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DIREITO PROCESSUAL CIVIL TESE: O PROCURADOR DO ESTADO E O INQUÉRITO CIVIL COM PODERES INVESTIGATÓRIOS COMO INSTRUMENTO EFICAZ DE COMBATE À SONEGAÇÃO ...
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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

TESE: O PROCURADOR DO ESTADO E O INQUÉRITO CIVIL COM PODERES INVESTIGATÓRIOS COMO INSTRUMENTO EFICAZ DE COMBATE À SONEGAÇÃO FISCAL

Autor: VANDERLEI FERREIRA DE LIMA Procurador do Estado de São Paulo, ex-Delegado de Polícia, Mestre em Direito Constitucional; professor de Direito Civil no Centro Universitário de Bauru – ITE email: [email protected]

RESUMO A sonegação fiscal, ao lado da corrupção, subtrai bilhões de reais dos cofres públicos. Nesse contexto, é necessário dotar os procuradores dos Estados de instrumentos jurídicos eficazes para que eles possam combater essa prática ilícita, preservando a economia pública e a livre concorrência. Dentre estes instrumentos, tem-se o inquérito civil com poderes investigatórios sob a presidência do procurador do Estado.

2015

O PROCURADOR DO ESTADO E O INQUÉRITO CIVIL COM PODERES INVESTIGATÓRIOS COMO INSTRUMENTO EFICAZ DE COMBATE À SONEGAÇÃO FISCAL INTRODUÇÃO Atualmente, a cobrança dos créditos tributários e os não tributários dos entes Públicos, regularmente inscritos na Dívida Ativa, é regida pela Lei 6.830/80. Constata-se que embora a referida lei ofereça alguns instrumentos para a constrição de bens dos devedores, ela é dotada de certa ineficácia, posto que o entes Públicos conseguem receber apenas de 1 a 3% de seus créditos. Pelo sistema micro processual da Lei 6.830/80, o ente Público somente consegue obter ordem judicial de constrição de bens do devedor após sua regular citação, dando-lhe oportunidade para que o mesmo pague o débito ou nomeie bens a penhora. A experiência tem demonstrado que até mesmo antes de da distribuição da ação de execução fiscal os contumazes sonegadores de tributos passam a dilapidar seu patrimônio tornando-se insolvente e continuam praticando regulamente suas atividades negociais em nome de terceiros, em franco desafio a ordem jurídica vigente. A situação de ineficácia da Lei 6.830/80 tem gerado dois graves para sociedade: De um lado, estimula a subtração indevida de recursos públicos pela sonegação fiscal, forçando a elevação da carga tributária e de outro, a concorrência desleal realizadas por empresa sonegadoras com as empresas que pagam seus tributos e mantém suas obrigações tributárias em dia. Do exposto, denota-se a necessidade de se idealizar instrumentos legais e eficazes que permitam às Procuradorias Públicas o recebimento dos créditos pertencentes aos entes Públicos.

FUNÇÃO SOCIAL DOS TRIBUTOS A cobrança e recebimento de tributos trata-se de instrumento de Justiça Social posto que se permite ao ente Público que forneça a uma multidão de pessoas que vivem à margem da cidadania serviços públicos essenciais tais como o acesso à escola, à saúde, ao trabalho, à moradia, à segurança, ao consumo de meios necessários à própria subsistência, ou seja, propicia uma existência digna a tais pessoas. É preciso informar à sociedade o caráter social dos tributos posto que estes somente são cobrados das pessoas físicas e jurídicas com capacidade contributiva. SONEGAÇÃO FISCAL Ao lado da corrupção, outro grande e grave mal que assola o país é a sonegação fiscal que consiste na conduta de ocultar ou dissimular auferimento de rendas, transações industriais, comerciais, financeiras e de prestação de serviços, tipificadores de fatos geradores de tributos.1 O conceito de sonegação fiscal é fornecido pela Lei 4.729/65 e Lei 8.137/90, nos seguintes termos: Lei 4.729/65 Art 1º Constitui crime de sonegação fiscal: I - prestar declaração falsa ou omitir, total ou parcialmente, informação que deva ser produzida a agentes das pessoas jurídicas de direito público interno, com a intenção de eximir-se, total ou parcialmente, do pagamento de tributos, taxas e quaisquer adicionais devidos por lei;

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Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória. § 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente. § 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos. § 3º A obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária. Art. 114. Fato gerador da obrigação principal é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.

