos com relação à cultura local, à melhora da auto-estima do grupo e, conseqüentemente a melhoria da renda familiar, evidencio assim o objetivo central dessa proposta. Partindo do problema acima citado, elaborei um questionário investigando como cada entrevistado classifica sua produção. Se a considera um trabalho, um hobby ou uma arte? O que a levou a se utilizar desta atividade? Para quem estava expondo ou vendendo? Também foi incluída a pergunta: Qual a importância do evento para sua atividade? E ainda oferecido espaço para que opinassem, relatassem seu pensamento, sobre o que difere arte, artesanato e trabalho manual. Vamos refletir sobre todos esses questionamentos como uma conversa. Chamo agora este trabalho de conversa, numa posição inversa ao que costumo dizer: Falar com as pessoas, perguntar, ouvi-las, é como ler um livro. Com a vantagem de termos a possibilidade das respostas às perguntas que surgem enquanto lemos um livro. E também ao desenhar essa proposta, chamo essa introdução de capítulo 1. No capítulo 2, discutiremos “A estética do bordado”, tendo no item 2.1 “O artesanato e o bordado”, dando continuidade ao tema, item 2.2 “Bordado que história é essa?” Seguida do diálogo entre “O bordado e a arte”, no item 2.3. O capítulo 3 traz “O bordado nos clubes de mães de Forquilhinha: um diálogo com a Estética”, 3.1 é o item que diz sobre “O bordado e a cultura local”. Acrescido do novo item 3.2 “O histórico dos clubes de mães”. Relatos também no item 3.3 da relação entre “O bordado e a cidade”. No capítulo 4 apresentam-se as questões metodológicas da pesquisa. Capítulo 5: “Análise de dados: O que dizem as bordadeiras?” 5.1: “Sobre a cultura”, 5.2: “Sobre o artesanato”, 5.3: “Sobre o bordado”. 5.4 “Sobre a arte” e 5.5: “Sobre a cidade”. Seguidas de considerações finais, bibliografia e anexos. Para essa investigação, a cientificidade dessa proposta exige um corpo teórico pertinente, portanto – apesar das dificuldades que encontrei em deixar

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minhas revistas antigas de lado – trago para cena Ivone Mendes Richter (2003), José Luiz dos Santos (1996), Doralécio Soares (2002), Jorge Coli (1981), Martha Le Parc (2001), Vera Maria Candau (1995), Marilsa Passos e Rita Pereira (2009), Tarcísio Mattos (2008), Melissa Leventon (2009), entre outras contribuições que foram iluminando os olhares sobre cada ponto desse bordar.

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2 A ESTÉTICA DO BORDADO

Olho para um bordado como para um texto, um bordado deve ser organizado, com espaços definidos, e, bem posicionado na peça que deverá compor. A estética envolve desde a sua execução até onde vai ser utilizado, deve complementar, embelezar. Partindo do princípio, do que diz segundo Oliveira, ou seja:

Estética é uma palavra usada, geralmente, como sinônimo de beleza [...] Estética, uma dimensão da filosofia, durante um certo período foi definida como “o estudo do belo”.[...] Naquela época, beleza era entendida como um ideal de perfeição (2005, p. 27).

Ao se acrescentar bordado em uma peça, agrega-se valor à mesma. Quanto mais aprimorado o bordado, maior grau de dificuldade em sua execução, normalmente, maior sua valoração. E nessa valoração encontram-se trabalhos oferecidos a públicos diferenciados. As toalhinhas de bandeja, ou, o vestido de noiva todo bordado de pedraria ou ainda em “renda renascença”, cada um nas suas devidas situações, de oferecer satisfação e prazer ao apreciador. Usados para melhorar a estética da vestimenta ou do ambiente, de pessoas com maior ou menor poder aquisitivo, mas apreciadores do bordado. No livro “História Ilustrada do Vestuário: um estudo da indumentária, do Egito antigo ao final do século XIX” (LEVENTON, 2009), encontramos alguns registros de bordados usados pelas personalidades de diferentes épocas. Por exemplo, conta dos anos 1700 que a condessa de Montfort é mostrada vestida de maneira informal, segundo o registro “usando uma sobreveste listrada sobre anágua e corpete bordados com apliques” (LEVENTON, 2009, p.161). Na China, nos anos 1850 a 1900 “Enquanto as camadas mais ricas dispunham de bordados generosos e apliques de luxo, a maioria da população era pobre e usava roupas com menos enfeites” (LEVENTON, 2009, p.189). Embora a palavra bordado apareça mostrando trajes denominados simples, muitas gravuras de indumentárias repletas de detalhes não estão relatadas como bordadas. O foco do relato histórico dessa publicação, na

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maioria das vezes era de mostrar a evolução das indumentárias em detrimento ao bordado. A figura 1 ilustra a fala de Leventon (2009, p.161) quando se refere à Condessa de Montfor. Apesar de dizer que a condessa esta vestida de maneira informal, é um traje rico em detalhes, onde se percebe bordados nas várias peças. No corpete, na saia, na sobreveste e no arranjo de cabeça.

Figura 01: Condessa de Montfor Fonte: Leventon (2009, p. 161)

Na Europa dos séculos XVI-XVII, era comum o uso de golas e rufos femininos, onde “a renda se desenvolveu durante o século XVI com base em técnicas de bordado e se tornou o acabamento mais importante e caro da época” (LEVENTON, 2009, p.139). Como este rufo mostrado na figura 2, “composto de extremidades trabalhadas com pontas aparentes e uma faixa de renda” (LEVENTON, 2009, p. 139). Vestimenta de pompa, bastante encontrada vestindo personagens nobres.

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Figura 02: Personagem do Século XVI usando rufo Fonte: Leventon (2009, p. 139)

Ainda sobre história do vestuário, Leventon traz outros modelos como este, visto na figura 3, afirmando:

Na pintura de c. 1592, de Gheeraerts, Elisabeth veste um rufo enorme em forma de leque, embora aqui apareça como duas peças separadas. O colar em forma de coração é um arranjo com jóias e integra o adereço da cabeça (LEVENTON, 2009, p. 139)

Figura 03: Elisabeth I usando rufo com técnica e bordado Fonte: Leventon (2009, p. 139)

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Na busca para melhor elucidar questões dessa pesquisa, remeto-me a esses bordados que marcam a história. Remetendo, assim ao próprio problema aqui traçado como sendo: “de que forma a estética do bordado dialoga com o trabalho das bordadeiras que compõem a Associação dos Clubes de Mães da cidade de Forquilhinha? Compreender que os bordados não são descolados de sua cultura e que na imagem anterior podemos perceber que o uso dos rufos era sinal de poder, sofisticação. As mulheres se enfeitavam com esses trabalhos para exibirem luxo nos seus relacionamentos, em seus passeios e atividades sociais, o mesmo luxo em dias atuais, pessoas se exibem com vestidos ricamente bordados. E sem o custo, de todo esse luxo, muitas vezes nos enfeitamos com florzinhas de fuxico feito por nós bordadeiras. Como veremos no capítulo a seguir, bordando ponto por ponto dessa narrativa que se constrói como uma conversa...

2.1 O Artesanato e o bordado

Para iniciar a nossa conversa sobre artesanato, vou utilizar as palavras de Vogel (2008, p.11) que faz comentários sob o titulo “Mãos em Obra”, ela coloca que: “O uso direto das mãos é um dos quesitos definidores do artesanato, mas isso não significa que o artesão não possa usar ferramentas.” A explanação da autora continua, e na perspectiva de melhor definir o artesanato, afirma:

Cada técnica de artesanato recorre a instrumentos apropriados. [...] E como o lugar social do artesanato mudou, também a palavra “artesanato” passou por mudanças. Foi apenas no final do século XIX que ela assumiu o sentido que damos hoje, para referir os objetos e coisas feitas diretamente com as mãos. Ainda no século XVI, “artista” e “artesão” eram palavras que podiam ser usadas para referir a mesma pessoa habilidosa (VOGEL, 2008, p. 11).

As coisas nem sempre foram da maneira que vemos, portanto continuando a falar de artesanato e habilidades, Vogel afirma ainda, que:

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Se olharmos em volta, poderemos encontrar muitos objetos que foram feitos quase como se fosse artesanato, ou seja, foram feitos à mão, uma peça por vez. É o caso dos panos de louça que às vezes nos oferecem na rua, com pinturas e acabamento em crochê, e dos muitos enfeites que encontramos nas feiras. [...] Atualmente, tende-se mesmo a considerar que artesanato de verdade é aquele em que a qualidade e a admiração causada pelos seus produtos denotam o peso de uma técnica (VOGEL, 2008, p. 13).

Quando falamos de artesanato, de técnica, encontramos discussões que nos fazem pensar, por exemplo, se nesses trabalhos que vemos produzidos por clubes de mães e grupos de artesãs contém arte. E as divergências se estendem até onde surgem as junções: ponto em que duas ou mais coisas se juntam e se confundem. Arte, artesanato, arte popular, sobre isso a autora segue dizendo que:

O artesanato também não é considerado como igual à arte popular, na medida em que o artesão não compartilha, com o artista, a obsessão pela originalidade. Diz-se singelamente, da arte popular, que é manifestação artística realizada por alguém que não estudou a história da arte e por isso não está impregnado por ela. (VOGEL, 2008, p. 11).

Seguindo nesse diálogo, digo então das rendas Renascença que vi durante o desenvolvimento dessa pesquisa. Por estar atenta aos bordados, chamoume atenção no aeroporto de Guarulhos, do estado de São Paulo. Trata-se de bordado feitos com agulhas de mão e linhas finas. Exclusivos e diferenciados, são trabalhos delicados onde as peças executadas por artesãs de Pernambuco estão colocadas à venda em loja da estilista, artesã e empresária Maria de Fátima Xavier Mergulhão, é possível conferir no site da artesã no qual afirma:

Conseguiu transformar o dom herdado da mãe Marieta Monteiro Xavier, em uma rede de lojas sólida e promissora. Juntas, mãe e filha cuidam pessoalmente do processo de criação de cada peça, desde a concepção do desenho até o acabamento final e a logística de distribuição para as lojas [...] Marieta Monteiro Xavier, ensinou a suas filhas, além da técnica do bordado, a importância do respeito a esse trabalho. (MERGULHÃO, 2010)

Conforme a informação no folder que peguei na loja e também no site, diz ainda que, “trezentas rendeiras trabalham para a grife”. Essas rendeiras

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executam pequenas peças como sapatinhos de bebê, toalhas de bandeja, de lavabo, até grandes e belíssimas toalhas de banquete de fino linho. Peças de beleza ímpar que ao ver não é possível segurar a exclamação: “é uma obra de arte!”. Trago esse recorte porque assim, sustento a possibilidade de transformar o trabalho das bordadeiras em fonte de renda. Com o bordado, ou com outros trabalhos manuais, trabalho individual ou de grupo é possível ganhar dinheiro. Cada bordadeira aproveitando o tempo a sua maneira. Remeto-me a essa questão porque sei das dificuldades que muitas vezes essas mulheres têm de acreditar na relevância de seus trabalhos. Essa preocupação ecoa no problema que se faz fio condutor dessa investigação. Mais do que falar das questões de venda, busco melhor compreender a própria estética do bordado, o que podemos constatar nas figuras 4 e 5, com relação à beleza das rendas renascença, onde vemos toalhas de lavabo delicadamente bordadas, trilho de mesa, rico em detalhes, e belíssima toalha de banquete em linho que requer muita atenção das bordadeiras.

