Novo CPC pode gerar explosão de reclamações ao STF

Fonte: Dr. Eduardo Macedo Leitão Seção: Justiça Versão: Online Data: 27/07/2016 Novo CPC pode gerar explosão de reclamações ao STF Crédito: Flickr/F...
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Fonte: Dr. Eduardo Macedo Leitão Seção: Justiça Versão: Online Data: 27/07/2016

Novo CPC pode gerar explosão de reclamações ao STF

Crédito: Flickr/Floriano Cathala

Por Livia ScocugliaBrasília

Entre celeridade e segurança, o novo Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) optou claramente pela melhor decisão do Judiciário, com mais previsibilidade e respeito aos precedentes. A busca por celeridade, no final das contas, passou ao largo do novo código. E, em alguns pontos, o texto

agravou o problema. Mas, a despeito das boas intenções, quais são os efeitos colaterais do novo Código? Ao mesmo tempo em que dá força aos precedentes com o objetivo de limitar o excesso de recursos extraordinários e fazer com que as decisões das instâncias superiores sejam repesitadas pelo próprio Poder Judiciário, o novo CPC pode ter aberto uma brecha para uma explosão de reclamações ao Supremo Tribunal Federal). Pela nova regra, os magistrados de instâncias inferiores devem observar os precedentes jurisprudenciais dos tribunais (artigos 926 e 927) – com o objetivo de garantir segurança jurídica e impedir as surpresas em cada decisão judicial. A dúvida é se, na prática, os tribunais respeitarão o que diz a nova lei. Nada absurdo se pensarmos que no começo de julho o próprio decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello, concedeu liminar para suspender a execução de mandado de prisão expedido por um tribunal de justiça que determinara o início do cumprimento da pena de um réu antes do trânsito em julgado da condenação definitiva. Ao apreciar o Habeas Corpus, o ministro afirmou que não poderia ser aplicada a decisão do plenário da Corte que concluiu ser possível a execução provisória da pena após decisão de segundo grau. Para Celso de Mello a decisão do plenário “não se reveste de eficácia vinculante”. O episódio traz a suspeita de que os juízes podem não observar a jurisprudência dos tribunais. No entanto, se isso acontecer, o novo código já traz uma possibilidade: o acórdão que violar a tese repetitiva pode ser avo de, ao mesmo tempo, REsp/RE e reclamação – tendo a reclamação a vantagem de ser apresentada diretamente no juízo de destino. Quem explica é o advogado Luiz Dellore, professor de Direito Processual do Mackenzie e colunista do JOTA. Segundo ele, o NCPC amplia o cabimento da reclamação (art. 988) para além das hipóteses já previstas anteriormente, ainda que o legislador tenha limitado o seu uso: a reclamação só é admitida quando esgotadas as instâncias ordinárias. “O objetivo da proposta foi diminuir o número de reclamações no âmbito dos tribunais superiores, mas limita a força da tese fixada em sede repetitiva”,a firmou Em relação aos precedentes, Dellore afirma que a ideia do novo código era fortalecer a jurisprudência dos tribunais, no entanto faz a ressalva de que “não é da nossa cultura seguir precedentes e decisões recentes mostram exatamente isso”. Tribunal de precedentes Ainda assim, o novo CPC pode reforçar o título do STF de tribunal de precedentes – o que já acontecia devido ao Recurso Extraordinário. Isso porque, com o novo Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, os tribunais de segundo grau irão decidir os incidentes e os recursos que chegarão ao STF já classificados como repetitivos.