II - inserir elementos inexatos ou omitir, rendimentos ou operações de qualquer natureza em documentos ou livros exigidos pelas leis fiscais, com a intenção de exonerar-se do pagamento de tributos devidos à Fazenda Pública; III - alterar faturas e quaisquer documentos relativos a operações mercantis com o propósito de fraudar a Fazenda Pública; IV - fornecer ou emitir documentos graciosos ou alterar despesas, majorando-as, com o objetivo de obter dedução de tributos devidos à Fazenda Pública, sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis. V - Exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário da paga, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida do imposto sobre a renda como incentivo fiscal.

Lei 8.137/90 Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias; II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal; III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável; IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato; V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação. Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V. Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:

I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo; II - deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos; III - exigir, pagar ou receber, para si ou para o contribuinte beneficiário, qualquer percentagem sobre a parcela dedutível ou deduzida de imposto ou de contribuição como incentivo fiscal; IV - deixar de aplicar, ou aplicar em desacordo com o estatuído, incentivo fiscal ou parcelas de imposto liberadas por órgão ou entidade de desenvolvimento; V - utilizar ou divulgar programa de processamento de dados que permita ao sujeito passivo da obrigação tributária possuir informação contábil diversa daquela que é, por lei, fornecida à Fazenda Pública. Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

Para a Revista Carta Capital, a “sonegação fiscal de impostos é sete vezes maior que a corrupção. Deixa de recolher 500 bilhões de reais por ano aos cofres públicos no País...”2 Para se ter uma ideia do que significam estes bilhões de reais sonegados, ou seja, ilicitamente subtraídos do Erário Público, a Lei Orçamentária do Estado de São Paulo previu para o ano de 2015 uma arrecadação de receita no total de R$ 204.879.492.272,00 (duzentos e quatro bilhões, oitocentos e setenta e nove milhões, quatrocentos e noventa e dois mil e duzentos e setenta e dois reais).3 Ou seja, sonega-se por ano 2 e ½ (duas vezes e meia) o valor que o Estado de São Paulo prevê arrecadar durante todo o ano de 2015. A sonegação dos maiores vultos se concentram nos grandes devedores. Segundo noticia divulgada pelo Jornal do Brasil, de janeiro a maio desde ano já foram sonegados 200 bilhões de reais:

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http://www.cartacapital.com.br/economia/sonegacao-de-impostos-e-sete-vezes-maior-que-a-corrupcao9109.html 3 LEI Nº 15.646, DE 23 DE DEZEMBRO DE 2014 Orça a Receita e fixa a Despesa do Estado para o exercício de 2015:art. 3º.

Pelo menos R$ 200 bilhões em impostos deixaram de ser pagos ao governo 2015, segundo o site Sonegômetro, que faz uma estimativa do quanto o país perde com sonegações por ano. A campanha, organizada pelo Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional (Sinprofaz) inclui também os desvios de dinheiro deflagrados pela Operação Zelotes, além de prejuízos com "laranjas" e caixa dois. Quantia corresponde a 25% do que já foi pago pelos brasileiros em impostos de janeiro a maio.4 Com o valor sonegado de tributos o Poder Público poderia a cada ano, construir e equipar com instrumentos de última geração 10.000 hospitais no valor de R$ 50.000.000,00 cada, ou seja, construiria 2 hospitais para cada município do Brasil num ano; poderia construir e equipar 20.000 escolas no valor de R$ 25.000,00 cada. No Estado de São Paulo, os tributos sonegados daria para custear as Secretarias da Educação (28.426.489.547), da Saúde (20.461.432.702), da Segurança Pública (20.195.007.590) por 8 anos aproximadamente. Ou seja, resolveria as principais demandas que atormentam o cidadão de bem. Um combate efetivo à sonegação fiscal significa uma arrecadação maior de tributos e, como consequência, o Poder Público poderia ampliar e melhorar a prestação de serviços públicos aos cidadãos. Também poderia significar em redução substância da carga tributária no país, que atualmente gira em torno de 35% do PIB (Produto Interno Bruto) para aqueles que efetivamente cumprem a legislação tributária e recolhendo em dia seus tributos. Também vai significar a implantação de uma Justiça Fiscal efetiva já que todos deverão pagar os tributos devidos ao Erário Público, notadamente os sonegadores. Portanto, apenas tipificar a sonegação fiscal como crime é muito pouco para combater a esse mal perverso que lesa a sociedade como um todo, tanto que as Leis 4.729/65 e 8.137 que tipificam a sonegação fiscal como crimes estão vigentes há décadas, no entanto a sonegação continua alta e o que é pior, aumentando a cada ano. Por ouro lado, na área processual, a Lei 8.630/80 também se mostrar ineficaz no combate a sonegação fiscal. 4

