ID: 46652012
15-03-2013
Tiragem: 14700
Pág: 4
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Semanal
Área: 28,49 x 36,58 cm²
Âmbito: Economia, Negócios e.
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JOSÉ ANTÓNIO DE SOUSA, PRESIDENTE DA LIBERTY PORTUGAL, VALORIZA INTERVENÇÃO DOS AGENTES PROFISSIONAIS
“Seguradoras diretas são Os seguros diretos respondem mal ao perfil de risco e às necessidades específicas de cada cliente – considera José António de Sousa. Em entrevista à “Vida Económica”, o presidente da Liberty Portugal aponta mais inconvenientes do que vantagens às seguradoras diretas. Este canal provoca a degradação dos resultados do ramo automóvel e não favorece a informação dos segurados quanto às coberturas, nem a correta avaliação dos custos. E existe um efeito de canibalização e perda de quota de mercado nas seguradoras que optaram por criar um canal direto em alternativa à distribuição através dos agentes. José António de Sousa afasta a hipótese de a Liberty criar um canal direto no mercado português e afirma ser um defensor acérrimo do papel do intermediário de seguros.
JOÃO LUÍS DE SOUSA
[email protected]
Vida Económica - As possíveis poupanças no seguro automóvel foram o tema de uma reportagem divulgada por uma estação de televisão que agitou a atividade seguradora. Há um défice de informação quanto aos custos e condições dos seguros neste ramo?
José de Sousa - A peça que passou na SIC está muito mal montada, cheia de erros crassos na descrição de coberturas, e na comparação de preços de coberturas que não são comparáveis (Responsabilidade Civil versus Danos Próprios, por exemplo), e focaliza apenas o fator preço. Um bom serviço público teria sido o de aconselhar os telespectadores a dirigir-se ao agente de uma qualquer companhia de seguros mais próximo às suas casas para verificar as suas apólices, falar sobre as coberturas que estão amparadas, falar sobre a tolerância individual da pessoa ao risco, e o que está disposta a pagar pela sua cobertura, etc. Disso, nada é dito. Preço, preço, preço, e muito mal explicado. Depois critica-se levianamente as seguradoras quando há sinistros, e não estão cobertos. Aí vem a “lengalenga” do costume, de que as companhias de seguros se baseiam em letras pequenas para não pagar, que “os seguros”, como disse recentemente uma deputada do partidos Os Verdes no parlamento, ao referir-se, sem especificar, aos seguros agrícolas, não servem para nada, etc.! “Sound bites” pouco profissionais, e que prestam um péssimo serviço ao consumidor. VE - Na sequência desta reportagem, decidiu tomar uma posição pública sobre o tema das seguradoras diretas. A Liberty está em guerra com esse canal, conforme tem sido noticiado?
JS - A posição pública que eu tomei na sequência da reportagem da SIC foi o envio de uma mensagem aos nossos parceiros estratégicos, os agentes ou intermediários de seguros, para que reagissem com força e contundência, de forma direta, ou através das suas organizações representativas de classe, contra a mensagem contida na já mencionada peça jornalísti-
“Uma verdadeira análise de risco e das necessidades de cobertura de cada cliente só pode ser feita de maneira profissional por um agente de seguros, que trabalha para várias seguradoras de forma independente” – afirma José António de Sousa.
ca. A Liberty Seguros, companhia que eu com muito orgulho represento, não está em guerra aberta com absolutamente ninguém em concreto. Estamos em guerra permanente no mercado contra a concorrência, como qualquer outra companhia, em sentido figurado, isso sim! O modelo de negócios de uma seguradora direta é tão legítimo quanto o nosso, que optamos em Portugal por distribuir os nossos produtos através de um agente, corretor ou intermediário de seguros. Alguns jornalistas, ou melhor, alguns funcionários dos jornais que são responsáveis por escrever os títulos, gostam de gerar confusão, e pô-los a “escorrer sangue”. Muitas vezes os títulos não têm qualquer ligação com o conteúdo ou o contexto da notícia. Foi o caso aqui, claramente. Não sou eu ou a Liberty Se-
À medida que as diretas crescem, as suas casas-mãe, que distribuem através de agentes, perdem quota de mercado
guros que temos de criticar o modelo das seguradoras diretas, ou estar em guerra contra esse modelo ! São aqueles cujo ganha-pão é ameaçado pelas seguradoras diretas, os agentes, corretores e intermediários de seguros, que devem tirar as devidas ilações, e defender-se! Até agora, as seguradoras diretas concorriam exclusivamente na base do preço. Essa continua a ser, aliás, a mensagem que veiculam maciçamente na televisão. Agora começam a dizer no que claramente parecem ser “publirreportagens” disfarçadas de notícias que, além do preço, oferecem conveniência, bom serviço e flexibilidade. Estas são, no entanto, as três principais características diferenciadoras que os agentes de seguros podem reclamar como valor agregado para si próprios, para contrapor ao argumento do preço puro e duro.
ID: 46652012
15-03-2013
Tiragem: 14700
Pág: 5
País: Portugal
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Period.: Semanal
Área: 28,64 x 35,54 cm²
Âmbito: Economia, Negócios e.
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globalmente deficitárias” VE - Em sua opinião, os mediadores profissionais criam valor para os segurados e para as seguradoras, prestando um serviço que as seguradoras diretas não podem dar?
JS - Acredito que os agentes são, e continuarão a ser, por muitos e muitos anos, um elemento indispensável e insubstituível na cadeia de valor dos seguros, até porque o agente é independente da seguradora, e portanto é um representante dos interesses do cliente. Quando um cliente se relaciona diretamente com uma seguradora ,fica sem conhecer as alternativas do mercado, apenas o que a seguradora lhe vende através do seu call center. O relacionamento pessoal, uma verdadeira análise de risco e das necessidades de cobertura de cada cliente, só pode ser feita de maneira profissional por um agente de seguros, que trabalha para várias seguradoras de forma independente. VE - O peso das seguradoras diretas é relevante em alguns ramos, como o automóvel?
JS - Em nenhum mercado, mesmo no inglês, conseguiu ultrapassar a fasquia dos 25%-30% de quota de mercado no ramo mais comum, que é o automóvel, que eu saiba. Em Portugal, da última vez que vi, andava pelos 5% de quota de mercado no automóvel. Certamente que ainda terá algum espaço para crescer, mas não nos esqueçamos de que algumas das diretas já existem há 15 ou 16 anos no mercado, e que o mercado hoje está saturado de diretas a disputar a mesma franja de clientes. Há mesmo clientes, dos que não se importam de comprar através de call center, que mudam de uma direta para outra com frequência, tratando de explorar o sistema para embaratecer os custos da sua cobertura a cada mudança de seguradora que fazem. A um desses deu-se um destaque enorme na reportagem da SIC. Um dia terão uma surpresa. Ou seja, sim, trata-se de um modelo de negócios que tem clientela específica e que estará certamente por aí no mercado a tratar de crescer e de ganhar quota de mercado aos agentes de seguros, mas que na minha ótica terá um teto natural, como em outros mercados, e nunca substituirá o papel preponderante que um agente profissional de seguros tem para que se estabeleça um relacionamento verdadeiramente independente de uma seguradora com o cliente. VE - Para as seguradoras diretas o custo de aquisição de clientes é mais elevado?
JS - O resultado melhor ou pior do modelo direto depende, como sabemos, do investimento que se faça essencialmente em te-
Os prejuízos das diretas estão a ser financiados com capital dos acionistas gerado por outros negócios ou pelos lucros obtidos no negócio segurador tradicional
levisão. Aliás, os call centers estão sempre de sobreaviso no horário em que sai o anúncio na televisão, pois, por via de regra é só nesses momentos que as chamadas começam a cair com força. Ou seja, para obter “leads” (contactos) de potenciais clientes é preciso investir agressivamente em publicidade maciça, preferentemente em televisão. Aquilo que um agente de seguros faz, olhar para quem o visita (ou para quem ele visita), avaliar a pessoa, falar com ela, ver se a mensagem é coerente e séria, se não se trata de algum aproveitador “à pesca”, ou de alguém a tentar fazer uma fraude, analisar as necessidades concretas do cliente, oferecer-lhe várias alternativas de coberturas em função do apetite do cliente para assumir mais risco, pagando menos prémio, nada disso acontece numa chamada de call center. No call center vendem ao cliente um pacote pré-desenhado já existente, com muito poucas opções, se é que as tem, de configurar o produto ao que realmente necessita, e ao seu poder económico efetivo. VE - Várias seguradoras tradicionais têm também seguradoras diretas. Nestes casos, surgem conflitos entre os vários canais de distribuição?
JS - Ambos os modelos são uma forma legítima de chegar aos clientes. Em Portugal são essencialmente os bancos, para tratar de controlar a relação com os clientes, da mesma maneira que o fazem no negócio bancário, as entidades que estão por detrás da diretas (entretanto há uma exceção, a AXA). Isto causa necessariamente conflitos, porque historicamente são também os bancos que, no processo de nacionalização e posterior desnacionalização do setor financeiro, acabaram também por ficar com muitas companhias de seguros cujo modelo de distribuição assenta nos agentes / intermediários. E portanto passaram a ter o conflito de canais de distribuição, que lá fora, por via de regra, não existe, dentro das próprias portas.
Liberty não equaciona canal direto em Portugal
VE - Da mesma forma que a Liberty opera com seguradoras diretas no estrangeiro, não o pode vir a fazer em Portugal? JS - Fico extraordinariamente grato por me fazer esta pergunta, pois permite-me esclarecer um tema em que a demagogia no tratamento da questão não é minha, acredite. Deixe-me começar por explicar um pouco a principal razão que me levou apaixonar-me pelo Liberty Mutual Group, e aceitar, já lá vão 10 longos anos, sair de outro grupo multinacional onde fiz, ao longo de 15 anos, uma carreira brilhante, para aceitar o desafio de liderar o projeto em Portugal. Vou-lhe contar uma história. Há mais de 300 testemunhas daquilo que lhe vou contar, todos os assistentes ao President’s Meeting mundial de 2007. O Liberty Mutual Group tinha acabado de lançar o projeto de uma
Em Portugal, pela reduzida dimensão do mercado nacional, no entanto, este tema das diretas assume outra escala, outra dimensão. Isto porque as pessoas, que não estavam habituadas a ver publicidade maciça de companhias de seguros na televisão, de repente passaram a ser bombardeadas com milhentos anúncios em “prime-time” focalizados no preço dos seguros automóveis. Com o resultado de que, sendo certo que as diretas foram ganhando quota de mercado, essa quota está-se a fazer à custa da canibalização das carteiras tradicionais das casas-mãe das próprias diretas. São números públicos, à medida que as diretas crescem, as suas casas-mãe, que distribuem através de agentes, perdem quota de mercado, e os resultados deterioram-se para todo o coletivo do mercado, direto ou via agente. VE - Considera que o canal direto cria valor ou destrói valor na atividade seguradora?