Figuras 04 e 05: Renda Renascença das bordadeiras do estado do Pernambuco Fonte: Acervo da pesquisadora

Existe uma vastidão de possibilidades, hoje há máquinas que imitam com perfeição os trabalhos feitos à mão. Até pouco tempo acreditava-se que não seria possível imitar o ponto cruz, pois já existem máquinas que o bordam, e o patchwork então?

Quando visitei o “5º Encontro de Patchwork e Bonecos e 1ª feira de

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Tendências Artesanais”, em Porto Alegre, de 15 a 17 de julho de 2010, lá estavam expostas máquinas maravilhosas que imitam com perfeição (perfeitos até demais) os trabalhos de pontos caseados, bordados a mão. Essas produções enganam com tranqüilidade quem compra o produto e não é conhecedor do trabalho manual. Acaba, então, eventualmente por acontecer o que alerta Oliveira (2005, p. 98) “Aqui, o fazer individual, manual, pode ser considerado pouco valioso, primitivo ou precário”. E assim, muitas vezes por não se dar o devido valor ao trabalho demorado e repleto de paciência das bordadeiras vemos à nossa volta acontecer o que a autora defende, ou seja: “Enquanto nem o artesanato, nem o conceito de artesanato são atualizados, continuamos aqui nos trópicos, pagando mais caro o suco de laranja de caixinha do que o natural” (OLIVEIRA, 2005, p. 98). O fazer artesanal é trabalho que “exigem habilidades de artesã para a tessitura dos fios, sob o risco de que o avesso termine por ser mais belo que o direito” (PARK, 2004, p. 7). Pode mesmo acontecer, nos confundirmos ao olhar para alguns bordados, com dificuldades para saber qual é o direito, qual é o avesso, então para não sermos pegas em flagrante erro, recorremos a conferir de que lado esta a bainha do tecido, é claro. Por falar em avesso perfeito, retorno à passagem pelo Aeroporto Internacional de Guarulhos, e o quanto me impressionou a beleza e acabamento das Rendas Renascença do estado de Pernambuco, toda feita com linha fina e agulha de mão. Diante daquelas belezas, naquele lugar, pensei: Quem compra? Quem recebe de presente uma peça dessas? Quem tem dinheiro para comprar? Quem faz? Quanto tempo demora? Quanto ganha pela execução da peça? Quanto vale o exercício dessas mãos bordadeiras? Acrescento ao diálogo as palavras de Barroso (2008, p.20), “Mãos que o tempo marca com dormências, tremores, calos [...] mãos que se prolongam em instrumentos...” e o autor segue ainda afirmando:

Mãos que trazem as linhas da vida traçadas na palma, cujos dedos ganham nomes de brinquedo nos jogos infantis: dedo mindinho, seu vizinho, maiorde-todos, fura–bolo, cata–piolho. Mãos humanas, mãos divinas, mãos que completam a criação do mundo. (BARROSO, 2008, p. 20)

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2.2 Bordado: que história é essa?

Para compor um pouco da história do bordado, remeto-me a Bonando e Nava para ampliar esse olhar:

Quem desejasse contar a história do bordado teria que percorrer um longo caminho retroceder no tempo. Trata-se de uma história estritamente ligada a evolução dos costumes e da moda, mas também à arte de todas as épocas e das civilizações recentes ou longínquas: da antiga Grécia ao Oriente, das Américas a Europa. Sempre mais elaborada e enriquecida de variantes e aplicações, esta antiga técnica decorativa, de origens humildes contribuiu para aumentar o fausto das cortes e dos palácios, de paramentos sacros e profanos, e enriqueceu um sem número de enxovais de futuras esposas. A sua época de ouro já esta superada, mas, apesar disso, o bordado e suas aplicações aparentemente simples, de artesanato doméstico essencialmente feminino, não deixou nunca de encontrar seguidoras, e hoje conhece uma nova era. (1981, p.7)

As vestes eclesiásticas, representando o século IX-XVIII mostradas na figura 6 (LEVENTON, 2009, p. 93), afirmando o que dizem Bonando e Nava (1981), a respeito do bordado ter decorado paramentos sacros:

Figura 06: Vestes bordadas do século XV Fonte: Leventon, 2009, p. 93

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Leventon, ao falar desta imagem vai costurando uma escrita a partir do significado que a imagem traz, remetendo aos seus bordado e sua relevância. Para ela: O bispo de branco, cor da maioria das vestes eclesiásticas na igreja antiga, trazia a conotação de pureza e, hoje é um dos quatro grupos de cores litúrgicas [...] decoradas com painéis retangulares e figuras bordadas na bainha. [...] A casula é a principal veste para celebrar missas, representada aqui na cor azul e enfeitadas com um aplique em forma de cruz bordada de ouro. A imagem é de um sacerdote veneziano de c. 1460 [...] (LEVENTON, 2009, p. 93).

A igreja católica nas celebrações festivas ainda utiliza vestimentas bordadas. Muitas vezes oferecidas por bordadeiras da comunidade. Também são bastante encontradas tolhas dos altares e mesas de celebrações ornamentadas com bordados. Sobre o bordado, encontro no livro: “Guia do Bordado” (BONANDO e NAVA, 1981), apresenta-se bem detalhado no que tange a informar e ensinar o modo de fazer, facilitador para alguém que deseje estar se incluindo na categoria de bordadeira. Quem se relaciona com as atividades artesanais eventualmente está à procura de histórias sobre as mesmas, ao mesmo tempo em que faz parte dessa história. Por isso então, isso ecoa com a afirmação de Demo (2003, p. 5), pois para ele: “a necessidade de fazer da pesquisa atitude cotidiana”. Venho procurando saber um pouco mais sobre isso, encontro então no livro “Mãos Preciosas: o Artesanato do Ceará” (BARROSO, 2008), um falar sobre bordado que até parece poesia:

A tarefa da mulher é sair completando com linha e agulha a obra divina. Povoar de sonhos os tecidos mais diferentes. Refazer a natureza que existia neles. Bordar flores, frutos, árvores, pássaros, tudo que flutua no ar e se abraça, tudo que se mistura e se enlaça. Ilustrar com carinhos, toalhas, colchas, lençóis, lenços, fronhas, anáguas, camisolas, palas, guardanapos, enxovais de noivas e recém nascidos. Por monogramas nos paninhos dos bebês. Bonito é a noiva bordar seu próprio enxoval, é a mãe bordar o enxoval do filho. Primeiro elas riscam o desenho a lápis no tecido. Depois o prendem a uma grade redonda, que chamam de bastidor. Usam apenas agulhas, tesourinha e um dedal. E saem passeando o fio com paciência pelas linhas do desenho, ponto a ponto: richelieu, cheio, matiz, corrido, crivo aberto, crivo fechado, crivo desfiado, de sombra, de marca, camada, aberto, cruz, estrela, paris, espinho. Passam meses naquela ocupação, até chegar

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ao arremate do bordado no dia do casamento ou do nascimento da criança. (BARROSO, 2008, p.59)

É um fazer repleto de emoções, de sentimento, um fazer brotar das mãos. Um fazer poético e estético de um bordado que vai tecendo um envolvimento, uma história. Como demonstram as palavras de Passos e Pereira, quando falam do fuxico.

Pega-se sobras de tecido e corta-se em pequenos círculos. Um por um, pesponta-se a borda, puxa-se com cuidado a linha para dar a forma franzida e arremata-se. Aperta-se levemente na palma da mão o tecido já cerzido, cuidando para que o arremate fique bem centralizado. Depois segue-se regando com uma boa conversa, costura-se essas pequenas partes em forma de mosaico para dar o acabamento desejado: colcha, almofada, bolsa, toalha de mesa, indumentária. Está pronto o fuxico. (2009, p. 7)

Este está pronto, remete a uma técnica utilizada para enriquecer bordados, que vem se destacando, deixou de ser aproveitamento de pequenos retalhos para compor peças de luxo.

Outras histórias [...] bordado em tecidos, cerzidos na memória e nas histórias orais. [...] Como todo mosaico, o fuxico propõe, em sua composição, um instigante jogo entre as partes que o constituem e o todo que forma. Cada círculo franzido – ou flor- tem sua própria identidade ( sua cor, sua textura, seu tamanho, a história do tecido de onde sobrara), mas é na relação com os outros que essa identidade se torna singular. Cada parte potencializa as possibilidades daquilo que pode dizer de si, ou daquilo que é, na presença de outras partes. Do mesmo modo, a arte do fuxico produz novas possibilidades de relações, tantas quantas novas combinações forem feitas. (PASSOS e PEREIRA, 2009, p. 8)

Faz–se necessário melhor refletir sobre as palavras das autoras, visto que sua colocação dialoga diretamente ao que pretendo expor sobre a relação das bordadeiras com os materiais usados, juntando-os a criatividade de cada uma, ou seja:

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A sobra do tafetá com que foi feito o vestido que freqüenta os grandes salões pode estar ao lado da chita que serviu para fazer a colcha, ou a toalha de mesa, ou a fantasia de carnaval. [...] a escolha de quem produz o fuxico, entretanto, não é arbitrária. Ela é feita com estudo e reflexão. É uma proposta estética, tem fundamentos lógicos e de valor, diz de um lugar e de uma compreensão de mundo. (PASSOS e PEREIRA, 2009, p. 8)

Os fuxicos vão aparecendo em diferentes lugares, como os trabalhos seguintes, composto por vários tipos de tecido, expostos a visitação no “5º encontro Gaúcho de Patchowrk e Bonecos e 1ª Feira de Tendências Artesanais”, feira que como monitora dos clubes de mães e pesquisadora, visitei em busca de idéias e informações. As figuras 7 e 8 são peças que impressionam pela riqueza do trabalho, a variedade de tecidos e de detalhes. Assim como estas, também outras com a mesma complexidade e beleza estavam expostas à visitação e ostentavam certificados de premiação. E de feira em feira, de exposição para outra exposição, agrego informações para seguir contando a história do bordado, da qual presencio momentos, enquanto me sinto produtora dessa história nas aulas que ministro.

