Análise
Custas processuais e custos de arbitragem: valores comparáveis? Duarte Gorjão Henriques Sócio da BCH Advogados
A ideia comum que circula entre estudiosos dos fenómenos processuais é clara e de simples formulação: os custos de arbitragem levam a concluir que se trata de um meio de resolução de litígios para cidadãos abastados. Para avaliar o acerto desta ideia, foi publicado há poucos anos um estudo conduzido sob a égide da Fundação Francisco Manuel dos Santos, o qual formulou um comparativo entre os custos associados a um processo judicial e a um processo de arbitragem, concluindo que o último é apenas mais caro em acções que apresentem um valor inferior a cerca de dois milhões de euros, enquanto que, acima de tal valor, o Estado cobraria mais. Será assim? Sem cuidar agora de qualquer rigor nos cálculos, tomemos como exemplo uma acção com um valor de 100 milhões de euros. As custas finais devidas nos termos do Regulamento das Custas Processuais ascenderiam a aproximadamente € 1,2 milhões. Se consultarmos alguns centros de arbitragem, poderíamos chegar a valores de 500 ou 700 mil euros, o que se revela inferior àquele. Quer um, quer outro dos valores são absolutamente incomportáveis para o cidadão comum. Porém, nem umas nem outras são tão elevadas, tudo dependendo do quadro de regras que vier (e como vier) a ser aplicado. Com efeito, no caso das custas judiciais, o art. 6 do Regulamento de Custas Processuais permite que seja dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça em acções acima de € 275.000 (quando a “especificidade da situação o justificar e o juiz de for-
A bem da certeza jurídica e da equidade, será crucial que, de uma vez por todas, se fixe um regime de custas processuais claro e que leve em linha de conta que os custos de funcionamento da Justiça são já suportados por todos os contribuintes.
“Há que realçar que nem toda a arbitragem é luxuosa. Quando as partes recorrem a arbitragem ad hoc, dispõem de ferramentas para controlar os custos, designadamente acertando com os árbitros o montante dos seus honorários”
ma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”). Este dispositivo legal tem sido interpretado e aplicado nos nossos tribunais, até por força de decisões do tribunal constitucional, de modo a constituir um verdadeiro “poderdever” do juiz: é uma faculdade que o juiz deve usar. Apesar dos seus contornos fluidos, tem-se entendido que “causa complexa” é a que: tem articulados ou alegações prolixas; tem questões de elevada especialização jurídica ou técnica, ou com análise combinada de diversas questões jurídicas; ou que envolva um elevado número de testemunhas, uma prova complexa ou morosa. Como se vê, ainda assim, a margem de discricionariedade deixada ao juiz neste “poder-dever” é considerável. Embora não se acredite que se fixem valores exorbitantes, a incerteza está ali à espera da conta final. De todo o modo, parece precipitada qualquer pretensão de que os tribunais judiciais são mais caros que os tribunais arbitrais. Seja como for, embora não seja este o local apropriado para discutir as diferenças entre arbitragem e contencioso judicial e não esquecendo que abordamos aqui apenas o tema dos custos, há que realçar que nem toda a arbitragem é “luxuosa”. Por um lado, quando as partes recorrem a arbitragem “ad hoc”, estas dispõem de ferramentas para controlar os custos, designadamente acertando com os árbitros o montante dos seus honorários. Exemplo disso são as arbitragens de medicamentos onde, por acordo entre as partes, se
16 advocatus abril 2017
“Há exemplos de centros de arbitragem, que não são propriamente de consumo, que oferecem soluções de arbitragem que asseguram qualidade a preços bastante acessíveis”
praticam valores de algum modo padronizados e distanciados da relevância pecuniária dos interesses em jogo. Por outro lado, exemplos de centros de arbitragem – que não são propriamente de “consumo” – oferecem soluções de arbitragem que asseguram qualidade a preços bastante acessíveis. Vejam-se os casos do Arbitrare para litígios de propriedade industrial e do Centro de Arbitragem da Propriedade e do Imobiliário, para litígios desta natureza. Em suma, nem uma é tão cara, nem a outra é tão barata. Mas, a bem da certeza jurídica e da equidade, será crucial que, de uma vez por todas, se fixe um regime de custas processuais claro e que leve em linha de conta que os custos de funcionamento da Justiça são já suportados por todos os contribuintes.