SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
SESSÃO SOLENE DE INSTALAÇÃO DO ANO JUDICIÁRIO DE 2015 SESSÃO DE 2 DE FEVEREIRO DE 2015
BRASÍLIA – 2015
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Ministro Enrique RICARDO LEWANDOWSKI (16-3-2006), Presidente Ministra CÁRMEN LÚCIA Antunes Rocha (21-6-2006), Vice-Presidente Ministro José CELSO DE MELLO Filho (17-8-1989) Ministro MARCO AURÉLIO Mendes de Farias Mello (13-6-1990) Ministro GILMAR Ferreira MENDES (20-6-2002) Ministro José Antonio DIAS TOFFOLI (23-10-2009) Ministro LUIZ FUX (3-3-2011) Ministra ROSA Maria WEBER Candiota da Rosa (19-12-2011) Ministro TEORI Albino ZAVASCKI (29-11-2012) Ministro Luís ROBERTO BARROSO (26-6-2013)
Secretaria-Geral da Presidência Manoel Carlos de Almeida Neto Secretaria de Documentação Dennys Albuquerque Rodrigues Coordenadoria de Divulgação de Jurisprudência Juliana Viana Cardoso Fotografias Nelson Gontijo Resende Júnior Capa Lucas Ribeiro França Diagramação Jorge Luis Villar Peres Projeto gráfico Eduardo Franco Dias Revisão Amélia Lopes Dias de Araújo, Mariana Sanmartin de Mello e Rochelle Quito
Supremo Tribunal Federal — Biblioteca Ministro Victor Nunes Leal Brasil. Supremo Tribunal Federal (STF). Sessão solene de instalação do Ano Judiciário de 2015 [recurso eletrônico] : (2-2-2015) / Supremo Tribunal Federal. – Brasília : Secretaria de Documentação, Coordenadoria de Divulgação de Jurisprudência, 2015. Modo de acesso: 1. Poder Judiciário, Brasil. 2. Tribunal supremo, Brasil. I. Brasil. Supremo Tribunal Federal (STF), sessão solene. II. Título. CDD-341.419104
Da esquerda para a direita: Doutor Rodrigo Janot Monteiro de Barros, Procurador-Geral da República; Doutor José Eduardo Cardozo, Ministro de Estado da Justiça; Ministro Ricardo Lewandowski, Presidente do Supremo Tribunal Federal; Deputado Eduardo Cunha, Presidente da Câmara dos Deputados; e Senador Jorge Viana, representando o Presidente do Senado Federal.
Ministro Ricardo Lewandowski, Presidente do Supremo Tribunal Federal, e Deputado Eduardo Cunha, Presidente da Câmara dos Deputados.
Plenário do Supremo Tribunal Federal, durante a celebração do Hino Nacional.
Senador Jorge Viana, representando o Presidente do Senado Federal, e Ministro Ricardo Lewandowski, Presidente do Supremo Tribunal Federal.
SUMÁRIO
Palavras do Excelentíssimo Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, Presidente do Supremo Tribunal Federal ....... 7
Discurso do Doutor Marcus Vinicius Furtado Côelho, Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil .................................................................................. 9
Discurso do Doutor Rodrigo Janot Monteiro de Barros, Procurador-Geral da República ......................................... 14
Discurso do Excelentíssimo Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, Presidente do Supremo Tribunal Federal ..... 18
Palavras do Excelentíssimo Senhor Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, Presidente do Supremo Tribunal Federal
O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Presidente) — Bom dia a todos. Vamos nos sentar, por gentileza. Declaro aberta esta sessão. Cumprimento várias autoridades que vejo no Plenário, colegas do Poder Judiciário, do Ministério Público, representantes da advocacia, do Conselho Nacional de Justiça, outras personalidades, que são muito bem-vindas. Esta sessão especial destina-se à abertura do Ano Judiciário de 2015. Desde logo, peço escusas pela ausência de alguns Colegas, que se justificaram previamente, porque muitos deles ficaram retidos por motivo de cancelamentos de voos e não puderam comparecer a esta sessão. Como é de praxe, e para honra de todos nós brasileiros, começamos a sessão de pé, para celebrarmos conjuntamente o Hino Nacional. (Execução do Hino Nacional.)
