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Rising Powers and Contested Orders in a Multipolar System Relatório Nos dias 19 e 20 de setembro, aconteceu no Salão da Pastoral da PUC-Rio o seminári...
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Rising Powers and Contested Orders in a Multipolar System Relatório Nos dias 19 e 20 de setembro, aconteceu no Salão da Pastoral da PUC-Rio o seminário “Rising Powers and contested orders in a Multipolar System”. O evento foi organizado pelo Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio em parceria com o Global Institute of Global and Area Studies (GIGA). A seguir, apresentamos um breve resumo sobre as apresentações que aconteceram durante o seminário.

Painel 1: “Ordens mundiais contestadas - Novos jogadores com novas abordagens?”, por Antônio Chagas O primeiro painel contou com a presença de Michael Zurn (Social Science Research Center Berlin) como chair e os palestrantes Richard Ned Lebow (King’s College London), Karen Smith (University of Capetown), Paulo Esteves (IRI/BRICS Policy Center), Sumit Ganguly (Indiana University) e Chales Kupchan (Geogetown University). O principal tópico abordado na apresentação de Richard Ned Lebow foi o questionamento sobre em que medida a hegemonia pode ser considerada uma ficção. Ele explicou sua ideia relacionando-a com o conceito de hegemonia e potências emergentes presentes na Teoria de Transição de Poder. Essa teoria afirma que potências emergentes lutam porque eles sentem a necessidade de guerrear para desafiar as potências dominantes, mas Lebow contesta esse argumento, afirmando que a transição de poder é uma consequência e não a causa das guerras. O autor afirmou que, enquanto estados dominantes esperam atingir a hegemonia, isso não significa que potências emergentes lutarão contra esses estados, porque elas também atacam potências menores e em declínio. Geralmente, a potência dominante está longe de ser um hegemon, o que explica o porquê de outros estados também possuírem poder de manobra. Se dissermos que a potência dominante cria sua própria ordem estaremos enganados, porque as ordens são negociadas e não simplesmente impostas por alguém. Nem sempre o Estado que é reconhecido como responsável pela manutenção da estabilidade da ordem agirá de acordo com as regras. No caso específico dos EUA, ele tem se comportado de maneira contrária à atual ordem política e econômica internacional. Portanto, a hegemonia é uma ilusão e os EUA são espertos o suficiente para perceberem isso. Vemos as mudanças do mundo com Estados poderosos agindo como free-riders e como os EUA não são uma exceção nesse aspecto. Capacidades materiais, poder e influência não deveriam ser divididos e explicados separadamente. Se analisarmos a maneira como os EUA persuadem outros é possível ver que a ideia de hegemonia desaparece. Pela definição de hegemonia dada por Kindleberger, os EUA não podem ser considerados um hegemon porque não têm o potencial de impor sua vontade sobre outros.

Karen Smith falou sobre a ansiedade africana com relação ao papel futuro dos EUA e os interesses chineses. Ela começou sua apresentação evidenciando seu background teórico para essa análise, ressaltando a utilidade da teoria de Robert Cox, uma vez que seu modelo triangular capta os aspectos necessários para compreendermos o papel da África na ordem mundial em transição. A África é um continente materialista e o resto do mundo tem explorado seus recursos naturais há um longo tempo. Tendo em mente que algumas regiões são mais vulneráveis e dependentes do que outras partes do mundo, os africanos percebem a reprodução da desigualdade no mundo através das instituições globais. Eles decidem, então, criar seu próprio framework institucional com ênfase nas instituições regionais. Com a criação de instituições como o Movimento dos Países Não-alinhados, o G77 e IBSA, eles gostariam de obter um padrão mais igualitário em instituições multilaterais. Alguns dos princípios defendidos pelos africanos a serem tomados em conta são o multilateralismo, a não intervenção e a soberania. Somando a esses princípios o fato de que o desenvolvimento é o principal conceito entre os africanos, o resultado é que a modernização é administrada por eles de forma autônoma, através de modelos alternativos e nem sempre em concordância com a inclusão de novas normas que não são tão claras como o R2P (Responsabilidade de proteger). Além das grandes expectativas sobre seu futuro, os africanos vêem novas opções que não existiam anteriormente. Eles imaginam um novo mundo no qual novas ideias possam florescer e isso significa possibilidades que não fazem parte do mundo liberal ocidental e da sua ordem. Atualmente, eles acreditam na parceria com a China por meio da coexistência, adotando uma abordagem instrumentalista. Se perguntados sobre que ordem mundial prevalecerá no futuro, eles sabem que é improvável que essa seja africana. A palestra de Paulo Esteves, por sua vez, foi principalmente sobre multilateralismo e os questionamentos colocados a esse formato institucional. Primeiramente, ele propôs duas possibilidades de entendimento da configuração do sistema internacional que levam a diferentes comportamentos. O primeiro deles é a visão de que o sistema internacional é unipolar, que suas instituições multilaterais refletem essa estrutura (hegemônica) e que todos os problemas que surgem das relações entre atores, como falhas de mercado e provisão de bens públicos, serão satisfeitos por