Se funcionar, a medida, que, por um lado é criticada por engessar o Poder Judiciário, pode gerar isonomia e impedir a insegurança jurídica. Para os otimistas: “O STF finalmente dará a última palavra quando a matéria for constitucional”. Segundo o advogado Rodolpho Vannucci, professor de Direito Civil do Mackenzie Campinas, o CPC anterior dava muita liberdade ao juiz, e o novo código tenta fazer com que os tribunais respeitem as decisões do Supremo. “A Corte será fortificada e assumirá uma responsabilidade ainda maior do que já tinha antes”,afirmou. Com a mudança, os 11 ministros do STF não precisão mais analisar recursos de casos semelhantes, já que a decisão da Corte se aplicará em todos os casos. “O que mais precisamos hoje é desafogar tribunais para se debruçar melhor nos casos que cheguem a eles. Os ministros poderão se dedicar a uma tese e aplicá-la nos tribunais inferiores. Quanto menor o número de recursos, melhor eles serão julgados”, explicou Vannucci. As atribuições do STF ganham importância quando se torna, de fato, um tribunal de precedentes. O advogado Luciano Godoy explica que o incidente de resolução de demandas repetitivas entra no tribunal de apelação, quando há recurso ao STF e vai automático ao tribunal. STF não decide se irá afetar o processo, já que o caso já chega ao tribunal com efeito repetitivo. No entanto, se por um lado o STF não vai mais receber tantos recursos iguais, o tempo ainda deve ser bem administrado uma vez que o novo código permite sustentação oral no julgamento de agravo interno interposto contra decisão de relator que extinga ação rescisória, mandado de segurança ou reclamação como demandas originárias nos tribunais. Antes, a sustentação oral só era permitida em apelações, recursos nos tribunais superiores e ação rescisória. Além disso, o STF também passa a aceitar o ingresso de qualquer pessoa física ou pessoas jurídica no processo, não como assistente, mas como um terceiro que queira contribuir com mais argumentos para a causa. Reclamação No STF, apesar de poder ser usado para mais hipóteses, o instrumento da reclamação não sofrerá grandes mudanças processuais com o Novo CPC. O novo código uniformizou o recurso nos demais tribunais que devem aceitar a reclamação contra descumprimento de decisão proferida pelo próprio tribunal. Além de preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões, a reclamação servirá para assegurar a observância das decisões em controle concentrado de constitucionalidade, de enunciado de súmula vinculante e de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos. O problema é relevante, já que o Novo CPC declara vinculantes os precedentes, mas não estipula sanções àqueles que não observam tal força vinculante, deixando todo o trabalho para a reclamação.

O risco é o possível aumento no recebimento de recurso extraordinários e reclamações. Haverá ampliação das hipóteses de reclamção, com possibilidade de interposição de recurso extraordinário das questões resolvidas nos tribunais a quo, bem como a propositura de reclação no STF, sob alegação de descumprimento de RE de tese repetitiva. Art. 988. Caberá reclamação da parte interessada ou do Ministério Público para: § 1o A reclamação pode ser proposta perante qualquer tribunal, e seu julgamento compete ao órgão jurisdicional cuja competência se busca preservar ou cuja autoridade se pretenda garantir. § 2o A reclamação deverá ser instruída com prova documental e dirigida ao presidente do tribunal. § 3o Assim que recebida, a reclamação será autuada e distribuída ao relator do processo principal, sempre que possível. § 5º É inadmissível a reclamação: I – proposta após o trânsito em julgado da decisão reclamada; II – proposta para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida ou de acórdão proferido em julgamento de recursos extraordinário ou especial repetitivos, quando não esgotadas as instâncias ordinárias. § 6o A inadmissibilidade ou o julgamento do recurso interposto contra a decisão proferida pelo órgão reclamado não prejudica a reclamação. Sustentação oral O novo CPC trata da disciplina da sustentação oral com mais abrangência do que o código anterior, ou seja, foram ampliadas as hipóteses de cabimento do instrumento. No STF ou no STJ, e também em tribunais de Justiça e tribunais regionais federais, há a possibilidade de sustentação oral no julgamento de agravo interno interposto contra decisão de relator que extinga ação rescisória, mandado de segurança ou reclamação como demandas originárias nos tribunais. Antes, os advogados só podiam apresentar o caso em sessão plenária no julgamento de apelações, recursos nos tribunais superiores e ação rescisória. O caput do art. 937 não contém ressalvas quanto ao cabimento da sustentação oral no julgamento de embargos de declaração e agravo de instrumento e, além disso, estabelece rol mínimo de recursos que necessariamente a admitem pela atual lei processual. Além disso, o Novo CPC permite a sustentação oral por meio de videoconferência ou “outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real”, o que deve incluir ferramentas como o Skype e o Facetime. Para o advogado Luciano Godoy, sócio do PVG Advogados, a ideia do CPC acena com maior ênfase ao direito de defesa e ao contraditório em ambas as hipóteses. Segundo ele, no caso de agravo interno interposto contra decisão de relator que extinga ação rescisória, mandado de segurança ou reclamação, há extinção prematura do caso por decisão monocrática do relator, extinguindo uma ação originária e, havendo o agravo interno, caberá a