Figura 07: Obra em patchwork Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 08: Obra em patchwork e fuxico Fonte: Acervo da Pesquisadora

Ser professora de trabalhos manuais para integrantes de clube de mães do

município

de

Forquilhinha,

para

meninas,

adolescentes

e

mulheres

freqüentadoras do Centro de Referência e Assistência Social (CRAS) de

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Forquilhinha/SC é dar mais alguns pontos nesse bordado. Ministro encontros em meu ateliê e ainda trago algumas experiências com alguns grupos com quem trabalhei, em Criciúma, Nova Veneza, Rio Cedro Médio - SC e Sapezal - MT. Minhas relações, enquanto professora de trabalhos manuais, se fazem com pessoas dedicadas aos diversos afazeres das linhas e agulhas. Trocamos experiências e lembranças. Nessas conversas acabamos sempre relatando reuniões de família, festa e presentes, batizados ou casamentos... Entre idas e voltas, nos guardados em baús antigos e com naftalinas encontramos peças que ultrapassam gerações e merecem serem reavaliadas. Quem é apreciador sabe que encontramos verdadeiras relíquias de valor estético nos armários das avós. Com elaboração e grau de dificuldade, que não são repetidas ao acaso, por isto tão grande valoração e apreço destinados às mesmas. Vestidos de batizado, de casamento, que muitas vezes se tornam ponto de honra usar o mesmo vestido, vê-lo repetido nas fotografias da nova geração. Peças que merecem ser guardadas pela beleza, pelo carinho quando bordadas pela gestante, avó, ou ainda por madrinha talentosa. Peças lindas como estas de renda renascença, executado por rendeiras do estado de Pernambuco, (figuras 9 e 10), mostradas a seguir.

Figura 9: Vestido de menina Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 10: Sapatinho de bebê Fonte: Acervo da pesquisadora

Figuras que remetem aos mimos, que fazemos aos bebês, que por representar alegres momentos, muitas vezes guardamos para dá-los de presente

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aos mesmos, quando adultos. Depois de ter contado muitas vezes a história do acontecimento a partir das peças bordadas, possivelmente para serem usados pelos netos, revelando uma história que a família escreve e desenha com os bordados que usam. Presentes também no armário da casa da mãe, que guarda bichos de pelúcia, bolinhas de gude, bonecas e outros mais. Tantas recordações dos filhos criança, adolescentes e depois jovens. Remeto-me a uma recordação em particular, o vestido de casamento (figuras 11 e 12), usado pelas irmãs Iara e Anita. Confeccionado por amiga da família e que a tia Terezinha fez questão de fazer o bordado do corpete.

Figura 11: Vestido de casamento Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 12: Mesmo vestido, anos depois Fonte: Acervo da Pesquisadora

Algumas vezes os motivos que impulsionam a relatar essas histórias, é o próprio falar do papel do bordado na vida dessas pessoas. Lembro inclusive de ter conhecido algumas peças do enxoval de minha mãe, uma toalha quadrada da mesa da sala, colocada em ponta para que melhor fosse visualizado o bordado. Rosas vermelhas com folhas em verde musgo causavam admiração tanto que não às esqueço. Barradinhos nas prateleiras do guarda-louça. Nas cristaleiras de minhas lembranças, bordados de ponto cheio, ponto atrás e ponto correntinha, e na minha cozinha, os pontos-cruz bordados de minha mãe.

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Figura 13: Bordados de ponto cruz, bordadeira Novelina Fonte: Acervo da pesquisadora

Nas roupas de cama de minha avó paterna, tinha algumas peças bordadas em Richelieu, tudo branco. Minhas tias bordavam, eu era criança, tenho na memória um vestido de uma prima um pouco mais nova que eu, todo bordado de abelhinhas em fio contado sobre cambraia. Inesquecível! Minha avó materna, italiana, usava lenço na cabeça, com bordados delicados. Poderia discorrer, ainda muito mais, como por exemplo: a toalha do meu enxoval que cobriu a mesa nos vários aniversários de meus filhos, ou a toalha branca que guardo ainda, bordada por uma de minhas irmãs, a Ivonete, com pequenas flores em pontos cruz em seus quadrados intercalados, figura 14, guardada só para ocasiões especiais. Ou então quando a saudade bate coloca-se a toalha na mesa, deixa arrumada e visualiza-se ela rodeada, com barulho da criançada se acotovelando para aparecer nas fotografias. Todos adoravam bolo de aniversário.

Figura14: Toalha bordada pela bordadeira Ivonete Acervo da pesquisadora

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Os bordados da Eliete, a terceira das filhas de minha mãe, revi seus trabalhos por ocasião do aniversário de 73 anos de minha mãe, e focando minha pesquisa, não resisti em fotografar para mostrá-los aqui. Parece uma pintura de tão miúdos e uniformes os pontos, como se revelam nas figuras 15 e 16:

Figura 15: Bordados da Eliete C. Zanatta Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 16: Bordados em ponto-cruz, Eliete Fonte: Acervo da Pesquisadora

É um trabalho encantador. Belezas que ela não vende, eventualmente dá de presente para pessoas muito queridas, talvez não venda porque não consiga se posicionar como vendedora. Também encantador é o bordado da delicada almofada – figura 17 – feita pela bordadeira Novelina M. Carradore, que com seus setenta e poucos anos continua a executar belos trabalhos, e presenteia filhas e netas, assim incentivando a dedicação, e a continuidade da arte de bordar.

Figura 17: Bordado pela senhora Novelina Fonte: Acervo da Pesquisadora

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Pessoas de talento, precisam continuar fazendo, ensinando e expondo seus belos bordados. Uma toalha de crochê, ou uma linda manta de tricô que agasalha o neto simboliza atenção, carinho, e são coisas que segundo o que afirma Leite (2004, p. 33), “[...] reescrevendo a história que, uma vez reescrita será sempre outra”, a nossa história.

2.3 O bordado e a Arte

É comum o desencontro de discursos sobre os trabalhos manuais e artesanais e sua relação com a arte. Então como se fosse possível chegarmos a um consenso, me empenho nessa discussão. Na literatura direcionada ao assunto nem sempre é possível encontrarmos uma definição, o que se confirma em Vogel quando afirma que:

[...] Atualmente, no uso cotidiano das palavras, é ainda freqüente a indefinição de fronteiras entre o que é artesanato, o que são trabalhos manuais e o que é arte, especialmente a arte popular. A rigor, trabalho manual, artesanato e arte popular remetem a objetos feitos à mão, mas em atividades que são diferentes entre si, embora suas técnicas às vezes de fato se confundam. (VOGEL apud MATTOS, 2008, p. 7)

E nessa tarefa de pesquisar tão envolvente assunto, nas conversas que provoquei, encontrei quem afirme que os trabalhos manuais são tidos como uma expressão cultural, como diz o Governador do Estado de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira na apresentação do livro organizado por Mattos:

O artesanato de uma sociedade expressa suas crenças, idéias e valores; revela suas circunstâncias, modos de viver e se expressar; traduz suas limitações e capacidades, seus medos e desejos, e, por isso mesmo, diz tanto sobre seu tempo quanto um tratado enciclopédico, as vezes até mais (2008, p.5).

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Há também outras contribuições como a de Soares (2002, p. 134), onde ele diz que “É a virtuosidade técnica aliada à vocação artística de cada pessoa, num extravasamento criativo que conduz certas obreiras à execução de perfeitas obrasprimas”. Em algumas publicações sobre trabalhos manuais, às quais tive acesso, sobre passo-a-passo de como realizá-los, alguns modos de execução, amostra de pontos, a tarefa de executar um bordado ou outro trabalho manual é colocada como arte. Cito, por exemplo, a revista publicada pela editora Fittipaldi (1998) sob o título “Faça Arte com Trabalhos Manuais”. Dá a entender no título, que fazer trabalhos manuais é fazer arte. Cito Também, a publicação de R. G. Santoro Editores Ltda. sobre bordados em vagonite, que o título é: A Arte de Bordar Vagonite. Outra da mesma editora que intitula-se: “A Arte de Bordar Ponto de Cruz” e da Online Editora: “Tapetes e Arte”, que ensina a bordar tapetes com ponto cruz, ponto rosinha, esmirna, arraiolos, entre outros, diz em seu editorial que “A arte de tecer tapetes continua presente na cultura de diversos paises” (s/d, p. 3). Ainda a reportagem da página 7 da revista Mãos de Ouro n° 41 de setembro de 2000, sob o título “Todas as Artes” que relaciona materiais para artesanato, cita a loja “A Casa da Arte” localizada no bairro da Mooca, em São Paulo. Todas utilizando a palavra arte em seus títulos, nos levando a entender que esses são trabalhos de arte. Afirmações assim levam as bordadeiras a se referirem sobre seus trabalhos, como obras de artes. Um belo trabalho, com algum grau de dificuldade, que se olha e não se encontra coragem para repetir, bordadeiras e apreciadoras afirmam: “é uma obra de arte”. Casos em que é mais promovida a beleza que a utilidade, peças que passam mais tempo dentro dos guarda roupas do que sendo usadas. Há uma preocupação pertinente em discutirmos o próprio conceito de arte, remeto-me então ao que afirma Coli:

O importante é termos em mente que o estatuto da arte não parte de uma definição abstrata, lógica ou teórica, do conceito, mas de atribuições feitas por instrumentos de nossa cultura, dignificando os objetos sobre os quais ela recai (1981, p. 11).

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Então, se não somos conhecedores do estatuto da arte, da regra que deve ser observada em tal avaliação, e os instrumentos de nossa cultura é variável, concordamos com o autor que a maioria desses trabalhos:

Não atinge um nível suficientemente elevado para que seja considerado como obra de arte [...] A autoridade institucional do discurso competente é forte, mas inconstante e contraditória, e não nos permite segurança no interior do universo das artes (COLI, 1981, p. 13).

Embora para fazer crítica a uma peça, quem o faça deva estar embasado de conceitos e regras, a forma como cada um vê o trabalho está impregnado de sua cultura formada em seu meio, por isso, a dificuldade em aceitar a decisão de que “A arte é aquilo que os críticos ou jurados definem como tal” (FARIAS, 2002, p. 64). Quem julga se é arte ou não, não detém todo conhecimento do universo, assim pode também cometer algumas injustiças, e estas podem custar gerações para serem corrigidas. Como vemos em relatos históricos, de pessoas que só foram consideradas artistas depois que os conceitos acabaram por sofrer modificações. Oliveira (2005, p. 8) afirma que “A compreensão da arte não se faz naturalmente, muito pelo contrário, ela é exigente, inquietante e requer sempre idas e voltas nos novos entrelaçamentos que propõe entre seus objetos e os destinatários”. Continuando essa discussão sobre o conceito de arte, Oliveira afirma ainda que:

A arte nos pede um tempo, aquele que ela depende para promover o nosso (dês) envolvimento que só se efetiva com o nosso aceitar as suas determinações. [...] Não sendo um objeto que se observa ao longe. Ou em reproduções de divulgação, a arte exige um contato face a face, uma vez que para a aquisição de competências que capacitem o destinatário a sentir o sensível, o que conta é a experiência vivida (OLIVEIRA, 2005, p. 8).