esse Estado líder. Nessa visão, grupos como o BRICS serão considerados irrelevantes e sua estratégia será a acomodação ou o soft-balancing. A segunda possibilidade se refere ao sistema internacional como multipolar, e na ausência de um hegemon, sempre haverá preocupações distributivas uma vez que o free-riding constituirá uma ameaça real. Diferentemente da visão anterior, nesse mundo, grupos como o BRICS têm papel central e quase sempre irão desafiar a ordem internacional. Em seguida, Esteves discutiu possíveis definições de multilateralismo, tomando como exemplos os conceitos estabelecidos por Keohane, em 1988, e Ruggie, em 1993. Esteves criticou a visão liberal sobre o multilateralismo por esta ignorar o fato de que os moldes institucionais não são dados, dificultando a sustentação do processo de criação de regras. Ele também critica o framework normativo de Ruggie por sua forma de pensar na esfera das relações sociais. O palestrante vê o multilateralismo como uma configuração social, processual e relacional. Como uma configuração social, o multilateralismo permite a emergência de conceitos específicos sobre tempo e espaço. Finalmente, Esteves apresenta a agenda transformativa dos países do BRICS. Apesar desses países estarem sujeitos a instituições previamente estabelecidas, eles buscam alterar suas estruturas para torná-las mais democráticas. O chamado “efeito BRICS” é um movimento de descentralização que estabiliza os clamores universalistas embutidos nas instituições multilaterais lideradas pelo ocidente. Esse efeito seria capaz de paralisar as instituições multilaterais porque o avanço de perspectivas neoliberais seria prejudicada por esses países. A questão é: O BRICS provê alternativas às normas neoliberais? A resposta é: não confiável. Esses países são híbridos por serem conformados por normas liberais, ao mesmo tempo em que apresentam críticas a elas. O objetivo da apresentação de Sumit Ganguly era compreender se a Índia deveria apoiar a ordem liberal. Ele responde a essa questão retomando muitos conceitos adotados e parcialmente criados pela Índia, sendo o mais importante deles a soberania. A Índia escolheu a autonomia estratégica como um novo modelo de não-alinhamento, e essa escolha traz consigo um ponto de vista extremamente crítico sobre muitas questões e sobre resoluções de problemas ditados por potências dominantes . O autor coloca alguns desses tópicos sobre os quais a Índia costuma ser crítica, como o princípio R2P, a promoção da democracia e a legitimidade da Corte Criminal Internacional. Em termos de eficiência e viés político, ou de institucionalização de

novas práticas similares ao colonialismo e imperialismo, todos esses tópicos possuem questões que precisam ser clarificados, de acordo com os políticos indianos. Além disso, é necessário lembrar que a região em torno da Índia é cheia de regimes autoritários, e que há restrições institucionais domésticas ao apoio de todos os planos da ordem liberal. A última palestra deste painel foi dada por Charles Kupchan, que fez algumas observações sobre as apresentações de seus colegas. Ele afirmou que a definição de hegemonia dada por Lebow é incompleta, deixando de lado questões de normas e práticas. Sobre a apresentação de Smith, afirmou que as normas normalmente começam de baixo, como o excepcionalismo Americano ou o ubuntu africano. Portanto, seria necessário classificar por quem e para quem essas normas são criadas. Os africanos têm mais a dizer sobre modelos de desenvolvimento alternativos, se a China é uma sucesso, eles a vêem como um modelo atrativo? Kupchan fez ainda uma advertência a Ganguly, afirmando que os indianos devem ter em mente os aspectos históricos, já que normas tendem a passar de geração em geração. Com relação a Esteves, ele afirmou que instituições multilaterais são vistas de formas diferentes pelos países dependendo de suas posições. Como normas não são vistas da mesma forma por todos, é função do BRICS criar uma agenda mais ativa do que reativa às questões globais. Kupchan afirmou que a discussão sobre potências emergentes normalmente são teóricas, porém fracas em seus registros empíricos, mas os papers apresentados no seminário são de grande valor, uma vez que colocam em questão algumas atividades realizadas pelos países.

Painel 2: “As regras contestadas do jogo - Governando através de hierarquias e redes”, por Marcelle Trote Martins O segundo painel foi denominado de “As regras contestadas do jogo Governando através de hierarquias e redes”. Os convidados discutiram sobre novas formas de governança criadas em uma ordem mundial contestada. Essa ordem é caracterizada pela emergência de novas formas de instituições, organizações e a criação de novas estratégias de os Estados buscarem sua política externa e a reforma de estruturas estabelecidas. Em resumo, o painel discutiu estratégias dos poderes estabelecidos em lidarem com novos contornos de heterogeneidade institucional. O painel foi composto por Amitav Acharya (American University), Miles Kahler (UC San Diego), Michael Zurn (Social Science Research Center Berlin), João Pontes Nogueira (IRI/BRICS Police Center) e Daniel Flames (German Institute of Global and Area Studies- GIGA). O primeiro palestrante, Amitav Acharya, discutiu sobre o fim da hegemonia americana. O autor argumentou que a Ordem Mundial Americana que dominou o século XX e o início do século XXI está se aproximando do seu fim, independente se os próprios EUA se encontram em declínio ou não. Acharya utiliza os termos “Ordem Mundial americana” e “ordem liberal hegemônica” indistintamente. Para ele, o declínio da Ordem Mundial Americana e o declínio dos EUA são assuntos diferentes, apesar de serem tratados como indistintos no debates públicos. Por “fim da hegemonia”, o autor compreende dois elementos: primeiramente, ele se refere à única ordem hegemônica existente atualmente, a hegemonia americana; segundo, Acharya se refere ao mundo do futuro como um concerto global do século XXI que inclui antigas e novas potências. Acharya sugere que o que aparecerá será uma Ordem Mundial Múltipla (Multiplex), formatada pela associação entre velhas e novas potências e uma arquitetura descentralizada de administração da ordem com a grande importância dada à liderança regional. O autor faz uma comparação entre um complexo de cinema e o que ele chama de “mundo Multiplex”. O mundo Multiplex é definido pelo autor como “um complexo que engloba vários cinemas”, o que significa que, nesse complexo, vários filmes estão sendo exibidos em diferentes cinemas. No mundo Muntiplex haveria diversos