http://www.jb.com.br/economia/noticias/2015/05/21/indicador-de-valores-sonegados-no-pais-chega-a-marcade-r-200-bilhoes-em-2015/

Assim, é preciso dotar as Procuradorias Gerais dos Estados, representadas por seus procuradores, de instrumentos efetivos de combate a sonegação fiscal, dentre estes instrumentos, está a atribuição de instauração de inquérito civil para a apuração de condutas tipificadas como sonegação fiscal. INQUERITO CIVIL COM PODERES INVESTIGATÓRIOS A expressão “ inquérito tem origem latina inquaritare5 que quer dizer ato ou efeito de inquirir, interrogatório, sindicância, devassa, conjunto de atos e diligências com que se visa a apurar alguma coisa” O inquérito civil trata-se de instrumento no qual se promove diligências, efetua requisições e notificações para coletar e materializar provas para fundamentar o ajuizamento de uma ação judicial, em defesa de direitos indisponíveis da sociedade. Teve sua origem no inquérito policial,6 instrumento presidido por delegado de Policia no qual se coleta provas para subsidiar o ajuizamento de uma ação penal. Segundo PROENÇA, Podem se objeto de investigação do inquérito civil: As lesões ao meio ambiente, aos direito do consumidor (coletivamente considerados), ao patrimônio público, aos princípios da Administração Pública, à ordem econômica, aos padrões urbanísticos , ao princípio da livre concorrência, aos fundamentos da república (cidadania, pluralismo político, etc), aos direitos políticos e sociais garantidos pela Constituição, dentre inúmeros outros direitos e interesses de natureza coletiva lato sensu 7 De outro, lado, o procurador do Estado atuando em demandas tributárias ajuizadas ou não, constantemente se depara com algumas situações fáticas que se subsumem em prática de sonegação fiscal, que por sua vez, provoca grave lesão à ordem jurídica e a economia públicas. 5

CESAR, João Batista Martins. Tutela Coletiva. Inquérito Civil – Poderes Investigatórios do Ministério Público – Enfoques Trabalhistas. Ltr . São Paulo, 2006, p 38. 66 Art. 6o. do Código de Processo Penal. 7 PROENÇA, Luís Roberto. Inquérito Civil. São Paulo. RT, 2001, p 42.

A experiência tem demonstrado que nestes casos, o procurador do Estado necessita e acaba por abrir pastas ou expedientes, nos quais ele vai coligindo cópias de provas extraídas de uns processos de execução fiscal para instruir outros contra o sonegador tributário. Estes expedientes que não possuem qualquer formalidade ou registro. Ficam a margem da lei e não trazem segurança tanto para a Administração Pública como para o cidadão. Nesse contexto, pode afirmar que um inquérito civil bem conduzido oferecerá elementos para o ajuizamento de uma ação fiscal bem aparelhada. O contrário também é verdadeiro, no inquérito civil poderá restar demonstrado que não há elementos de convicção da pratica de sonegação fiscal. Com a possibilidade do procurador do Estado instaurar inquérito civil para apuração de sonegação fiscal, todas as medidas e provas seriam materializadas em um instrumento formalmente registrado. Inclusive, com possibilidade de vista pelo representante judicial da parte investigada. DA