Para quem não vive essa situação, não executa com suas mãos o ponto a ponto deve ser difícil entender porque tanto valor é agregado à peça bordada. São histórias que vão sendo construídas durante o bordar. O pensamento “viaja” e nele se vive passado, presente e futuro, cada peça conta uma história. É preciso atenção

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para perceber no trabalho executado quanto o mesmo contém do artista ou artesão que o executa. Como professora de bordado, tricô, crochê, corte e costura e na elaboração de diversos trabalhos manuais, vou criando relações com pessoas dedicadas aos diversos afazeres das linhas e agulhas. Esses encontros, depois que tracei o problema dessa investigação, vão dando suporte para ampliar a compreensão sobre “de que forma a estética do bordado dialoga com o trabalho das bordadeiras que compõem a Associação dos Clubes de Mães da cidade de Forquilhinha? Falar de estética, falar de arte, emergem questões que precisam ser melhor evidenciadas, conceituadas para que essas reflexões encontrem a cientificidade necessária. Encontramos nas feiras e exposições, e não raro nos deparamos com trabalhos que fazem surgir a expressão: “Isto é uma obra de arte !!” “.... quem faz isto é um artista!!”. Exclamações estas, não aceitas por colegas integrantes da turma de Pós–graduação, por exemplo. A maioria dos graduados em artes, afirmam que trabalho manual e artesanato não se encaixam no termo arte. Busco algumas reflexões para melhor pensar o ato de bordar, fuxicar, tricotar... Pois como diz o Governador de S/C Luiz Henrique da Silveira, na apresentação do livro “Feito à Mãos: O artesanato de Santa Catarina”:

A arte do artesanato pode ser garimpada [...] passando pelos adornos e utensílios das nações indígenas já no século XVI, até hoje, onde convivem com a sociedade pós-industrial não só as nossas rendeiras, sobrevivência da cultura açoriana... (MATTOS, 2008, p. 5)

E assim nesse concordar e discordar, cito Costa (1999, p.7), onde ela afirma que: “Muitos falam em arte referindo-se às obras consagradas que estão em museus, [...] alguns consideram arte apenas o que é feito por artistas consagrados, enquanto outros julgam ser arte também as manifestações da cultura popular [...]”. Nesse diálogo que busco com diversos autores encontro em MORA (1998, p. 48), a afirmação de que “[...] no século XX, com as numerosas resoluções artísticas e a dissolução da rígida divisão entre as diversas belas artes, apagou-se a distinção entre arte e artesanato”. O autor ainda afirma que:

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A estética ocupa-se de certos juízos de apreciação na medida em que se aplicam à certos valores (o feio e o belo) a filosofia da arte é uma reflexão filosófica sobre a arte e não sobre os objetos artísticos como tais;a ciência das artes se ocupa das regras (variáveis) que presidem a elaboração das obras de arte; a psicologia da arte é dos estados de consciência e dos fenômenos inconscientes que concorrem na criação e na contemplação da obra artística (MORA, 1998, p.48).

Ponto a ponto falar de arte e de bordado é tão simples e tão complexo, como executá-los. A pesquisa é um caminho, o que, parafraseando Demo (2003), afirmo que o questionamento reconstrutivo com qualidade [...] é o cerne do processo de pesquisa. Para elucidar algumas questões, buscamos o diálogo com o bordado no Clube de Mães de Forquilhinha, enquanto trago uma fala sobre estética.

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3 O BORDADO NO CLUBE DE MÃES DE FORQUILHINHA: UM DIÁLOGO COM A ESTÉTICA

Para falar sobre o bordado no Clube de Mães, faço opção nesse momento, de abordar questões que circulam sobre a estética do bordado, proponho o diálogo a partir do que defende Richter:

Mas o que é valor estético? Para Rader e Jessup, valor estético se relaciona com o prazer que o ser humano experiência no simples olhar a natureza ou para objetos fabricados; o prazer em ouvir a canção dos pássaros ou uma música; em sentir um pedaço de madeira ou a textura de uma lã; em arrumar uma mesa atrativa ou um canteiro de flores (2003, p.23).

Para cada indivíduo, o prazer experimentado pode ser diferente, alguns se encantarão mais diante de uma música, outros diante de belas flores, e ainda, outros diante de um significante bordado. Continuando a explanação sobre valor estético, a autora diz ainda:

A experiência estética envolve muito mais do que simples prazer. Ela pode provocar toda a mente e o espírito do ser humano, pois se relaciona, de inúmeras maneiras, com outros interesses e experiências e com outros valores. [...] a experiência estética amplia o conceito de arte, pois arte significaria, genericamente, a criação de valor estético, em qualquer que seja sua forma (RICHTER, 2003, p. 24.)

Utilizo-me da figura 18, um bordado com fitas, bela peça para possibilitar o sentido explanado acima. Repetindo que a experiência estética pode provocar toda a mente e o espírito do ser humano.

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Figura 18: Bordado com fita – Angelina Fonte: Acervo da pesquisadora

Por algumas pessoas será experimentado o desejo de obter a peça: desejarão comprá-la. Outras desejarão saber como se faz. Tentarão aprender e executar o bordado. E também há pessoas que ao verem um belo trabalho, seu pensamento será remetido a alguém que gostariam de presentear, para ver a felicidade de quem recebe. Oliveira define a estética enquanto fala de arte afirmando que:

Assim, diante de um arranjo estético, constata-se que os elementos da composição não estão colocados como adornos, enfeites, decoração, mas aí estão posicionados em um modo particular de presença. Ao nos fazer senti-los, nos faz construir sua identidade, seu estilo, sua significação. Ao arranjos da arte chamam a atenção sobretudo, para as suas características formais, ou seja, sua estética, que, antes de um conteúdo qualquer, promove o contato com a rede de articulações tramada na montagem do todo. Pela ação das qualidades plásticas sobre nós, apreendemos como desbravar esse enredamento particular. (OLIVEIRA, 2005, p. 9)

E os arranjos tramados na montagem da peça, envolvem desde o planejamento do bordado, o tecido mais apropriado, a cor que terá mais relação com o ambiente a ser colocado. Nestas palavras, visualizo uma toalha de mesa grande, em tons de bege, num algodão de espaços definidos por tramas de fios que formam quadrados, que ao olhar para fios bem tecidos sugerem bordar ponto cruz. Tudo em volta faz com que a toalha provoque a mente criadora, e assim será mais uma vez

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algo digno de admiração. Como também nasce das mãos criadoras de Rejane, monitora de clube de mães, os quadrinhos da parede e esta linda camiseta bordada em patchwork para sua filha, somado ao sorriso de satisfação, mostrados na figura 19:

Figura 19: Rejane mostrando seu trabalho Fonte: Acervo da Pesquisadora

Assim, também as outras monitoras dos clubes de mães constroem seus diálogos com a estética. É o caso do Crivo, técnica que está sendo resgatada em Forquilhinha, pelas integrantes dos Clubes, em trabalhos oferecidos pela Associação de Clube de Mães.

Figura 20: Bordado de Crivo Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 21: Bordado de Crivo Fonte: Acervo da Pesquisadora

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Foram executadas algumas peças no ano de 2009 e 2010, evidenciando o bordado de crivo, além de alguns trabalhos utilizando a mesma técnica, com pontos diferentes, para propiciar um aprendizado gradativo às bordadeiras. A primeira vista, houve a insegurança e a preocupação de não conseguir executar os pontos sugeridos. Mas com persistência os trabalhos foram melhorando a cada peça, também foram aparecendo quem se identificasse com o novo fazer, o que relato por ter vivenciado esse processo. O bordado nos clubes de mães de Forquilhinha vem sendo aperfeiçoado no decorrer dos anos, as bordadeiras aceitam os novos desafios e assim, sempre são sugeridas novidades que embelezam, a cada novo trabalho, as casas das executoras, das presenteadas e das aquisitoras.

3.1 O bordado e a cultura local

O bordado reflete uma implicação cultural, familiar e tradicional. Em casa de bordadeira é comum a menina aprender bordar, pois a avó e a mãe fazem questão de ensinar. Para comentar a questão da cultura, Thomaz explica:

(...) a cultura se refere à capacidade que os seres humanos têm de dar significado às suas ações e o mundo que os rodeia. A cultura é compartilhada pelos indivíduos de um determinado grupo, não se referindo, pois, a um fenômeno individual; por outro lado, cada grupo de seres humanos, em diferentes épocas e lugares, dá diferentes significados a coisas e passagens da vida aparentemente semelhantes (THOMAZ, s/d apud RICHTER, 2003, p.17).

Nesse desejo de compartilhar das coisas que aprendi desde menina, venho buscando adeptas, com o discurso de que “o que se aprende o ladrão não rouba, o conhecimento será sempre nosso”. Na tenra idade é uma ocupação saudável, depois mais tarde poderá vir a ser uma opção de trabalho e renda. As meninas da figura 22 e 23 fazem questão de sorrir para este registro enquanto implantam o gosto pelo bordado. Como novas seguidoras, e ressaltando a importância de aprender, valorizam seu tempo ocioso, pois neste afazer se mantêm

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ocupadas, fora dos horários escolares bordando. Além de ser uma forma de tê-las por perto sob olhar cuidadoso do adulto, nas conversas intermediárias entre um ponto e outro, alertamos que pode vir a ser uma fonte de renda.

Figuras 22 e 23: Meninas aprendendo a bordar no Ateliê ETI ARTE Fonte: Acervo da pesquisadora

Vivi na casa de minha avó paterna alguns anos de minha adolescência e ela me colocou para aprender bordados desde criança. Considero que o esforço dela foi válido e tento passar isto a quem seja possível. Aprender ainda criança, enquanto não se tem maior compromisso com escola ou trabalho, é um bom momento. O que se aprende é tesouro para sempre. Aprendi que saber é a riqueza que ladrão nenhum leva. Meu pai costumava dizer que saber não ocupa lugar; com estas palavras incentivava a que nos esforçássemos a aprender. Ele tinha oportunidades de sair para centros maiores e um belo dia chegou de volta para casa com agulhas de bordar ponto russo, comprou de um vendedor que fazia demonstração na rua e levou para mim. Talvez daí, dessas lembranças, venha o gosto em repassar modos de fazer para meninas e adolescentes. Cada ser age de acordo com sua cultura, seu viver, pois:

Ao analisarmos as diferentes dimensões da cultura em que estamos imersos tomamos consciência de que se trata de um universo diversificado

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e provocativo. (...) Neles estão presentes expressões de diferentes universos culturais, assim da arte e da ciência, do artesanato [...] alguns falam de um verdadeiro labirinto em que se dão formas originais de produção cultural (CANDAU, 1995 apud RICHTER, 2003, p.18).

A significação dada por quem olha um vestido bordado, colocado numa vitrine de uma boutique da cidade, e que se imagina usando o vestido numa festa, espera receber o olhar que signifique como essa pessoa está bonita neste vestido. A pessoa quer ser valorizada dentro da peça. Diferente da significação dada por quem executa o trabalho, que contando minúcias espera ver o vestido ser o sucesso da festa. São olhares diferentes, provocados pela cultura do fazedor, criador dos detalhes e a cultura do aquisitor, onde o mais importante é vestir o vestido. Então sobre a cultura de trabalhos manuais em Forquilhinha faço opção por me referir a Associação dos Clubes de Mães, porque, assim foi oportunizada a proliferação das variadas técnicas, socializando conhecimento em diálogo com a cultura local. Quem já conhecia e gostava de bordados, pode demonstrar seu talento, quem apenas via e achava bonito teve oportunidade de aprender, se aperfeiçoar e executar belos trabalhos. A cidade tem entre suas moradoras mais antigas, bordadeiras como Tecla, monitora de clube de mães por mais de 20 anos, que em conversa que tivemos, lembra de alunas das primeiras turmas: reconhecidos talentos. Para continuar falando de bordado e sua relação com a cultura local, remeto-me à história do Clube de Mães, no capítulo que segue.