produtores e atores encenando seus shows simultaneamente. A audiência poderia, portanto, escolher entre assistir aos diferentes tipos de filmes, o que faria com que nenhum produtor ou ator conseguisse monopolizar a audiência. No mundo politico, os diferentes Estados poderiam exibir seus “filmes” e a audiência poderia assistir a uma variedade deles e escolher o que mais lhes agrada. O autor sugere que, durante um determinado período, o filme americano pode ter tido a maior audiência, mas essa audiência logo perderia o interesse devido à grande variedade de opções. Acharya argumenta que esses filmes seriam exibidos em 4D. As três dimensões (comprimento, altura e profundidade) seriam equivalentes a poder (altura, que significa a distribuição clássica de hard Power), escopo geográfico (comprimento, que equivale ao escopo da ordem, sua extensão geográfica e dispersão) e liderança (profundidade, ou seja, as condições que possibilitam a ordem como instituições, normas, soft Power e liderança baseada em ideias). A essas dimensões seria acrescentada uma quarta, a qual o autor considera essencial para o entendimento do mundo, a “dimensão temporal” (atraindo atenção para os pontos de origem e fim de uma ordem). Mile Kahler introduziu seu artigo “Potências emergentes e modelos alternativos de Governança Global” (Rising Powers and alternative modes of global governance no original). O autor surgere que os esforços para expandir a influência na Governança Global vinda de economias emergentes como Brasil, India e China (BIC) tem sido focada em instituições formais chave como o FMI e a OMC. Kahler argumenta que menos atenção tem sido dada ao rápido crescimento dos modelos alternativos de Governança Global que desviam do modelo tradicional de Organizações InterGovernamentais (OIGs). A participação do BIC na ordem global influencia a criação de quatro modelos alternativos: grupos informais de governos que produzem soft Law; estruturas de governança informais dentro de OIGs existentes; governança em rede na forma de redes transgovernamentais; e alternativas híbridas que incluem atores nãoestatais, principalmente Organizações Não-Governamentais (ONGs). A participação do BIC nessas formas alternativas de instituições produz três conclusões possíveis: a produção de soft law dentro de um grupo ad hoc informal coincide com as preferências das potências emergentes; o BIC descobriu que poderes incumbentes são frequentemente impregnados com alternativas de OIGs entrenched to accept alternatives of intergovernmental organizations as they are to accept the IGOs alternatives.”; e a habilidade das potências emergentes de influenciarem os novos fóruns irá ser acelerada

ou desacelerado de acordo com as fontes políticas e econômicas domésticas bancadas por eles. Michael Zurn apresentou seu artigo intitulado “Ordens Mundiais Contestadas: Potências Emergentes, Atores Não-Estatais e a Política de Autoridade Além do EstadoNação” (originalmente “Contested World Orders: Rising Powers, Non-State actors, and the politics of authority beyond the Nation-State.”), feito em parceria com Mathew Stevens. De acordo com o autor, potências emergentes e atores não-estatais contestam as instituições internacionais existentes. Esse fato pode ser encontrado na discussão em torno das demandas das potências emergentes pela ênfase na soberania e nas demandas das ONGs por transparência e participação social. Com isso em mente, o autor busca estudar e desenvolver um modelo conceitual das interações entre as ordens mundiais contestadas. Zurn argumenta que a emergência de uma sociedade civil transnacional questiona a exclusividade dos atores estatais no âmbito internacional. A sociedade civil transnacional e o setor privado vêm tomando o papel de prover novos mecanismos de governança. Os resultados desses desafios para a autoridade institucional internacional é a redistribuição de poder, que vem causando uma mudança exógena na base de poder das instituições existentes; e por outro lado, as instituições vêm gerando uma maior conscientização pública de mobilização no sentido de criar um público transnacional ativo. João Pontes Nogueira, do BRICS Policy Center, questionou a capacidade de ação política conjunta dos países emergentes. Os BRICS estão contestando uma ordem na qual eles não podem participar em igualdade de termos com as antigas potências. No entanto, esses países são potências em transição que funcionam melhor em cooperação intra-BRICS, contribuindo para uma ordem mundial plural. Nogueira enfatizou que as teorias de Globalização não são capazes de lidar com mudanças. Portanto, quando se trata dos BRICS , não é possível utilizar teorias que não expliquem a transição na ordem mundial que pode ser causada pelos BRICS. Daniel Flemes expôs sobre como os Estados podem limitar o impacto de recursos materiais na Ordem Global Multipolar. O autor argumentou que redes de política externa são efetivas fábricas de legitimidade e poder de barganha que permite a realização dos objetivos da política externa alemã que têm sido prejudicados pela sua deficiência em poder militar desde o final da Segunda Guerra Mundial.

A mudança na política externa alemã pode ser analisada em quadro dimensões antitéticas:

consideração

institucionalizadas

versus

europeia redes

versus

interesse

intergovernamentais;

nacional;

organizações

antimilitarismo

versus

responsabilidade de proteger; e aliança transatlântica versus diversificação de parcerias. O autor concluiu que mudanças profundas nessas dimensões produzem uma política externa alemã mais autônoma uma vez que o país obtém mais recursos militares e econômicos. Por outro lado, Flemes considera que a busca alemã por maior responsabilidade na constituição da ordem mundial também demandará maiores custos políticos e econômicos.