LEGITIMIDADE

DO

PROCURADOR

DO

ESTADO

PARA

INSTAURAR E PRESIDIR O INQUÉRITO CIVIL PARA APURAR E COMBATER A SONEGAÇÃO FISCAL É bem verdade que a legitimidade do procurador do Estado para instaurar e presidir inquérito civil pode ser questionada uma vez que a legislação federal menciona expressamente que compete ao Ministério Público instaurar e presidir o inquérito civil (art. 129, III CF/88 e art. 8º., da 8.347/85). Contudo, não existe texto expresso dizendo que a instauração de inquérito civil é atividade exclusiva do Ministério Público e que é proibido sua instauração pelo procurador do Estado. É o argumento que foi utilizado para permitir que o Ministério Público possa realiza-se investigação criminal em detrimento das atribuições do delegado de polícia. Veja-se o que decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça: Se por um lado, não há texto normativo que mencione expressamente a possibilidade de o MP conduzir investigações criminais, por outro lado não há dispositivo legal em sentido oposto. Ao contrário da total omissão, há indícios aqui, ali e acolá em direção a legitimidade da atuação, sustenta. Em sua avaliação,

se o MP é responsável pela propositura da ação penal pública, deve ter o direito e os meios de colher elementos que vão sustentar essa ação (RESP. 494320-RJ, Rel. Min. Nilson Naves) Assim, se compete ao procurador do Estado ajuizar ações tributárias individuais ou coletivas, ações de execução fiscal, dentre outras, nada mais justo do que conceder-lhe instrumentos para poder bem instruir as referidas ações. É certo que estas ações são ajuizadas em nome do ente público, contudo, o interesse defendido é da própria sociedade, consistente no recebimento do tributo que irá beneficiá-la. Se não bastasse, nos termos do art. 5o. da Lei 7.347/85 (LACP), os Estados Membros, através de suas Procuradorias Gerais do Estados, tem atribuição para ajuizar ações civis públicas, inclusive as cautelares. É natural que as Procuradorias Gerais dos Estados Membros também detenham atribuição para instaurar o inquérito civil, notadamente quando envolva a grave conduta tipificada como sonegação fiscal que dilapida enormes vultos de recursos públicos.

Lei 7.347/85 Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007). I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007). (...) III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios; (Incluído pela Lei nº 11.448, de 2007).

Pode derradeiro, a Lei Complementar Estadual 734/93, inovando o ordenamento jurídico Federal prevê a possibilidade do promotor de Justiça instaurar procedimentos preparatórios para a instauração do inquérito civil.8 A instauração desses procedimentos preparatórios não tem previsão na Constituição ou em lei Federal.9 Ora! Se o promotor de 8

Arts. 104, II e 106, parag. 1º. Da Lei Complementar Estadual 734/93. Mas se o promotor pretende empreender qualquer investigação mais complexa ou demorada, então será o próprio inquérito civil, e só o inquérito civil, o meio adequado para fazê-lo. 9

Justiça pode instaurar um procedimento que sequer tem previsão legal, é natural que o procurador do Estado tenha, no mínimo, atribuição para instaurar inquérito civil para apuração de sonegação fiscal. Ainda, deve ser esclarecido que, quando se trata da defesa em juízo da ordem econômica, da livre concorrência, do patrimônio público, dentre outros direitos e interesses da sociedade, o Ministério Público e as Procuradorias Gerais dos Estados não atuam de forma contraposta, mas de maneira concorrente, defendendo os direitos e interesses da cidadania. Insista-se, quando o procurador do Estado atua nas ações judiciais que envolvam matéria tributária (ações anulatórias, cautelares fiscais, execução fiscal) defende interesses imediatos da sociedade, uma vez que o produto da arrecadação se destina a custear serviços públicos essenciais ao cidadão, notadamente aqueles que são mais carentes de recursos e encontram nas politicas públicas, seu único amparo. Assim, conclui-se que, se cabe ao procurador do Estado representar os Estados Membros em juízo e fora dele na defesa de interesses tributários. É natural que ele deve dispor de meios para bem instruir suas ações. O inquérito civil é um desses meios. INSTAURAÇÃO DO INQUERITO CIVIL10 A instauração do inquérito civil para a apuração de condutas tipificadas como sonegação fiscal, a exemplo das demais hipóteses, através de portaria fundamentada, poderá ocorrer ex officcio quando o procurador do Estado, no exercício de suas funções, toma conhecimento de fato capaz de sustentar sua abertura; Também pode ocorrer mediante provocação quando qualquer interessado, seja servidor público11 ou não, leve ao