sustentação oral em casos como discussão de legalidade de ato de presidente da República no STF, de ministro de Estado no STJ ou de governador do Estado nos tribunais de Justiça. “As mudanças impactarão as rotinas dos tribunais, sobretudo pela quantidade de recursos de agravo de instrumento contra decisões que deferem ou negam tutelas provisórias”, afirmou em artigo publicado no JOTA. (Leia o texto na íntegra) O advogado Franco Mauro Russo Brugioni, sócio do Raeffray Brugioni Advogados, explica que, antes do Novo CPC, havia muita divergência nos regimentos internos dos tribunais, o que foi uniformizado e terá o tempo de 15 minutos. A mudança principal, segundo o advogado, é a possibilidade de videoconferência, o que não deve funcionar. “Os tribunais não têm verba para providenciar a estrutura, como a instalação de câmeras. Além disso, a sustentação oral mostra que o advogado está lutando pelo seu cliente e não ir até Brasília pode aparecer um descaso por parte do advogado”, argumenta. No entanto, o advogado afirma que a sustentação deveria ser mais breve e que o profissional deveria chamar a atenção para a matéria de fato e deixar a tribuna. “Não podemos confundir ampla defesa com abrir instrumentos para deixar o processo mais longo. Enquanto o código prevê medidas para criar parar de criar recursos, abre a possibilidade para deixar julgamento ainda mais longo”, critica. Em um sessão plenária de abril, os ministros do STF não conseguiram chegar a conclusão sobre o cabimento de sustentação oral em agravo regimental contra decisão monocrática que extinguiu Mandado de Segurança. O novo CPC permite a sustentação oral nesses casos, e desde a sua aprovação pelo Congresso Nacional, a área técnica do tribunal alertou os ministros para o impacto da regra. Na época, o ministro Luiz Fux, que presidiu a comissão que elaborou o novo CPC, afirmou que os gabinetes estão “abarrotados” de agravos antigos pendentes de julgamento. Como os advogados teriam 15 minutos para sustentar no julgamento de cada um deles, o Supremo enfrentaria uma lentidão que poderia prejudicar o julgamento de outras causas, como Habeas Corpus, por exemplo. A sustentação oral está prevista no artigo 937, inciso VI, parágrafo 3º do Novo CPC, que diz: “em ação rescisória, mandado de segurança e reclamação caberá sustentação oral no agravo interno interposto contra decisão de relator que o extinga.” O texto representa uma alteração em relação ao CPC de 1973, que não previa sustentação oral em agravo regimental contra decisão monocrática que extinguiu mandado de segurança. A despeito do que estabelecido na lei, Fux defendeu que não seriam permitidas as sustentações em recursos interpostos antes da entrada em vigor do novo CPC – 18 de março. De acordo com ele, essa posição iria ao encontro do cerne do Código: a razoável duração do processo. Ao permitir a sustentação oral, os ministros estariam esvaziando esse objetivo do novo CPC. Por isso, ele defendeu

que agravos interpostos antes da vigência do novo CPC sejam julgados conforme a legislação anterior. Ainda não há uma decisão sobre o assunto. Art. 937. Na sessão de julgamento, depois da exposição da causa pelo relator, o presidente dará a palavra, sucessivamente, ao recorrente, ao recorrido e, nos casos de sua intervenção, ao membro do Ministério Público, pelo prazo improrrogável de 15 (quinze) minutos para cada um, a fim de sustentarem suas razões, nas seguintes hipóteses, nos termos da parte final do caput do art. 1.021: I – no recurso de apelação; II – no recurso ordinário; III – no recurso especial; IV – no recurso extraordinário; V – nos embargos de divergência; VI – na ação rescisória, no mandado de segurança e na reclamação • •

3o Nos processos de competência originária previstos no inciso VI, caberá sustentação oral no agravo interno interposto contra decisão de relator que o extinga. 4o É permitido ao advogado com domicílio profissional em cidade diversa daquela onde está sediado o tribunal realizar sustentação oral por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons e imagens em tempo real, desde que o requeira até o dia anterior ao da sessão.