Painel 3: “Multilateralismo Contestado - Perspectivas Críticas”, por Maiara Folly O último painel do primeiro dia foi intitulado “Contested Multilateralism – A Critical Perspective” e contou com a presença dos palestrantes: Nicholas Onuf (IRI/Florida InternationalUniversity), SiddaharthMallavarapu (South AsianUniversity), SibaGrovogui (Johns Hopkins University), Andrea Ribeiro Hoffman (Freie-Universitat) e Andrew Cooper (Universityof Waterloo). O debate foi mediado por Adriana Erthal Abdenur (IRI/BRICS Policy Center). A mesa tinha como objetivo propor um panorama do papel dos países BRICS na governança global e apontar a forma na qual tais países se inserem e atuam dentro desta. Também objetivava-se esclarecer questionamentos comumente auferidos ao tratar-se do agrupamento. Seriam os BRICS atores em conformidade com as normas do Sistema Internacional? Ou tais países estariam buscando redesenhar as Instituições Multilaterais existentes? Diante desse tipo de questões, teve início o debate. O palestrante inicial Nicholas Onuf criticou a visão de que está ocorrendo uma mudança normativa no Sistema Internacional protagonizada pelos BRICS. Para ele, esse processo não vem acontecendo e os BRICS não estariam buscando contestar a política mundial. Sendo assim, no seu ponto de vista, não faria sentido falar em adaptação das potências já estabelecidas. Isso porque, para as potencias tradicionais, a realidade mundial continua sendo a mesma, guiada pelas mesmas regras e normas. Onuf reconheceu que existem algumas mudanças, como por exemplo a proliferação de plataformas informais de governança. Contudo, não haveria evidências que apontariam para uma transformação ou tentativa de reforma da ordem mundial. Sendo assim, os BRICS estariam atuando em conformidade com o sistema, buscando se inserir no jogo do status quo. O palestrante seguinte adotou um ponto de vista distinto de Onuf. O indiano Siddaharth Mallavarapu não vê como inimaginável que estejam ocorrendo contestações da ordem internacional. Mallavarapu apontou convergências e divergências na literatura das Relações Internacionais que trata das potências emergentes, buscando apontar as semelhanças da Índia com trais potências, sobretudo em termos de contestação de elementos presentes na ordem internacional pós Segunda Guerra Mundial. O professor buscou apontar as semelhanças da Índia com tais potências, com enfoque no esforço do país em se consolidar enquanto um ator regional influente. Para ele é possível que uma

potência regional emergente busque transpor sua influência política para além de sua região. Sendo assim, tais atores poderiam ser responsáveis por uma transformação, ainda que lenta, do sistema internacional. Mallavarapu destacou que para haver uma redistribuição de poder na esfera global que pudesse acarretar em mudanças, seria necessário que as instituições internacionais existentes fossem mais inclusivas. Frente a isso, os países do “Sul” global desenvolvem uma série de estratégias em resposta à atual ordem internacional. Com base em sua argumentação, ficou claro que, para ele, mudanças envolvem elementos ideacionais, bem como a criação de novos conceitos e reformulação de antigos. O terceiro a falar foi Siba Grovogui, que também apresentou uma posição divergente da adotada pelo primeiro palestrante. Grovogui enfatizou diversas vezes a existência de uma contestação da ordem internacional. Para ele existem muitos países insatisfeitos com a lógica liberal de conduzir a política mundial, sobretudo os países do “Sul” global. Em sua visão, há uma evidente divergência entre os países desenvolvidos do “Norte”

e os países em desenvolvimento, do “Sul”. Este posicionamento se

evidencia e se clarifica, a seu ver, no que diz respeito à regras, normas e princípios morais e legais presentes no internacional. Grande parte dessa insatisfação deu-se em face da maneira impositiva pela qual os países ocidentais costumam disseminar seus valores. Para garantir sua posição hegemônica, o ocidente estaria agindo de forma a manter os demais países e nações em uma condição de subordinação. Essa tentativa de dominação estaria acentuando o sentimento de insatisfação e impulsionando medidas reacionárias a respeito de conceitos, normas e valores. A próxima a externar seus argumentos foi Andrea Ribeiro Hoffman. A professora da Freie-Universitat também acredita que existem movimentos de contestações, que se expressam não apenas no âmbito internacional, como também nas ruas, sendo as manifestações brasileiras um exemplo claro disto. O foco de sua análise foi o agrupamento do BRICS. Hoffman expôs a evolução do agrupamento, que passou de um mero acrônimo utilizado pela primeira vez em 2001, para um mecanismo cooperativo com cúpulas anuais no nível de Chefes de Estado desde 2009. Em meio a esses argumentos, o aumento do nível de interação entre Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul teria criado um modelo multilateral específico e a relevância dos mesmos, nao se restringe puramente ao ramo econômico. Os países estariam ganhando força na

criação de conceitos de desenvolvimento e até mesmo em termos de normas. Sendo assim, os BRICS não só almejariam mudar, como já estariam promovendo mudanças. O último a palestrar foi Andrew Cooper, que manteve o enfoque da sua apresentação no G20 (reunião de cúpula onde se encontram os chefes de Estado das 20 maiores economias mundiais). Cooper enxerga como insuficiente a ideia que se costuma passar do G20 enquanto um agrupamento que foi capaz de incluir países em ascensão, tomando o lugar do até então G7/8. O professor forneceu então, uma visão alternativa, ressaltando a contestação que o G20 vem sofrendo sob uma série de aspectos. Isso porque, ainda que tenha expandido a gama de países membros, muitos são os que ficaram sem qualquer tipo de representatividade, fazendo com que a pressão por inclusão se tornasse crescente. Com relação à possibilidade de mudança, Cooper não minimiza a relevância do G20 em termos de fornecimento de novas perspectivas em um contexto de crescente contestação e reordenamento da ordem mundial. Contudo, haveria um processo de descentralização do G20. Para ele, os países não limitariam suas reivindicações ao espaço de tal fórum, a luta por maior igualdade aconteceria também em outras instituições e a partir disso poderia ocorrer algum tipo de mudança no plano internacional. Com base no debate exposto, a mediadora da mesa Adriana Erthal Abdenur encerrou o painel. No que diz respeito ao questionamento sobre a ocorrência de transformações no cenário internacional contemporâneo, Abdenur defendeu a posição de que há a possibilidade de que sejam inseridas novas normas no plano internacional. Em termos de BRICS, a institucionalização do Banco de Desenvolvimento anunciado pelos países membros do agrupamento poderia, por exemplo, representar a promoção de novos modelos de desenvolvimento. Pode-se afirmar que a mesa cumpriu com a sua proposta inicial de problematizar a questão da contestação da governança global e de avaliar o papel do BRICS nesse processo. A partir das apresentações, percebeu-se que ainda que ainda que as opiniões não tenham sido totalmente uniformes, em geral, os palestrantes reconheceram a existência de indícios de insatisfação dos atores no plano global. Além disso, prevaleceu a possibilidade de ocorrência de mudanças na ordem internacional, ainda que o meio para isso não esteja claro.