Entretanto, tem-se generalizado uma deformação no sistema, com o abuso do uso de investigações preliminares antes de instaurar-se o inquérito civil, que é substituído por procedimentos outros, mas de finalidade e conteúdo idêntico aos daquele. MAZZILLI, Hugo Nigro. O Inquérito Civil. Saraiva. São Paulo. 1999, p. 130. 10

Art. 5o Nos crimes de ação pública o inquérito policial será iniciado: I - de ofício; II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.

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O servidor público tem o dever legal de denunciar fatos tidos como de sonegação fiscal.

conhecimento do procurador do Estado, na modalidade escrita ou verbal, o conhecimento de fatos podem caracterizam a sonegação fiscal. A instauração dessa modalidade de inquérito civil também pode decorrer de requisição do Procurador Geral do Estado ou do Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado, caso em que o procurador do Estado designado para presidi-lo não poderá analisar a conveniência e oportunidade de sua instauração, mas, como age pode delegação dos referidos órgãos Superiores da Advocacia Pública, terá o dever de instaurá-lo. DILIGÊNCIAS NO INQUÉRITO CIVIL Uma vez instaurado o instaurado o inquérito civil pelo procurador do Estado, por analogia com o inquérito policial,12 poderá esta autoridade, na defesa do Erário Público, notificar e ouvir pessoas; poderá realizar diligências ou requisitá-las de órgãos e autoridades públicas; poderá requisitar documentos a órgãos públicos e privados e, quando estes forem acobertados por sigilo, tais como transações bancárias, cadastros eleitorais e informações fiscais; deverá o procurador do Estado decretar o sigilo do inquérito civil, permitindo acesso apenas as partes ou a Advogados com poderes para representar o investigado. Havendo resistência de órgão público ou privado em apresentar as informações requisitadas, sob o argumento ou de sua impossibilidade, o procurador do Estado poderá ajuizar ação cautelar de exibição até de busca e apreensão de documentos, inclusive,

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Art. 6o Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade policial deverá: I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) (Vide Lei nº 5.970, de 1973) II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o ofendido; V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; IX - averiguar a vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter.

pleiteando a condenação do requerido no pagamento das custas e honorários advocatícios e, até mesmo, a aplicação de astreintes ao omisso em atender tais requisições. MEIOS ELETRÔNICOS DE INVESTIGAÇÃO NO INQUERITO CIVIL Na busca da apuração de sonegação fiscal e identificar o patrimônio dos sonegadores, o procurador do Estado poderá se valer dos meios eletrônicos,13 tais como como a pesquisa de empresas na JUCESP (Junta Comercial do Estado de São Paulo); movimentação financeira através do Bacen Jud (para acesso ao cadastro de clientes do sistema financeiro nacional); de veículos através do RENAJUD (Restrições Judiciais sobre Veículos