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Discurso do Doutor MARCUS VINICIUS FURTADO CÔELHO, Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil
O Doutor Marcus Vinicius Furtado Côelho (Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil) — Excelentíssimo Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Ricardo Lewandowski, em cuja pessoa saúdo as Excelentíssimas Senhoras Ministras e os Excelentíssimos Senhores Ministros que, com muita dignidade e competência, compõem esta mais alta Corte de Justiça do Brasil; Excelentíssimo Ministro de Estado da Justiça José Eduardo Cardozo, digno representante da Excelentíssima Senhora Presidenta da República Dilma Rousseff, colega advogado que lustra esta alta função da República de nosso país; Senador Jorge Viana, neste ato representando o Senhor Presidente do Senado Federal, importante Casa Alta do Parlamento brasileiro; Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Federal Eduardo Cunha, que preside o Parlamento brasileiro, os representantes do povo no Parlamento e que iniciará, no dia de hoje, o exercício de seu mandato; Ministros do Supremo Tribunal Federal de hoje e de sempre; Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Francisco Falcão, e Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro Barros Levenhagen; uma saudação especial ao digno Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, também colega advogado que, como fiscal da lei e da sociedade, desempenha com denodo a sua missão; digna Corregedora Nacional de Justiça, Ministra Nancy Andrighi; saúdo todos os advogados aqui presentes na pessoa do meu colega Advogado-Geral da União, Ministro Luís Adams, competente Advogado Público do Brasil; e saúdo, por fim, o Ministro Presidente do Tribunal de Contas da União, Doutor Aroldo Cedraz. Senhoras e Senhores, Honra os 850 mil advogados do Brasil saudar o Judiciário por ocasião da abertura solene de suas atividades anuais, dirigindo-se à plural, competente e digna composição atual do Supremo Tribunal Federal.
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O Ministro Presidente Ricardo Lewandowski tem empreendido um diálogo de alto nível com as funções essenciais à Justiça, tornando concreto e efetivo o conceito de família forense. Magistratura, advocacia e Ministério Público perseguimos o mesmo ideal de Justiça, desempenhando cada qual a sua missão com respeito recíproco, lealdade processual e compromisso com os valores constitucionais. A profícua gestão ora desenvolvida pelo Ministro Presidente Ricardo Lewandowski e pela Ministra Vice-Presidente Cármen Lúcia bem sinaliza no sentido da superação de obstáculos que impedem a prestação jurisdicional de qualidade aos cidadãos. A priorização dos julgamentos em repercussão geral e o estímulo aos meios alternativos de resolução de conflitos, como mediação, conciliação e arbitragem, são exemplos dessa profícua atuação. Estado de Direito pressupõe a submissão de todos ao império da lei, à separação dos Poderes, que, a par da independência, devem guardar harmonia e respeito aos direitos e garantias individuais. O grau de civilidade de uma sociedade pode ser medido pela efetividade verificada ao devido processo legal. A liberdade e os bens possuem superlativa proteção constitucional, sendo necessário um prévio processo justo para a sua privação. Há oito séculos, a Magna Carta inglesa substituiu a justiça do soberano pelo julgamento de acordo com as leis da Terra, sendo precursora do devido processo legal e de seus princípios inafastáveis, destacadamente, a ampla defesa e a presunção de inocência. Impõe-se a paridade de armas entre defesa e acusação. Elas são iguais em importância e dignidade. Na pena de Rui Barbosa, a defesa não é menos especial à satisfação da moralidade pública do que a acusação. A defesa é a voz dos direitos legais. A história do Brasil não possui saudade do decreto-lei do Estado Novo que instituiu o Tribunal de Segurança Nacional ao prever que se presume provada a acusação, cabendo ao réu a prova em contrário nos casos de crimes graves e estado de flagrância; o ônus da prova é exclusivo do órgão acusador, a prova do fato é obrigação de quem alega. A presunção de culpabilidade vigorante nos regimes autoritários da Europa da primeira metade do século passado não pode ter terreno fértil dentro de um Estado constitucional. O método de julgamento do tribunal nazista para crimes políticos, marcado pela humilhação e ridicularização dos réus, não há de ser tolerado dentro do marco constitucional. A defesa não pode ser peça de ficção e o julgamento não pode ser um espetáculo.