Painel 4: “Assimetria e Legitimidade - O caso da América do Sul”, por Pedro Maia (ORIGINAL) No segundo dia do seminário, teve lugar o painel sobre o papel da América do Sul na ordem internacional. Fomos brindados com a presença de Steven Lobell, Federico Merke, Andrew Hurrel, Sean Burges, Mônica Herz e Daniel Flemes como chair do painel. O painel visava entender as questões relacionadas aos países emergentes na região, o papel da legitimidade para esses atores, as consequências das assimetrias – regionais e globais- e as estratégias cunhadas pelos mesmos para lidar com esses novos desafios, pontos esses levantados pelo professor Daniel Flemes. O professor da Universidade de Utah, Steven Lobell, acredita que a adoção do ponto de vista do neo-realismo traria grande benefício para o debate. Afirmou que, no aspecto teórico, faz-se necessário um distanciamento do âmbito do poder bruto, para uma forma de analise onde os elementos de poder venham a ocupar um lugar central. Dessa forma, argumenta que devemos atentar para esses elementos de poder dos países emergentes e também no BRICS e tentar entender se esses elementos podem ser considerados ameaçadores ou não. Mas, além disso, devemos entender que em um nível sistêmico ou até mesmo subsistêmico, uma alteração no poder bruto de certo país não vai necessariamente afetar a balança de poder regional, dado que cada balança possui suas próprias dinâmicas. Contudo, ainda não é claro quais elementos de poder serão vistos como ameaçadores. Assim sendo, notamos que a partir desse ponto de vista, algumas perguntas veem à tona. O que o crescimento do Brasil significa para a Argentina e como isso pode afetar o MERCOSUL? Estariam o BRICS propondo uma agenda nova e alternativa à já proposta pelos EUA e, além disso, seria tal atitude vista como ameaçadora pela OTAN? O professor Federico Merke da Universidade de San Andreas na Argentina apresentou um ponto de vista alternativo ao proposto por Steven Lobell. O ponto de partida teórico do professor é fortemente influenciado pela Escola Inglesa e o mesmo afirma que tanto as teorias realistas quanto as liberais acabam por fornecer uma análise da região incompleta, dado que o poder na região atua em uma escala muito maior e mais complexa.

Para entendermos como atua o poder brasileiro na região e também a balança de poder, devemos aceitar a capacidade de influência de certas instituições, como o poder coletivo, a diplomacia e o direito internacional. Dessa forma podemos entender como se dá a relação entre Brasil e América do Sul, como o Estado brasileiro se posiciona em relação a ela e como a região lida com esse caráter de emergência global e regional do Brasil. Essa abordagem - como dita por Federico – mais complexa, permite com que seja possível perceber algumas normas, valores e instituições partilhadas entre os países do entorno regional que acabam por criar os fundamentos de uma sociedade internacional distinta na região. Para Sean Burges, a questão possui aspectos um pouco diferentes. Para o professor da Universidade Nacional Australiana, ocorreram algumas mudanças na chamada hegemonia consensual estabelecida pelo Brasil. Ele afirma que apesar do Brasil ter conseguido estabelecer uma série de ideias – entendidas como normas e princípios - na região, como o respeito pela lei internacional, o Brasil precisa tomar uma postura de real liderança no entorno geográfico para conseguir manter sua posição de destaque. Para tal, o Brasil precisa intensificar uma prática já utilizada com uma certa frequência: a intervenção. O professor afirma que o Brasil possui uma clara postura intervencionista, contudo, tal intervenção se dá por meios muito sutis e de maneira indireta, como por exemplo através de instituições internacionais. Todavia, a política externa brasileira se encontra atualmente congelada e que para sair de tal situação deve-se repensar o próprio papel do Itamaraty e adotar uma postura mais intervencionista como uma maneira de assegurar sua liderança regional. Um das formas possíveis é se aproximando da Aliança Pacífica. Outro ponto que se mostra importante, foi a mudança da característica da hegemonia brasileira, que passa de um simples aspecto consensual, para uma hegemonia cooperativa, onde o mesmo cria formas de cooperação que o auxiliam a manter seu lugar de destaque na região. A professora Monica Herz da PUC-Rio, por sua vez, tratou do aspecto da governança global e da governança regional e como existem relações de poder comuns a essas duas arenas. A professora focou em como que as organizações, no caso citado por ela a OEA, são capazes de construírem ameaças como o terrorismo e a não-

proliferação como temas que justificam a imposição de certo controle na população alterando até mesmo as formas de se exercer tal controle. Além disso, salta aos olhos como que a agenda anti-terrorismo da OEA foi capaz de influenciar outras instituições regionais, como próprio MERCOSUL no estabelecimento do anti-terrorismo como um tópico a ser debatido. Outra instituição que aderiu à agenda de não-proliferação foi a UNASUL. Assim sendo, notamos como que as agendas das instituições regionais auxiliam na construção de uma ameaça comum à região, mas não só isso, como que elas acabam por se relacionar com a governança global justamente ao aderirem temáticas que estão presentes em diversos outros foros de discussão como a própria ONU. Andrew Hurrel, professor da Universidade de Oxford, questionou um ponto central no debate apresentado: a hegemonia brasileira. E nesse ponto em questão foi claro ao afirmar que, na sua opinião, não existe tal coisa, uma vez que o Brasil não se vê como possuidor de tal função. Um dos motivos seria o fato dos atores regionais terem mudado ao mesmo tempo que os processos de regionalização se intensificaram, fazendo com que alterassem a referência de líder na região. Dessa forma, notamos como que a região da América do Sul atualmente está envolvida em uma série de dinâmicas se relacionam diretamente com fluxos que se encontram em uma espaço que extrapola o regional e alcança o internacional. Além disso, fica claro como que os atores de possíveis mudanças no cenário internacional podem estar presentes na América Latina.

Painel 5: “Ordens regionais contestadas - O caso da Ásia”, por Antônio Chagas O 5º painel do seminário contou com a presença de Sumit Ganguly (Indiana University) como chair, Kai He (University of Utah), Chris Hughes (University of Warwick), Cheng-Chwee Kuik (National University of Malaysia), Adriana Erthal Abdenur (IRI/BRICS Policy Center) e Hannes Ebert (GIGA). Kai He apresentou sobre balancing institucional na região da Ásia Pacífico. Para o autor existem dois principais argumentos que explicam o comportamento de diferentes atores na região: primeiramente, conflitos armados não são inevitáveis já que a ordem contestada pode coexistir ali; segundo, o aprofundamento da interdependência econômica resulta no encorajamento de Estados em confiar em diferentes estratégias de balancing institucional. Ele demonstrou que existem diferentes modos de entender as ordens regionais e internacionais que dependem, por sua vez, das lentes escolhidas para realizar a análise, mas todas elas têm a mesma visão singular e estática dessas ordens. As principais teorias escolhidas por analistas - Realismo, Liberalismo e Construtivismo - enfatizam excessivamente

as

limitações

estruturais

do

sistema

internacional

sobre

o

comportamento dos Estados. Eles deixam de abordar algumas evoluções e, que serão, dessa forma, propostas pelo palestrante. Para He, agentes também podem influenciar a estrutura. Um tipo de diplomacia habilidosa como a de Bismarck pode levar à ascensão bem sucedida de um país sem trazer grandes conflitos com seus vizinhos, e uma interdependência econômica profunda que cria as condições para os Estados buscarem segurança por meios não-militares. Todos esses pontos levam ao argumento de que uma teoria da transição que seja meramente estrutural não é condição suficiente, e nem mesmo necessária para prever um conflito de guerra inevitável na região, uma vez que o aprofundamento da interdependência econômica alterou a forma pela qual os Estados competem sob a anarquia. Chris Highes abordou a perspectiva japonesa sobre a ascensão da China. Seu objetivo era responder se o Japão desafia o status quo. A mudança estratégica do Japão vis-à-vis a China é óbvia, mas não há consenso entre políticos e acadêmicos sobre a

posição do Japão no sistema internacional. Talvez seria possível conceber uma análise alternativa sobre a resposta japonesa em relação à China. Cada vez mais evidências empíricas demonstram que o Japão está se remilitarizando doméstica e internacionalmente. Esse fato poderia comprovar as teorias que indicam que a mudança de hedging para balancing, no caso do Japão active balancing ou hard balancing como normalmente é chamado. A crença japonesa no hedging vem se deteriorando desde o início dos anos 2000, com a mudança de regime e sua postura revisionista, o país poderia ser levado a um novo realismo, distante da tradicional Doutrina Yoshida, cuja grande estratégia prescreve um caráter mais defensivo. A ansiedade sobre a China e também sobre o abandono dos EUA pressionam o Japão para manifestações de independent balancing, conflitos por autonomia e revisionismo doméstico. Todos esses aspectos convidam os analistas a repensarem na maneira como olham para a região e Hughes deixa essa questão em aberto. O assunto da palestra de Cheng-Chwee Kuik foi quando e por que Estados mais fracos realizam hedging, apresentando a resposta dos Estados do Sudeste Asiático para o crescimento da China como exemplo. Nós normalmente percebemos apenas duas possibilidades das potências menores lidarem com potências maiores: balancing e bandwagoning. Na primeira, os Estados fracos contrabalanceiam o forte através de alianças e armamento, enquanto na segunda, eles aceitam um papel de subordinação por receberem recompensas econômicas, políticas e militares para tal. Na visão de Kuik, o balacing puro é estrategicamente desnecessário, politicamente provocativo e contra produtivo e economicamente imprudente. Similarmente, puro bandwagoning é economicamente atrativo, porém politicamente indesejável e estrategicamente arriscado. A opção abordada pelo autor é, portanto, hedging, pois ela engloba um comportamento no qual Estados busquem múltiplas opções políticas que visam produzir efeitos que se neutralizam mutuamente. Quando essa opção é útil? Quando as apostas e a incerteza são altas. E por que ele deveria ser usado? Kuik apresenta três razões: evitar tomar lados, adotar medidas ambíguas e que se neutralizem mutualmente (com elementos de defesa e provocação) e manter uma posição de ressalva.

A apresentação de Adriana Abdenur deu espaço a várias discussões nesse painel, já que sua palestra foi direcionada para a descrição da contestação da Índia sobre a China no Oceano Índico. Sua proposição de que a Índia estaria se movendo para redefinir a região instigou a observação por parte da mesa. Ela utilizou um background teórico da Geografia Crítica para realizar a análise, e foi capaz de comprovar que através das instituições como a IOR-ARC (Indian Ocean Rim Association for Regional Cooperation), a Índia criou um modelo centrífugo que possui a China como alvo a ser excluído. A expansão das missões do PLA (People's Liberation Army) e o discurso de Xi Jinping (primeiro ministro chinês) sobre os direitos marítimos chineses que levaram à Índia a uma posição mais cautelosa em relação à sua vizinha. Abdenur considera as estratégias indianas bem sucedidas, e apesar da influência de mudanças sistêmicas na região, as parceiras que a Índia possui são uma boa garantia contra possíveis ameaçar vindas da China. A última apresentação do painel, feita por Hannes Ebert, é o resultado de uma ampla revisão teórica sobre contestação política na Ásia. O palestrante demonstrou todas as possíveis respostas estratégicas de um país para uma potência emergente percebida como uma ameaça, através dos conceitos dados pelas teorias de Relações Internacionais. Tendo em mente que as agendas amplas têm respostas conflitivas, competitivas e cooperativas, ele construiu uma tabela onde os objetivos estratégicos se relacionavam com o grau de confrontação, tendo como resultado quatro possibilidades de ação: balacing, reformismo, soft balancing e resignação. Ebert enxerga dois motores para a contestação: amplas assimetrias e legados históricos. Finalmente, ele apresenta os casos das relações entre Paquistão-Índia e Japão-China. Enquanto o primeiro apresenta todas as quatro distinções feitas acima, o último apresenta apenas o comportamento revisionista. ______________________________________________________________________

Painel 6: “Limitando escolhas estratégicas – O caso da África Sub-sahariana”, por Deborah Lipka

Timothy Shaw, da University of Massachusetts, apresentou o artigo “Potências Médias Emergentes na África pós-2015: da dependência para a agência? De Estados frágeis para em desenvolvimento?”, no qual problematiza a chamada dependência dos Estados africanos em relação aos países mais desenvolvidos. Ele ressalta que tal dependência, que tem sido observada até o momento, está começando a mudar, especialmente na segunda metade do século XXI. Com a impactante crise econômica do Norte, o enorme crescimento do Sul pôde ser notado, o que inclui a África, juntamente com a América Latina e a Ásia. Por conta disso, países que sempre contraíram empréstimos agora terão a possibilidade de não apenas parar de contrair de instituições internacionais e de outros países bilateralmente como também serão capazes de servir como credores. As taxas divulgadas por importantes revistas econômicas, como a The Economist, demonstram essa mudança no panorama global. O autor ressalta que esses países não necessitam ser parte de algo como os BRICS para ter uma crescente influência. Mesmo países como o Catar ou a Cingapura podem exercer “soft power’. O artigo conclui, assim, que a nova realidade dos países da África em um futuro próximo é definitivamente positiva, e não negativa como muitos afirmam sobre o continente. O segundo palestrante, Adam Habib, da University of Witwatersrand, discutiu o artigo “A África do Sul no mundo: Grandes Potências Contestadoras na confecção de uma nova Ordem Mundial”. O estudioso pretendeu analisar a política externa da África do Sul, que inclui um engajamento mais efetivo no sistema internacional, principalmente por meio da participação em instituições internacionais – como a ONU, o Banco Mundial e o FMI. No entanto, Habib mostra que a política externa da África do Sul na era pós-apartheid é conflitante com a comunidade de Direitos Humanos mundo afora. O autor enxerga que a elite sul-africana está tentando mudar essa realidade, mas assume sua falência, ou no mínimo falta de capacidade, em fazê-lo.

Tendo isso em vista, a estratégia tem sido a de estabelecer alianças com outros países em desenvolvimento e defender, junto a eles, a reforma de muitas instituições internacionais e seus valores. Para concretizá-lo, a África do Sul teve de estabilizar sua economia e política. Tudo isso é feito para que a elite que comanda o país não tenha que de fato resolver o problema, promovendo mudanças estruturais na sua própria sociedade e extinguindo o racismo e outras formas de desrespeito aos Direitos Humanos. Habib utiliza a administração de Zuma como um marco para apresentar a primeira real tentativa do governo de reverter essa realidade tão criticada, tanto doméstica como internacionalmente. O apoio dado à Resolução de 1973, em que se garantia a proteção dos civis na Líbia, infelizmente não foi efetivo, e as críticas em relação à política externa da África do Sul permaneceram vigentes. A conclusão propõe que ambas as coisas podem se unir: a mudança interna, histórica, da sociedade sul-africana e o respeito aos Direitos Humanos. Fazendo isso, o país se tornará definitivamente mais integrado no sistema internacional dos dias de hoje. Chris Alden, da London School of Economics, apresentou o seu artigo “A Economia Política da Contestação: Hegemonia da África do Sul e seus Descontentes”. Seu objetivo foi expor a atmosfera conflituosa dentro do continente africano em relação à tentativa sul-africana de se tornar uma hegemonia regional, ou o que parece sê-lo. Para alcançar isso, ele discute a continuidade da agenda de política externa do aspirante a hegemon, que inclui a participação em diversas organizações e fóruns internacionais. Constituindo o único país africano membro de alguns importantes grupos como o G-20 e os BRICS, a África do Sul afirma a sua posição, sendo considerada a voz do continente. A questão é até que ponto tal posição é realmente legítima, considerando as opiniões dos seus vizinhos africanos. O artigo mostra sucintamente que não há concordância entre os países africanos em geral de que a África do Sul deve ser a “líder” do continente, o país mais poderoso a buscar os interesses do continente. Para a maioria deles, isso é claramente uma tentativa hegemônica. Por conta disso, o governo sul-africano tomou determinados esforços para mudar essa visão, tentando promover uma agenda continental, mas esses foram frustrados pelas acusações dos demais. Nesse sentido, Alden escreve sobre as ambições,