3.2 Histórico – Clube de Mães

Este histórico foi fornecido pela secretaria da associação, a diretoria atual é dirigida pela presidente Marilda. Faz parte de seus registros, por isso são dados que coloco na íntegra.

A Associação de Clubes de Mães de Forquilhinha foi constituída em 21 de dezembro de 1990, logo após a emancipação deste Município. É uma

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entidade que atua sem fins lucrativos e que nasceu da iniciativa de um grupo de mulheres. A Associação tem como objetivo central: Promover o desenvolvimento e aprendizado de atividades artesanais que confeccionadas resgatam os aspectos culturais e históricos da população forquilhinhense, bem como com a venda desses produtos possam contribuir no complemento da renda familiar das mães que participam dos clubes. Despertar a consciência participativa e comunitária no sentido da emancipação da pessoa humana, através das práticas esportivas e recreativas. Oportunizar palestras de orientações sobre saúde preventiva, dentre outras informações de extrema importância às mães. Durante todos estes anos muitos foram os trabalhos desenvolvidos e também muitos foram os uniformes utilizados nos clubes. Ressaltamos que a Associação já contou com a dedicação voluntária das Presidentes e vices, as senhoras: 1990 a 1992 – Ana Maria Maag Ricken e Rosa Maria Tomazi Dassoler; 1993 a 1996 – Rosa Maria Tomazi Dassoler e Maria Inês Coelho Arns; 1997 a 2000 – Ana Maria Maag Ricken e Miriam Hoepers; 2001 a 2004 – Miriam Hoepers e Maria Inês Coelho Arns; 2005 a 2008 – Miriam Hoepers e Maria Inês dos Santos Rodrigues. 2009 a 2012 – Marilda Casagrande Alexandre e Louvani de Fátima Sebastião da Silva. Os Clubes de Mães de Forquilhinha participam também de alguns projetos sociais em parceria com Secretaria Municipal de Saúde, Secretaria de Ação Social, Empresas, Parque Ecológico, tais como: Embelezamento dos espaços públicos Com o objetivo de embelezar, através de jardins, locais públicos dos bairros, onde são oferecidas mudas de flores e plantas pelo horto municipal e as integrantes dos Clubes, plantam em espaços próximos ao local de encontro semanal. Confecção de kit gestante Com o objetivo de incentivar as gestantes a participar dos cursos de formação realizados nos postos de saúde, o KIT contendo roupinhas e edredon confeccionadas pela associação dos clubes de mães e pelas voluntárias da Irmã Norberta é doado pela instituição a mães que participam de reuniões educativas durante a gestação. Incentivo ao trabalho voluntário Como o Grupo de Voluntárias da Irmã Norberta, que é um grupo que dedica seu tempo aqueles que mais precisam. Uma vez por semana elas se reúnem para confeccionar edredons, roupas de bebê e o que mais for necessário para ajudar pessoas carentes do município. Durante todos esses anos nunca contaram quantas peças confeccionaram, mas afirmam que puderam ajudar muitas famílias. Os encontros se transformam em animadas tardes, enquanto trabalham compartilham alegrias e se ajudam em momentos difíceis.

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Muitas senhoras já participaram do Grupo, mas atualmente o grupo é formado por: Elza Preis Backes, Evilásia Eyng Tiscoski, Melita Preis Eyng, Valdina Nuernberg Eyng, Hilda Minatto Spillere, Célia Marcelo Mariott, Ludvina Kurtz Eyng, Sônia Brina Baggio, Tatiane dos Santos. “O exemplo dado por elas e o bom trabalho desenvolvido deve servir de modelo a gerações futuras no que se refere à solidariedade humana”. Estas senhoras, citadas no histórico acima, compõem o grupo: “Voluntárias da Irmã Norberta”, nome dado em homenagem a irmã Norberta que enquanto viveu, desempenhou funções de caridade aos moradores de Forquilhinha. A grande maioria atuou com ela, inclusive a fundadora da associação dos clubes de mães. A associação tem grande valoração de todos os munícipes. A sua fundadora recebeu por ocasião do aniversário de 20 anos de emancipação política da cidade de Forquilhinha, o titulo de cidadã Forquilhense. Homenagem que a fez muito feliz, segundo suas próprias palavras: “Ficaram registrados na minha memória, muitas lembranças e histórias felizes”. E, continuando a responder a minha pesquisa ela conta: “Lembro-me, por exemplo, do primeiro treinamento dado às monitoras dos clubes de mães, que fora realizado na garagem da minha casa, já que éramos carentes de prédios públicos”. E com a alegria de grande mulher, vista na figura 24 afirma: “Foram tempos pioneiros sem as facilidades que, graças a Deus temos atualmente”.

Figura 24: D. Ana Maria Magg Ricken Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 25: D. Ana e seu bordado Fonte: Acervo da Pesquisadora

D. Ana ocupou a função de presidente por duas administrações, e em sua casa, onde mora só, ela responde a quem questione essa condição dizendo que:

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“Não estou só. Estou com meus bordados, faço crochê, costuro um pouco, adoro fazer bolachas...” e apresentou o belo trabalho executado por ela, visto na figura 25. O logotipo atual da Associação foi adotado na atual administração por opção da direção e das monitoras que escolheram entre alguns modelos oferecidos qual formato e cores mais gostaram (figura 26).

Figura 26: Logotipo do Clube de Mães Fonte: Associação de clubes de Mães de Forquilhinha

As letras da palavra mães desenhadas com arabescos, remete a bordado, carinho, emoções. Talvez daí venha o motivo das monitoras terem escolhido esse modelo. Esse “enroladinho” das letras remete a abraços, aconchego. E como a atividade é repleta de atenção e carinho tanto das monitoras, quanto das monitoradas, este carinho esta representado na forma das letras escolhidas. E a cor? Porque lilás? Lilás de violetas. Quem não é apaixonado por violetas? Aquelas florzinhas miudinhas delicadas que de vez em quando ganhamos de presente. A sua delicadeza lembra bala de goma coberta de açúcar... Quer algo mais doce? Só amor de mãe! Voltando a cientificidade, opto por relatar um pouco da história da associação utilizando as falas das monitoras mais antigas: Tecla, Fátima, Marilva e Dilza contam com detalhes como aconteceu a implantação do clube de mães. Relembram que anterior à associação existia o grupo de voluntárias que se reuniam para fazer peças artesanais para serem doadas às gestantes carentes, acolchoados para campanha do agasalho. Roupas que a Irmã Norberta ganhava de seus amigos e parentes da Alemanha, as quais eram consertadas, ajustadas e doadas a quem precisasse. Além das coisas materiais: um pouco de amor. Assim, pela conhecida vocação em doarem-se, essas mulheres passaram a ser procuradas ainda mais por pessoas pedindo que as ensinassem os primeiros

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pontos. Por esse motivo, a senhora Ana Maria Maag Ricken, mãe do primeiro prefeito de Forquilhinha, que fazia seu papel de primeira dama sentiu a necessidade de criar a Associação, e desde a primeira administração, no ano de 1990, a oportunidade esta sendo oferecida em todas as comunidades do centro e interior. A idéia atraiu mulheres de todas as idades, que se fazem seguidoras desde o início da implantação da Associação até nossos dias. E desses primeiros pontos foram se revelando talentos, pessoas dedicadas e caprichosas, que atraem a exposição de trabalhos todo fim de ano grande número de visitantes. Como afirma Soares (2002, p.13), “Ao se estudar as manifestações das camadas mais simples das populações, muitas vezes nos surpreendemos ao encontrar um valioso saber”. Na continuidade do falar do bordado, vamos falar da cidade, como diz Italo Calvino (1990, p. 45), [...] “Partiram em busca daquela cidade; não a encontraram, mas encontraram uns aos outros; decidiram construir uma cidade como a do sonho”. O sonho, que nessa conversa se veste com um bordado ímpar, bordado feito a mão com contribuições diversas.

3.3 O bordado e a cidade

As administrações de muitas cidades voltaram seus interesses para o turismo e uma maneira de ter uma marca própria tem se revelado através do artesanato ou trabalhos manuais. E referindo-se a esse assunto Vogel afirma que:

Um primeiro interesse comercial pelos objetos artesanais começou a aparecer em Santa Catarina nos anos de 1960 [...] E na medida que se acelerou a integração comercial e o turismo, cresceu o interesse pelo artesanato. Assim ganhou estímulo e revigorou-se o artesanato dos diversos povos que colonizaram o território catarinense (VOGEL, 2008, p. 9).

O turismo continua sendo um grande atrativo para a produção de trabalhos artesanais e manuais, e algumas cidades interioranas como no caso de

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Forquilhinha, se esforçam para aparecer mais no cenário de festas típicas. Agregam forças na organização dos eventos chamando artesãos para comporem esse cenário, oferecendo espaço e estrutura para que a variedade de trabalhos executados seja mostrada e sirva de atração aos visitantes, como vemos nas figuras 27 e 28. Feira realizada na festa de aniversário do município em abril de 2010. Reforçando esse interesse em agregar forças e melhor cuidar dessa questão, oferecer oportunidade de expor e vender os trabalhos, no dia da cultura, dia 5 de novembro de 2010, é então criada a Associação Forquilhense de Artesãos (AFA), visando assim, otimizar o trabalho das pessoas que se envolvem com o bordado e outras atividades correlatas. Nessa otimização, está inclusa a possibilidade de o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) estar ajudando a resolver a questão de como calcular o preço de venda das peças, agregando assim, maiores informações a respeito do que as possíveis de encontrar nas páginas das revistas de artesanato.

Figura 28: Feira no centro da cidade Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 29: Feirarte – abril de 2010 Fonte: Acervo da Pesquisadora

O artesanato vai se integrando às festas da cidade por meio do bordado, em Forquilhinha. Para Vogel, seria o fato de que “Algumas técnicas e objetos artesanais que pareciam perdidos começaram a ser redescobertos. A valorização comercial e as positivas reações locais [...] redescobriram a tradição” (VOGEL, 2008, p.11). Embora a cidade seja composta pelas etnias italiana e alemã predominantemente, temos também com menor volume, mas não menos importante,

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outras etnias, como por ex: japoneses. De todos os berços que fundaram nossa cidade, a cultura é composta também pelos lindos bordados que vemos desfilar em dias comemorativos, nas festas típicas, ou nos colos das mães envolvendo seus bebês.