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O Supremo Tribunal Federal sempre se porta como guardião do julgamento justo, respeitando o devido processo legal em toda a sua história. Atribuindo ampla efetividade à presunção de inocência, o Plenário do Supremo Tribunal Federal assevera, desde 2009, a inconstitucionalidade da execução provisória da pena, HC 84.078, de Minas Gerais. Ninguém pode sofrer as consequências de uma punição antes de sentença condenatória transitada em julgado. A presunção de inocência foi reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal em repercussão geral julgada em dezembro último, RE 591.054, quando decidiu que os inquéritos, processos penais em andamento e julgamentos passíveis de recursos não são suficientes para impingir ao cidadão a condição de maus antecedentes — como deflui desse julgado relatado pelo digno e competente ministro Marco Aurélio de Mello. No seu voto, o Decano do Tribunal, Ministro Celso de Mello, enfatizou, com seu reconhecido brilho: “É preciso, desse modo, dar consequência e conferir real efetividade a esse dogma inerente ao Estado Democrático de Direito”. Com efeito, a presunção de inocência, que se dirige ao Estado para impor limitações ao seu Poder, qualificando-se, sob tal perspectiva, como típica garantia de índole constitucional, e que também se destina ao indivíduo como direito fundamental, por este titularizado, representa uma notável conquista histórica dos cidadãos em sua permanente luta contra a opressão do Poder. Cabe referir, por extremamente oportuno, que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento do Plenário, RE 482.006, relatado pelo eminente Ministro Presidente, Ricardo Lewandowski, interpretando a Constituição da República, observou em sua decisão essa mesma diretriz que fez incidir a presunção constitucional de inocência, também em domínio extrapenal, explicitando que esse postulado constitucional alcança quaisquer medidas restritivas de direitos. O desafio deste momento histórico, Excelentíssimos Ministros, é a efetivação do princípio constitucional da igualdade, a impedir a instrumentalização do Poder para estabelecer privilégios, efetuar injustas perseguições e estabelecer fosso entre as pessoas e as instituições. A igualdade política será mais aproximada com o fim do investimento empresarial em candidatos e partidos, como já assinalado pela maioria do Supremo Tribunal Federal. Uma Nação constituída por um povo livre e de iguais, eis a promessa constitucional a ser efetivada. A proteção jurídica da igualdade deve ser compreendida como postulado antidiscriminatório a proibir a subjugação de pessoas e grupos e com o propósito de inclusão a
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superar desigualdades regionais, sociais e econômicas. Significa principalmente reconhecer e assegurar a todos o tratamento com igual respeito e consideração. Nunca mais a voz única do autoritarismo. Temos repulsa ao preconceito, à intolerância. Propugnamos pela centralidade da dignidade da pessoa humana, pelo respeito à diferença e pelo pluralismo. O Estado Democrático de Direito pressupõe o debate livre de ideias, o respeito à divergência e a não utilização da desqualificação do oponente como método argumentativo. As ideias devem brigar, não os homens. Do somatório da síntese das inteligências humanas são constituídos os melhores caminhos para a humanidade. Com esse sentimento de profundo respeito ao papel garantidor dos valores constitucionais desempenhados pelo Supremo Tribunal Federal, a advocacia, voz indispensável do cidadão e essencial à Justiça, renova o seu propósito em permanecer à disposição do Judiciário brasileiro para contribuir com a consolidação das instituições da República, com a estabilidade democrática e com a construção de uma sociedade justa, porque igualitária, e fraterna, porque plural, sem discriminação e com a efetividade das garantias fundamentais insculpidas na Constituição Federal. Muito obrigado.