assim como as limitações e constrangimentos da África do Sul em seu objetivo, real ou não, de se consolidar como uma hegemonia regional. Daniel Bach, da Science Po Bordeaux, apresentou o artigo “Construção regional e integração global: em direção a uma mudança paradigmática na África Subsahariana”, no qual explora a veracidade da suposição geral dos dias de hoje de que a África está evoluindo para um bloco único. O autor explica que isso ocorre devido à adoção por parte dos países africanos da mesma estratégia dos países europeus, ao criarem organizações regionais – mais tarde inseridas na UE – para permitir a integração do continente. Entretanto, o que o autor expõe é uma perspectiva diferenciada. Apesar de existir de fato algumas organizações regionais, econômicas e políticas, como a ECOWAS, a AU, entre outras, as disparidades nos níveis de desenvolvimento e nas visões políticas ainda são muito notáveis. Ainda, a burocracia envolvida nessas instituições serve como obstáculo à integração. O ponto mais importante, no entanto, é que as diferenças que podem ser vistas nos investimentos nesses países e nas estratégias de acumulação de capital criam novos meios de integração, que às vezes escapam do controle do Estado. Nesse sentido, aqueles Estados tentam se unir para reforçar seu poder e controle sobre os seus próprios territórios, recompondo, assim, a interação entre si. Além disso, a criminalização da política e a violência massiva, mencionadas pelo autor, produzem o mesmo efeito. Esse quadro permite Daniel Bach explorar a “construção regional” do continente, mostrando que, apesar de ser muito mais integrado do que era e um passado não tão distante, essa não é tão simples quanto se é dito. O projeto de regionalismo e o processo de regionalização, a seu ver, são coisas diferentes. Adekaye Adebajo, do Center of Conflict Resolution (CCR) da University of Cape Town, discutiu o seu artigo “Um conto de Hegemons: Pax Nigeriana, Pax Sulafricana, Pax Gallica”. Seu objetivo foi mostrar a influência e o poder de ambas África do Sul e Nigéria no continente africano, e sua ambição de se tornarem hegemonias regionais, assim como a competição contra a antiga e bem consolidada influência francesa na região para alcançarem seus interesses. Ao mesmo tempo, o estudiosos

caracteriza as relações de ambos os hegemons regionais e a França, que podem ser vistas como conflituosas em determinados aspectos e benéficas em outros. Apesar da existência de outros atores chave na região, o palestrante enfatiza esses três países devido aos seus importantes papéis políticos, militares e econômicos na área, que excedem o desses outros atores. A Nigéria e a África do Sul, como países africanos, são mais propensos a representar aspirantes de poder em seu próprio continente, ao passo que a França tenta perpetuar sua influência na região para manter um papel global, que, atualmente, é passível de atuação apenas na África. Para mostrar como funciona a lógica da disputa de poder na África, Adebajo apresentou um panorama, que pode ser entendido por meio de uma comparação que estabelece entre Nigéria e África do Sul, na África, e França e Alemanha, na Europa para sobrelevar as semelhanças e as diferenças da distribuição de poder. Para alcançar isso, Adebajo leva em conta o aproveitamento de instituições regionais – africanas e europeias, respectivamente – por Nigéria, África do Sul e França. O que pode ser notado a partir dessa consideração é que a influência francesa apenas persiste por conta do seu melhor aproveitamento das importantes instituições multilaterais às quais faz parte, como a ONU e a UE. Estas ainda são mais benéficas para a França do que as africanas o são para a África do Sul e a Nigéria. A diferença, no entanto, é que aquela é parte dos BRICS e do G-20, o que dá a ela mais legitimidade ao exercício de algum tipo de papel de controle sobre o continente. O palestrante ilustra, individualmente, as ambições da Nigéria, da África do Sul e da França na África, descrevendo a Pax Nigeriana, a Pax Gallica e a Pax South Africana, respectivamente. A Pax Nigeriana, historicamente, é constituída por inúmeras tentativas por parte da Nigéria de consolidar o seu poder na região. Essas podem ser vistas na sua luta por se tornar a liderança africana na ONU e nas instituições africanas, como a ECOWAS economicamente, o Movimento dos Não-Alinhados (MNA) politicamente e a Organização da Unidade Africana (OUA) e a União Africana (UA). Militarmente, a Nigéria comandou muitas operações de peacekeeping em países vizinhos, agindo como o Estado comandante dessas missões junto às tropas da ONU por aproximadamente cinco décadas, até o seu último líder deixar de investir tanto na promoção de segurança e a própria Nigéria sofrer ataques de grupos terroristas.

Exercendo uma enorme influência na área por mais de cem anos de colonização, a Pax Gallica consiste na presença francesa na África, que continua mesmo após a independência dos países francófonos, considerando-se que a França insiste em subsidiar os seus interesses paroquiais. Uma herança política-cultural sempre permanece após longos períodos de colonização, e as colônias francesas não fugiram a isso. Entretanto, mais do que qualquer outro aspecto, é militarmente que a influência francesa deve ser levada em conta, considerando-se que é responsável por inúmeras operações de peacekeeping na região ao logo de todo esse período posterior às independências (por cerca de cinqüenta anos). Neste ano de 2013, a França ainda apresenta algo em torno de 7.000 tropas na área. Economicamente, no entanto, a crise europeia obrigou o país a recuar. Ela não desistiu de financiar intervenções. Em vez disso, a estratégia francesa passou a ser a de “europeizar” o orçamento, dividindo os custos das intervenções com seus vizinhos continentais. A Pax Sul-Africana, assim como a Nigeriana, sempre constituiu uma tentativa de representar a maior potência do continente, um Estado hegemônico. Para alcançar isso, a África do Sul se aliou à Líbia, o que serviu para endurecer a sua rivalidade com a Nigéria, uma vez que esta possui relações conflituosas com a Líbia por conta de provocações de Muammar Qaddafi. Como já foi dito, a participação da África do Sul em importantes grupos multilaterais como os BRICS e o G-20, ainda, auxilia em muito o país em sua estratégia hegemônica. Após descrever cada Pax, o palestrante as relaciona a contextos específicos em que elas influenciaram e desafiaram umas às outras – mais especificamente na Costa do Marfim e na Líbia, no Mali e na República Democrática do Congo. Adebajo conclui levando em consideração a crescente colaboração entre a Nigéria e a África do Sul e a necessidade de se manter essa relação, assim como com outros atores chave na região, que têm de legitimar suas lideranças em nome do continente. Também foi ressaltada a importância de se utilizar as instituições regionais, que ainda são subutilizadas pelos seus membros e aspirantes a hegemons. Apenas o fazendo, Nigéria e África do Sul podem repelir a França da região – ou ao menos reduzir sua influência –, podendo alcançar seu objetivo.