OBSERVATÓRIO DE INFORMAÇÕES MUNICIPAIS
IMPACTO DA CRISE ATUAL NAS FINANÇAS DOS MUNICÍPIOS EM 2017 François E. J. de Bremaeker Bacharel em Economia e Licenciado e Bacharel em Geografia Gestor do Observatório de Informações Municipais Membro do Núcleo de Estudos Urbanos da Associação Comercial de São Paulo Presidente do Conselho Municipal do Ambiente de Paraíba do Sul (RJ) (
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No dia 1 de dezembro de 2016 foi realizada no Plenário 16 da Câmara dos Deputados o Encontro Nacional de Prefeituras promovido pela Associação Brasileira de Prefeituras (ABRAP). Na oportunidade foi efetuada uma palestra sobre o “Impacto da crise atual nas finanças dos Municípios brasileiros”. Segundo dados apresentados pelo gestor do Observatório de Informações Municipais, o conjunto dos Municípios brasileiro teve a seu dispor, em 2015, o montante de R$ 566,2 bilhões, o que correspondeu a 6,53% a mais do que o montante de recursos disponíveis em 2014. Estes recursos dizem respeito às receitas tributárias, às transferências constitucionais e voluntárias e às outras receitas. Considerando-se que a inflação apurada pelo IPCA em 2015 e que o salário mínimo foi reajustado em 8,84% a partir de janeiro de 2015, é flagrante a pressão sofrida pelos Municípios para atender a todas as demandas por serviços, cujos custos superam o crescimento das receitas, levando a maioria dos Municípios a fechar o exercício em déficit fiscal. No ano de 2016, para o qual ainda n]ao estão disponíveis os dados das finanças municipais, sabe-se que as reclamações originárias dos Prefeitos e de Secretários de Fazenda têm sido no sentido de que as despesas têm superado as receitas, principalmente em decorrência da redução no crescimento das transferências constitucionais federais e estaduais, como decorrência da crise econômica que assola o País. De ante-mão sabe-se que a inflação deverá fechar o ano em torno dos 6,0% a 6,5% e que o aumento do salário mínimo desde janeiro de 2016 foi de 11,68%. Os repasses de recursos por parte da União e dos Estados têm sido pouco alentadores. François E. J. de Bremaeker - consultor
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O Fundo de Participação dos Municípios, a principal fonte de receita da maioria dos Municípios brasileiros, principalmente aqueles de menor porte demográfico, cresceu em 2016 apenas 4,59%, considerando-se as estimativas para dezembro de 2016. E mesmo recebendo o adicional de 1% em julho de 2016. Em novembro os Municípios obtiveram uma receita extraordinária do FPM oriunda da repatriação de recursos. Este repasse adicional fez com que a previsão para 2016 seja de um aumento do FPM de 10,36% em relação a igual período de 2015. Mas sabe-se que esta receita não deverá se repetir na mesma intensidade no ano de 2017. Para o ano de 2017 foi previsto no Orçamento Geral da União um aumento do FPM da ordem de 6,09% e o aumento do salário mínimo a partir de janeiro de 7,5%. Estes dados mostram que os Prefeitos que iniciam seu mandato em 1 de janeiro de 2017 deverão ser econômicos nos seus gastos até que a recuperação da economia se faça sentir nos repasses do FPM e também do ICMS, que depende do desempenho do consumo nos Estados. Outros ingredientes que deverão afetar as transferências voluntárias em favor dos Municípios dizem respeito às restrições orçamentárias tanto da União como dos Estados, motivados pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional do “Teto de Gastos” como também pelos fortes ajustes fiscais que deverão ser empreendidos pelos Estados para reduzir os efeitos dos desajustes fiscais. Outro fator que dificultará a liberação de transferências voluntárias é a ampliação dos recursos que poderão ser desvinculados do orçamento. A desvinculação das receitas da União elevou-se de 20% para 30% e em relação aos Estados foi aprovada uma Desvinculação das Receitas dos Estados igualmente de 30%. A agravante é que para os Estados não havia o instituto da desvinculação orçamentária anteriormente. A finalidade é ajudar o pagamento das dívidas da União e dos Estados. Em relação aos Municípios também foi aprovada a Desvinculação das Receitas dos Municípios em 30%. Mas é uma ilusão contábil, pois sendo os Municípios o ente da Federação que se encontra mais próximo da população, além de encontrar restrições no recebimento de recursos da União e dos Estados, acabarão por serem cobrados pela população para a prestação dos serviços, o que pressionará ainda mais as já combalidas finanças dos Municípios. Exceções podem existir entre os Municípios, principalmente os de maior porte demográfico, mas não são a regra. François E. J. de Bremaeker - consultor
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OBSERVATÓRIO DE INFORMAÇÕES MUNICIPAIS Panorama das finanças municipais A composição da receita do conjunto de Municípios do País é constituída em duas terças partes por transferências (66,31%). As receitas tributárias alcançam o equivalente a 17,26% das receitas. Os Municípios da região Norte têm 80,19% das suas receitas provenientes de transferências e os da região Nordeste 79,81%. Na região Centro-oeste o peso das transferências é de 71,45%. A região Sul se posiciona pouco abaixo da média nacional (65,32%) e a região Sudeste é a que apresenta a menor participação: 58,23%. O panorama geral é de uma forte dependência das transferências, um quadro que vem se repetindo sempre. Em 2015 a receita orçamentária per capita do conjunto dos Municípios foi de R$ 2.809. Os Municípios da região Sudeste são os que apresentam a maior receita per capita: R$ 3.235. Seguem-se em importância as regiões Sul (R$ 3.154) e Centro-oeste (R$ 2.869). Abaixo da média brasileira estão os Municípios das regiões Norte (R$ 2.116) e Nordeste (R$ 2.160). A receita de transferências per capita é de R$ 1.863 para o conjunto de Municípios brasileiros. As desigualdades entre as regiões é relativamente pequena. Varia de R$ 1.697 para a região Norte a R$ 2.060 para a região Sudeste, onde além do FPM os Municípios recebem um montante de recursos proveniente do ICMS. Quanto às receitas tributárias, as desigualdades são mais flagrantes. Os Municípios das regiões Norte e Nordeste apresentam um valor per capita de R$ 208, o mais baixo entre as regiões. Em seguida aparecem os Municípios da região Centro-oeste (R$ 396) e os da região Sul: R$ 470. Apenas o conjunto dos Municípios da região Sudeste ultrapassa a média nacional: R$ 742. Ao verificarmos a distribuição da receita orçamentária per capita segundo o porte demográfico dos Municípios, constata-se que aqueles de menor porte demográfico possuem um valor bem mais elevado, graças ao efeito da transferência do Fundo de Participação dos Municípios, cuja filosofia é a de dar mais recursos proporcionalmente aos Municípios menores e que apresentam maior dificuldade de arrecadar tributos. Os Municípios com população até 2 mil habitantes apresentam uma receita orçamentária per capita de R$ 7.256. Aqueles com população entre 2 mil e 5 mil habitantes têm á sua disposição R$ 4.309. Os Municípios com população entre 5 mil e 10 mil habitantes possuem uma receita per capita de R$ 2.974. Estes grupos de Municípios estão acima da média nacional. François E. J. de Bremaeker - consultor
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Os Municípios com população entre 10 mil e 20 mil habitantes apresentam uma receita per capita de R$ 2.556, cujo valor continua caindo para aqueles com população entre 20 mil e 50 mil habitantes: R$ 2.427. A partir deste grupo de Municípios a receita per capita começa a subir. Para os Municípios com população entre 50 mil e 100 mil habitantes o crescimento é pequeno: R$ 2.437. Os Municípios com população entre 100 mil e 200 mil habitantes possuem uma receita per capita de R$ 2.597. Para os três grupos de habitantes seguintes as receitas per capita praticamente se posicionam num mesmo patamar: R$ 2.788 para os Municípios com população entre 200 mil e 500 mil habitantes; R$ 2.795 para aqueles com população entre 500 mil e 1 milhão de habitantes; e R$ 2.739 para aqueles com população entre 1 milhão e 5 milhões de habitantes. Apenas o grupo de Municípios com mais de 5 milhões de habitantes consegue mostrar uma receita per capita mais elevada (R$ 4.192), semelhante àquela dos Municípios com população entre 2 mil e 5 mil habitantes. O valor total das transferências federais per capita é de R$ 749. A maior parte dos recursos é proveniente do FPM (R$ 411), seguindo-se em importância o repasse do SUS (R$ 211); as transferências para a educação (R$ 51); as compensações financeiras (R$ 42); os recursos para a assistência social (R$ 12) e as demais transferências e convênios (R$ 22). O valor total das transferências estaduais per capita é de R$ 612. A maior parte dos recursos é proveniente do ICMS (R$ 483), seguindo-se em importância o repasse do IPVA (R$ 90) e das demais transferências e convênios (R$ 40). Pacto Federativo Em teoria a reconstrução do Pacto Federativo, reclamado há várias décadas pelos Municípios, é simples. Bastaria equacionar uma regra de três: redefinir os encargos para em seguida redistribuir os recursos. Entretanto, isto depende de dois importantes fatores: a vontade política dos demais entes federados (União e Estados) e da unidade de reivindicações por parte dos Municípios. Em tempos de poucos recursos financeiros, aí é que as dificuldades de agigantam. Quando foi promulgada a Constituição de 1988, a chamada Constituição Cidadã, os recursos Municipais foram ampliados. O FPM aumentou François E. J. de Bremaeker - consultor
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OBSERVATÓRIO DE INFORMAÇÕES MUNICIPAIS imediatamente de 17% para 20% e nos 5 anos seguintes cresceu 0,5% até 1993, quando chegou a 22,5% do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados. No mesmo momento o atual ICMS foi ampliado dos 20% do que era o antigo ICM para 25% do novo ICMS. E os Municípios ganharam um novo tributo, o IVVC – Imposto sobre a Venda de Combustíveis. Mas 5 anos depois o IVVC foi extinto. Em 2003 o ISS teve ampliada a sua base de tributação. Em 2012 o FPM subiu para 23,5% e em 2015 foi a 24% e em 2016 a 24,5%. O crescimento inicial das receitas (na época da Constituição de 1988), entretanto, não foi suficiente para contrabalançar o grande aumento de encargos quer foram colocados sob a responsabilidade dos Municípios. A prova está no aumento de receitas a cada década, depois de muitas de muitas reclamações dos Municípios e que continuam a crescer, principalmente com as dificuldades financeiras da União e dos Estados. Os descaminhos do Pacto Federativo As pressões sobre as finanças municipais já vem ocorrendo há várias décadas. Tempo aliás em que os Municípios vêm reclamando por um novo Pacto Federativo. As medidas vão sendo aprovadas sem que se faça uma simples simulação dos impactos que se produziriam sobre as finanças municipais. Em 1983 a Emenda Constitucional 24 passou a obrigar que os Municípios aplicassem pelo menos 25% dos seus impostos em educação. Em 1988 a Constituição Federal introduziu a obrigação de aplicar pelo menos 25% dos impostos e das transferências constitucionais em educação. Em 2000 a Emenda Constitucional 29 passou a obrigar os Municípios a aplicar pelo menos 15% dos impostos e transferências constitucionais na área da saúde. Através de legislação infraconstitucional outras obrigações foram sendo imputadas aos Municípios. As mais significativas são: piso nacional para os professores; piso nacional para os agentes de saúde; a judicialização da saúde; a implantação do Programa de Saúde da Família; o Programa das Creches; a obrigatoriedade de atender às crianças de 0 a 5 anos, tudo sem repasse de recursos para sua manutenção, como se os recursos municipais François E. J. de Bremaeker - consultor
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OBSERVATÓRIO DE INFORMAÇÕES MUNICIPAIS fossem infinitos. Depois o problema é diagnosticado como sendo de gestão dos agentes públicos municipais. Mas as coisas não param por aí. Quando foi implementado o Fundef, sob a alegação de que os recursos deveriam ser direcionados de acordo com o número de alunos matriculados na rede de ensino, parte dos recursos foram deslocados dos Municípios de pequeno porte demográfico para os Estados ou para Municípios de médio e grande porte demográfico, incentivando a que os Municípios passassem a universalizar o atendimento aos alunos do ensino fundamental. Quando 10 anos depois foi implementada a transição do Fundef para o Fundeb, inserindo no programa o ensino médio, mais uma vez não foi feita a conta do impacto financeiro, vez que os recursos adicionados ao Fundo cresceram 37% e o número de alunos aumentou em 62%! Atualmente além de novos programas em vias de implantação estarem sendo gestados, encontra-se em vias de aprovação no Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição que atribui aos Municípios também a coresponsabilidade na área da segurança pública, cuja Lei que detalha as obrigações dos Municípios, inclusive com a ampliação do contingente das guardas municipais em todos os Municípios, já foi aprovada há mais de um ano. Estudos elaborados pelo Observatório de Informações Municipais mostram que o custo imputado aos Municípios na manutenção de programas, serviços e ações de responsabilidade dos Estados e da União, representava um montante de pelo menos R$ 30 bilhões em 2015, sendo que em termos relativos, o custo recai proporcionalmente mais para os Municípios de menor porte demográfico. A população não tem conhecimento do que compete a cada ente federado realizar. Se alguma coisa funciona mal, a população reclama para o agente político mais próximo que é o Prefeito. E é ele que responde pela precariedade dos serviços dos demais entes federados e acaba tendo de alocar recursos municipais para que serviços estaduais e federais aconteçam. Um triste exemplo tem sido a manutenção das Unidades de Pronto Atendimento na área da Saúde (UPAs), cujas despesas deveriam ser repartidas igualmente pelos três entes federados. Mas a União tem atrasado os repasses e muitos Estados pararam de transferir recursos e o resultado final é
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OBSERVATÓRIO DE INFORMAÇÕES MUNICIPAIS que muitos Municípios têm sido obrigados a fechar as UPAs pois não suportam mais os seus custos. O efeito real da mudança de responsabilidades Dados levantados em 1972 pelo IBGE através de convênio firmado à época entre o IBAM e Ministério do Planejamento, mostram como depois de 4 décadas alteraram-se significativamente as despesas municipais, fruto do aumento de encargos a eles atribuídos. Em 1972 os Municípios aplicavam 14,82% dos seus recursos na função educação e cultura. Hoje em dia estas duas funções, que na época eram unificadas, consomem 26,95% dos recursos municipais. Em 1972 os Municípios aplicavam 5,67% dos seus recursos na função saúde e saneamento. Hoje em dia estas duas funções, que na época eram unificadas, consomem 25,42% dos recursos municipais. Em 1972 os Municípios aplicavam 27,41% dos seus recursos na função urbanismo. Hoje em dia estas duas funções, que na época eram unificadas, consomem 11,09% dos recursos municipais. Hoje o conjunto dos Municípios aplica em educação, cultura, saúde e saneamento o equivalente a 52,37% de todos os seus recursos. A necessidade principalmente por parte dos Municípios de maior porte demográfico em atender às necessidades da função urbanismo têm sido feitas através da tomada de empréstimos, que os levaram à preocupante situação de grandes devedores. Na apresentação realizada quando do Encontro Nacional de Prefeituras fiz um paralelo com um acidente de avião. Esta ocorrência se deve a uma sucessão de fatores que levam à queda do avião. Hoje vejo os Municípios como um avião que está em processo de queda. A sucessão de fatores, que são todos os encargos colocados sob a responsabilidade dos Municípios, os estão deixando sem combustível para continuar o vôo em segurança. Este foi o motivo pelo qual grande parte dos Prefeitos desistiu da reeleição. E daqueles que a tentaram, o índice de sucesso foi o mais baixo de todo o período em que é permitida a reeleição.
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