JS - Em Portugal, uma vez mais, as coisas nunca são tão taxa-
companhia de seguros diretos na Polónia, que arrancou em Setembro de 2007. Nesta conferência internacional de quadros de topo do grupo toda a gente estava eufórica com o êxito do lançamento na Polónia, e o presidente mundial do grupo, Ted Kelly, pegou no microfone, e perguntou ao chefe da região europeia naquela altura: “então e em Portugal, quando teremos uma companhia direta?”. O homem, um brilhante profissional e um grande amigo meu, sem olhar para mim, saltou da cadeira e respondeu publicamente que no final de 2008 ela estaria montada! Só depois olhou para mim, e viu-me com o braço estendido e o dedo esticado a dizer-lhe que não. No final da reunião eu fui ter com ele e disse-lhe taxativamente que se quisesse ter uma operação de direto em Portugal, à semelhança do que existe em outros mercados, teria que ser sobre o meu cadáver, ou seja, teriam que me pôr a andar. E portanto que na primeira oportunidade corrigisse o compromisso que tinha assumido com o presidente do Liberty Mutual Group, porque comigo esse compromisso não valia nada. Seis anos depois deste acontecimento, eu ainda cá estou, não há uma direta Liberty Seguros em Portugal, e eu e e a pessoa em causa somos amicíssimos. Em Portugal também distribuímos produtos por formas alternativas, mas tudo aquilo que fazemos é através de um intermediário reconhecido e validado no ISP. Mesmo aquilo que fazemos em termos de internet acaba sempre canalizado para um dos nossos parceiros da rede. O importante a
tivas, tão preto no branco, como resulta da forma em que a pergunta está formulada. É relativamente difícil, porque as diretas estão associadas a uma casa-mãe, muitas vezes a um grupo financeiro. Se fossem operações “stand-alone” as diretas ou fechavam as portas, ou teriam de ser sucessivamente capitalizadas. Isso significa que o modelo que têm é insustentável, que estão a praticar preços tecnicamente insuficientes, e a gastar operativamente demais também. O rácio combinado (gastos totais de operação mais sinistros incorridos, que são os pagos e os reservados, medidos em percentagem dos prémios auferidos) excede em todas elas os 100%, nalguns casos largamente. Como estão inseridas num grupo financeiro, os deficits de exploração são cobertos pelo acionista, que por sua vez ganha dinheiro com a operação de seguros vendidos através da rede de agentes. Ou seja, apesar de esta afirmação ter causado muita polêmica, porque nem os de um lado nem alguns
reter desta história é o seguinte. Em cada mercado o Liberty Mutual Group opta pela estratégia que é a mais correta para esse mercado. Não importamos modelos de lado nenhum. O CEO de cada mercado, enquanto os acionistas estiverem contentes, tem o poder de vetar projetos ou iniciativas que lhe querem ser impostos de fora, não importando de onde venha. Não há multinacional no mundo que funcione assim, e é este espírito de fomento ao empreendedorismo que me cativou no Liberty Mutual Group. Toda a minha vida fui um acérrimo defensor do valor do intermediário de seguros na cadeia de valor do nosso setor. Em qualquer mercado que esteja sob a minha alçada, a distribuição através de parceiros, para mim, é absolutamente inquestionável, inabalável e inatacável. Não por demagogia, mas por crença pessoal. Aquilo que os meus colegas fazem em Espanha ou na China é lá com eles. São outros mercados, outras mentalidades, outras filosofias de trabalho, outras dimensões, outra tolerância dos consumidores e dos próprios distribuidores a canais alternativos. Portugal é um país minúsculo, um mercado perfeitamente marginal, que já quase nem aparece nas estatísticas. Há uma camada grande de profissionais que diariamente lutam por se manter atualizados, por formar-se e vender aos clientes um traje feito à medida das necessidades de cada um e das suas famílias. Olho no olho. Este é o único modelo em que eu acredito. E, portanto, é o modelo pelo qual eu luto, sem quartel.
do outro gostaram de a ouvir, o facto nu e cru é que os prejuízos das diretas estão a ser financiados ou com capital dos acionistas gerado por outros negócios, ou pelos lucros obtidos no negócio segurador tradicional, gerado através dos agentes. Podem dizer o que quiserem, chamar-me um exótico e perigoso demagogo, mas a conclusão só pode ser mesmo essa, gostem ou não de a ouvir nua e crua ! Portanto posso sem qualquer hesitação dizer que a deterioração dos resultados no Ramo Automóvel, e muito em breve no Saúde e possivelmente no Lar também, é derivado da divulgação maciça do fator preço no único meio de comunicação a que as pessoas realmente ligam, a televisão. Portanto, em Portugal, este minúsculo mercadozinho em que há diretas a encher a televisão maciçamente com uma mensagem focalizada no preço, as diretas foram também diretamente responsáveis pela degradação a que assistimos nos resultados operacionais do Ramo Automóvel. Esta é a minha opinião.
ID: 46652012
15-03-2013
Tiragem: 14700
Pág: 1
País: Portugal
Cores: Cor
Period.: Semanal
Área: 27,93 x 4,08 cm²
Âmbito: Economia, Negócios e.
Corte: 3 de 3
PRESIDENTE DA LIBERTY PORTUGAL AFIRMA
“Seguradoras diretas são globalmente deficitárias”
Págs. 4 e 5