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Discurso do Doutor RODRIGO JANOT MONTEIRO DE BARROS, Procurador-Geral da República
O Doutor Rodrigo Janot Monteiro de Barros (Procurador-Geral da República) — Excelentíssimo Senhor Presidente, na pessoa de quem saúdo todas as autoridades aqui presentes dos três Poderes da República; Senhoras Ministras, Senhores Ministros de ontem, de hoje e de sempre; Magistrados; Membros do Ministério Público; Senhores advogados; Senhoras e Senhores. O Ministério Público brasileiro saúda a retomada dos trabalhos para mais um Ano Judiciário. Essa simples, porém tradicional, solenidade tem o propósito não só de marcar temporalmente o reinício dos julgamentos colegiados, mas também de oportunizar espaço para externarmos as expectativas em relação ao ano que ora se inicia. Os desafios que temos pela frente não são poucos. O maior acesso à jurisdição, ao passo que traz cidadania ao nosso povo, traz também consigo o inevitável e vertiginoso aumento do número das demandas submetidas à apreciação do Poder Judiciário. Tal fenômeno não tem consequências estanques nos órgãos julgadores, pois movimenta toda a máquina institucional pela qual se faz Justiça. Advogados, públicos e privados, Procuradores dos Estados, Defensores Públicos, Membros do Ministério Público nos seus diversos ramos, todos auxiliados por seus servidores, têm à frente o desafio e o compromisso profissional de dar consecução à distribuição da Justiça.
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Nesse reinício de jornada, destaco alguns temas que merecem real atenção dos Poderes constituídos: — A solidificação do combate à corrupção como fortalecimento das instituições e do regime democrático. Quanto ao ponto, ressalto que a estratégia até agora adotada de seguir o caminho do dinheiro parece ter sido correta; — A reafirmação do indispensável poder investigatório do Ministério Público; — O balizamento legal em relação ao financiamento público e privado das campanhas eleitorais; — A inafastável melhoria das condições do sistema carcerário; — Revisitar o tema da Lei da Anistia, em razão do julgamento do Estado Brasileiro pela Corte Interamericana dos Direitos Humanos; — O uso planejado do instituto da repercussão geral como instrumento de celeridade e eficiência do sistema de justiça; — A necessária valorização das carreiras dos servidores do Poder Judiciário e do Ministério Público. A solidificação do regime democrático e do Estado de Direito exigirá de todos, e de cada um de nós, parcela maior de esforço para vencermos os enormes desafios que temos pela frente. No que toca especificamente à chefia do Ministério Público da União — carga maior, ante o avizinhar do final do biênio de minha gestão em setembro próximo —, a responsabilidade institucional, que não é pequena, ganha maior dimensão no momento nacional vivido. A Constituição, ao forjar o Ministério Público que hoje temos, deu-nos prerrogativas, garantias, estrutura material e de pessoal. Mas não foi só. Deu-nos responsabilidade, e muita, para a defesa do regime democrático e do Estado de Direito. Tenho que os desafios que se avizinham hão de ser enfrentados com serenidade, porém com firmeza, com independência e com responsabilidade.
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De toda sorte, com os ânimos renovados, externo o desejo de que o Ministério Público brasileiro continue a aprofundar a parceria com o Poder Judiciário, ao permitir que a celeridade processual, balizada pelo devido processo legal, permita dar aos brasileiros um País cada dia melhor. De minha parte, Senhor Presidente, renovo aqui o desejo de que o Supremo Tribunal Federal continue contando com a Procuradoria-Geral da República como parceira efetiva na condução dos trabalhos deste ano de 2015. Que possamos ter sabedoria e afinco nos trabalhos que se iniciam hoje. Muito obrigado.