Automotores); de imóveis através da ARISP (Associação dos Registradores

Imobiliários de São Paulo); para identificação e localização de aeronaves com a ANAC (agencia Nacional de Aviação Civil); com a Bolsa de Valores BM&F Bovespa para localização de ações; para acessar o cadastro das pessoas jurídicas de todas as juntas comerciais de todo o país CNE (Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas); para localizar bens CNIB (Cadastro Nacional de Indisponibilidade de Bens); para localizar aplicações em seguro e previdência privada CNseg (Confederação Nacional de Empresas de Seguro Gerais, Previdência Privada, Saúde Complementar e Capitalização); convênio com a capitania dos Portos de São Paulo para localização de embarcações em nome dos sonegadores; para localizar os devedores poderá firmar convênio com CPFL (Companhia Paulista de Força e Luz), com o SNCR (Sistema Nacional de Cadastro Rural), com INFOSEG (Secretaria Nacional de Segurança Pública); para o acesso a marcas e patentes, convênio com INPI (Sistema Eletrônico de Gestão de Propriedade Industrial); para a localização dos sonegadores convênio com o SIEL (Sistema de In formações Eleitorais); com a SSP/SP – Secretaria de Segurança Publica de São Paulo para obtenção do nome completo, data de nascimento, filiação, cônjuge, dados de filhos, RG, CPF e registro de ocorrência policial; pesquisas junto a todos tribunais do país ( para a localização de ações em que os sonegadores sejam autores ou tenham créditos a receber ou estejam pleiteando a posse ou propriedade de bens móveis e imóveis); Convênio com a VIVO permite consulta ao banco de dados das linhas móveis da operadora; com a CENSEG (Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados) para Acesso a testamentos, escrituras de casamento, divórcios, inventários, procurações; com o 13

Código Tributário Nacional: Art. 199. A Fazenda Pública da União e as dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios prestar-se-ão mutuamente assistência para a fiscalização dos tributos respectivos e permuta de informações, na forma estabelecida, em caráter geral ou específico, por lei ou convênio.

COAF ( Conselho de Controle de Atividades Financeiras - Controle de grandes movimentações bancárias, a partir de R$ 10.000,00). Também poderá acessar as declarações de rendas dos sonegadores através do sistema infojud (acesso das declarações de Imposto de Rendas Pessoa Física e Pessoa Jurídica) O acesso as informações para localização das pessoas dos sonegadores e de seu patrimônio fruto da sonegação também pode se dar através de meios eletrônicos decorrentes de convênios firmados pelas Procuradorias Gerais dos Estados com os respectivos órgãos públicos ou privados detentores de tais informações. O procurador do Estado será cadastrado nos sistemas, sendo responsável pelo sigilo e utilização da senha recebida. Sobre a utilização de meios eletrônicos para coibir a sonegação fiscal, ensina SOARES: O Estado moderno, considerado pelos três poderes que o compõe, está cada vez mais submetido ao mundo informatizado, não tem escolha, ou se informatiza ou prevarica no seu dever de bem atender aos deveres que constitucionalmente lhe foram impostos. Assim como o Judiciário, que diante das necessidades prementes da vida moderna vem se informatizando (controle de ações, seus andamentos, etc), também o Executivo paulista vem paulatinamente se informatizando no atendimento à população (Poupatempo), no controle orçamentário (pregão eletrônico, que gerou economia de milhões no ano que passou, etc., cabendo-lhe cuidar da outra ponta, qual seja, a criação de instrumentos informatizados de fiscalização, coibindo a sonegação fiscal.14 Pode-se pensar que se trata de excesso de poderes ao procurador do Estado, contudo, se a ele é dada a incumbência de combater a sonegação fiscal, também se deve assegurar-lhe poderes para localizar e identificar o patrimônio dos sonegadores para receber as vultosas quantias desviadas do Erário Público. O inquérito civil pode ser instrumento eficaz para que o procurador do estado possa bem cumprir sua elevada missão.

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SOARES, Margarida Maria Pereira. Meios Eletrônicos de Combate à Sonegação Fiscal – Informações em mandado de segurança. Prêmio O estado em juízo 2009. Serie Estudos n. 18. Centro de Estudos da Procuradoria geral do Estado de São Paulo., p 29.

CONTROLE SONEGAÇÃO FISCAL

DO

INQUÉRITO

CIVIL

PARA

APURAÇÃO

DA

15

Ao instaurar o inquérito civil, deverá o procurador do Estado deve comunicar o Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado sobre a instauração para registro e eventual acompanhamento. Contra o ato administrativo de instauração do inquérito civil, caberá recurso interna corporis ao Conselho Superior da Procuradoria Geral no prazo previsto para em lei. O investigado também poderá realizar o controle jurisdicional do ato de instauração do inquérito civil através do ajuizamento do mandado de segurança. Nesse sentido, ensina MAZZILLI: Assim, no caso de inquérito civil instaurado sem justa causa, poderá caber até mesmo mandado de segurança. Além disso, o trancamento judicial do inquérito civil pelo Poder Judiciário só ocorrerá em hipóteses restritas, e, nessa linha, podemos imaginar casos de ilegalidade, desvio de finalidade ou de poder ou falta de atribuições, quando será possível impetrar-se o mandado de segurança contra a instauração do inquérito civil.16 Concluído o inquérito civil, o procurador deverá ajuizar as ações judiciais dele decorrentes, tais como cautelar de indisponibilidade de bens dos sonegadores; ações anulatórias de desvio/dilapidação do patrimônio, ações de execução fiscal, dentre outras. Tais ações deverão ser instruídas com cópias de peças de investigação na fase administrativa de tramitação do inquérito civil. A conclusão do inquérito civil com o ajuizamento destas ações também deve ser comunicado ao Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado. Por outro lado, se o procurador do Estado entender que não é o caso de se ajuizar qualquer ação judicial, deverá remeter o inquérito civil com sua proposta de arquivamento para apreciação do Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado. Se o Conselho Superior entender que é o caso de arquivamento, chancelará a proposta. Em contrário, entendendo que é o caso de se ajuizar qualquer ação judicial, deverá fundamentadamente designar outro procurador do Estado para fazê-lo. 15 16

A Finalidade desse controle rígido é evitar abusos na instauração e no seu resultado final. MAZZILLI, Hugo Nigro. O inquérito Civil. Saraiva. São Paulo. 1999., p 282

EFEITOS DA INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO CIVIL DE APURAÇÃO DE SONEGAÇÃO FISCAL A instauração de inquérito civil sempre deverá ser feito através de portaria fundamentada em robustos indícios de sonegação fiscal e devidamente comunicado ao Conselho Superior da Procuradoria Geral do Estado No intuito de se resguardar os direitos básicos da sociedade – saúde, educação, segurança pública, dentre outros, deveriam ser custeados com os tributos sonegados, o procurador do Estado poderá comunicar aos Bancos (BACEN JUD) Cartórios de Registro de Imóveis (ARISP)17, aos departamentos estaduais de Trânsito, as bolsas de valores e aos demais órgãos públicos e privados de custódia de registro de propriedade e de transferência de bens, a instauração do inquérito civil para que terceiros18 que tenham o proposito de realizar transações com o investigado tome conhecimento do inquérito civil instaurado. PROPOSTA LEGISLATIVA É certo que, a teor da legislação atual, não há duvidas que o procurador do Estado tem poderes para a instauração do inquérito civil para apuração de sonegação fiscal, contudo, para dissipar eventuais questionamentos que podem surgir, notadamente quanto aos poderes de investigação atribuídos ao procurador do Estado, propõe-se a seguinte alteração legislativa: PROJETO DE LEI Nº Considerando os graves danos que a sonegação fiscal provoca à ordem jurídica, à economia pública, à concorrência, com elevados custos a efetivação e políticas públicas em benefício da sociedade, propõe-se o projeto de lei que Altera a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, para disciplinar a utilização do inquérito civil a cargo do procurador do Estado para apuração da prática de sonegação fiscal. LEI NO.

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da Lei nº 6.015, de 31/12/1973, art. 167, II, item “12”, e art. 246, “caput”. Lei nº 8.078/90, art. 6º. III: direito básico à informação dos consumidores.

Art. 1º Esta Lei disciplina o procedimento do inquérito civil para apuração da prática de sonegação fiscal, nos seguintes termos: Art. 2º o artigo 1º., da Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 1º... (...) X - por pratica de sonegação fiscal. (...) Art. 3º. A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer e a indisponibilidade de bens por pratica de atos tipificados como sonegação fiscal. (...) Art. 5º. Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (...) III - III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, representados por suas Procuradorias Gerais. (...) Art. 7º Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Ministério Público para as providências cabíveis. § 1º. Se os fatos ensejarem fato gerador de tributos ou a pratica de sonegação fiscal, remeterão as peças à Procuradoria Geral do ente público titular da competência tributária. Art. 8º. ... § 1º O Ministério Público, e o Procurador do Estado no caso de sonegação fiscal, poderão instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar, de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias, no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis. § 2º Somente nos casos em que a lei impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informação, hipótese em que a ação poderá ser proposta desacompanhada daqueles documentos, cabendo ao juiz requisitá-los. Art. 9º Se o órgão do Ministério Público, e o Procurador do Estado no caso de sonegação fiscal, esgotadas todas as diligências, se convencer da inexistência de