Nos presentes oferecidos à amigos e familiares, o trabalho manual e o

bordado é sempre uma opção. No Município de Forquilhinha a Associação trabalha em todas as 36 comunidades, isto é significativo para que a cultura artesanal se implante fortemente. O que em outros tempos era visto como uma simples atividade de integração entre as mulheres de cada comunidade, e de comunidade com comunidade, rende outros frutos. O cuidado, o embelezamento da produção tem sido constante e já se encontram algumas comerciantes entre essas mulheres. Com a dedicação a estes trabalhos, as mulheres que participam dos grupos têm ampliado a renda familiar, apesar de muitas vezes, ainda a timidez impedir de oferecer sua produção. Não é raro ouvir de admiradores elogios que as deixam felizes e incentivadas a produzirem peças cada vez mais bonitas e cheias de técnicas diferenciadas. “Com o que ganho com a venda ajudo em casa, se for viver somente do salário do meu marido, não dá” conta Eugenia Hipólito, 44 anos, que produz trabalhos manuais e comercializa em casa. “Adoro, é uma terapia” afirma a mesma. (CRISPIN, 2010, p. 1). Assim como Eugenia, existem tantas outras, que fazem seus trabalhos em casa e vendem para as amigas e são felizes fazendo o que gostam. A exposição dos trabalhos executados pelos clubes, que acontece como encerramento das atividades todo final de ano, na maioria das vezes em novembro, é um evento para a cidade. Faz parte da programação dos festejos de Luzes de Natal, e sempre aguardado com expectativa. Cada clube procura surpreender com identificações variadas, cada um querendo ter o bordado mais bonito, mais diferente, identificando seu espaço, aguardando elogios. São geralmente dois dias de intensa visitação. As cidades vizinhas são convidadas para prestigiarem e são recebidas com muita alegria.

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4 QUESTÕES METODOLÓGICAS DA PESQUISA

No desenvolvimento desta pesquisa, que tem como problema: “de que forma a estética do bordado dialoga com o trabalho das bordadeiras que compõem a Associação dos Clubes de Mães da cidade de Forquilhinha? Trago minhas experiências que dia-a-dia me levam a observar mais e mais o contexto em que estamos inseridos: falo de nós bordadeiras. Remeto-me a afirmação de Silva e Grigolo:

Quando pesquisamos, a realidade não é simplesmente aceita tal qual ela é; necessitamos percebê-la, conhecê-la melhor, desvenda-la para poder transformá-la. Nossas explicações, por sua vez, dificilmente conseguem compreender a realidade em toda sua extensão. Por isso mesmo, referenciais teóricos e metodológicos são tentativas de compreender, de resolver os problemas que nos são apresentados pela realidade, que nunca se esgotam em sua plena compreensão (2006, p. 14).

A metodologia utilizada para o desenvolvimento deste trabalho que se caracteriza como uma pesquisa qualitativa, envolveu pesquisa de campo. A mesma foi efetivada em locais de trabalho (aulas por mim ministradas – no CRÁS, nos Clubes de mães e no meu próprio atelier), conforme afirmam ainda as autoras: “A pesquisa de campo é assim denominada porque trabalhos de ‘coleta de dados’ pelo pesquisador são efetuados em campo, ou seja, onde acontecem espontaneamente os fenômenos pesquisados...” (2006, p. 32). Continuando também em feiras e em alguns eventos nos quais pude me fazer presente coletando dados relevantes para essa investigação. Para Chizzotti, quando fala de pesquisa qualitativa, afirma que:

A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por uma teoria explicativa; o sujeito observador é parte integrante do processo de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes significado. O objeto não é um dado inerte ou neutro; está

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possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas ações. (CHIZZOTTI, 2005 apud SILVA e GRIGOLO, 2006, p.17)

Como instrumento de investigação, tracei algumas perguntas desenhadas na forma de um questionário. Aplicada às pessoas de diversos segmentos, ditos artesanais, artísticos e trabalhos manuais e também dirigida para homens e mulheres a partir de suas relações com os eventos afins. Chamo de formulário um questionário com perguntas e espaço para respostas, também com item pedindo que assinassem autorização permitindo a utilização das informações, o mesmo contempla as seguintes perguntas:



Como você classifica sua produção, é um trabalho, um Hobby, uma arte?



O que levou a se utilizar desta atividade?



Qual a importância deste evento para sua atividade?



O que difere arte, artesanato e trabalho manual? Diga sua opinião.

Tendo em vista meu projeto de pesquisa, antes mesmo de elaborá-lo, vinha com o assunto em mente. Por isto as primeiras entrevistas que fazem parte dessa pesquisa foram realizadas em setembro de 2009, com um grupo de 11 (onze) mães do clube da comunidade de Santa Cruz. Depois na “feira de arte, trabalhos manuais e artesanato”, realizada no pavilhão de eventos Dr. Ijair Conti nos dias 27 e 28 de março de 2010, em Criciúma/SC, na qual 17 (dezessete) pessoas responderam minha pesquisa. No dia 16 de maio de 2010 em Curitiba, no Largo da Ordem, 3 (três) pessoas responderam. Ainda no dia 21 de maio no encontro de monitoras dos clubes de mães da Associação dos Municípios da Região Carbonífera (AMREC) e exposição de trabalhos manuais e artesanais de Nova Veneza, 6 (seis) monitoras atenderam meu pedido e responderam ao questionário. No “5º Encontro Gaúcho de Patchwork e Bonecos e 1ª Feira de Tendências Artesanais” 1 (uma) pessoa respondeu. A última com formulário foi dirigida a integrantes da Feirarte, durante a festa Municipal do Colono e Motorista, em Forquilhinha/SC, onde 9 (nove) pessoas responderam as perguntas relacionadas ao assunto. Compondo assim o número de 47 (Quarenta e sete) pessoas que responderam aos questionários, mas a pesquisa se estende no meu dia a dia, empolgada com as proposta fui bordando

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essa conversa, procurando não perder o foco a partir da (re) construção do problema. Quando em julho estive em Cuiabá, durante a Feira e exposição me surpreendi com o responsável por um espaço no evento, um homem que enquanto falava comigo, executava seu crochê tranqüilamente e me afirmava que todos os trabalhos colocados à venda naquele espaço ele executara, muito bem acabados, caprichados (figura 29). Outro evento visitado por ocasião da pesquisa foi o “Arraial Fest”, em Sombrio/SC. Onde pude conferir os trabalhos expostos, conforme figura 30.

Figura 29: Evento em Cuiabá Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 30: Arraial Fest Fonte: Acervo da Pesquisadora

Continuando minhas ações de pesquisadora, conferi em Paragominas, no Pará como a cidade organiza a exposição e o acesso dos aquisitores ao trabalho dos artesãos. No Parque Municipal Ambiental onde funciona a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo existe uma exposição de bordados e outros trabalhos manuais à venda durante a visitação ao parque. Figura 31, (A arara é de verdade!), constatei também que em Paragominas a feira na praça acontece aos domingos, final de tarde, entrando pela noite, para aproveitar o horário de temperatura mais agradável.

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Figura 31: Exposição de bordados Paragominas Acervo da pesquisadora

Minha empolgação com o presente tema, enquanto atropelava o processo, ia elucidando diferentes caminhos que se construíam ponto por ponto, durante um espaço de tempo limitado que se configurou em 13 meses. De setembro de 2009 à novembro de 2010.

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5 ANÁLISE DE DADOS: O QUE DIZEM AS BORDADEIRAS?

As bordadeiras são pessoas que envolvidas com agulhas e linhas contam um pouco de suas histórias. Nas várias entrevistas feitas durante o projeto de pesquisa, falas das entrevistadas continham muitas vezes, um dizer de que utilizam deste artifício para se livrar de casos depressivos ou de solidão pós-aposentadoria. Outras que acabaram por aumentar a renda familiar executando peças e atendendo pedidos. Ainda outras por não resistirem à atração exercida ao olhar belos trabalhos. Esses dizeres vão estampando as próximas páginas, nos recortes sobre cultura, artesanato, bordado, arte e cidade. Busco assim reflexões a partir dessas categorias de análises para melhor elucidar o problema dessa investigação, qual seja: “de que forma a estética do bordado dialoga com o trabalho das bordadeiras que compõem a Associação dos Clubes de Mães da cidade de Forquilhinha?” Para tanto faço alguns recortes, como a experiência que trago de minhas viagens a partir da relação que trago com o bordado. A senhora Stael Macedo, encontrei-a na feira do Largo da Ordem em Curitiba - PR, respondeu minhas perguntas dizendo que a sua produção é arte em renda de Frivolité, é um trabalho, e, que foi levada a essa atividade pela necessidade de agregar valor a renda familiar. Participar da feira do largo da Ordem onde trabalha em Curitiba, Paraná, ela considera uma renovação de vida. Muito satisfeita em ser uma das poucas pessoas que executam esse tipo de trabalho me permitiu que fotografasse as peças que mostro a seguir.

Figura 33: Stael respondendo a pesquisa Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 34: Toalha com renda de Frivolié Fonte: Acervo da Pesquisadora

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É bordado delicado, e precisa ser habilidosa a bordadeira que pretenda ser uma rendeira de frivolité. Rendeiras antigas usavam a “navete” para executar esta renda. Agora com toques de modernidade esta sendo repassada uma técnica que reproduz o mesmo resultado com agulha. A seguir, na figura 34, um modelo de navete pode ser conhecido.

Figura 35: Navete: instrumento usado para executar Frivolité Acervo da pesquisadora

Encontrei na pesquisa realizada no pavilhão de eventos Dr. Ijair Conti, em Criciúma, por ocasião da feira e exposição da cidade nos dia 27 e 28 de março de 2010, a senhora Ângela Maria Corrêa Lima, que nas respostas ao questionário, afirma: “É trabalho, hobby e arte. O meu trabalho é feito com amor e principalmente com muito prazer.” O que a levou a se utilizar desta atividade? “Sempre gostei de artesanato. Após a aposentadoria, uni o útil ao agradável, comercializando meus produtos”. A importância do evento, para sua atividade? “É com eventos assim que podemos mostrar que tem muita gente fazendo coisas bonitas”. O que difere arte, artesanato e trabalho manual? Diga a sua opinião. “Para mim não tem diferença. É um trabalho manual feito com arte”. Nessa linha de pensamento seguem-se várias afirmações. Em resposta a essa última questão: O que difere arte, artesanato e trabalho manual? O aluno do curso de artes visuais da UNESC, Breno Stern Cruz afirma: “Toda opinião sobre arte é superficial. O fazer sensível, criativo, caprichoso e com carinho evidencia a cultura da pessoa e a sua relação com o meio, fortalecendo os laços de união e reforçando valores pacifistas. A diferença entre as atividades é gerada pelo mercado de arte. O artesanato brasileiro é ‘coisa fina’ no mundo inteiro”.

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Outra pessoa pesquisada no mesmo evento foi Sandrelena Lima da Silva, formada em Artes Visuais e Pedagogia, que em resposta ao questionário classifica sua produção como “artesanato”. A segunda questão respondeu que seu trabalho “é uma arte, forma de trabalho, um hobby”. O que levou a se utilizar desta atividade? “O gosto pela arte e a necessidade”. Qual a importância deste evento para sua atividade? “A exposição, a apresentação do meu trabalho para a sociedade”. O que difere arte, artesanato e trabalho manual? Diga sua opinião. “A arte vem de dentro de você, é um sentimento. O artesanato é uma técnica para você representá-lo. O trabalho manual apresenta a arte com as mãos, com toque. O trabalho sem a utilização de materiais industrializados caracteriza ainda mais o artesanato”. Eliane Stanger, bordadeira e fuxiqueira classifica sua produção como “trabalhos manuais”, a segunda questão afirma que é um trabalho. O que a levou a se utilizar desta atividade? “Para ajudar na renda familiar”. Qual a importância deste evento para sua atividade? “Bom para divulgação cultural”. O que difere arte, artesanato e trabalho manual. Diga sua opinião. “Olhando pelo trabalho de cada tipo, tudo é uma arte”. Na seqüência desse exercício de conversa, vou pontuando questões mais específicas, sobre cultura, bordado, artesanato, arte e cidade.