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Discurso do Excelentíssimo Senhor Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, Presidente do Supremo Tribunal Federal
O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Presidente) — Inicio cumprimentando o Ministro de Estado da Justiça, Doutor José Eduardo Cardozo, neste ato, representando a Excelentíssima Senhora Dilma Rousseff, Presidenta da República; cumprimento também o Senador Jorge Viana, neste ato, representando o Excelentíssimo Senhor Presidente do Senado Federal; cumprimento também o Presidente da Câmara dos Deputados, recém-eleito, Deputado Federal Eduardo Cunha; cumprimento igualmente os Ministros do Supremo Tribunal Federal de hoje e de sempre, que nos honram com a presença; o Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Francisco Falcão, a quem cumprimento e agradeço a presença; o Presidente do Tribunal Superior do Trabalho, Ministro Barros Levenhagen, aqui presente à minha direita; a Corregedora Nacional de Justiça, Ministra Nancy Andrighi, na pessoa de quem cumprimento todos os Conselheiros do Conselho Nacional de Justiça aqui presentes; o Advogado-Geral da União, Ministro Luís Inácio Lucena Adams; o Procurador-Geral da República, Doutor Rodrigo Janot Monteiro de Barros, na pessoa de quem cumprimento todos os Membros do Ministério Público, agradecendo também as generosas palavras que dirigiu a esta Corte; tenho a honra de cumprimentar e agradecer a presença do Presidente do Tribunal de Contas da União, aqui à minha direita, o Ministro Aroldo Cedraz, na pessoa de quem cumprimento todos os Ministros daquele Tribunal; cumprimento o Comandante do Exército brasileiro, General Enzo Peri; o Secretário-Geral da Marinha, Almirante-de-Esquadra Aírton Teixeira Pinho Filho, neste ato, representando o Comandante Júlio Soares, da Marinha do Brasil; o Comandante da Aeronáutica do Brasil, Tenente-Brigadeiro-do-Ar Nivaldo Luiz Rossato; o Presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Doutor Marcus Vinicius Furtado Côelho, na pessoa de quem cumprimento todos os Advogados brasileiros, e a quem aproveito para agradecer as gentis palavras dirigidas ao Judiciário brasileiro; cumprimento o Defensor Público-Geral Federal da União, Haman Tabosa de Moraes e Córdova, aqui à minha frente; cumprimento igualmente os Senhores Presidentes das Associações de Magistrados,
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de Advogados e Membros do Ministério Público; Senhores Ministros dos Tribunais Superiores, Senhores integrantes da Magistratura brasileira, Senhores Jornalistas, servidores deste e de outro Tribunal, minhas Senhoras e Meus Senhores. As insatisfações pessoais, somadas aos conflitos interindividuais e coletivos resultantes de motivos patrimoniais, psicológicos, morais, econômicos, políticos ou sociais, encontram-se, como jamais estiveram, nos dias que correm, largamente disseminadas, sobretudo em face da antevisão do iminente advento do Estado de bem-estar social, logo após o término da Segunda Guerra Mundial, cujas generosas promessas, todavia, ainda remanescem, em sua maior parte, em um plano apenas retórico. Por isso mesmo, desde meados da centúria passada, a busca pela prestação jurisdicional, como expressão de um serviço público essencial, vem se intensificando segundo uma progressão geométrica, uma vez que as leis e constituições dos países democráticos, que surgiram no pós-guerra, tais como as do Brasil, passaram a assegurar aos seus cidadãos — e mesmo aos estrangeiros sob sua proteção — um vasto rol de direitos fundamentais, garantindo-lhes o mais amplo acesso à Justiça. Os litígios judiciais, por tal razão, têm aumentado de forma exponencial, sem que os distintos Judiciários tenham logrado dar efetiva vazão a essa crescente demanda, cujo atendimento célere e eficaz é hoje legitimamente considerado um valor indispensável à vida em comunidade. Como muitos estudiosos vêm registrando, se os litígios existentes na sociedade contemporânea, constantemente bombardeada por apelos a um consumo conspícuo e perdulário — ainda que sobrepairando de forma potencial ou latente —, não forem rápida e adequadamente resolvidos pelas autoridades estatais competentes, eles poderão degenerar em frustrações e violências, trazendo como consectário um grave comprometimento da paz pública. Para Kazuo Watanabe, citado por Cândido Dinamarco1, a litigiosidade contida — sem perspectiva de solução a curto ou médio prazo — representa perigoso fator de descontentamento pessoal e desagregação social, constituindo dever do Estado dar-lhe efetivo cobro ou, quando menos, amenizar tal estado de insatisfação.