fundamento para a propositura da ação civil ou qualquer outra ação judicial, promoverá o arquivamento dos autos do inquérito civil ou das peças informativas, fazendo-o fundamentadamente. § 1º Os autos do inquérito civil ou das peças de informação arquivadas serão remetidos, sob pena de se incorrer em falta grave, no prazo de 3 (três) dias, ao Conselho Superior do Ministério Público, ou ao Conselho Superior da Procuradoria Geral no caso de sonegação fiscal. § 2º Até que, em sessão do Conselho Superior do Ministério Público, seja homologada ou rejeitada a promoção de arquivamento, poderão as associações legitimadas apresentar razões escritas ou documentos, que serão juntados aos autos do inquérito ou anexados às peças de informação. § 3º A promoção de arquivamento será submetida a exame e deliberação do Conselho Superior do Ministério Público, ou ao Conselho Superior da Procuradoria Geral no caso de sonegação, fiscal conforme dispuser o seu Regimento. § 4º Deixando o Conselho Superior de homologar a promoção de arquivamento, designará, desde logo, outro órgão do Ministério Público, ou outro Procurador do Estado no caso de sonegação fiscal, para o ajuizamento da ação cabível. CONCLUSÕES Por todo o exposto, conclui-se que é necessário campanhas publicitárias informando ao cidadão sobre a função social dos tributos bem como que sua cobrança recai sobre as pessoas físicas e jurídicas que possuem a capacidade contributiva. Também é necessário informar a sociedade que ao lado da corrução, outro grave mal que lesa a sociedade com um todo é a sonegação fiscal que subtrair bilhões de reais dos cofres públicos. Valores que poderiam custear uma gama infindável de serviços públicos. A sociedade não pode continuar refém de sonegadores de tributos. Ele precisa de instituições fortes para combater esse mal que é a sonegação fiscal, dentre estas, pode-se incluir as Procuradorias Gerais dos Estados.

O procurador do Estado, no exercício das atribuições de seu cargo, defende interesses indisponíveis da sociedade, notadamente, nas ações tributárias que visam receber tributos e combater a sonegação fiscal, posto que, com o resultado de seu trabalho – recebimento de tributos – custeia serviços públicos essenciais aos cidadãos, notadamente os mais carentes, posto que são os que mais se valem desses serviços. É necessário que se lance um novo olhar sobre as Procuradorias Gerais dos Estados, provendo-as de recursos humanos e materiais para que possam bem cumprir sua elevada missão de cobrança de tributos, no combate a sonegação fiscal e a concorrência desleal. Também se faz necessário provê-las de instrumentos jurídicos eficazes de combate a sonegação fiscal, dentre este, está o inquérito civil com poderes investigatórios ao Procurador do Estado. BIBLIOGRAFIA CESAR, João Batista Martins. Tutela Coletiva. Inquérito Civil – Poderes Investigatórios do Ministério Público – Enfoques Trabalhistas. Ltr . São Paulo. 2006. http://www.cartacapital.com.br/economia/sonegacao-de-impostos-e-sete-vezes-maior-que-a-corrupcao9109.html http://www.jb.com.br/economia/noticias/2015/05/21/indicador-de-valores-sonegados-no-pais-chega-a-marca-der-200-bilhoes-em-2015/ MAZZILLI, Hugo Nigro. O Inquérito Civil. Saraiva. São Paulo. 1999.

PROENÇA, Luís Roberto. Inquérito Civil. São Paulo. RT, 2001. SOARES, Margarida Maria Pereira. Meios Eletrônicos de Combate à Sonegação Fiscal – Informações em mandado de segurança. Prêmio O estado em juízo 2009. Serie Estudos n. 18. Centro de Estudos da Procuradoria geral do Estado de São Paulo.