secretariado nacional da pastoral da cultura
Observatório da cultura Nº. 16 www.snpcultura.org
novembro 2011
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O que é mais importante (criar, manter, repensar) na relação da Igreja com a cultura? Alice Vieira Escritora André Dourado Programador cultural Ângela Xavier Historiadora Duarte Brito de Goes Grupo Política e Sociedade/Pastoral da Cultura P. Duarte Melo Diretor do Museu Carlos Machado, Açores Filipa Oliveira Curadora de Artes Visuais Guilherme d’Oliveira Martins Presidente do Centro Nacional de Cultura Inês Gil Grupo de Cinema/Pastoral da Cultura P. Jardim Gonçalves Diretor do Gabinete do Cardeal-Patriarca João Bigotte Chorão Escritor João Duque Presidente do Centro Regional de Braga da UCP João Madureira Compositor João Wengorovius Meneses Diretor de Ação Social da Câmara de Lisboa
Joaquim Azevedo Diretor da Pastoral da Cultura /Diocese do Porto Jorge Reis-Sá Editora Babel Jorge Wemans Diretor da RTP-2 José Carlos Seabra Pereira Universidade de Coimbra José Leitão Centro de Reflexão Cristã José Pedro Serra Universidade de Lisboa Leonor Xavier Escritora Lídia Jorge Escritora Manuel Carmo Ferreira Universidade de Lisboa Maria Helena da Rocha Pereira Universidade de Coimbra, Prémio Árvore da Vida 2008 Mário Avelar Universidade Aberta Martim Avillez Comentador político P. Peter Stilwell Vice-reitor da UCP Simão Lucas Pires Estudante universitário Zita Seabra Editora Alêtheia
O que é mais importante (criar, manter, repensar) na relação da Igreja com a Cultura?
Alice Vieira, escritora Criar, manter e repensar são vertentes necessárias para uma melhor comunicação e para que a cultura seja entendida de melhor maneira. Se não tivermos uma cultura de valores com muita força ficaremos numa situação complicada neste momento de grande crise. A Igreja tem pela frente um grande trabalho de estar ao lado da cultura, e também de a ampliar e pensar. Penso que a Pastoral da Cultura está com muita força e a fazer um bom trabalho mas por vezes usa uma linguagem nem sempre acessível a todos. Temos de pensar que há muitas camadas diferenciadas de pessoas, pelo que é importante chegar a todas e que todas cheguem a nós, sem afastar ninguém.*
André Dourado, programador cultural Na relação entre a Igreja e a Cultura, é tempo de restaurar descomplexadamente uma das linhas mestras da relação entre as duas ao longo dos tempos, e que fez da segunda um meio privilegiado de propagação da Fé. Apesar da Cultura ser hoje feita de realidades muito diversificadas das quais a religião é apenas uma parte, e já não o centro, ela deve ser assumida, a par da área social/humanitária, como o campo por excelência no qual se estabelece o contacto entre a Igreja e a sociedade, tornando-se um palco de afirmação do papel da Igreja no mundo. Ao fazê-lo, a Igreja cumpre assim plenamente as palavras do Papa Paulo VI quando escrevia que "A Igreja deve entrar em diálogo com o mundo em que vive", palavras que, de resto, o próprio Papa Bento XVI lembrou em Lisboa no ano passado, no Centro Cultural de Belém. Para além do seu relevante e crescente papel na conservação, estudo e divulgação do património histórico religioso - que se pertence antes de mais aos
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católicos, não deixa de constituir património usufruível por todos os portugueses, pelo qual todos são assim, também, responsáveis - a Igreja deve voltar a assumir-se como um motor de criação artística, não hesitando em recorrer a formas artísticas contemporâneas para satisfazer as suas necessidades cultuais, sejam elas relativas a bens móveis ou imóveis, utilizando todos os recursos da contemporaneidade, mesmo os tecnológicos, para cumprir a sua missão. No fundo, trata-se de constituir a Arte Sacra do nosso tempo, que o representará espiritualmente um dia como os testemunhos da arte sacra medieval ou barroca representam os seus. É de registar, no entanto, que o momento que vivemos parece já realizar parte destes desideratos: entre a Igreja e a Cultura em Portugal estabeleceram-se relações fecundas nos últimos anos, que são testemunhadas pela qualidade da presença da Universidade Católica em todo o país, pelo fulgor intelectual e espiritual de algumas das principais figuras da Igreja portuguesa, como o Cardeal Patriarca de Lisboa ou o Bispo do Porto, e pela atividade da Pastoral Cultural das dioceses, nas quais se assinalam a abertura de arquivos e estruturas museológicas, a edição de livros e revistas, a realização de exposições, concertos e conferências, etc. Um bom exemplo dessa interação crescente é a programação que o padre e poeta Tolentino de Mendonça tem vindo a realizar na Capela do Rato, em Lisboa, na qual artistas plásticos são convidados a criar obras para este lugar de culto, e no qual atores consagrados leem textos sagrados ou religiosos, frente a públicos compostos por cristãos ou não cristãos, que neles reconhecem uma herança e um espaço de vida em comum. Daí que me pareça que os caminhos das (boas) relações entre a Igreja e a Cultura em Portugal estão já traçados, e que há apenas que os trilhar, aprofundando um diálogo que já existe, a benefício de ambas as partes.
Ângela Xavier, historiadora Não consigo deixar de ficar perplexa perante a facilidade com que enunciamos esta polaridade - Igreja e Cultura -,
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como se de identidades distintas se tratassem. Para depois traçarmos as pontes, os diálogos. Apesar das vantagens metodológicas, da necessidade que temos em delimitarmos campos e conceitos, pergunto-me: estamos, de facto, perante entidades substantivamente distintas, ou, pelo contrário, podemos entender a Igreja enquanto parte inseparável da Cultura, enquanto Cultura (ainda que o inverso não se aplique)? E não me estou a referir apenas a um passado protagonizado por heróis como Giotto e Caravaggio, Rafael e Michelangelo, Borromini e Bernini, Erasmo ou António Vieira (e, no mundo protestante, por Bach), e limito-me a enunciar alguns dos nomes maiores da cultura da época moderna, crescidos dentro ou nas vizinhanças da(s) Igreja(s). Apesar desse passado de intimidade, que processos históricos variados se encarregaram de romper, convidar, também ele, a repensar a Igreja enquanto lugar de Cultura. Mas é conquistar algo de semelhante que, julgo, devemos almejar: tornar inevitável esse continuum, esse estado, esse estatuto, e reabrir definitivamente as portas da Igreja a todos os que, por vias diversas, pesquisam caminhos que os conduzam «para além de», para além do óbvio, para além de um senso comum repetidamente repetido, numa qualquer busca do(s) sagrado(s), das diversas formas pelas quais o(s) sagrado(s) se pode(m) manifestar, experienciar. Acolher essa inquietação virtuosa - em tudo semelhante ao caminho do cristão - entregará de novo a Igreja à sociedade, tornando-a no lugar de acolhimento que é e que sempre deveria ter sido, e, por isso, necessariamente, inevitavelmente, lugar de Cultura.
Duarte Brito de Goes, Grupo Política e Sociedade do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura A Igreja tem percorrido nos últimos anos o caminho inevitável e já inadiável de reaproximação à Cultura. É crucial que esta direção seja mantida. Temos que continuar a criar pontes e a fazer renascer os tempos não tão longínquos em que a Igreja era a grande
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impulsionadora e fonte da Cultura. Tivemos o privilégio do Santo Padre nos indicar claramente o caminho, aquando da sua visita a Portugal no ano passado. A Igreja deve continuar a incentivar o diálogo permanente com todos os atores do mundo da cultura, superando-se diariamente para crescer no conhecimento de outras culturas, como forma de aprofundar e anunciar a sua cultura de Verdade. Num momento em que o mundo se centra no económico e no material, caberá à Igreja ser um centro de promoção do Homem em todas as suas vertentes. Estou certo que nos tempos mais próximos, a Igreja vai desenrolar um papel crucial na Cultura pois só através da Cultura o Homem se poderá realizar na sua plenitude. E quando tudo o resto falhar, a Igreja manter-se-á o firme bastião da promoção do Homem.
P. Duarte Melo, diretor do Museu Carlos Machado, Ponta Delgada, Açores A cultura não reconhece o limite da margem ou de periferia, e, como tal, favorece a consciência da totalidade que inscreve no humano o inseparável. Criar, manter e repensar, configura uma trilogia de alteridade que constrói necessariamente um vasto território em que a Igreja e as culturas apresentam o humano na sua verdade e beleza. Para a Igreja, na sua relação com a cultura, é importante conservar a sua intrínseca unidade e não se deixar contaminar pela cultura do slogan. Um diálogo teimoso e criativo com a pluralidade favorecerá a Igreja e a sua missão no mundo. A Igreja não existe fora do mundo cultural e, por isso, está condenada a viver com a cultura, enquanto realidade histórica.
Filipa Oliveira, curadora de Artes Visuais A relação entre a Igreja e a Cultura tem uma longa e rica história. Contudo, no presente há uma separação que me parece uma perda para os dois lados. A cultura contemporânea está impregnada por uma espiritualidade profunda e a Igreja, na maior parte dos casos, está afastada das manifestações culturais de mais
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vanguarda. Penso que um repensar desta ligação através de projetos que podem ser pontuais ou mais a longo prazo seria um desafio muito enriquecedor. Projetos como o que o Padre Tolentino Mendonça desenvolveu para a Capela do Rato, em conjunto com um grupo de leigos dessa comunidade, intitulado “Diálogos entre a Arte Contemporânea e o Sagrado” são, a meu ver, um exemplo extraordinário de como restabelecer essa ligação, de como a fortificar e de como ambos podem dialogar e se completar mutuamente.
Guilherme d’Oliveira Martins, presidente do Centro Nacional da Cultura Recordo uma fotografia emblemática dos anos cinquenta que representa Graham Greene com François Mauriac. Ambos estão no auge do seu sucesso e aquele encontro representa as diferenças e as confluências das obras dos dois romancistas. A austeridade da fotografia a preto e branco esconde para todos os leitores dos dois celebrados escritores uma multidão de temas e de personagens. Com Greene vem-nos à memória o drama de “O Poder e a Glória” em que a Graça e o Pecado se encontram e desencontram - uma vez que o romancista britânico diz-nos que é na situação limite e no afrontamento do mal que a Graça se revela. O mesmo se diga de “Thérèse Desqueiroux”, em que Mauriac também afronta a humanidade pelo lado da presença constante de um confronto de resultado incerto entre o bem e o mal. Mas nessa fotografia austera e belíssima está presente um debate sempre inacabado - o de saber se há uma literatura cristã ou católica. Greene e Mauriac consideram-se, antes de tudo, romancistas. É verdade que são cristãos, é também certo que os valores dos Evangelhos estão bem presentes na sua escrita, ainda que muitas vezes façam questão de partir dos antípodas ou do avesso. No entanto não há um romance cristão como não há uma arte cristã. Há, sim, cristãos na arte e na vida - de Fra Angelico a Rouault. Mas como é bem evidente no inesperado encontro de Cristo com a samaritana do que se trata é de dar testemunho pela dignidade humana não numa sociedade formatada e
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perfeita, mas entre a imperfeição e a estranheza porque o vento da Graça sopra onde menos se espera.
Inês Gil, Grupo de Cinema do SNPC Penso que a Igreja tem feito um enorme esforço para reencontrar um debate com a cultura, que tinha ficado bastante tímido no fim do século passado. A cultura evoluiu muito, os valores também e a Igreja está disposta a reconhecer que é preciso desconstruir para construir algo novo. Na desconstrução existe a transgressão, que também é uma forma de pastoral invertida, mas presente. Penso que os tempos difíceis que existiram entre a cultura e a Igreja pertencem ao passado e que foi necessário passar por conflitos e oposições para que haja um reencontro mais sólido e tolerante. É muito difícil definir hoje os limites éticos da cultura, e penso que a Igreja acredita que essa clareza é também necessária para que haja uma procura de novos valores. A Igreja pode ser uma voz importante, sem impor, na proposta de uma cultura moderna e atualizada, para a expressão de um mundo mais humilde, sendo crítica e não excluindo o humor. A Igreja está disposta a entrar em diálogo com a cultura contemporânea; é preciso que a cultura também se mostre aberta a acolher a proposta da Igreja.
P. Jardim Gonçalves, diretor do Gabinete do Cardeal-Patriarca de Lisboa Há três aspetos positivos relativamente à maneira como a Igreja em Portugal tem encarado a cultura nos tempos recentes que importa aprofundar. Nos últimos anos começou a falar-se de cultura no interior da Igreja. Para este dinamismo contribuiu o Concílio Vaticano II, a criação do Conselho Pontifício para a Cultura, bem como a ocorrência de mudanças em Portugal que tornaram a cultura numa referência quase irrecusável, o que fez com que a Igreja também despertasse para ela. Outro aspeto positivo é o facto de a Igreja ter continuado a ser um espaço de acolhimento e de promoção de uma
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certa cultura que por vezes é pobre, mas que para determinado mundo necessitado não teria outra forma de se afirmar. A Igreja tem desempenhado um papel de abertura e acolhimento, sobretudo ao nível da juventude, oferecendo os seus espaços para o acolhimento de coros, festivais de música e iniciativas semelhantes. Há também que realçar que o ensino e a formação oferecida pela Igreja contribuem igualmente para uma certa abertura dos espíritos; penso que haveria de limar esta dimensão, que não é realizada com todo o rigor; em todo o caso é um sinal de serviço, sobretudo às classes mais necessitadas. Um terceiro aspeto, talvez o mais relevante, tem a ver com o património, para o qual a Igreja não esteve suficientemente desperta. Há uns tempos a esta parte tem sido dada maior atenção, na generalidade do país, quer ao património artístico e monumental quer ao arquivístico. Nos últimos anos verifica-se uma atenção muito grande e muito positiva, porque além de defender e catalogar toda essa riqueza, a Igreja também tem tido o cuidado de oferecer momentos e espaços de reflexão pedagógicos bastante úteis. Dito isto, voltava ao princípio para falar da cultura. Não há escrito nenhum, boletim paroquial, revista, diário ou semanário eclesial que não fale da cultura na Igreja. Estou convencido que se trata mais de uma palavra que se escreve com uma noção bastante abstrata, pouco concreta e, sobretudo, sem conteúdo. Se formos perguntar a muita gente da Igreja o que quer dizer com “cultura”, estou certo que a resposta é bastante dececionante. É um “flatus vocis”, uma coisa que se diz mas que não mobiliza interiormente as pessoas nem o seu pensar, e muito menos a sua ação e intervenção na sociedade. Há falta de tempo, e também de programa e projeto, para que os cristãos assumam a cultura sob um olhar evangelizador. Há aqui todo um trabalho a fazer. Julgo que a catequese, os movimentos e a própria doutrina social da Igreja, que desde os últimos pontífices engloba já a cultura, poderiam ter um papel importante, o mesmo acontecendo com o Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura.
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Passaria agora ao maior apelo relativamente à intervenção da Igreja na área da cultura em Portugal. A Igreja está muito longe do mundo cultural. Não se faz evangelização da cultura se não com os seus agentes. A missão de evangelização neste âmbito é um trabalho de grande exigência que supõe a diferenciação relativamente à natureza das diferentes formas culturais. Supõe ainda a presença da Igreja no meio artístico, literário e científico, onde se verifica uma ausência total. Não podemos traçar um projeto evangelizador cultural mobilizador se não houver algo de muito bem organizado. Os agentes da cultura não são pessoas quaisquer: há os que sabem o que estão a fazer no mundo e conhecem a importância que têm na sociedade, enquanto outros trazem uma novidade às áreas da arte, da ciência e do pensamento. Não é fácil, exige tempo e meios. Tenho a impressão que a cultura é às vezes olhada como supérflua. E não é. Finalmente, creio que há um horizonte onde ainda se pode fazer muito mais. Refiro-me à vida litúrgica da Igreja. Há coisas inegavelmente positivas e assiste-se a um esforço que está a ser feito no décor, na forma como decorrem as celebrações, nos conteúdos que se transmitem, na música que se toca. Há outras coisas menos boas e que são mesmo ridículas. A liturgia é a grande representação da Igreja, é uma arte em si. É uma forma de presença através de elementos eminentemente culturais, como o canto, a palavra, as vestes, entre outros elementos. Mas estamos muito longe de conseguir que a liturgia seja uma referência para o mundo da cultura - algumas pessoas do meio arrepiam-se ao referirmos esta dimensão. É preciso que o belo que somos chamados a transmitir esteja à altura do representado, que é todo o Mistério de Deus, a perfeição absoluta.*
João Bigotte Chorão, escritor Vimos de um tempo em que havia literatura, editoras e imprensa expressamente católicas, que foram desaparecendo com a progressiva laicização e
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secularização da sociedade e da cultura. Mas nem sempre o que tinha rótulo “católico” era na verdade católico, isto é, universal. Uma literatura piedosa e um jornalismo de sacristia não era o melhor cartão de visita para entrar no mundo da cultura. Nesse mundo há quem procure e encontre, como Pascal, e quem, como Unamuno, se debata sempre em dramática, agónica dúvida. Comentando o romance Deus nasceu no exílio do seu compatriota Vintila Horia, observa com finura Nicolae Steinhardt que “no livro, Cristo e o cristianismo não se mencionam; não se diz nada; tudo se sugere e se pressente; é virtual e iminente”. Assim deve ser numa literatura mais espiritual que devota. O diálogo com os não-crentes é um caminho para chegar a consensos em matérias tão delicadas como o bem supremo da liberdade, a dignidade da pessoa, o respeito pela vida. Aqui a Igreja tem dado passos decisivos ao repensar a cultura, não como um espaço fechado, mas aberto ao diálogo intercultural que não quer impor unilateral e dogmaticamente apenas a sua visão, sem abdicar de, ela própria, se centrar no essencial. Em contrapartida, quem rasga as vestes na praça pública para discutir livros e autores que se movem pela ânsia de escândalo e lucro, torna-se aliado objetivo desses mesmos autores e seus produtos ou subprodutos. Num mundo dessacralizado e mesmo militantemente ateu, impõe-se prestar a melhor atenção aos artistas que, à contracorrente, exercitam os seus dons e logram, na sua obra, conciliar estética e ética. Uma obra pode não ser, prima facie, religiosa, mas, pela sua carga espiritual, tornar-se naturalmente cristã (vide o filme Águas Agitadas do norueguês Erik Poppe). A natureza-morta - neste momento objeto de uma grande exposição na Gulbenkian - não é arte sacra. Mas, por exemplo, em Morandi, as coisas - garrafas, jarros, copos - são como que transfiguradas e diremos mesmo
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humanizadas. Como disse alguém, esses objetos de distraído uso quotidiano aparecem numa ascética atmosfera metafísica. Dir-se-ia que retomam a lição franciscana de reverenciar todas as coisas criadas.
João Duque, presidente do Centro Regional de Braga da Universidade Católica Portuguesa 1. Penso ser necessário criar mais espaços e iniciativas de formação dos fiéis leigos, a nível local (eventualmente paroquial), para tornar os cristãos portugueses mais capazes de entrar no debate público e na construção da cultura, seja do ponto de vista geral, seja enquanto cultura artística e intelectual. Aliás, a atual cultura da informação, com o correspondente pluralismo que a determina, constitui um desafio a que só se pode responder com profunda formação. A organização pastoral da Igreja não pode descurar essa formação do espírito crítico e exigente de todos os seus fiéis, sem aceção. 2. Penso que será de manter e aprofundar a presença de certas instituições eclesiais no mundo da cultura: por um lado, a atividade cada vez mais visível e fértil do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, nas suas intervenções oportunas; por outro lado, a formação superior e a presença no mundo da investigação, proporcionada pela Universidade Católica Portuguesa. Nesse campo, penso ser importante incentivar a investigação sobre os processos da cultura contemporânea, em relação com a nossa memória cultural e na projeção de um futuro mais acolhedor do ser humano. Esse é, sem dúvida, um importantíssimo contributo da Igreja para a configuração da cultura atual e futura. 3. Penso que deveremos repensar certo alheamento de muitos cristãos e comunidades, em relação aos processos culturais do nosso mundo. Esse alheamento pode ser originado por certo tradicionalismo religioso de inércia, que se limita a práticas mínimas de manutenção de uma débil identidade cristã e não assume o seu papel configurador de cultura; ou então, pode ser originado por um novo espírito de seita, que apenas se
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preocupa com a vida interna das pequenas comunidades, sem se aventurar na praça pública, no debate comum, como contributo para a humanidade toda. Por outro lado, no campo concreto da formação superior, devido ao seu lugar estratégico na relação com a cultura, considero ser necessário repensar a identidade e as práticas da Universidade Católica Portuguesa. Isso permitirá, certamente, colocar a questão essencial do seu lugar na Igreja e na sociedade portuguesa, libertando-a de eventuais reducionismos e aproximando-a sempre mais da sua missão fundamental de ser um espaço de aprofundamento e transmissão da antropologia cristã, no seio da cultura em que habitamos e que também construímos.
João Madureira, compositor Como compositor, venho sentindo cada vez mais a urgência de dar testemunho da interdependência das três atitudes que refere [criar, manter, repensar]. Penso que nenhuma delas pode verdadeiramente existir sem as outras: é imprescindível criar para manter, manter para repensar, e repensar para criar. Ou manter para criar, e criar para repensar. Ou ainda criar para repensar, e repensar para manter… São múltiplos os caminhos desta aliança, que não deve, na minha opinião, ser destruída.
João Wengorovius Meneses, diretor de Ação Social, Educação, Juventude e Desporto da Câmara Municipal de Lisboa Às vezes basta uma palavra: Deus. E ouço a música, pinto o inferno. É uma espécie de inocência ardente, um modo de ir para longe. Sou elementar, anjos são os primeiros nomes. (Herberto Helder)
Não é fácil tentar responder à questão sobre o que é mais importante (criar, manter, repensar) na relação da Igreja com a cultura. Por um lado, há uma tendência para centrar a questão não na Igreja mas na religião; por
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outro, a definição de cultura é tão ampla, que se fica sempre aquém (como dizia Agostinho da Silva, até “um pastel de bacalhau é cultura”). Certo é que a ligação entre religião e cultura é tão forte que muitos autores ou mal as distinguem ou fazem depender a qualidade de uma da qualidade da outra por exemplo, para Maria Zambrano, “uma cultura depende da qualidade dos seus deuses” e, para T. S. Eliot, “nenhuma cultura pode aparecer ou desenvolver-se exceto em relação com uma religião”. De facto, mais do que apenas uma herança, o Cristianismo, ao longo da História, tem sido uma matriz inspiradora da arte e da cultura em geral. Desde logo, na sua génese, há uma cumplicidade, um “húmus comum”, entre o Cristianismo e a Cultura Clássica. Ainda que com diferentes conceções do Homem, de Deus e da relação entre ambos, “conhece-te a ti mesmo” tanto proclamou Sócrates como proclama o Novo Testamento. Em certa medida, religião e cultura têm em comum constituírem processos de «autolibertação progressiva do homem», através dos quais «o homem descobre e prova um novo poder: o poder de edificar um mundo 'ideal'» (E. Cassirer). Sendo certo que, no que concerne à religião, há um apelo à santidade, que não será tão manifesto na cultura, é também verdade que ambas procuram (e nos ensinam) a lançar outro olhar sobre o mundo e nós próprios. Regressando à questão sobre o que é mais importante (criar, manter, repensar) na relação entre a Igreja e a Cultura: 1) É fundamental manter o interesse e o diálogo entre a Igreja e a Cultura, sabendo que essa relação obriga a Igreja a “sair para a rua”, a “estar entre gente”, a valorizar o pluralismo cultural, a expor-se, a reinventar os modos e, portanto, a correr riscos. Claro está, evitando o relativismo, o consumismo cultural ou ter de pedir desculpa pela existência de Deus ou pelos princípios que defende e a definem. 2) A repensar haverá (hoje e sempre) o modo como o esforço de abertura e proximidade se processa e
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exprime. Exige-se à Igreja lastro, maturidade, precisão. Alçada Batista, no seu livro “Peregrinação Interior”, faz um alerta que continua válido: «À preocupação de reter a religião fora do mundo e da vida sucedeu o oportunismo religioso de 'batizar tudo e à pressa' (…). Esta reação (…) exprimiu-se no quotidiano religioso por manifestações imaturas e superficiais que não vêm de modo nenhum resolver a problemática profunda que pôs em crise a igreja tradicional. Não me parece que missas yé-yés, (…) as 'espertezas' pastorais, os movimentos ditos de vanguarda, uma santa alegria pateta, um otimismo infantil e quase enternecedor, venham solucionar um problema que continua em aberto a reclamar uma solução de inteligência e de verdade. (…) Isto só vem revelar, a meu ver, a extrema debilidade das nossas infraestruturas religiosas, nos seus aspetos intelectuais, espirituais, éticos e da própria sensibilidade. Porque uma coisa é a nossa predisposição (…) para a abertura aos outros, para a magna carta da coexistência, e outra, muito diferente, é a exigência que devemos manter no conteúdo da Fé (…). Uma coisa é a coexistência, a tolerância, a compreensão (…), outra é a preocupação simples de integrar tudo o que está na moda, sem qualquer juízo crítico (…).» 3) Por último, o que poderá ser importante criar na relação entre a Igreja e a Cultura? A Igreja, como espaço de amor e afeto, de promoção da pessoa e dos direitos humanos, e de busca da beleza, tem nos Evangelhos um ponto de apoio e na Cultura uma alavanca extraordinária (apesar da sua secularização). Daí a importância da pastoral da cultura - dela se espera «uma espécie de inocência ardente, um modo de ir para longe.»
Joaquim Azevedo, diretor do Secretariado da Pastoral da Cultura da diocese do Porto A Igreja Católica de hoje bebe de uma imensa sabedoria, acumulada ao longo de milénios, fruto de um povo a caminho. Essa sabedoria, os traços dessa cultura, vividos e narrados, são de uma crucial importância para os homens e mulheres de hoje, nestes tempos em que a maioria dos cidadãos se sente mal, desorientada,
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angustiada, quando não mesmo em situação de desespero. Qual é a palavra e a presença da Igreja nesta crise? Que critérios aponta para a vivermos em justiça e em paz? Que ações empreende, que testemunho dá, como luz para os nossos dias? Que palavra concreta e inteligível tem a dizer, que seja testemunho de esperança? A crise vai ter um rumo e o pós-crise vai configurar um dado tipo de sociedade, que pode ser apenas mais do mesmo ou ainda mais injustiça e violência humana e mais insustentabilidade sobre a Terra. A Igreja está aí, no meio do turbilhão e é precisamente aí que tem de dar as razões da sua esperança, agindo e falando não para si mesma, nem para os outros, mas com os outros, sobretudo com quem mais precisa.
Jorge Reis-Sá, editora Babel A fé na cultura Há dez anos, acreditando no sucesso de um candidato a presidente da autarquia da minha terra natal, e mesmo contra todas as sondagens que o davam como perdedor, escrevi num panfleto de apoio as seguintes frases: "dizem que a política é a arte da razão; e que a fé é irracional; no entanto, eu acredito". O meu candidato perdeu, como bem dizia a razão. Mas eu percebi aos vinte e poucos anos uma coisa importante: a fé não deve entrar nos domínios da razão. Nisto fui bem ensinado (soube-o mais tarde) pelo evolucionista Stephen Jay Gould que, devido a questões conjunturais que tinham a ver com o debate entre os cientistas e os criacionistas americanos, propôs a tese essencial dos magistérios separados, colocando de um lado a ciência e do outro a religião. Os animais não têm cultura no sentido que é o que mais facilmente apreendemos. Podem ter rituais do domínio da biologia de cada grupo, mas algo que se transmite geracionalmente como aprendido pela própria sociedade é apenas humano. Poder-se-á por isso inferir, tendo em consideração que somos o único animal racional, que a cultura está, como os exemplos dados da política e da religião, fora do âmbito da fé e por
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conseguinte da religião. Acho que não. Poder-se-á, claro, falar de cultura cientifica e até política, o que contradiz esta humilde tese. Mas a cultura que aqui se quer pensar na sua relação com a religião é a das artes, do génio humano enquanto devedor de um sopro divino que permite quadros de Botticelli ou de Chagall. É por isso matéria de fé. De que forma? Daquela que, no mito do universo poético, diz sempre que "o primeiro verso é oferecido, os restantes são conquistados". Não podemos ser portanto mais limitados se analisarmos a perspetiva cultural fora do âmbito do religioso. Seja no âmbito da fé, do oferecido pelos deuses, seja no âmbito da Igreja que lhe dá corpo. Não valerá a pena sequer discorrer aqui da dívida que o génio humano na sua perspetiva artística tem com a Igreja. Basta pensarmos que até há bem pouco tempo era no seu seio e por si que a arte se fazia. Mas vale a pena pensar um bocadinho onde estamos agora nessa relação secular. Não estamos de costas voltadas, quero crer. Em Portugal, a Igreja tem ainda (e ainda bem) um papel importantíssimo na sociedade. Não podemos nem devemos esquecer que grande parte do país ainda é feito de localidades e que, tirando os dois grandes centros urbanos de Lisboa e Porto, é a Igreja quem sustenta muito do que a juventude cria. Se a isto se somar que é nela que, mesmo aqueles para quem a fé desapareceu, se encontra o Belo, percebe-se a dimensão da sua importância. Seja nas igrejas, seja nos cânticos ou seja nos ritos (o Compasso Pascal ou o Missal, por exemplo). Mesmo distante que estou de alguma fé, já várias vezes entrei com o meu filho de cinco anos na missa que ao fim da tarde se celebra no Chiado. Só para que ele veja que é esta a nossa cultura, com dois mil anos de história e saber. Só para que ele saiba que, querendo acreditar ou não, é muita a beleza que a Igreja traz e deve merecer o maior respeito por todos aqueles que se dizem possuidores de razão - com ou sem a irracional fé.
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Capela Árvore da Vida, Braga. Foto: Nelson Garrido
Jorge Wemans, diretor da RTP-2 Maldição e culpa são os temas que nestes tempos sombrios marcam a experiência quotidiana dos europeus (dos que habitam a cultura ocidental). A maldição dos ditos "mercados financeiros" que nos escravizam e a culpa (dos outros, é claro!) que procuramos insistentemente como bodes expiatórios de uma racionalidade a que não conseguimos aceder. Neste contexto, as artes continuam maioritariamente à procura de exprimir buscas hedonistas individualistas sem futuro. Cabe à Igreja interrogar a cultura e as artes com aquela pergunta inquietante: "de que queremos ser salvos (curados)?" - propondo a convicção de que ninguém se salva (cura) sozinho. A urgência fundamental centra-se hoje na revalorização dos laços comunitários, no recentrar da pessoa (experiência individual livre e irrepetível) cujo horizonte de felicidade e alegria só pode existir na relação de comunhão.
José Carlos Seabra Pereira, professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra Sem desinvestimento na consolidação do meritório trabalho que a Comissão Episcopal, o Secretariado Nacional e os organismos eclesiais conexos têm desenvolvido, no sentido da valorização espiritual da componente estética da vida humana e da articulação das iniciativas e dos referentes culturais no interior do mundo católico, reputo de urgência maior: - combater os hábitos e os engodos da mera atitude reativa (quando os protagonistas da comunicação social e da agenda cultural entendem conceder espaço à nossa voz ou quando nos sentimos atingidos por posições e formulações adversas); e, contra a inércia dos preconceitos alheios e das inibições próprias, "passar à ofensiva" no debate de ideias e na manifestação de criatividade, isto é, tomar sistematicamente a iniciativa do discurso de interpelação e de proposta nos meios académicos, filosóficos, científicos e artísticos;
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- sem iludir os limites (aliás tão injustos) do impacto que a ação da Rádio Renascença, da agência Ecclesia e da imprensa católica alcança na opinião pública, encontrar e ativar novos e eficazes meios de visibilidade no espaço público, conquistando maiores efeitos de presença e de afirmação, de motivação e de adesão; - tornar efetivo e contínuo (não apenas formalmente reconhecido ou conjunturalmente solicitado pela Hierarquia) o papel dos leigos intelectuais na vida da Igreja, abrindo-lhes novos órgãos de reflexão e opinião e novos domínios de intervenção - num processo que poderia ter por marco fundacional a realização (porventura em Fátima) de um grande Congresso que convocasse pensadores, cientistas, artistas, escritores e jornalistas.
José Leitão, Centro de Reflexão Cristã A Igreja para manter uma relação mutuamente enriquecedora com a Cultura tem que encarar sem medo as transformações culturais, sociais e políticas e saber ler (e reler) permanentemente os sinais dos tempos. Tem que aprender a viver com naturalidade num mundo num processo acelerado e vertiginoso de mutação. Num mundo em que as crises económicas e financeiras dos Estados até agora dominantes anunciam o advento de uma nova época e a emergência de novos Estados, línguas e culturas e em que os frutos da revolução científica e tecnológica e as novas tecnologias de informação invadem o quotidiano dos cidadãos, a Igreja tem de repensar permanentemente as suas relações com a Cultura. Em Portugal, a Igreja tem vindo a promover uma Pastoral da Cultura que tem sido capaz de estabelecer pontes com muitos criadores culturais, crentes e não-crentes, e despertado comunidades cristãs para a importância da cultura para a pessoa humana ter acesso verdadeiro e pleno à humanidade. Naturalmente que há muito para fazer e repensar. Num País em que a crise financeira, se transformou numa crise económica, existem riscos sérios de subalternização da importância da Cultura e do trabalho dos
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criadores culturais. O discurso sobre a necessidade do empobrecimento num contexto de crise corre o risco de esquecer que uma coisa é ter menos recursos para gastar, outra coisa é esquecer que não só de pão vive o homem, mas precisa de sentido e beleza. As despesas com a Cultura não são gastos, são investimentos numa sociedade mais justa, humana e solidária e contribuem para aumentar as exportações. Não desistimos de ter esperança estamos certos que o desenvolvimento individual e coletivo é possível, mobilizando todos os recursos disponíveis, nomeadamente, o contributo dos criadores culturais, não apenas dos escritores e poetas, mas também dos cineastas, dos músicos, filósofos, dos arquitetos, dos dançarinos, de todos os criadores culturais sem exceção. O repensar da relação da Igreja com a Cultura em Portugal passa por alargar e descentralizar o diálogo com os criadores culturais, crentes e não-crentes, ao longo de todo o País, estabelecendo pontes com os que se encontram espalhados pelo mundo e com o mundo de Língua Portuguesa. O repensar da relação da Igreja com a Cultura deve assentar no direito de todos à cultura e à sua realização prática, no promover em cada pessoa a consciência do direito à cultura e do dever de se cultivar. A atitude da Igreja no diálogo com os criadores culturais não pressupõe o silenciamento das diferenças e das divergências, mas deve ser marcada pelo saber escutar as críticas, as inquietações, as perguntas. A relação da Igreja com a Cultura deve, como defendeu Júlia Kristeva, em Assis [27.10.2011], ousar a “aposta na renovação contínua da capacidade dos homens e das mulheres para crer e viver em conjunto (...) para que a humanidade possa prosseguir por muito tempo o seu destino criador”.
José Pedro Serra, professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa Há duas linhas de força que no diálogo entre a Igreja e a
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cultura devem ser mantidas com muito afinco e persistência. A primeira é que a Igreja não é uma organização cultural. Ela é uma instituição que está no mundo e na cultura mas que aponta para uma dimensão para além do mundo e da cultura. Neste sentido parecer-me-ia muito prejudicial para a noção de identidade e missão da Igreja que possibilitássemos a ideia de que ela se pode dissolver ou reduzir à cultura. A voz mais profunda que a Igreja possui aponta para uma dimensão que está para além da cultura. Por outro lado, e sem desmentir nada disto, entendo que a Igreja não tem de temer nenhum diálogo com o mundo nem nenhuma relação com a cultura. Ela deve fortalecer os laços com a cultura e esclarecer sem nenhum temor a sua posição no seio da cultura, qualquer que ela seja.*
Leonor Xavier, escritora A questão é fundamental, como sempre foi. Basta ver o realce que o papa Bento XVI tem dado à cultura. No mundo de hoje a cultura ajuda-nos a repensar o lado temporal da Igreja e a ter um maior entendimento das nossas identidades, das transformações do mundo contemporâneo e das crises que atravessamos porque ela é uma dimensão absoluta do pensamento. Aqui evoco sempre o meu professor Vitorino Nemésio, docente de História da Cultura Portuguesa na Faculdade de Letras de Lisboa, a quem nós, então alunos nos anos 60, perguntávamos sobre a matéria para o exame, e ele nos respondia: «Tudo aquilo que vocês souberem e tudo aquilo que eu souber». Ou seja, vamos desconstruir o conceito formal ou apenas intelectualmente superior de cultura e vamos aplicar-lhe a dimensão absoluta da nossa vida. A Igreja em Portugal pode incluir nos seus rituais e espaços sagrados uma dimensão de arte e sensibilidade, em que as várias disciplinas do conhecimento sejam contempladas. Tem havido experiências novas,
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como a do padre Tolentino Mendonça, que na Capela do Rato passou a chamar pessoas da cultura e obras de arte de artistas plásticos para integrar no espaço de fé. É também impossível não nos lembrarmos do encontro de Assis, em que o papa chamou pessoas não crentes para expressarem o seu pensamento sobre questões fundamentais como a paz, a justiça e a liberdade, que também são coordenadas de cultura no tempo em que vivemos.*
Lídia Jorge, escritora Não me parece que a relação entre a Igreja e a Cultura se possa manter por muito tempo tal qual se encontra. É verdade que se está perante dois universos difíceis de gerir, já que em parte são coincidentes, e em parte divergem. Entre outras divergências, sublinho o facto de a Cultura se basear na interpretação do pensamento sem limite de variáveis, sendo por natureza aberta e inconclusa, e a Religião fundamentar-se em silogismos de resolução fechada. Pelo meio, porém, existem todas as aproximações possíveis e desejáveis, não esquecendo que a Cultura se aproxima com mais facilidade da Religião do que a Religião da Cultura. No ponto em que estamos, vários me parecem ser os aspetos em que a aproximação da Igreja poderia ser útil para a sociedade crente e não crente dos nossos dias. Um dos aspetos tem a ver com a natureza do discurso pastoral. Se em determinados contextos a Igreja ainda associa a criação de ambientes e discursos pouco inteligíveis como forma de desencadear relações místicas, é bem verdade que hoje em dia se assiste à prática salutar de uma crescente aproximação do discurso lógico, interventivo, por vezes com alto grau de racionalidade e muita informação, como convém a uma sociedade cada vez mais aberta e exposta ao mundo da comunicação e da crítica globalizada. Mas nem todos os agentes da Igreja conseguem atingir um nível eficaz. O principal obstáculo talvez resida na dificuldade que os sacerdotes encontram em passar das narrativas bíblicas
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e da leitura do Evangelho, altamente metaforizadas, para as parábolas da atualidade. Desocultar os sentidos do mundo atual através do “texto sagrado” exige o conhecimento e a introdução de narrativas atuais, sobretudo, a introdução da parábola e da poética contemporâneas. A ideia que têm muitos fiéis é de que escutam, ano após ano, os mesmos textos fixados num tempo remoto cujas lições são fundadoras mas insuficientes para lidarem com os sentidos do mundo onde estão imersos. Naturalmente que a proposta é difícil de cumprir. Exigiria uma formação cultural humanística e artística muito forte, e os riscos de serem avocados para o interior da Igreja textos exteriores ao cânone religioso, bem como a fábula colhida do dia a dia, exporia o clero a uma dificuldade que assim evita, refugiando-se num discurso cristalizado pelo uso, e inofensivo pela decantação que o tempo tem trazido. Mas um dia, mais tarde ou mais cedo, esse “contágio” com um outro “corpus”, o cultural, vai ser inevitável, se a Igreja desejar ter argumentos para salvaguardar o que do seu património considera intocável. Outro aspeto seria uma nova vivência do Património Artístico da Igreja, sua forma e significado colocados em perspetiva histórica e crítica. E outro, talvez tão importante quanto a revisão do discurso, seria um novo investimento nos contributos do canto, da música e da coreografia nas várias cerimónias com que a Igreja acompanha os momentos fundamentais da vida. Sem deixar que a espontaneidade dos diversos grupos tenha a sua natural intervenção, numa altura em que as artes cénicas ganharam um expressão tão sofisticada, a Igreja parece incapaz de se mover de uma fase arcaica, em contraste com a agilidade dos meios de comunicação. A aposta no sentido das coisas em vez da sua aparência, num mundo de aparência, acaba infelizmente por engolir o propósito do sentido.
Manuel Carmo Ferreira, professor da Universidade de Lisboa O mais importante na relação da cultura com a Igreja é que ela seja fiel à sua missão - o anúncio da Boa Nova e assegure a seriedade do processo cultural.
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Ambas as realidades, eclesial e cultural, convergem numa dupla dinâmica de procura da verdade e da liberdade. A investigação do que é verdadeiro e de uma efetiva liberdade é a operação essencial da cultura. A Igreja tem de cooperar com este trabalho comum, reconhecendo que a verdade não está sempre dada à comunidade humana mas é um esforço de permanente conquista e invenção. A verdade e a liberdade são tão importantes para a Igreja como para a cultura e implicam-se uma à outra. Não é possível uma existência segundo a liberdade que não tenha como grande preocupação a busca da verdade, como também nunca será verdadeira uma aquisição da verdade que não leve em si a componente da produtividade. Em termos mais concretos, a relação da Igreja com a cultura tem de processar-se segundo uma dupla polarização: o pólo da invenção permanente do novo, que no evangelho está configurado na expressão de ir buscar ao tesouro coisas novas e velhas, e simultaneamente reconhecer que essa criação precisa de um espaço institucional. A cultura é uma permanente busca da realização do humano que tem como suporte uma certa estabilidade, dada pelas instituições. Compete à Igreja a atenção, o cuidado e a recetividade desse plano institucional, sem nunca sacrificar esse enquadramento à necessária criação. Se não for essa inventividade e esse constante aflorar de uma liberdade produtiva, não temos cultura mas apenas património adquirido. É a fidelidade da Igreja à sua missão que lhe exige uma sensibilidade e um cuidar da cultura, pois só aí ela encontrará a possibilidade de mediar o mistério que traz em si.*
Maria Helena da Rocha Pereira, Universidade de Coimbra, Prémio Árvore da Vida 2008 Em livro muito conhecido, publicado em Nova Iorque há mais de meio século, A. L. Kroeber e Clyde Kluckhohn,
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com o título “Culture. A critical review of concepts and definitions”, analisaram nada menos de 164 definições de cultura. Entretanto multiplicaram-se as áreas de saber, algumas das quais, como a astronomia e a física, parecem alterar todos os conhecimentos sobre o mundo que nos rodeia. Por isso um dos mais notáveis cientistas de todos os tempos - Heisenberg - escreveu esta frase famosa: «O primeiro golo da taça das ciências da natureza torna-nos ateus, porém, no fundo da taça, Deus está à nossa espera». Outros grandes nomes como Francis Collins, ao anunciar a sua descoberta do genoma humano, mostrou como a ciência fornece provas para a fé. Para não falar de diálogos sobre o tema com filósofos contemporâneos, cujo número aumenta dia a dia, fica-nos esta dúvida: quais os caminhos a seguir para reunificar Igreja e cultura - tomando como cultura todos os campos do saber que excedem a noção de natura. Quero com isso sugerir que todas as áreas da ciência devem, cada vez mais, ser consideradas pela Igreja como matéria de reflexão e estudo. Provisória, como tudo o que é humano. É isso, de resto, o que nos ensina a história da ciência, e para isso não temos de ir mais longe do que lembrar através de vários séculos a questão da teoria heliocêntrica. Descoberta no século II a.C. por Aristarco de Samos, foi impugnada por Arquimedes e por Hiparco de Nicéia e, já na época romana, por Ptolomeu. Dezoito séculos depois é retomada por Copérnico, novamente com escândalo geral. Proposta por Galileu (e é só deste que geralmente se tem conhecimento), é preciso ainda esperar por Kepler (já nos começos do século XVII) que conseguiu fundamentar a explicação das aparentes contradições que dificultavam o entendimento da teoria substituindo as órbitas circulares por elípticas. Se recordo esta história, é porque ela é algo paradigmático para nos fazer compreender as dúvidas que persistem no nosso entendimento do mundo em que vivemos.
Mário Avelar, professor da Universidade Aberta Na sociedade em que vivemos é ainda pertinente e
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rigoroso o diagnóstico feito em 1939 por T. S. Eliot, segundo o qual “muito da vida moderna é meramente uma sanção de objetivos não cristãos” (A ideia de uma sociedade cristã). No entanto, não é menos pertinente e rigoroso o diagnóstico de Chesterton: “no mundo moderno em que vivemos, com os seus movimentos modernos, continua presente o legado católico” (É o humanismo uma religião?). Será perante esta tensão entre discursos que divergem de (ou confrontam mesmo) uma conceção cristã da vida, e uma matriz que, sendo relevantemente cristã nos seus fundamentos, parece diluir-se nas nossas práticas quotidianas, que a Igreja deve criar, manter e repensar a sua relação com a Cultura. Na coabitação destas três sugestões de percurso - criar, manter e repensar, reside a resposta que o presente exige à Igreja no seu todo. A realidade decorrente do facto de o discurso católico ter deixado de ser dominante, deve ser entendida como oportunidade para nos repensarmos enquanto alteridade(s), e para assim partir ao encontro de outros outros. Como referiu Bento XVI no encontro com o mundo da cultura no CCB, “há toda uma aprendizagem a fazer quanto à forma de a Igreja estar no mundo, levando a sociedade a perceber que, proclamando a verdade, é um serviço que a Igreja presta à sociedade, abrindo horizontes novos de futuro, de grandeza e dignidade”. Na humildade que esta postura de nós exige, deverá ainda compreender-se aquilo que ela significa de abertura para o reconhecimento de novas formas de expressão estéticas e da espiritualidade que elas porventura encerram. Penso, por exemplo, naquela que, à partida, pode parecer ser a estranha dimensão espiritual de meros espaços monocromáticos da pintura de Mark Rothko. Porque, contra os divulgados hedonismo e ceticismo, urge não abdicar da busca do Belo e da Verdade. E dessa busca participa o inevitável exercício da razão,
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como demonstra D. Manuel Clemente em 1810-19102010. Datas e Desafios. Por fim, exige-se de cada católico que “não tenha vergonha” de intervir na cidade, que não receie a polémica, e que não abdique de dar voz a uma postura ética, que é também estética, de estar no mundo; uma forma ética que foi determinante na construção da matriz cultural que é a nossa - algo que importa não deixar de recordar, analisar e compreender. Mas isso compete, também, a cada um de nós.
Martim Avillez, comentador político Como é evidente para um católico, a cultura nunca é completamente independente da relação que temos com a nossa tradição católica e apostólica romana. Quando penso em cultura, e agora penso na arte contemporânea, não consigo quase nunca desligar-me das noções de Belo que estão diretamente relacionadas com as imagens que a vida de Cristo nos trouxe. Ou seja, não há nada mais belo que esse exemplo e é à luz desse padrão que eu avalio a arte. A cultura não é apenas arte. Ela é uma das variáveis mais importantes do que somos. E, de novo, é quase impossível, mesmo para um não católico, desligar a cultura ocidental da história da Igreja e do exemplo de Cristo. Esta perspetiva ajuda a enquadrar todas as nossas formas de relação com a cultura. Eu, enquanto católico, torno-me mais culto para ser mais capaz de desempenhar o meu papel na Terra; eu, não católico, torno-me mais culto para entender tudo aquilo que ajuda a desenhar as variáveis da minha vida. Para nós, católicos, é muito mais cheio vivermos a nossa cultura com base numa experiência tão marcante como foi a história de Cristo, e a partir daí relacionarmos a nossa vida com esse exemplo e tentarmos guiar-nos por ele o mais possível. Mas mesmo para os não católicos não há cultura sem este exemplo, nem que seja para o contrariar ou colocar em perspetiva com tudo o resto. Manter viva a memória de Cristo na nossa cultura é uma
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das contribuições mais decisivas que a Igreja nos deu. Desde o papa João Paulo II a Igreja tem mantido uma relação muito aberta com a cultura. Acho que essa é a visão que todos desejamos: ver a Igreja em diálogo com todas as variáveis que contribuíram para desenhar a cultura ocidental. Esse ecumenismo, essa capacidade de nos abrirmos ao outro - que é também um exemplo da vida de Cristo - é algo que a Igreja não deve perder, estimulando-a e reforçando-a o mais possível. Quando o nosso papa visitou Portugal [maio de 2010] tivemos campanhas que encheram as ruas com mensagens do evangelho muito simples mas muito abertas. Este tipo de iniciativas ajuda a manter viva a marca da cultura que foi a vida de Cristo e o exemplo da capacidade de amar os homens que ele nos deu. Tudo o que contribuir para manter vivo a abertura às outras formas de olhar a humanidade e tudo o que manter vivo a palavra e o exemplo de Cristo constituem elementos essenciais da relação da Igreja com a cultura.*
P. Peter Stilwell, vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa Ciência, tecnologia e economia, reais ou imaginadas, fornecem para muitos dos nossos contemporâneos a grande narrativa que sustenta sua confiança, esperança e compromisso. Sem confiança, esperança e empenhamento, os espíritos afundam-se em depressão e as sociedades deixam de funcionar. Todos os dias vemos as flutuações na confiança varrer milhões do valor das ações nas bolsas e abalar os fundamentos de governos. Às vezes a erosão da confiança conduz ao colapso de um regime. Neste contexto, a grande narrativa afirma que a ciência, a tecnologia e a magia económica responderão a seu tempo à maioria dos dilemas atuais e porão a nu as verdadeiras causas do sofrimento e da doença. A realidade da condição humana, no entanto, é mais complexa. Uma avaliação serena da vida e do universo abre as portas para mais perguntas do que respostas. (...)
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Face a calamidades naturais e à corrupção moral, famílias, clãs, nações e culturas tentaram escorar a sua confiança coletiva a fim de garantir a sobrevivência. Tanto a honra familiar, como o orgulho nacional, ou ideologias abstratas têm servido, ao longo dos tempos, para esse objetivo. Nada, no entanto, tem contribuído tão poderosa e criativamente para esse esforço como a “experiência espiritual”. Nascida do silêncio e da contemplação, está associada a uma perceção profunda da natureza última do universo, não muito distante da súbita intuição do cientista que se esforça por ir além da acumulação de dados e das hipóteses parcelares, ao encontro de uma teoria unificadora de algum aspeto da realidade. (...) Existe outra dimensão da experiência espiritual, no entanto, que não deve ser esquecida. Para muitos, é a chave para uma verdadeira compreensão da realidade. Refiro-me à palavra do místico e do profeta. Ela testemunha uma inesperada irrupção da Raiz Última do ser, que enche a mente e o coração de felicidade. O momento é vivido como uma visitação divina, uma vocação pessoal e uma missão quase irrecusável. (...) Como olha (...) a tradição judaica e cristã a evolução da ciência? Em certo sentido, os livros da Escritura e o livro da Natureza têm para nós um mesmo Autor. Por isso o progresso da ciência, ao aprofundar a nossa compreensão da razoabilidade do real, aproxima-nos de uma inteligência mais ampla e verdadeira do seu Criador. Mas com uma ressalva: só por si, o conhecimento - obtido quer pela Escritura quer pela Natureza - não traz maior bondade ou dignidade. Pois, para lá do conhecimento, está a liberdade; e a sabedoria para atuar livre e justamente nasce da humildade e do amor. Excertos da intervenção nos TEDxEdges, Fundação Champalimaud, Lisboa, 1.10.2011
Simão Lucas Pires, estudante universitário Rilke dizia que o nosso tempo se distingue de tempos mais antigos pelo facto de nós não termos Teatro - assim mesmo, com letra maiúscula. Não quer dizer que a dramaturgia contemporânea seja pior ou melhor do que
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a de épocas passadas. Quer dizer simplesmente que não há, no centro da nossa suposta comunidade, uma interrogação acerca do problema que nos é comum a todos: o que somos enquanto homens. O grande defeito da nossa cultura tem a ver com isto. No coração de todo o barulho, de todos os gestos, de todas as formas de expressão, está o quê? Muitas vezes parece que não está nada, senão a própria vontade de exprimir seja o que for - e não me refiro apenas às secções assumidamente supérfluas do campo cultural. Em vez de criação, há ruído. Uma espécie de cultura à deriva, na qual os homens conservaram o hábito de falar, mas esqueceram-se do assunto que dá razão de ser ao discurso. Na verdade, não nos esquecemos de nada; cansámo-nos. E é esta a decadência contra a qual a Igreja deve lutar. Quando penso na relação entre Igreja e cultura, penso no papel que os crentes podem desempenhar. A primeira coisa importante é não compactuar com este esvaziamento, com esta desistência em relação à única coisa urgente. Não promover a cultura morna na qual, apesar dos tons de voz, dos prémios e da gravidade cuidadosamente encenada, nada está em causa. A Igreja não pode ficar satisfeita com um cenário onde o lugar da verdade é o canto a que ninguém liga e a inquirição acerca do homem é uma forma de entretenimento tão insignificante como todas os outras. Valores como a tolerância e o respeito pela alteridade saltaram da posição de moderação que lhes cabe para perverterem aquilo que vinham salvar: a possibilidade de um confronto regrado de perspetivas, com os olhos postos na verdade. Os olhos deixaram-se tapar, as pessoas jogam à defesa e a cultura é só uma área respeitável e inconsequente. Parece-me que este é um obstáculo ao qual nós, membros da Igreja, nem sempre temos sabido responder. O problema é o da integração do discurso católico num campo amorfo e não dominado pela fé. Em vez de ser olhado na sua pretensão de verdade universal, o discurso é visto como pertencendo a uma esfera restrita e completamente alheia. O desafio da Igreja prende-se, assim, com a própria
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forma de apresentação do seu discurso. Não se trata de adequar o produto ao público. Trata-se de apresentar a sua mensagem como o que de facto é: uma resposta aos problemas do ser humano. Isso implica uma mudança de linguagem e implica tomar consciência da dimensão universal desta história em que estamos metidos. Falar para homens, como Chesterton fez.
Zita Seabra, editora Alêtheia A Igreja teve sempre uma relação privilegiada com a cultura. Ao pensar nos dois mil anos de Cristo, muitas das mais belas obras de arte têm a ver com o cristianismo e com a forma como se representa Deus e a Bíblia através da música, da pintura, da literatura e de todas as formas de expressão de arte. Abandonar a ideia do Belo e da sua busca, transformando a arte apenas num espaço vazio de sentimentos, faz perder a noção de Belo e afasta a Igreja daquilo que em muitos casos ela foi no encontro com as pessoas. Não faz sentido falar de cultura sem falar da Igreja e não faz sentido que esta pense em evangelizar sem simultaneamente procurar a representação da Beleza. O papa Bento XVI tem falado e escrito sobre este tema, incentivando, tal como aconteceu noutras épocas, que a Igreja na sua liturgia e noutras formas de expressão não esqueça a procura do Belo. Esta demanda não se reduz ao património mas também se exerce nos dias de hoje, não deixando que algum mau gosto e incultura, que por vezes parecem sobrepor-se aos valores culturais inseparáveis dos valores espirituais, deixem abafar esse encontro constante entre Deus e a noção de cultura. Há referências mundiais na literatura, na música, na arquitetura, na pintura. Não sei se a obra que na minha opinião mais nos aproxima de Deus, a Pietá, de Miguel Ângelo, podia ser feita sem o sentido de espiritualidade que ele coloca naquela escultura que nos espanta profundamente. No tempo atual também encontramos momentos assim, quando a fé e a cultura se juntam.* *
Depoimentos recolhidos por telefone.
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Capela do Rato, Lisboa. Foto: Rui Martins