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DINAMARCO, Cândido. Instituições de direito processual civil. p. 129-131.
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Dinamarco ressalta, nesse sentido, que a importância social do processo judicial é justamente pacificar as relações entre grupos e pessoas, mediante a eliminação dos conflitos, tendo como base os consagrados cânones da Justiça. Ainda de acordo com o jurista, o exercício correto e continuado da jurisdição configura elemento de grande valia, com vistas não apenas a educar as pessoas para o respeito aos direitos alheios e o exercício de seus próprios, mas também, nesse passo, contribuir para a coesão social. A jurisdição célere e eficaz, continua Dinamarco, contribui para a estabilidade das instituições e o fortalecimento da própria democracia, pois realça os valores mais caros à cidadania, na medida em que dá concreção às liberdades públicas e aos direitos fundamentais. Mas, infelizmente, não se trata de um caminho sem percalços. O Relatório Justiça em Números 2014, ano-base 2013, recém-divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça, traz dados verdadeiramente dramáticos quanto ao tema, por revelarem uma verdadeira “explosão de litigiosidade no País”, para usarmos uma expressão cara a Boaventura Souza Santos. Os números gerais do Poder Judiciário (sem contar os registrados pelo STF e pelos Conselhos) contidos no mencionado Relatório representam um impressionante total aproximado de 95 milhões de processos em tramitação, um incremento de 3,3% em relação a 2012. O que é mais dramático — apesar do acréscimo de 1,7% na produtividade dos juízes, que somam atualmente cerca de 16.500 profissionais em atividade — é que a taxa de congestionamento cresceu 1,3% em comparação a 2012, atingindo o frustrante porcentual de 70,9%. Também, aqui, no Supremo Tribunal Federal, o número de processos que ingressaram em 2014 sofreu um incremento de cerca de 8,5% em relação ao ano anterior. Em todo o País, vive-se um momento de sensível ampliação das demandas judiciais, que requerem um planejamento estratégico envolvendo todos os tribunais e juízes. Embora esses dados sejam, à primeira vista, sumamente adversos, eles evidenciam, por outro lado, o prestígio que o Judiciário, apesar de tudo, desfruta na vida das pessoas, deixando transparecer a maturidade institucional que alcançamos no Brasil.
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Nesse sentido, a crescente busca pela jurisdição revela-se bastante emblemática, pois só reivindica direitos quem reconhece que deles é efetivamente detentor e tem a convicção de que o sistema judicial pode dar-lhe a satisfação almejada. Atento a essa problemática, o Supremo Tribunal Federal, logo nos primeiros dias de 2015, publicou portaria explicitando as diretrizes da presente gestão para este e para o próximo ano. A motivação foi esclarecer à sociedade, em geral, e aos operadores do Direito, em especial, o que se pode esperar da Corte no referido período, na certeza de que a informação clara e a administração transparente são essenciais aos tempos republicanos que vivemos. Dentre os objetivos expostos destacam-se: I — Promover permanente diagnóstico e identificação dos entraves a uma prestação célere e eficaz, propondo as soluções administrativas, técnicas e normativas cabíveis; II — Intensificar as relações com os demais Poderes e outras instituições essenciais à administração da Justiça, com vistas a buscar a convergência de esforços nas tarefas que lhes são comuns; III — Dar prioridade, nos julgamentos do Plenário, a processos de maior impacto na sociedade, a exemplo dos recursos extraordinários com repercussão geral e das ações originárias com efeitos erga omnes; IV — Acelerar a edição de súmulas vinculantes, por representarem orientações objetivas e permanentes aos operadores do Direito para a solução de temas constitucionais controvertidos; V — Melhorar a comunicação e o compartilhamento de informações processuais entre o Tribunal e os demais órgãos do Poder Judiciário, para dar maior eficácia à jurisdição constitucional; VI — Realizar estudos empíricos sobre a produção jurisdicional da Corte, agregando valor aos dados estatísticos resultantes, promovendo a sua divulgação periódica; VII — Estimular o uso de instrumentos de participação social na solução das controvérsias submetidas ao Tribunal, de maneira a robustecer a legitimidade das decisões por ele tomadas;
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VIII — Envidar esforços para a permanente valorização dos magistrados e dos servidores da Corte e do Poder Judiciário em geral; IX — Aprimorar a interlocução do STF com organismos internacionais, tribunais supranacionais e cortes de outros países, objetivando fortalecer a proteção dos direitos fundamentais enquanto valores que integram o patrimônio comum da Humanidade. No tocante especificamente aos entraves administrativos, permitimo-nos destacar o resultado positivo sobre a produção da Corte obtido com a publicação da Portaria 536, de 16 de outubro de 2014, que dispôs sobre o prazo para publicação de acórdãos referentes a julgamentos do Plenário. Com a entrada em vigor do referido ato, alcançou-se, nos meses de novembro e dezembro passados, um prazo médio de 22,15 dias entre o julgamento de um dado caso e a publicação do acórdão correspondente, enquanto no ano de 2013 a duração apurada foi de 93,13 dias. Medidas administrativas desse jaez, embora de simples implementação, revelam-se bastante eficazes, resultando em significativo incremento no grau de satisfação dos jurisdicionados. De outra parte, já agora no plano institucional, haveremos de enviar ao Congresso Nacional, ainda em 2015, o novo Estatuto da Magistratura, previsto no artigo 93, caput, da Constituição Federal, superando-se, assim, a disciplina normativa dos juízes brasileiros, concebida em pleno regime de exceção, mas ainda vigente nos dias de hoje. Pensamos que é chegada a hora de rediscutirmos as bases da magistratura nacional, de maneira a colocarmos os nossos juízes em um patamar profissional e institucional compatível com os inestimáveis serviços que prestam ao País. Acreditamos que a ocasião é propícia para tanto, pois vivemos um momento histórico ímpar, em que desfrutamos de uma democracia amadurecida e de um ambiente apto ao debate franco e aberto com todos os interessados nessa relevante questão. Também no começo deste ano, estabelecemos, em ato formal, a nossa visão estratégica do Supremo Tribunal Federal para o futuro que se avizinha, consignando que ela correspondia a “Assegurar a concretização dos direitos fundamentais, consideradas as suas várias dimensões, e garantir a estabilidade das instituições republicanas”.
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Esse é o compromisso que a atual gestão da Corte assume com a sociedade brasileira, conclamando os honrados pares, os operosos magistrados, os combativos advogados, os zelosos membros do Ministério Público e os dedicados servidores a emprestarem sua indispensável contribuição para que possamos dar conta dessa magna tarefa, em prol da pacificação dos inúmeros conflitos que ainda entravam o pleno desenvolvimento econômico e social do País. Dito isso, declaro aberto o Ano Judiciário de 2015, desejando a todos que tenham um ano pleno de realizações. Declaro encerrada esta sessão. Agradeço, mais uma vez, honradíssimo, a presença de todos. Peço que permaneçam em seus lugares até a retirada da Corte e das autoridades que compõem a mesa. Mais uma vez, obrigado.
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