5.1 Sobre a Cultura A discussão sobre cultura popular continua na ordem do dia, enriquecida pela fusão das preocupações político ideológicas, [.com um maior rigor na pesquisa e análise das manifestações culturais populares, o que leva ao aprofundamento das questões conceituais.] dessa forma, a cultura popular é entendida como produção historicamente determinada, elaborada e consumida (AYALA e AYALA, 2002, p.50).

A cultura enraizada e tradicional, que persiste no diálogo das bordadeiras freqüentadoras dos Clubes de Mães, ainda é a de participar do clube como oportunidade de interação e captar o que lhes é possível como aprendizado, além de receber o trabalho que é oferecido a cada bimestre pela Associação. Não está no objetivo da maioria ser uma bordadeira comerciante. É uma questão a ser mais trabalhada, inclusive no aumento da auto-estima e preparação com técnicas de vendas. A maioria das entrevistadas não consegue dar o devido valor ao seu

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trabalho. Como afirma Lucimar Marcelino, integrante do clube de mães Santa Cruz, interior de Forquilhinha, “Não vendo, só faço para a família e presenteio alguém”. Também Janett Medeiros diz com convicção: “Eu faço os trabalhos com amor, mas não vendo, fico para mim e faço também para presentear”. Sobre seus trabalhos Angelina afirma: “São para presentear as pessoas amigas, aniversários e no final de ano”. Mesmo boas bordadeiras, talentosas com linhas e agulhas não se sentem vendedoras, muitas delas recuam a pergunta “quanto custa?”. Preocupação presente nas falas da maioria das bordadeiras e nossa sugestão tem sido para que os órgãos administrativos ofereçam palestras de orientação do SEBRAE, para ajudar a definir melhor esta tarefa. Inclusive para as monitoras, durante anos a sua preocupação era somente ensinar como fazer o trabalho. A função de vendedoras foi acontecendo com o tempo, em função dos pedidos insistentes, então superando, em termos, esta dificuldade, passaram a executar seus trabalhos também para vender (figura 35).

Figura 35: Monitora Tecla bordando Fonte: Acervo da Pesquisadora

Artesãos de maneira geral esperam que com a criação da AFA estas questões sejam mais amplamente discutidas e solucionadas, como afirma Burity (2002, p. 34), “Não se pode deixar de destacar a cultura, na medida que ela nomeia uma dimensão da realidade social e humana classicamente associada ao processo de construção [...]”, unindo forças as bordadeiras querem mostrar sua atividade e

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importância para da cultura local. Nessa construção vamos falar do artesanato, o que dizem as bordadeiras.

5.2 Sobre o Artesanato

Depois que a cidade começou a organizar espaço para venda dos trabalhos confeccionados pelos artesãos, o artesanato vem recebendo melhor tratamento. Devagar vai conquistando seu lugar. É a luta constante de quem faz trabalhos manuais, agregar valor aos mesmos. Vogel afirma que:

É preciso considerar, ainda, que o trabalho do artista e do artesão tendem a se aproximar quando uma nova lógica de mercado redefine a ordem simbólica da qual ambos se alimentam. Como se disse, foi a modernidade estética que separou a arte do artesanato (VOGEL apud MATTOS, 2008, p. 15 ).

Esta afirmação parte da publicação do governo do Estado de Santa Catarina, a qual vem contribuir com a atualização de conceitos, esclarece termos utilizados por produtores de diversas artes, artesãos, bordadeiras, quem se dedica a estes trabalhos manuais e também compradores, e facilita o entendimento da linguagem relacionada à atividade. Martha Le Parc, graduada pela academia de Belas Artes, reivindica para si o título de artesã dizendo de seu descontentamento diante de como é tratado o artesanato.

Gostaria de denunciar a perda irreparável deste saber ou fazer que é o artesanato, que se transmitia de geração em geração[...]tão naturalmente como um dialeto ou idioma. Em grande parte porque esse “saber ou fazer” que era o artesanato era com freqüência produzido por mãos femininas, e a transmissão desse saber se produzia de maneira tão natural que ele não era reconhecido por seu valor artístico” (PARC, 1991, p. 5)

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A senhora Angelina Demark, que respondeu minha pesquisa no encontro regional de monitoras, em resposta a pergunta. O que difere arte, artesanato e trabalho manual, ela respondeu; “Para mim é a mesma coisa, porque todo artesanato é manual e depois de pronto se transforma em arte”. Ou ainda, no mesmo encontro, Nézia João Pereira, em resposta a mesma questão, afirma; “A arte é a expressão de seus sentimentos e inspirações, o artesanato e a forma de habilidades próprias”. A entrevistada de Curitiba, Valdete Dircksen, deu a seguinte resposta: “Arte acredito que seja nato de alguns, artesanato e a criatividade de um trabalho e trabalho manual, a execução das artes e trabalhos manual”. Ainda a pesquisa respondida por Maria das Graças Ramos “artesanato é a complementação de sua arte”. Nessa discussão, Mora afirma que: “Com as numerosas revoluções artísticas e a dissolução da rígida divisão entre as diversas belas-artes, apagou-se a distinção entre arte e artesanato” (MORA, 1998, p. 48). Esta é a afirmação de Martha Le Parc quando expõe suas obras na Pinacoteca do estado de São Paulo, materializa seu acreditar que “o artesanato merece o olhar respeitoso dos críticos de arte” (2001, p. 6). Então, parece não existir uma regra separando arte do artesanato ou vice versa, depende do espaço no qual ele é colocado, ou do conceito de quem o olha, talvez. O que é certo é que arte ou artesanato, ambos merecem o olhar respeitoso das pessoas, parafraseando Le Parc.

5.3 Sobre o bordado

No bordado procuramos a perfeição, o ponto cruz especialmente é valorizado pelo avesso perfeito. Orientar as menos experientes é tarefa para as monitoras dos clubes de mães. Algumas estão na atividade de monitorar grupos a mais de 20 anos. Sempre com a incumbência de levar novidades, procurando atender toda expectativa a cada trabalho novo que a associação oferece. A fala das monitoras sobre o bordado repete-se em lembrar que o acabamento é importante. O que valoriza a peça é o capricho com que ela é tratada. D. Celiria borda ponto russo; Angelina de Bona Alano borda ponto russo, ponto cruz

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e expõe com orgulho seu trilho bordado em hardanger. Angelina ainda afirma: “é lindo, mas não tenho coragem para fazer outro”. E nesse discurso muitas peças ficam guardadas e retomadas de vez em quando para se convencer diante da dificuldade presenciada e repetir “fui eu que fiz”. Estas figuras 36 e 37 são fotos de amostras de bordados que as mães nos clubes bordaram, já há alguns anos.

Figura 36: Bordado no cânhamo, em p. reto Fonte: Acervo da Pesquisadora

Figura 37: Bordado em tecido xadrez Fonte: Acervo da Pesquisadora

Também fora bordado em tempos mais antigos, ponto cruz sobre juta. Tecido de fronhas e lençóis, bordados com ponto cheio. Uma bordadeira exigente, a Maria Lucia Perri Arima Tiscoski, afirma, “Gosto de coisa delicada, de linha fina...”. Maria é talentosa e sabe diferenciar o que é um bordado bem feito. A respeito da feira na cidade para vender os trabalhos ela afirma: “É preciso começar, criar o costume das pessoas verem os trabalhos à venda na praça, tem muito trabalho bonito, é preciso mostrar”.

5.4 Sobre a Arte

O que dizem as pessoas a quem me dirigi no momento da pesquisa para realização deste trabalho, sobre a arte, deixa transparecer o conceito popular e o conceito de arte. Arte está relacionada à beleza, a criatividade...

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Em resposta a entrevista, Classimeire Buss disse: “Cada trabalho tem o seu valor, o seu jeito de trabalhar. São vários os pontos diferentes, mas no fim tudo se torna uma arte”. Vogel se refere à arte quando afirma:

[...] na arte popular reina certa espontaneidade, enquanto na arte elevada ou erudita existe a exigência da crítica, da pesquisa intelectual. Mas, embora nem todo artesão seja considerado um artista popular, às vezes um artista popular se manifesta dentre os artesãos (VOGEL, 2008, p.15).

Andréia Ramos, uma das entrevistadas disse: “Não encontro muita diferença, penso que o artista já nasce feito, mas muitos também podem se formar. É só querer”. Existe a divergência, a problemática como afirma Vogel:

[...] Atualmente, mesmo falar em arte popular pode ser em alguma medida problemático, porque tanto a idéia do que seja arte, quanto do que seja o popular estão sendo questionadas.[...] No campo da arte, a fronteira entre o erudito ou culto e o ingênuo ou popular também se move (VOGEL, 2008, p.15).

A resposta de Jucélia Albino se deu com as seguintes palavras: “Na minha opinião, não há diferença, todo tipo de trabalho que fazemos não deixa de ser uma arte, ou vice-versa”. Nézia João Pereira respondeu da seguinte forma: “A arte é a expressão de seus sentimentos e inspirações”. E esta é a opinião da maioria das pessoas entrevistadas. Para completar o que dizemos as bordadeiras sobre o que é arte me atenho à Vogel, no dizer que:

Concretamente, sabemos que tanto o artístico quanto o artesanal estão hoje inscritos em processos massivos de circulação de bens e mensagens. Por isso, tanto suas fontes de informação, seja nas formas ou nas imagens, como seus modos de difusão e a formação de seus públicos cada vez mais parecidos ou até os mesmo. Temos acesso a imagens sons e idéias de todas as partes do mundo. E é difícil, nessa circunstancias, ficar apegado a uma exigência intransigente de purismo (2008, p.15).

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É preciso dedicação, persistência e muito capricho na execução das peças, juntando a capacidade de unir diferentes afazeres, como relata Piza ao falar de Martha Le Parc:

[...] Vi-a criar filhos, vi-a cuidar da casa [...] criar coisas; primeiro vestidos extraordinários - desses que todo mundo pergunta quem fez, numa época que a mulher dificilmente fazia moda. Vi-a, depois, fazendo tapeçarias. Seu trabalho devia ser visto com uma atenção especial. Porque nele passa uma nova maneira dentro da arte, nas beiradas, nos espaços inesperados. (LE PARC, 2001, p. 3)

Assim nas conversas das bordadeiras sempre sai a afirmação, conseguir cuidar da casa, marido, filhos além de tarefas fora do lar, ainda assim fazer alguns bordados ... Tem que ser artista... Na multiplicação do tempo para dar conta de todas as tarefas e ainda dizer que borda para relaxar, se acalmar... Como afirma Lucilene dos Santos Mendes, “Gosto de fazer, isso me acalma”.

5.5 Sobre a Cidade

Volto a ressaltar a importante influência da “Associação de Clubes de Mães” na apropriação das técnicas artesanais e produtivas em diferentes regiões, mas falo em específico do município de Forquilhinha -SC, cidade no qual moro e trabalho. Em todos os bairros da cidade existem bordadeiras, “crocheteiras”, é só sair perguntando, que são falados vários nomes. Apesar de a maioria dizer que não faz seus pontos para vender, mas com um pouco de insistência se consegue alguém para fazer um trabalho por encomenda. As trabalhadoras costumam afirmar que não é valorizado o bordado, o fazer manual... São pessoas que só existem porque procuramos por elas, como afirma Calvino “[...] os carregadores, os pedreiros, os lixeiros, as cozinheiras que limpas as entranhas dos frangos, as lavadeiras inclinadas sobre a pedra, as mães de família que mexem o arroz aleitando os recém nascidos, só existem porque pensamos neles” (1990, p. 109).

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As mais atuantes são orgulhosas de seus bordar, final de outubro já estão em alerta preparando as peças para a exposição que normalmente acontece em novembro no ginásio de esportes no centro da cidade. Neste período as menos talentosas ou ocupadas com outros afazeres, inclusive muitas costureiras da indústria e outras funcionárias dos frigoríficos da cidade e região, não conseguem deixar prontos seus trabalhos e recorrem a ajuda de Sidene, Cleudinete, estas se identificam com a afirmação de que estão adorando fazer e bordando para as outras que pediram socorro. O encerramento dos clubes é a maior exposição que acontece no ano. Trabalhos de todos os tipos, pequenos, grandes, simples, elaborados, tem para todos os gostos. E aí já começa a nova curiosidade, “o que será que vem no ano que vem?” A presidente da associação gosta de fazer surpresa e, mesmo a diretoria e monitoras que preparam as novidades, são chamadas a guardar segredo. Assim a cidade fica nesse burburinho até o início dos encontros e a chegada do novo trabalho. Como lembra Calvino, ao falar das cidades invisíveis:

Os passos seguem não o que se encontra fora do alcance dos olhos mas dentro, sepultado e cancelado: se entre dois pórticos um continua a parecer mais alegre é porque trinta anos atrás ali passava uma moça de largas mangas bordadas, ou então é porque a uma certa hora do dia recebe uma luz como a daquele pórtico de cuja localização não se recorda mais (1990, p.86).

Até o que se esquece volta à tona no encontro, no vai-e-vem da exposição. É reencontrado, além de velhas amigas, velhas artes guardadas e novamente trazidas para um novo olhar. Quase nunca se consegue ver tudo, e a cada troca de conversa se acha algo não visto. Sobre a cidade na fala das bordadeiras é lembrado a D. Ana, que recebeu o titulo de cidadã forquilhiense, em homenagem ao relevante trabalho prestado em prol da cidade como cidadã e como fundadora da instituição. Com muita satisfação e alegria no encontro que tivemos permitiu-me que fotografasse seu título para mostrá-lo nessa pesquisa, conforme figura 38:

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Figura 38: Título Honorífico dado à D. Ana Fonte: Acervo da pesquisadora

Para D. Ana esta homenagem representa um agradecimento ao esforço despendido em prol das famílias que pode atender com seu carinho e trabalho, e também o esforço para fazer a associação de clubes de mães fundada por ela, se fixar e ter hoje a representatividade que tem, na cidade de Forquilhinha.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Emociono-me chegar ao final desta empreitada, entrei neste estudo em “Educação Estética: Arte e as Perspectivas Contemporâneas”, para tentar encontrar algumas respostas para os questionamentos que me inquietavam. As questões de arte me intrigavam, tem arte, não é arte? Cada disciplina, cada professor, estar entre os colegas, tudo isto significava muito. O ambiente acadêmico me fez sentir bem. Fui criança curiosa, então continuei a fazer perguntas, nesse momento a pergunta que busco resposta é “de que forma a estética do bordado dialoga com o trabalho das bordadeiras que compõem a Associação dos Clubes de Mães da cidade de Forquilhinha? Como já disse, falar com as pessoas é como ler um livro, com as possibilidades de termos respostas para as perguntas que surgem durante a conversa. Resta saber se essas “conversas” conseguiram responder o problema aqui pontuado. Em sala de aula, ao ver como era difícil falar de arte, me expus dizendo que para mim, falar de arte parecia o mesmo que falar de Deus. Sobre Deus, me entenda, aprendi que Deus está em todo lugar, depende de nós vermos ou não. Sentir. Ele é abstrato, invisível. E a arte, para alguns está presente, para outros, não. Quando comentei este meu sentimento com a minha orientadora, ela argumentou: “não é só abstrato, é subjetivo”. Nos trabalhos que fazia, vinha instigando as alunas, parceiras de atividade, caminhando, descobrindo, tropeçando e me encantando. Comecei esta pesquisa bem antes de programá-la, antes de definir a metodologia. E no desejo de fazer a monografia sobre a minha área de atuação, comecei a buscar embasamento teórico. Foi difícil encontrar publicações sobre o tema, definir o problema, mas o que é difícil requer mais cuidado, mais perguntas, e daqui ou dali, de uma ou outra consegui uma informação, a indicação de um livro... As pessoas que procurei para tratar do tema foram atenciosas, responderam a pesquisa com prazer, orgulhosas por comporem um trabalho acadêmico. Sou satisfeita de ter me graduado em Pedagogia e agora esta pós-graduação. Mas só tomei coragem de atuar como professora após a graduação. O meu desejo de estar contribuindo para que mais pessoas agreguem esses saberes esta sendo oportunizado. Continuo afirmando que é importante

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aprender na tenra idade – com meus 55 anos – me fiz pesquisadora pela primeira vez na academia, mas assumo o interesse constante por novas descobertas desde muito tempo. E ainda como afirma Richter” “[...] Comovemo-nos com os matizes culturais propiciado por herança de avôs, avós, por ensinamento passados de mãe para filha, para filho, de avó para neta” (2005, p. 87). Para dar ênfase a esses matizes, um grupo de artesãos e a secretaria da cultura, acabam (acabamos) de criar a AFA, com a expectativa de deixarmos marca (a nossa) na cidade, esperando que outras mãos se agreguem a causa, e assim vamos nós construir a cada dia a nossa história, enquanto vamos nos construindo. E, contudo, sabe-se bem que não existe aquele artista que esteja desligado da cultura. E que o popular não se define por uma essência dada, mas pelas estratégias com que cada grupo humano elabora a sua posição no mundo (VOGEL apud MATTOS, 2008, p. 15)

E no apagar das luzes, no afã de pesquisadora, que sempre quer mais, vejo no Jornal Nacional da rede Globo (13/11/2010) o MASP se vestir de bordado. Senão o maior, um dos maiores redutos da arte no Brasil. A artista plástica Regina Silveira “criou um céu e, com ele, está envolvendo o MASP, o maior museu da América Latina, na Avenida Paulista [...] O céu que aos poucos vai se formando é um céu bordado, criado com a geometria e o ponto cruz ainda inacabado. O olhar de quem passa tropeça na novidade”. E para fundamentar esta notícia, recorro ao site da Rede Globo: É uma arte publica, fora dos espaços protegidos da arte, que se mete no meio da vida das pessoas, no cotidiano.” [...] “Ela se atravessa esta ali,” [...] “Eu espero sinceramente que eles possam ter a oportunidade de olhar o céu construído e bordado dessa maneira tão artificiosa. Vai chover, vai fazer sol,vai anoitecer, e esse céu vai estar sempre azul”, aponta a artista plástica Regina Silveira. Essa paisagem vai durar menos do que uma estação. No final de janeiro, o céu bordado em ponto cruz e a agulha esquecida no tecido vão desaparecer no movimento da cidade.

A estética do bordado dialoga com o trabalho das bordadeiras da mesma forma que esse céu cobre o MASP, um manto azul com bordados que com uma linguagem contemporânea, traz um olhar que remete a afirmação de Martha Le Parc quando expõe suas obras na Pinacoteca do estado de São Paulo (conforme consta

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na página 55 dessa monografia). Falo do dizer que, “o artesanato merece o olhar respeitoso dos críticos de arte” (LE PARC, 2001, p.6). É uma notícia que ainda mais me convence da relevância deste trabalho. O bordado presente na vida das pessoas embelezando e enriquecendo em passagens rápidas ou durando gerações. Enquanto tecia este trabalho, enquanto falava das diversas mãos, falava também de minhas mãos, que agora neste teclado, tecem este bordado, o qual responde parcialmente o problema, uma vez que a pesquisa continua na perspectiva de trazer reflexões sobre a estética do bordado e a arte, considerando as mãos bordadeiras como mãos que fazem, mãos que podem pensar uma sociedade diferente, na perspectiva de falar do resultado obtido nas aulas que ministrei as freqüentadoras do CRAS de Forquilhinha. Durante o tempo que estive com elas, mulheres e meninas, mais do que ensinar a cortar, costurar a pintar frutas, flores e bonecas, bordávamos um relacionamento no qual, mais que ensinar eu aprendia. Esforçava-me para contar a essas mulheres que estudaram bem pouco e para essas meninas que estão começando sua vida de estudantes um pouco da importância dessa história, enfeitar a oportunidade que tinham de estar nesse ambiente recebendo capacitação e motivação para se tornarem pessoas atuantes na sociedade em que vivem. Presenciei a mudança de postura acontecer (a minha mudança, inclusive) e juntas escolhemos o nome para nossa oficina para ser exposto no evento de encerramento das atividades no dia 10 de dezembro de 2010. Com o olhar aprimorado pela educação estética percebo transformação nas bordadeiras quando encontro com elas e conversamos sobre trabalho. Dessas conversas surgiu uma faixa bordada ostentando o letreiro “MÃOS QUE FAZEM” e fotos das integrantes da oficina colocadas junto a seus trabalhos, acrescida dos dizeres “EU FAÇO”, e também passaram a oferecer o cartãozinho de visitas dizendo “Aceito Encomendas, Nome, Telefone”. Orgulhosas levaram seus trabalhos para a exposição e se posicionaram como vendedoras. É gratificante ver o resultado que este trabalho acadêmico esta proporcionando, desejo que mais pessoas se interessem por essas e outras questões que venham a valorizar o bordado, as bordadeiras, a cidade e sua cultura local, pois sei que muito ainda ficou por dizer.

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REFERÊNCIAS

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VOGEL, Daisi. Mãos em obra. In: MATTOS, Tarcisio. Feito a mãos: o artesanato de Santa Catarina. Florianópolis: Tempo Editorial, 2008.

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ANEXOS

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UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE

Curso de Pós – Graduação em Educação Estética: Arte e as Perspectivas Contemporâneas.

2010 / 2 PROFESSORA ORIENTADORA:

Me. Silemar Maria de Medeiros da Silva

PERÍODO:fev 2009 à nov 2010

AUTORIZAÇÃO

Eu,................................................................................................................................., RG......................................., mãe de............................................................................, autorizo a Professora/Pesquisadora .Maria Salete Carradore Fernandes a usar as imagens das aulas que minha filha freqüentou na sala Eti Arte para uso da pesquisa que trata do tema “A Estética do Bordado”.

Atenciosamente,

______________________________________ Assinatura