Amicus Curiae O Novo Código de Processo Civil permite o ingresso de um terceiro como amigo da corte. Pela regra, qualquer pessoa física ou pessoas jurídica (entidade representativa) pode ingressar no processo, não como assistente, mas como um terceiro que queira ampliar os argumentos e contribuir para uma melhor prestação judicial. Levando em consideração que a sociedade está cada dia mais complexa e os casos em disputa judicial repercutem na esfera de direitos ou mesmo econômica e social, o novo código dá a possibilidade de o juiz, de ofício ou após requerimento das partes, admitir participação de pessoa natural ou jurídica no processo. O amicus curiae no novo código é regulado pelo artigo 138 que determina: Art. 138. O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou

a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação. Como exemplo, um ambientalista pode ingressar em uma ação civil de reparação de danos ambientais para levar pontos ainda não abordados pelas partes ou uma entidade empresarial poderia atuar na defesa dos interesses da União para punição de um cartel que prejudica os seus associados, destacando aspectos econômicos. A nova regra que aceita terceiros sem interesse no caso a complementar informações apenas ratifica o que já era praticado no STF. A Corte já é aberta a aceitar a figura do amicus curiae nos casos mais difíceis ou que sejam de interesse social. O advogado Eduardo Macedo Leitão, sócio do setor Contencioso Cível do Siqueira Castro Advogados, explica que nem sempre a demanda da controvérsia está bem fundamentada e lembra que existem sindicados representativos de categoria de representatividade nacional e que têm muito a contribuir nas demandas que tratem sobre o assunto de seu especialidade. “O amicus curiae vem somar argumentação de um lado ou outro o que é muito importante já que a partir do novo CPC, as decisões terão repercussão nacional”, afirmou. Recursos O novo CPC estabelece também que o recorrente pode desistir do recurso apresentado em qualquer momento e sem depender da aprovação do recorrido. Ao desistir de um recurso, a sentença continua valendo. A preocupação, neste caso, é se a desistência do recurso extraordinário não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida ou daquela objeto de julgamento de tese repetitiva. O mecanismo já existia e a regulamentação do novo CPC não deve afetar o STF, já que não é comum a desistência de recurso que já chegou ao STF. A única situação que pode fazer diferença é sobre recursos repetitivos. Se o recurso for escolhido pelo STF para ser representativo, mesmo que haja desistência, o caso será julgado de qualquer jeito. A medida impede que o recorrente use o recurso apenas para ganhar tempo no processo. Art. 998. O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso. Parágrafo único. A desistência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos. Fundamentação das decisões judiciais

Os ministros devem fundamentar todas as decisões judiciais e deve enfrentar todos os argumentos apresentados pelas partes. O receio é se os ministros conseguirão conciliar o volume de processos que chegarão no STF com a necessidade de afastamento dos argumentos da parte vencida. (art. 486, § 1º, IV). O que não passou Em dezembro do ano passado, após forte atuação dos ministros do STF, o Senado aprovou o Projeto de Lei da Câmara nº 168/2015 que propôs várias mudanças no texto do novo CPC. A principal mudança foi em relação ao juízo de admissibilidade de recursos que foi mantido como previsto no Código de Processo Civil de 1973. Os ministros alegavam que a ausência do juízo prévio de admissibilidade na origem poderia aumentar significativamente os processos recursais no STF. Juízo de admissibilidade do Recurso Extraordinário diretamente no STF No projeto original do Novo CPC, o juízo de admissibilidade do Recurso Extraordinário deixava de ser atribuição das cortes inferiores (TJs, TRFs, STJ, TST e TSE) e passava a incumbir apenas ao STF. O controle de admissibilidade do RE que antes era dividido entre vários desembargadores foi substituído por um modelo concentrado, em que apenas o relator do recurso no STF decide se o recurso é admissível. No STF, a preocupação era se os 11 ministros do STF teriam condições de analisar o cabimento de todos os REs do Brasil e se a regra não incentivaria o ajuizamento de REs já que eles serão analisados diretamente pelo STF. (art. 1.027, parágrafo único) Em dezembro do ano passado, o Senado aprovou o Projeto de Lei da Câmara nº 168/2015, mantendo o juízo de admissibilidade de recursos tal como está previsto no Código de Processo Civil de 1973. Ordem cronológica O código ainda previa que o STF deveria obedecer a ordem cronológica de conclusão para proferir seus acórdãos. A definição de quando julgar as ADIs, ADCs, ADPFs, Reclamações, Repercussões Gerais, Recursos Ordinários, Recursos Extraordinários (não repetitivos), entre outros, deixaria de pertencer ao relator ou ao Presidente do Tribunal e passaria a ser definida pela cronologia de conclusão. Esse ponto também foi revogado para preservar a autonomia de gerência dos ministros aos processos que estão sob sua relatoria. O NCPC determina que os juízes deverão atender preferencialmente à ordem cronológica de conclusão para proferir o acórdão.

Como era: Art. 12. Os juízes e os tribunais deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Como ficou: Art. 12. Os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão.