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II Série-C — Número 29 Segunda-feira, 20 de Julho de 2009 X LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009) SUMÁRIO Comissões parlamentares: Comiss...
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II Série-C — Número 29

Segunda-feira, 20 de Julho de 2009

X LEGISLATURA

4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2008-2009)

SUMÁRIO Comissões parlamentares: Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas: Relatório final.

RELATÓRIO

COMISSÃO EVENTUAL PARA O ACOMPANHAMENTO DAS QUESTÕES ENERGÉTICAS

JULHO DE 2009

Relator: Deputado Jorge Seguro Sanches, do PS

20 DE JULHO DE 2009 3 ____________________________________________________________________________________________________________

ÍNDICE NOTA PRÉVIA PARTE I - ENQUADRAMENTO 1.1.

A Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas (CEAQE)

1.2.

Metodologia

1.3.

Audições

1.4.

Visitas de trabalho

PARTE II- DIAGNÓSTICO DA SITUAÇÃO ACTUAL 2.1. A dependência energética do país e a sua evolução 2.2. A expressão e o potencial das Energias Renováveis (a energia hídrica, a energia eólica, a co-geração, o aproveitamento de resíduos para fins energéticos, etc.) 2.3. O sub-sector eléctrico 2.4. O sub-sector do Gás Natural 2.5. Os combustíveis 2.6. Os preços, os custos da energia e a competitividade 2.7. A energia e os transportes 2.8 A investigação no sector da energia 2.9 O papel do Estado no sector da energia e as perspectivas para o futuro – as políticas europeias, o MIBEL e o mercado interno de energia 2.10 - Os compromissos, os constrangimentos e as oportunidades derivados da política internacional sobre Alterações Climáticas e limitação das emissões de Gases com Efeito de Estufa (gees); PARTE III - A URGÊNCIA DE UM NOVO PARADIGMA 3.1. As energias renováveis 3.2. O potencial do seu desenvolvimento em Portugal e a relevância dos impactes económicos e ambientais delas decorrentes 3.2.1 Energia das ondas 3.2.2. Energia solar 3.2.3 Energia eólica 3.3. O futuro do aproveitamento da energia das ondas e das marés; 3.4. Os combustíveis derivados de resíduos 3.5. A Geotermia 3.6. A micro-geração 3.7. A fusão nuclear

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3.8. O futuro: A passagem dos sistemas actuais de fissão nuclear para os de fusão de átomos de elementos leves 3.9 - As necessidades de adaptação das redes de transporte e de distribuição de electricidade 3.10 - A oferta energética em termos gerais e particularmente nas renováveis – eólicas, hidroeléctricas, biocombustíveis 3.11.– As biomassas agrícolas 3.12. O papel do Estado articulação com orientações comunitárias PARTE IV - A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA CONCLUSÕES

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NOTA PRÉVIA A energia não se produz, transforma-se. A elaboração de um relatório com a dimensão e a importância do actual pecará sempre por defeito. Pela riqueza extraordinária, quer das audições, quer das apresentações, da conferência e acima de tudo do tema, este documento é apenas uma síntese, necessariamente incompleta, da qual fazem parte integrante todas as actas, apresentações e documentos de trabalho que constituem o espólio documental da Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas (CEAQE). Este Relatório não pretende ser um trabalho científico ou mesmo técnico. É um documento que resulta de muitas horas, dias e meses de contacto com um conjunto considerável de agentes do apaixonante e determinante mundo da energia. O seu objectivo, mais do que identificar o caminho já percorrido, é acima de tudo de encontrar saídas e oportunidades e colocar a política ainda mais ao serviço de um combate decisivo para o país e para a humanidade. Esta é talvez a questão mais importante e premente a ponderar, na definição de um modelo de vida sustentável para a Humanidade. O modelo de consumo energético assente em energia barata e inesgotável, consolidado nos últimos 150 anos, foi esgotado. A ineficiência e o desperdício energéticos têm forçosamente os dias contados. No último ano, às razões ambientais acresceram – por força do aumento do preço do petróleo – as razões económicas: a opinião pública mundial terá realmente percebido que está em curso uma mudança de paradigma ao nível da energia? E que a época do petróleo barato terminou mesmo? Não possuindo reservas próprias de petróleo ou de gás, Portugal nunca teve, dentro das suas fronteiras, energia fácil e barata quando no mercado externo a energia era fácil e barata. Mandaria o bom senso que, durante esse período, o País tivesse desenvolvido tecnologia e saber que nos permitisse, quando a energia deixasse de ser barata, encontrar alternativas ao petróleo. Mas não. foi isso que se passou.

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No que concerne à energia, Portugal apresenta duas características distintas e de algum modo contraditórias: um elevado potencial nas renováveis – Portugal tem sol, vento, mar e rios com capacidade para produzir energia – mas simultaneamente uma total dependência energética do exterior, tão forte quanto a dependência das energias fósseis. Portugal consome ainda cerca de 85% da sua energia primária, com base em fontes não renováveis de energia (59% petróleo, 14% gás natural e 12% carvão) e totalmente adquiridas ao exterior, contribuindo decisivamente para o desequilíbrio constante das contas nacionais. Portugal é um país que apesar de apresentar um elevado potencial energético – renovável na sua quase totalidade – não promoveu o seu desenvolvimento durante décadas e décadas. A Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas (CEAQE) surge na Assembleia da República num momento a humanidade cada vez mais toma consciência de uma mudança de paradigma e em que o atraso nacional é pouco justificável, tendo em conta que o nosso país importa, ontem como hoje, mais de 80% da energia que consome, o que corresponde a mais de 4% do Produto Interno Bruto (PIB). A dificuldade que se destaca nas nossas agendas pode ser contudo uma grande oportunidade para o nosso país: - combatendo as alterações climáticas, em muito resultantes das emissões de CO2 dos processos de transformação de energia; - diminuindo a dependência energética, quer aumentando a componente endógena, quer aumentando o número de países fornecedores; - criando oportunidades de negócio para a economia nacional, abrindo condições a uma área onde a inovação é bastante importante. As empresas e os países que souberem liderar a mudança de paradigma serão os vencedores do mundo dos próximos anos. Uma nota final de agradecimento a todos os Deputados que arduamente colaboraram com o trabalho agora apresentado, bem como aos serviços de apoio de que destacamos a Dra. Margarida Rodrigues e o Sr. António Carlos Pereira.

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PARTE I - ENQUADRAMENTO 1.1.

A Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas (CEAQE)

A Comissão Eventual de Acompanhamento das Questões Energéticas foi criada pela Resolução da Assembleia da República nº 66/2006, publicada no Diário da República I – A Série, nº 234, de 6 de Dezembro, na sequência do Projecto de Resolução n.º 158/X, do Grupo Parlamentar do PSD, que recolheu unanimidade em todas as bancadas parlamentares. Os trabalhos da Comissão iniciaram-se em Maio de 007, de acordo com a seguinte a composição: Agostinho Lopes / Presidente (PCP) Renato Sampaio / Vice-Presidente (PS) Vasco Cunha / Secretário (PSD) Afonso Candal (PS) Glória Araújo (PS) Isabel Jorge (PS) Jorge Seguro Sanches (PS) José Lamego (PS) Manuela de Melo (PS) Maximiano Martins (PS) Mota Andrade (PS) Nuno Sá (PS) Paula Barros (PS) Paula Cristina Duarte (PS)

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Carlos Poço (PSD) José Eduardo Martins (PSD) Luís Carloto Marques (PSD) Miguel Almeida (PSD) António Carlos Monteiro (CDS-PP) Hélder Amaral (CDS-PP) Honório Novo (PCP) Alda Macedo (BE) Francisco Madeira Lopes (PEV) Foi possível encontrar um consenso, para a aprovação de um regulamento de funcionamento, do plano de actividades, quer e ainda da metodologia de trabalho. O

objecto

da

Comissão,

tal

como

estabelecido

na

Resolução,

consistiu

fundamentalmente no acompanhamento da política energética e ainda, por acordo entre os partidos e Sua Excelência o Presidente da Assembleia da República, na organização de uma conferência parlamentar sobre o tema, para além da realização de visitas a equipamentos da área da energia. As questões energéticas eram matéria que há 10 anos, preocupavam, essencialmente, os especialistas. Contudo, hoje em dia, é um tema que a todos preocupa e que diariamente ocupa as páginas dos jornais, discutindo-se questões como as tarifas, a dependência energética, as alterações climáticas e os efeitos da política energética sobre outros sectores fundamentais como o agrícola e o alimentar Tornou-se, de facto, um tema de sociedade e é uma das mais importantes questões civilizacionais que teremos de enfrentar. Como anteriormente já foi referido, este documento não se trata de um relatório técnico, nem tão pouco poderá ter a ambição de fechar qualquer uma das questões que nos propusemos abordar. O objectivo deste documento, do qual fazem parte

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todas as actas das audições – bem como os documentos e apresentações anexas – é contribuir para um balanço analítico da situação energética actual. O clima está a mudar mais do que aquilo que se esperava. A economia do carbono tem os dias contados. Portugal pode transformar esta dificuldade numa oportunidade. 1.2.

Metodologia

Para a elaboração do relatório, procedeu-se à selecção e posterior audição de entidades – empresas, instituições do domínio público e privado, universidades e centros de investigação e ainda personalidades diversas, para que, sempre que possível, fossem abordadas as componentes do diagnóstico energético actual e as tendências de opções para o futuro. O critério obedeceu à tentativa de audição de todos os sectores relacionados com energia, com uma atenção muito particular para as fileiras endógenas. 1.3.

Audições

Realizaram-se as seguintes audições: A 4 de Julho de 2007, o Presidente da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE), Prof. Doutor Vítor Santos; A 11 de Julho de 2007, o Ministro da Economia e Inovação, Doutor Manuel Pinho; A 18 de Julho de 2007, o Presidente da Associação das Empresas de Construção e Obras Públicas (AECOPS), Eng. Joaquim Fortunato e o Presidente da Rede Eléctrica Nacional (REN), Eng.º José Penedos; A 14 de Setembro de 2007, o Secretário-Geral e o Vice-Presidente da Confederação de Agricultores de Portugal (CAP), respectivamente, Eng. Luís Mira e Eng. Luís Bulhão Martins; A 18 de Setembro de 2007, o Vice-Presidente da Associação Nacional de Conservação da Natureza (QUERCUS), Professor Francisco Ferreira, e ainda o Director-Geral e o Director da Área de Auditoria Energética da Agência para a Energia (ADENE), respectivamente, Dr. Alexandre Fernandes e Eng.º Paulo Santos;

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A 25 de Setembro de 2007, o Presidente da GALP Energia, Eng.º Ferreira de Oliveira e o Secretário-Geral da Associação Portuguesa para a Defesa dos Consumidores (DECO), Dr. Jorge Morgado; A 16 de Outubro de 2007, o Director-Geral de Energia e Geologia (DGGE), Dr. Miguel Barreto e o Presidente da Associação Nacional de Revendedores de Combustíveis (ANAREC), Augusto Cymbron; A 23 de Outubro de 2007, o Presidente Liga de Protecção da Natureza (LPN) Eng. Eugénio Menezes de Sequeira e o Membro do Conselho Directivo da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), Eng. Joaquim Barreto; A 25 de Outubro de 2007, o Administrador da Energy Systems and Infrastructures (ENERSIS), Dr. Afonso Proença e o Presidente do Conselho de Administração da Energias de Portugal (EDP), Dr. António Mexia; A 30 de Outubro de 2007, o Presidente da Associação Portuguesa de Energia (APE), Eng. José Penedos e o Presidente do Instituto da Água (INAG), Dr. Orlando Borges; A 31 de Outubro de 2007, o Presidente do Conselho de Administração da (CARRIS), Dr. José Manuel Silva Rodrigues e o Presidente da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN), Prof. Doutor António Sá da Costa; A 6 de Novembro de 2007, o Presidente da Comissão Executiva da Associação Portuguesa de Co-Geração (COGEN), Eng. Álvaro Brandão Pinto, e o Director do Departamento de Energias Renováveis do Instituto Nacional de Engenharia e Tecnologia e Inovação (INETI), Dr. António Joyce; A 20 de Novembro de 2007, o Secretário-Geral da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APETRO), Eng. José Horta e o Administrador dos Caminhos de Ferro Portugueses (CP), Prof. Nuno Moreira; A 21 de Novembro de 2007, o Presidente da ENDESA PORTUGAL, Eng. Nuno Ribeiro da Silva; A 4 de Dezembro de 2007, o Professor da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, Prof. Eduardo Oliveira Fernandes;

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A 18 de Dezembro de 2007, o Presidente da Sociedade Ibérica de Oleaginosas, SA (IBEROL), Sr. João Rodrigues e o Professor Catedrático da Universidade de Évora, Prof. Namorado Rosa; A 8 de Janeiro de 2008, o Presidente da Empresa Geral de Fomento (EGF), Eng. António Branco e o Professor do Instituto Superior Técnico (IST), Prof. Carlos Varandas; A 12 de Fevereiro de 2008, a Presidente do Conselho de Administração do Sociedade de Transportes Colectivos do Porto, SA, (SCTP), Dra. Fernanda Menezes e o Prof. Jorge Freire, também da Administração do SCTP; A 19 de Fevereiro de 2008, os Representantes do Conselho Coordenador da Rede Nacional de Agências de Energia (RENAE), Prof. Joaquim Borges Gouveia, Eng. Melim Mendes, Eng. Luís Fernandes e Eng. Luís Silva e, o Director da Wave Energy Centre (WEC), Prof. António Sarmento; A 4 de Março de 2008, o Presidente da IBERDROLA, Dr. Joaquim Pina Moura; A 11 de Março de 2008, o Administrador da empresa Desenvolvimento de Sistemas para Energias Alternativas, SA (AGNI-INC), Eng. Luís Vieira; A 25 de Março de 2008, o Presidente da Associação Portuguesa de Distribuidores de Propano Canalizado (ADPC), Eng. Artur Caracol e os Presidente e Vice-Presidente da Associação Portuguesa do Veículo a Gás Natural (APVGN), respectivamente, Eng. Marques dos Santos e Sr. Jorge Figueiredo; A 8 de Abril de 2008, o Representante Português no MIBEL, Prof. Luís Braga da Cruz, e a Representante em Portugal da Comissão Europeia, Dra. Margarida Marques; A 30 de Abril de 2008, o Prof. Carlos Borrego; A 14 de Maio de 2008, os Representantes da Associação Industrial Portuguesa (AIP), Dr. Nuno Ribeiro da Silva e os Representantes do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS), Prof. Filipe Duarte Santos, Prof. Lima Santos e Dr. Henrique Duarte;

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A 20 de Maio de 2008, o Presidente da Confederação da Indústria portuguesa (CIP), Eng. Francisco Van Zeller, e o Representante do Fundo Português do Carbono, Dr. Nuno Lacasta; A 28 de Maio de 2008, o Presidente da empresa Soluções Racionais de Energia, SA (SRE), Eng. José Campos Rodrigues e os Representantes da DREEN Europa, SGPS, SA, Profs. Diogo Vaz Guedes e Manuel Collares Pereira; A 3 de Junho de 2008, o Presidente do Conselho de Administração da empresa ALGAFUEL, Eng. Nuno Coelho, e a Responsável pela investigação com microalgas do INETI, Dra. Fernanda Rosa; A 4 de Junho de 2008, o especialista em Geotermia, Prof. Carlos Calado; A 11 de Junho de 2008, o Director-Geral da Agência Portuguesa de Ambiente (APA) Autoridade Nacional de Resíduos, Eng. Gonçalves Henriques e o Bastonário da Ordem dos Engenheiros, Eng. Fernando Santo; A 17 de Junho de 2008, o Professor do Instituto Superior Técnico, Prof. Carlos Alegria; A 18 de Junho de 2008, o Membro da Mesa da Assembleia-Geral da EDF-EN, Eng. Carlos Pimenta e o Presidente da Transportadora Aérea Portuguesa (TAP), Eng. Fernando Pinto; A 16 de Setembro de 2008, o Comissário Europeu para a Área da Energia, Sr. Andris Piegals; 1.4.

Visitas de trabalho

A Comissão procurou inteirar-se in loco quer das infra-estruturas mais relevantes do ponto de vista energético nacional, quer de alguns dos caminhos e opções que hoje são traçados, de uma forma inovadora. Independente do trabalho individual desenvolvido por cada Deputado e pelos Grupos Parlamentares, foram realizadas visitas de trabalho ao Edifico Solar XXI, à estação de terra do Parque de Ondas Aguçadora 1 da CEO - Companhia de Energia Oceânica, ao Porto de Leixões para observação do equipamento Pelamis (estruturas semi-

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submersas semelhantes a lagartas para aproveitamento da energia das ondas), às instalações da Cooperativa de Habitação Sete Bicas aos Transportes Urbanos de Braga, a uma empresa de energia eólica, aos estaleiros de metalomecânica da Martifer, a uma Central de Biomassa, ao Centro de Controlo do Operador do Sistema (Despacho) da Rede Eléctrica Nacional (REN), às instalações da Refinaria da Galp Energia, ao terminal de Sines de gás natural da REN, à central termoeléctrica de Sines da EDP e à Central fotovoltáicade Serpa. Em 27 de Outubro, a CEAQE organizou a Conferência “Energia e Sustentabilidade, um novo desígnio”. Este evento parlamentar, que registou uma participação e assistência do público muito relevante, coincidiu com o termo das actividades da Comissão, fornecendo-lhe informação adicional e a consolidação dos temas tratados. O programa da Conferência, cuja sessão de abertura contou com Sua Excelência o Presidente da Assembleia da República, agrupou as intervenções por três painéis temáticos, conforme se apresenta mais abaixo: Primeiro Painel: O diagnóstico da situação actual e o novo paradigma energético Este painel, cuja moderação esteve a cargo do jornalista Luís Ferreira Lopes (SIC), teve como relator o Deputado Jorge Seguro Sanches (PS), incluindo os seguintes oradores: Alfonso Gonzalez Finat – Direcção-Geral da Energia e Transportes da U E André Ribeiro, Administrador Executivo da GALP António Mexia, Presidente da EDP Pina Moura, Administrador da IBERDROLA Portugal Aníbal Fernandes, Presidente da Comissão Executiva da ENEOP - Eólicas de Portugal Segundo Painel: Eficiência Energética O painel que se seguiu, contou com o jornalista Ricardo Garcia (Público) no papel de moderador, tendo o Deputado António Carlos Monteiro (CDS-PP) sido o relator. Os oradores convidados realizaram as suas intervenções de acordo com a seguinte ordem: Victor Santos, Presidente da ERSE

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José Manuel de Almeida Esteves Perdigoto, Director-Geral de Energia e Geologia Francisco Ferreira, Vice-Presidente da QUERCUS Jorge Morgado, Secretário-Geral da DECO Filipe Duarte Santos, Universidade de Lisboa Borges Gouveia, Universidade de Aveiro Terceiro Painel: Energia e Sustentabilidade Finalmente, o último painel contou com a presença do jornalista José Pedro Frazão (Rádio Renascença) como moderador dos trabalhos e com o Deputado Miguel Almeida (PSD) como relator. Os oradores convidados para a terceira e última parte da Conferência foram os seguintes: Humberto Rosa, Secretário de Estado do Ambiente José Penedos, Presidente da REN Graça Carvalho, Assessora do Gabinete do Presidente da Comissão Europeia Carlos Pimenta, Membro da Assembleia-Geral da EDF EN Mira Amaral, IST Namorado Rosa, Universidade de Évora Um CD contendo a gravação áudio da conferência encontra-se disponível em anexo ao presente relatório.

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PARTE II- DIAGNÓSTICO DA SITUAÇÃO ACTUAL 2.1. A dependência energética do país e a sua evolução Em 2008, a factura energética do país agravou-se em 2,1%, para 6.484 milhões de euros. Este facto não é novo, é o resultado de uma tendência. Na década de 90, Portugal importou sistematicamente mais de 85% da energia primária que consumiu e foi no espaço europeu, a seguir ao Luxemburgo (100% dependente), o país da União Europeia com maior procura energética externa. Desagregando as fontes de energia primária consumida por Portugal, apercebemonos de uma tendência na primeira década deste milénio (considerando os anos de 2000 e 2007): No petróleo, decrescendo de 62% para 55%; No carvão, decrescendo de 15% para 12%; Na hídrica, mantendo 4%; No gás natural, aumentando de 8% para 15%; Na biomassa, aumentando de 11% para 12% E o surgimento pela primeira vez da energia eólica e da geotermia. Em termos internacionais e de acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE), a procura mundial de energia deverá crescer 25% até 2015, e 50% até 2030. Entre 2003 e 2030 a procura de electricidade deverá duplicar, atingindo um peso de 20% no consumo final de energia. Os países fora da OCDE serão responsáveis por mais de 70% do crescimento. O gás natural representa actualmente 21% do consumo mundial de energia primária. Entre 2005 e 2010 prevê-se que esse consumo cresça cerca de quinze pontos percentuais. É de salientar que nos países da OCDE, o crescimento do consumo de gás natural está normalmente associado à produção de electricidade. No entanto, no seu conjunto, detêm apenas 9% das reservas mundiais desse combustível.

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Sabemos que mais de 1.000 milhões de pessoas ainda não entraram no mercado de consumo de energia. E se é certo que a chegada de mais consumidores é uma boa notícia para a diminuição da pobreza no mundo, corresponderá por outro lado a um aumento da procura, sendo que o volume de reservas mundiais é inferior a essa procura. De referir ainda que o peso do preço do petróleo em Portugal, tem aproximadamente o dobro da importância que tem nos restantes países da União Europeia (0,054% na UE25 para 0,107% em Portugal, em relação ao PIB). Ficou claro para a CEAQE que a tendência do consumo de energia em Portugal é de crescimento, como é evidente no quadro seguinte. Fig. 1 Evolução do fornecimento de energia primária a Portugal (fonte Agência para a Energia)

Também claro parece ser o facto de que a economia portuguesa é mais dependente do petróleo (59%) do que a média europeia (36,7%) e a quase totalidade das suas congéneres europeias.

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Fig. 2 Consumo de energia na UE e em Portugal - 2005 Renewabl es 6,7%

Others 0,2%

Solid fuels 17,7%

Gás Natural Saldo Importador 14% de Electricidade 2%

Nuclear 14,2%

Renováveis (incluindo hídrica) 13%

2005

Natural gas 24,6%

Crude oil and petroleum products 36,7%

Carvão 12% Petróleo 59%

Fonte: Eurostat e REN

Fig. 3 O “peak oil” e a esgotabilidade do petróleo.

Em linhas gerais, poder-se-ão caracterizar as opções políticas e estratégicas no sector da energia em Portugal desde 1950, da seguinte forma: Nos anos 50, a chamada década de ouro da hidroeléctrica nacional, foram definidas as principais construções de barragens e o Plano de Electrificação Nacional. Em 1954, através do Decreto – Lei n.º 39 580, de 29 de Março de 1954, foi criada a Junta de Energia Nuclear e a Comissão de Estudos de Energia Nuclear do Instituto de Alta Cultura (16 anos após a descoberta da cisão dos núcleos de átomos de urânio, sob a acção de

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neutrões)1. Entre 1960 e 1974 (até ao primeiro choque petrolífero), observou-se uma aposta nas centrais termoeléctricas a fuelóleo (abertura das Centrais de Setúbal e Carregado) e, nos anos seguintes com o Plano Energético Nacional (de 1983 a 1990) à aposta no carvão para diminuir o peso do petróleo, com as Centrais a carvão de Sines2 e do Pego/Abrantes. A partir de 19943 assistiu-se a uma aposta clara na criação de uma rede de gás natural4 (com a construção de gasodutos e do terminal de Sines). Todavia, é em 11 de Setembro de 2001 que se assinala o início de um novo choque petrolífero mundial, marcado pelo ataque às torres gémeas de New York e ao aumento de instabilidade na zona do Médio Oriente. Este facto, cruzado com as preocupações mundiais relativamente às alterações climáticas, levou a que os países europeus acelerassem o esforço para a criação, pesquisa e investigação de novas fontes de produção de energia, menos poluentes e de maior segurança no abastecimento. Fig 4 Evolução da potência instalada em Portugal

Fonte: DGEG

É um dado evidente que a Europa é um continente que se caracteriza por ter uma forte dependência energética. Hoje em dia, 50% do consumo total depende de Recorrentemente discute-se a opção nuclear em Portugal. Em 2007 o Presidente da República, Cavaco Silva declarou que “"a energia nuclear, com certeza, virá a ser discutida em Portugal como está a ser discutida noutros países". 1

2

1985 A introdução efectiva do gás natural ocorre em 1997. 4 Cujos preços estão indexados aos do petróleo. 3

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importações do exterior e, se nada fosse feito, esse índice passaria rapidamente de 50% para 65%. É sabido que a União Europeia se encontra muito dependente das importações de energia do exterior, pelo que, nesse quadro e face à grande volatilidade e crescimento dos preços internacionais, a competitividade da economia europeia estará em causa se nada for feito, em termos substanciais, no que se refere a soluções endógenas que simultaneamente sejam uma mais-valia ambiental. Ao nível da União Europeia os objectivos estão definidos e, até 2020, vinte por cento da oferta total de energia será baseada em renováveis. Como já foi referido, em Portugal assistiu-se a uma evolução, semelhante à que ocorreu, aliás, na maior parte dos países europeus, relativamente à estrutura do consumo de energia primária. Tal evolução na energia primária, traduz o maior ou menor grau de diversificação energética e aquilo que se passou em Portugal foi um pouco aquilo que ocorreu na maior parte dos países europeus em que, em consequência dos choques petrolíferos houve um efeito de substituição, por via do qual, de forma progressiva e gradual, o petróleo foi sendo progressivamente substituído por outras formas de energia — no caso português, pelo gás natural e pelo carvão e, no caso europeu, em média, por esses dois combustíveis e também pela energia nuclear. No nosso país o petróleo já representou 80% das necessidades energéticas, representando actualmente cerca de 60% da energia consumida, observando-se aqui um efeito de substituição, visto uma parte do petróleo que era utilizada no consumo, ter sido substituído pelo gás natural e pelo carvão. 2.2. A expressão e o potencial das Energias Renováveis (a energia hídrica, a energia eólica, a co-geração, o aproveitamento de resíduos para fins energéticos, etc.) A Directiva das Energias Renováveis 077/CE/2001 impôs que em 2010, no mínimo cerca de 39% da electricidade consumida em Portugal, seja de origem renovável. Em Janeiro de 2007, o Governo aumentou esse valor para 45%. Alcançando esta meta,

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Portugal estará, em termos relativos, na linha da frente das energias renováveis, juntamente com a Áustria e a Suécia. É importante destacar que em Portugal, especialmente a energia eólica, tem alcançado um crescimento espantoso. Com efeito, em 2005, Portugal foi o país da União Europeia que mais cresceu na capacidade de produção de energia eólica. Em 2006 Portugal assinalou também o segundo maior crescimento, em resultado da aposta de licenciamento de parques eólicos iniciada em 2002 e da aplicação de uma tarifa amiga das renováveis. Fig 5 Energia renovável em Portugal

Fonte: APREN

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Fig 6 - Os 10 países com maior potencial eólico

Fonte: APREN

Portugal é um dos países da União Europeia com maior potencial hídrico por explorar e maior dependência energética do exterior, mas também um dos que menos cresceu em termos de capacidade hídrica, nos últimos 30 anos. Fig 7 - Potencial hídrico versus dependência energética

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Fonte: INAG

Fig 8 - Potencial hidroeléctrico aproveitado 96%

95%

95% 85% 75%

70%

70%

46%

Germany

France

Italy

Spain

Sweden

Austria

Finland

Portugal

42%

Greece

Fonte: REN

Numa primeira fase foi definido como objectivo, atingir 5.575 MW de potência instalada já em 2010, através da duplicação da central de Alqueva e da antecipação dos reforços de potência nas centrais de Picote e Bemposta. Com a aprovação do Plano Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico (PNBEPH), pretendeu-se ainda, até 2020, superar os 7.000 MW de potência hídrica instalada, permitindo a Portugal passar a utilizar 70% do seu potencial, contra os 46% actuais. Os novos aproveitamentos do PNBEPH (2020) possuirão uma potência instalada total de 1 100 MW. Considera-se que se atingirá a meta estabelecida de potência total instalada em 2020 (70% do potencial identificado ou seja cerca de 7 000 MW), evitando-se desse modo, cerca de 550.000 ton./ano de emissões de CO2 (comparação com produção em centrais térmicas equivalentes, sem considerar o transporte da matéria-prima) e a importação de 330 000 toneladas de combustível, por ano. O Plano de Barragens virá assim permitir um conjunto de investimentos de iniciativa pública totalmente concebidos e financiados pelos privados de elevada, A valia energética daí resultante traduzir-se-á: 

No aproveitamento de recursos endógenos, em substituição dos combustíveis fósseis;



Na redução da dependência energética externa;

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Na Complementaridade com energia eólica;

Quanto à Valia ambiental, destaca-se: 

a redução de emissões de GEE;



a criação de reserva estratégica da água para abastecimento, incêndios e outros;



a regularização de caudais e controlo de cheias.

Finalmente, a Valia económica e social traduzir-se-á em: 

criação de empregos;



aumento do PIB;



desenvolvimento regional.

Este Plano corresponde a uma mudança de paradigma em Portugal, porque antes a localização das barragens dependia de entidades privadas, seleccionadas apenas pelo seu potencial hidroeléctrico, sem qualquer planeamento, sem contrapartidas para o Estado e sem concurso. Com o Plano de Barragens, a localização destes empreendimentos é definida pelo Estado, tendo por base o potencial hidroeléctrico, social e ambiental, com base num planeamento e numa avaliação ambiental

estratégica

prévios,

com

contrapartidas

financeiras

e

com

procedimentos concursais abertos e transparentes, com a obrigação destes empreendimentos garantirem outros usos, nomeadamente abastecimento e rega.

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Fig 9 - Produção de electricidade a partir de fontes de energia renováveis

Fonte: DGEG

2.3. O sub-sector eléctrico A electricidade representa cerca de 25 % da energia consumida no mundo. Em Portugal representa mais de 30%. Este consumo é todavia pouco diversificado, embora com o crescimento sustentado da componente renovável (em 2000 era cerca de 31%, em 2007 de 41% e em 2008 de 43%) prevendo-se mesmo que ultrapasse os 60% em 2020. O sector energético nacional confronta-se com algumas fragilidades, tais como, uma fraca diversificação energética (o peso das fósseis continua a ser preponderante) com uma grande dependência externa e ainda uma forte dinâmica da procura. Essa dinâmica da procura, em termos de consumo de energia, sendo um bom indicador de desenvolvimento e de crescimento económico, coloca no entanto problemas ao nível do funcionamento do sistema energético, podendo igualmente criar problemas ao nível da própria forma como essa energia é consumida e utilizada. A organização do Sistema Eléctrico Nacional (SEN) assenta na existência de dois mercados, um Mercado Liberalizado e um Mercado Regulado sendo que os agentes económicos têm a opção de estabelecer relações contratuais com o Comercializador Regulado, ao abrigo das condições aprovadas pela ERSE, ou negociar outras condições com os Comercializadores em Mercado Liberalizado (ML).

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Desde 1999, a abertura de mercado começou a ter efeitos para os consumidores em níveis de tensão mais elevados, tendo sido progressivamente alargada a todos os consumidores de energia eléctrica. Em 2000, sentiram-se os primeiros efeitos da liberalização, mas foi em 2002 que se verificou um significativo aumento do número de Clientes, quando o acesso ao Mercado Liberalizado (ML) passou a abranger todas as instalações, excepto as ligadas em Baixa Tensão (ver gráfica abaixo). Parte destas últimas, as ligadas em Baixa Tensão Especial (BTE), vieram a ter acesso ao mercado em 2004. A partir de 4 de Setembro de 2006, com a liberalização da Baixa Tensão Normal (BTN), todos as instalações, independentemente do nível de tensão a que estão ligados às redes, passaram a ter condições para eleger o seu fornecedor de electricidade.

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Fig 10 - Rede Nacional de transporte de Electricidade (2007)

Fonte: REN

2.4. O sub-sector do Gás Natural O gás natural tem apresentado um crescimento significativo desde o início da sua utilização em Portugal, em 1997. Portugal iniciou a comercialização de gás natural muitos anos após a maioria dos países europeus.

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A utilização do gás natural apresenta vantagens a diversos níveis. Desde logo apresenta benefícios ambientais, com menores emissões com efeito estufa do que o carvão, o petróleo ou os seus derivados e benefícios ao nível da segurança, pelo facto de o gás natural ser mais leve que o ar. O crescimento do consumo final de gás natural em Portugal tem sido feito à custa da redução de consumo de petróleo, representando uma alternativa aos derivados do petróleo, nomeadamente na produção de electricidade e no sector dos transportes, como já hoje em dia é bem patente. As novas centrais de gás natural em licenciamento, permitirão substituir até 2010, a totalidade de produção a fuel e, uma nova aposta na co-combustão, permitirá substituir cinco a 10% do carvão utilizado em Sines e Pego por Biomassa. Ao nível da segurança no abastecimento de gás natural, é de referir a excelente opção estratégica do terminal de gás natural em Sines, que permite alternativas à principal região abastecedora (o Norte de África). De referir a grande evolução da procura de gás natural nos países da OCDE entre 2000 e 2005, período durante o qual passou de 2.700 milhões de metros cúbicos para 600 mil milhões de metros cúbicos. No que diz respeito ao fornecimento de gás natural a Portugal, sublinha-se a importância do aumento da diversificação esperada a partir de 2009, com a entrada de um novo gasoduto oriundo da Argélia. Ao nível Europeu, o crescimento do gás natural foi muito significativo, existindo actualmente quinze terminais de GNL na Europa, oito em construção ou já aprovados, e mais vinte e oito ainda em fase de estudo. O GNL desempenha funções diferentes em cada país, mas sempre com uma importância crescente. De referir que em Espanha 70% do gás actualmente consumido é GNL. A rede de infra-estruturas portuguesa de gás natural ascende a 1.218km.

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Fig 11 - Rede Nacional de Transporte de Gás Natural (2008).

Fonte: REN

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2.5. Os combustíveis A primeira certeza e garantia que se pode e deve ter em matéria de política dos combustíveis, é a inexorabilidade do seu futuro esgotamento. Derivado desse facto e não só, poder-se-á afirmar, em termos gerais e tentando fazer um diagnóstico do sector energético, que se registou, tanto em Portugal, como na maior parte dos países europeus, uma evolução na estrutura do consumo da energia primária. Ou seja, como consequência dos vários choques petrolíferos, registaram-se efeitos de substituição nessa estrutura, por via dos quais o petróleo foi sendo gradual e progressivamente substituído por outras formas de energia: no caso português, pelo gás natural e pelo carvão e, no caso europeu, em média, por esses dois combustíveis e também pela energia nuclear. Aliás, esta diversificação no mix dos combustíveis é sempre altamente recomendável, sobretudo para casos como o do nosso País, pois em caso de falha de um dos sub-tipos de combustíveis ou em caso de um aumento excessivo de preços, será sempre possível dispor, alternativamente, de uma opção por outros combustíveis a preços que melhor possam satisfazer os nossos interesses e objectivos estratégicos. Caberá, todavia, aqui a registar a manutenção de uma situação de forte dependência externa portuguesa, apesar desta diversificação recente das fontes, desde logo, por via da necessidade da importação do petróleo; Mas, também, hoje em dia, pelo gás natural, pelo carvão, pelo fuelóleo e, até, pela própria electricidade, que, de igual modo, continua a haver necessidade de adquirir no exterior – embora, neste último caso, os nossos índices de importação de energia eléctrica se mantenham como meramente residuais. O único alívio possível - tanto para Portugal, como para outros países – relativamente a esta situação de forte dependência energética externa assenta numa aposta simultânea nos biocombustíveis e nas energias renováveis, a par de maiores níveis de eficiência energética, tanto mais que estas últimas nem sequer reclamam qualquer recurso a combustíveis para a sua produção energética tendo por isso custos de produção sempre fixos, contrariamente ao que sucede com os restantes combustíveis.

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Relativamente aos biocombustíveis, a União Europeia fixou uma meta da sua incorporação nos combustíveis fósseis de 5,75% para 2010 e de 10% para 2020. O objectivo estabelecido pelo Governo português, de 10% de incorporação já para o ano de 2010, é a meta actualmente definida que pode ser considerada uma oportunidade para a agricultura portuguesa. Ainda no tocante aos biocombustíveis, recomendar-se-á, porém, sempre uma prévia e muito criteriosa análise custo/benefício e ambiental. Não enquanto eles sejam obtidos a partir de processos de aproveitamento de resíduos, mas quando, por outra via, impliquem ou levem a uma necessária produção agrícola intensiva, para a obtenção da matéria-prima para a sua (dos biocombustíveis) fabricação, com o consequente e inevitável prejuízo do uso da terra e da agricultura, para a produção fundamental de bens alimentares. É que a desregulação desta última forma de actuação levou já à produção de efeitos acentuadamente negativos, nomeadamente para o sector alimentar e para os meios elementares de subsistência dos povos em geral. Ao nível do funcionamento do mercado, não se revela de todo aconselhável a promoção de um monopólio da GALP no sector dos biocombustíveis, semelhante à que hoje em dia esta empresa já detém, ao nível da grande produção e da distribuição dos combustíveis, em geral. Parece sim, altamente recomendável, uma abertura clara do mercado interno dos biocombustíveis e a adopção de uma política de total transparência de procedimentos e de actuações entre o Estado e a totalidade dos agentes económicos envolvidos. 2.6. Os preços, os custos da energia e a competitividade; O tema dos preços e dos custos é uma questão central na discussão sobre energia. Se para a electricidade e para o gás natural a actividade da fixação de preços é uma competência da ERSE, resultando a tarifa da actividade da regulação, por força da Portaria n.º 1423-F/2003 de 31 de Dezembro, o preço da gasolina sem chumbo IO 95, do gasóleo rodoviário e do gasóleo colorido e marcado, estão liberalizados. Se para os preços regulados, a discussão se centra na forma como são adicionadas inúmeras parcelas ao preço total da energia (contribuindo para aquilo que se tem

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vindo a designar por deficit tarifário), no caso dos combustíveis de transportes a questão do preço foi debatida e investigada pela Autoridade da Concorrência, no sentido de tentar identificar a possibilidade de existir abuso de posição dominante no mercado português. O relatório da Autoridade da Concorrência é público, encontrando-se disponível em http://www.concorrencia.pt/. Apesar de esse documento ser um excelente e muito provavelmente o mais completo trabalho realizado em Portugal sobre o tema, a discussão sobre o preço dos combustíveis rodoviários não está fechada. A publicitação dos preços das diversas gasolineiras quer utilizando “placards”, quer a internet, são medidas que vão num caminho correcto, tal como as medidas que apontam para um aumento das gasolineiras de “marca branca”, tradicionalmente com preços bastante mais reduzidos. De qualquer forma, a discussão em Portugal revelou um deficit bastante relevante sobre o conhecimento dos consumidores, relativamente à forma como são formados os preços. Outra nota igualmente relevante assinalou a diferença muito significativa dos preços dos combustíveis entre Portugal e Espanha, que coloca as gasolineiras portuguesas junto à fronteira em grandes dificuldades, só possíveis de corrigir através de alterações ao nível da política fiscal. 2.7. A energia e os transportes Um terço do consumo de energia na Europa está associado ao sector dos transportes, enquanto que a nível nacional, os transportes são responsáveis por cerca de 35% do consumo energético. O sector dos transportes – a par com o sector da habitação – é um dos mais problemáticos no nosso País, hoje em dia, em termos de eficiência energética. Por isso, uma boa parte do esforço destinado a corrigir a situação de grave ineficiência energética que se verifica em Portugal, deverá incidir sobre este sector. Calcula-se que, se não houver uma inflexão das políticas de energia e de transporte os dois componentes essenciais que pressionam a procura de fontes de energia poderemos vir a estar envolvidos numa situação em que a dependência energética da

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União Europeia passará dos actuais cerca de 50% do consumo total para cerca de 65%, até 2030. Porém, esta problemática dos transportes tem também a montante, questões de desordenamento do território e de falta de estratégias urbanas, bem como a inexistência de um mercado de arrendamento, que permita a real mobilidade aos cidadãos. Algumas soluções práticas e imediatas se apresentam no entanto como viáveis face às situações de facto entretanto criadas, como, por exemplo, a taxação da circulação automóvel em função do número de passageiros que viajam num veículo. Refira-se, também, que algumas medidas já previstas para o sector dos transportes – mas, infelizmente, ainda não implementadas - poderiam vir a ser extremamente importantes. Basta atentar-se nas decorrentes da criação das Autoridades Metropolitanas de Transportes de Lisboa e Porto. Com o funcionamento pleno destas entidades, poder-se-ia obter uma redução de 5% do tráfego rodoviário individual, o qual passaria, por essa via, para os transportes colectivos. Isto não deve, contudo, obnubilar a necessidade premente de se continuar a investir fortemente na qualidade e no conforto dos transportes públicos, sem o que muito dificilmente se poderá atrair mais passageiros e levá-los a abdicar do uso do veículo particular. Também a interoperabilidade do transporte público ferroviário com o rodoviário se torna essencial, sobretudo nos médios e longos cursos – mas, também, nos percursos mais curtos ou pendulares -, em face da “vantagem” a priori de o transporte rodoviário particular poder deixar o cidadão imediatamente “à porta” do seu destino. Neste tocante é muito importante – uma vez mais, para tentar deslocar o cidadão do seu veículo privado para os transportes públicos – que aquela interoperabilidade se estabeleça, também, ao nível da articulação dos horários de funcionamento entre os vários modos de transporte público. Ao nível do transporte de mercadorias, torna-se muito importante, hoje em dia, no nosso País, um retorno à opção ferroviária, a qual comporta impactos muito menos significativos em termos energéticos. Para isso, uma das medidas fundamentais a adoptar será a ligação do transporte ferroviário às plataformas logísticas.

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Por outro lado há que apostar no desenvolvimento tecnológico das formas de transporte. O automóvel e o seu motor tradicional – o motor de explosão - tal como o concebemos e fabricamos ainda hoje tem, no seu funcionamento, uma ineficiência energética de 85%. Ou seja, perde-se 85% desde a energia inicial até à energia útil transformada em movimento, ficando essa energia apenas a aquecer o carro. Uma solução está a ser colocada em prática em Portugal, através da promoção fiscal e de um programa de utilização de carros eléctricos, que pode criar emprego, reduzir o consumo de energia primária (-17%) as emissões de CO2 (-12%), a factura energética (38%) e a dependência energética externa (-8%). 2.8 A investigação no sector da energia O crescimento exponencial verificado nos mercados asiáticos, muito especialmente na última década bem como e a dependência mundial de combustíveis fósseis, criaram uma situação insustentável no domínio da competitividade e da segurança de abastecimento energético. Acresce que o preço do petróleo e do gás atingiram em 2008 o seu máximo histórico. Os cenários de médio prazo fazem prever que o mercado dos combustíveis fósseis continuará sob pressão, induzindo a redução do preço relativo das energias renováveis e o aumento da sua competitividade. Por outro lado, a emissão de gases com efeito de estufa está cada vez mais a inviabilizar a vida no planeta, tornando-se imperativo desenvolver uma economia assente num reduzido teor de carbono, um dos maiores desafios de natureza global deste século. Face a este cenário, a Europa precisa urgentemente de implementar uma estratégia de médio prazo de que lhe permita desenvolver a investigação e desenvolvimento (I&D) no sector da energia, atraindo investimento privado nesta área, que por seu turno permitirá criar mais emprego. A investigação tem um papel importante na implementação de novas tecnologias com menores custos associados, sendo por isso necessário criar condições, também em Portugal, para o desenvolvimento de um cluster de produção de energia com elevado potencial competitivo, envolvendo os centros de excelência nacionais.

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A interdependência entre a energia e o ambiente criaram condições favoráveis à mudança e à procura de energias alternativas. A solução passa por políticas de procura focadas na eficiência energética, políticas de oferta centradas na mudança tecnológica, uma aposta nas energias alternativas e no desenvolvimento de um conjunto de novas tecnologias, capazes de atingir os objectivos em termos de redução de emissões de dióxido de carbono (CO2) e de consumo energético. Dispondo de alguns recursos naturais endógenos, Portugal tem vindo a desenvolver nos últimos anos tecnologia não poluente e renovável, com o objectivo de constituir num futuro próximo desejável, uma rede em que os agentes económicos, famílias e empresas se vão posicionar simultaneamente como consumidores e produtores de energia, oferecendo soluções diversificadas e descentralizadas que minimizem os efeitos da natureza intermitente das fontes renováveis. Quando se questiona se se trata de uma mudança de paradigma no domínio da energia, essa mudança é visível na evolução rápida observada nas renováveis como a eólica ou a solar. Um dos maiores desafios actuais passa por abandonar a lógica da grande central, para se passar para o conceito de microgeração e de uma lógica de produtor e consumidor para a de produtor/consumidor. Os microgeradores são actualmente uma realidade e essa tecnologia já se encontra disponível. De entre as tecnologias mais inovadoras dos últimos anos que têm vindo a ser desenvolvidas em Portugal, destaca-se a aposta em microalgas, sendo inúmeros os projectos de I&D no âmbito de microalgas e biocombustíveis e da biotecnologia industrial de microalgas. Como parceiros científicos em Portugal no âmbito de projectos de biocombustíveis de microalgas, destacam-se as Universidades do Algarve, do Minho, do Porto, de Coimbra e a Universidade Católica e o ex-INETI. No âmbito das suas competências, a CEAQE ouviu em audição durante o mês de Junho de 2008, o responsável por uma empresa nacional produtora de microalgas, que defendeu como aposta estratégica para Portugal, o desenvolvimento de tecnologias de produção industrial de microalgas que possibilitem processos industriais de sequestro

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de CO2 e outros GEE, produzindo biomassa para a produção de biodiesel e respeitando desse modo, o ambiente e a orientação nacional para a sustentabilidade global. As microalgas, plantas unicelulares microscópicas, com cerca de 4.000 milhares de espécies diferentes identificadas, são mantidas em meio de cultura aquoso (água doce, efluentes e água do mar), e através da absorção de nutrientes e da acção do Sol, fixam o dióxido de carbono e outros GEE, produzindo biomassa com diversos aproveitamentos, libertando paralelamente oxigénio para a atmosfera. Têm a vantagem de tratarem águas residuais, que depois poderão ser utilizadas para regadio. São uma importante fonte de matéria prima e extremamente eficientes, duplicando-se em cada 1 a 3 dias, com uma produtividade excepcionalmente superior em cerca de 300 vezes, à das plantas terrestres, permitindo o sequestro de CO2 em quantidade muito significativas (>2:1). Contudo, as microalgas têm várias utilizações possíveis. Para além da produção de biodiesel e de biogás, podem ser utilizadas na produção de biofertilizantes, rações, produtos biosintetizados, consumo humano (corantes alimentares, suplementos alimentares, antioxidantes), aquacultura e aquarofilia e fins terapêuticos. A tecnologia empregue, assenta em sistemas extensivos (no México e na Austrália), em sistemas semi-extensivcos (nos EUA, Japão e Israel) ou ainda intensivos (como é o caso em Portugal) em que a produção assenta num sistema tubular de placas fechado de fotobioreactores, associado a culturas mais concentradas e a produtividades mais elevadas. Trata-se de uma tecnologia escalável e pouco sensível a catástrofes naturais, tendo um grande potencial de desenvolvimento (I&D). A recente necessidade de biocombustíeis aliada à aparente simplicidade de produção, provocaram uma explosão de empresas dedicadas à sua produção, a nível mundial. Portugal tem condições para se tornar uma referência mundial na produção industrial de microalgas, defendeu o especialista convidado pela CEAQE, pois dispõe de investigadores credenciados, com um know-how de produção de referência e tem condições geoclimáticas muitíssimo favoráveis e únicas na Europa.

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Quanto ao hidrogénio, também considerado como um novo vector energético com desafios e oportunidades para Portugal, a Comissão ouviu em Maio de 2008, um especialista

nesta

área.

Conforme

defendeu,

a

humanidade

tem

vindo

progressivamente a descarbobinzar as fontes energéticas utilizadas, tratando-se a próxima era, da era “carbon free”, em que as energias renováveis e o hidrogénio assegurarão os recursos energéticos necessários ao desenvolvimento sustentado a uma escala global, sem dependências de hidrocarbonetos e ao alcance de qualquer comunidade, com impactos profundos no actual quadro macroeconómico e geopolítico. A energia do hidrogénio é uma economia ainda em fase emergente com elevado potencial de crescimento nas próximas décadas, sendo o seu valor estimado no mercado, em 2020, de 27.500x106 de Euros, estando previsto um investimento comunitário numa plataforma tecnológica, de 7,4 biliões de Euros, até 2015. Esta energia que tem associado um custo de entrada reduzido, por já existir know-how em Portugal, poderia vir no futuro a garantir a independência energética nacional, permitindo a captação de investimento estrangeiro estratégico. O Hidrogénio é um combustível não poluente e pode servir de combustível para o automóvel eléctrico, permitindo um modelo de independência energética. Trata-se de uma energia limpa, economicamente viável, segura, utilizável em todos os sectores da economia. Os seus campos de aplicação são a electrónica, nomeadamente em equipamentos portáteis (constituindo uma alternativa às baterias, como geradores de energia renovável que são), as aplicações estacionárias tais como a co-geração, as soluções híbridas e o sector automóvel. A pilha de combustível a hidrogénio é um equipamento que utiliza hidrogénio e oxigénio para criar electricidade através de um processo electroquímico, tendo associado um baixo nível de ruído, não provoca desgaste mecânico e que produz água, como subproduto. Ao utilizar dois eléctrodos – um negativo (ânodo) e um positivo (cátodo) – envolvidos por um electrólito, os protões migram através do electrólito na direcção do cátodo, onde se combinam com o oxigénio do ar que é introduzido na pilha e com os electrões, produzindo água e calor. As pilhas de combustível são

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classificadas consoante o tipo de electrólito e a temperatura de funcionamento. Hoje, os sistemas de hidrogénio/pilhas de combustível têm potências que variam entre apenas alguns Watts e os 10MW. Na óptica do especialista convidado pela Comissão, Portugal deverá acompanhar a mudança, maximizando o valor acrescentado do hidrogénio como factor gerador de riqueza e constituindo uma nova especialização competitiva da economia nacional. Também em Fevereiro de 2008, os Deputados da Comissão ouviram em audição o responsável por um projecto nacional de aproveitamento de energia das ondas de grande envergadura, que pretendeu elucidar os ouvintes sobre o potencial dessa energia no país. A investigação e desenvolvimento tecnológico nesta área, foram foi iniciados após a crise petrolífera de 1973, tendo a primeira fase de desenvolvimento decorrido entre 1974 e o início dos anos 80, com financiamento governamental, liderada por instituições de I&D sediadas no Reino Unido, Japão, Noruega, Suécia, Dinamarca, Irlanda e Portugal. A segunda fase, decorreu entre início dos anos 80 e meados dos anos 90, tendo sido instalados na costa ou junto dela, protótipos de 1ª e 2ª geração, com uma tecnologia mais simples que as offshore. Também em Portugal em 1999, decorreram testes na Ilha do Pico, nos Açores. Recentemente, foi feito um mapeamento das áreas litorais de Portugal com potencialidades de utilização para a produção de energia a partir das ondas, atendendo-se aos condicionalismos associados às zonas protegidas da costa, que apontou para um potencial de produção por parte dos sistemas de exploração bastante elevado, que poderia inclusivamente vir a satisfazer cerca de 20% das necessidades energéticas nacionais. O aproveitamento desta fonte de energia integra-se num mercado que internamente poderá vir a ascender a 5.000 milhões de euros, para uma capacidade instalada de 600 Gigawatts, apresentando-se como um projecto economicamente viável para Portugal e perspectivando-se também um vasto mercado potencial a nível mundial, visto a

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energia produzida a partir das ondas poder vir a substituir grande parte da energia produzida nas grandes centrais de energia eléctrica em todo o mundo. Representa um mercado global de cerca de 600.000 milhões de euros, caso Portugal venha a conseguir deter pelo menos 10% desse mercado, representará um contributo para o PIB nacional superior a 1%, durante cerca de 30 a 40 anos. Esta possibilidade aliada ao potencial de oferta de emprego qualificado a afectar a esta tecnologia inovadora, constituiria certamente uma importante alavanca para o desenvolvimento económico nacional. A energia das ondas tem a vantagem de ser uma energia limpa, tal como a energia solar ou a eólica, sendo auto-sustentável, o que tem vindo a aumentar o seu interesse a nível global. O funcionamento mecânico do sistema de extracção de energia das ondas foi explicado aos Deputados da Comissão, numa visita realizada ao porto de Matosinhos: as ondas resultam do atrito do vento com a superfície oceânica e transportam uma grande quantidade de energia, sendo da vibração das máquinas que se retira a energia. O movimento das ondas associado ao movimento do ar pode ser usado para activar turbinas, que vêem a sua energia mecânica transformada em energia eléctrica, através de um gerador. O MIT estima que uma tecnologia eficiente para captar a energia das ondas poderia facilmente gerar 1 Megawatt para cada quilómetro de equipamento instalado. Cerca de 13% do consumo corrente mundial de electricidade poderia ser satisfeito por energia das ondas, pois a costa oeste portuguesa oferece condições bastante favoráveis para a exploração desta fonte de energia. Tratando-se de uma tecnologia ainda na fase inicial de desenvolvimento é relativamente fácil a sua penetração de Portugal. Como vantagens comparativas desta forma de energia, apontam-se o traçado e o relevo da costa portuguesa, o rápido “afundamento” da costa (apenas a cerca de 50 metros de terra), o fácil acesso ao alto mar, a inexistência de grandes calamidades naturais em Portugal e, finalmente, as características naturais especialmente atractivas, da nossa costa. Por outro lado, o mercado interno, poderá em teoria, crescer muito mais depressa do que o estrangeiro, porque Portugal dispõe nesta área

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de, aproximadamente, trinta anos de investigação e desenvolvimento. Diversas empresas têm demonstrado interesse na exploração da energia das ondas, existindo presentemente um conjunto de políticas favoráveis ao seu desenvolvimento e uma opinião pública também favorável. No que respeita ao estado actual da tecnologia, encontra-se ainda em fase de demonstração, coexistindo cerca de dezoito tecnologias diferentes, cujos protótipos foram testados em situação de alto mar mediante condições relativamente controladas, faltando agora ver o efeito das mesmas em condições adversas. Na opinião do especialista, torna-se necessário caminhar rapidamente para a fase da comercialização onde Portugal terá um importante papel, já que relativamente à fase de desenvolvimento industrial, Portugal está ainda atrasado. A zona piloto portuguesa é pioneira a nível internacional. Tendo apenas 20 megawatts não permitirá criar uma indústria, mas será uma rampa de lançamento para a criação de condições de definição de regras de instalação. A zona piloto será, segundo opinou, uma zona de aprendizagem até para os organismos públicos, como por exemplo o Ministério do Ambiente, do ponto de vista tecnológico. Se se pretende criar um cluster, torna-se necessário fazer uma monitorização adequada do produto e do mercado. Em Espanha e França, os projectos de exploração de energia das ondas já se encontram na fase de engenharia e Portugal deverá necessariamente também avançar, pois se perder esta primeira vaga, a sua entrada tardia reduzirá substancialmente o impacto, transmitiu preocupado o orador. A CEAQE foi de seguida sensibilizada pelo Professor, para a necessidade de o Estado arranjar fontes de apoio diversificadas através de uma rede de suporte à investigação. Dada a existência do QREN, este quadro de referência estratégico para Portugal deveria contemplar medidas específicas para a vertente da energia das ondas, garantindo-se desse modo, um esforço concertado. No que se refere à localização e as condições de instalação dos sistemas de energia das ondas, a profundidade de referência para a instalação do equipamento varia entre os 50 metros de profundidade e os 80 metros. No entanto, tratando-se de um sistema

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flutuante, pode ser instalado a qualquer profundidade. Contudo, quanto maior for a profundidade e a distância da costa, maior quantidade de cabos eléctricos exigirá e isso terá significativa incidência nos custos de instalação. Assim, basicamente, serão apenas os custos desses cabos a razão para a determinação da profundidade de referência. Entre os 5 e os 10 km da linha da costa é possível atingir os 50 metros de profundidade. Existe uma extensão de 335 quilómetros potencialmente disponível na costa portuguesa para o aproveitamento da energia das ondas. Ao situar a energia das ondas no contexto das energias alternativas observa-se que ondas são geradas ao largo, resultando da acção do vento ao longo do Atlântico Norte, pelo que integram energia eólica em quantidade significativa. As ondas têm estabilidade e o seu comportamento é de fácil previsão a seis dias, sensivelmente, sendo esta forma de energia mais fácil de integrar do que a eólica, com a vantagem de apresentar um impacto visual bastante inferior. Urge promover a reflexão sobre o desafio tecnológico e o valor acrescentado que advirá para Portugal, derivado do aproveitamento da energia das ondas. A produção de energia eléctrica a partir da energia das ondas, será feita por pequenas unidades instaladas ao longo da costa, garantindo uma produção descentralizada e próxima do consumidor. As turbinas eólicas onshore poderão vir nos próximos 20 anos a ser transferidas para offshore, devido ao impacto visual que provocam na paisagem. No que concerne ao universo de recursos humanos disponíveis, do ponto de vista técnico e científico, em Portugal, para responder ao desenvolvimento desta potencialidade oferecida pela energia das ondas neste projecto em curso, contabilizam-se cerca de 30 pessoas em regime mais permanente e cerca de 10 pessoas que acompanham os projectos apenas com contribuições pontuais, 12 investigadores no IST e 7 a 8 no INETI. Empresas como a Efacec e Martinfer, têm também já neste momento, equipas a trabalhar na energia das ondas. Em resposta à questão da dimensão do impacto negativo dos sistemas de exploração da energia das ondas sobre a pesca tradicional, o convido esclareceu à Comissão que a pesca industrial opera para além das seis milhas, não havendo por tal motivo qualquer

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conflito entre as duas actividades, para além do facto de os parques de produção de energia das ondas ocuparem, no máximo, 2% da superfície da costa. Quanto a sinergias, elas existem essencialmente ao nível das infra-estruturas de suporte, tais como as navais, ao nível dos cabos e infra-estruturas eléctricas, e ainda com o eólico offshore e a aquacultura. Está a ser desenvolvida a tecnologia para o primeiro protótipo de eólica offshore. Quanto ao ponto de situação da Central do Pico a mesma está em funcionamento desde 1999, mas não em regime permanente. Pertence ao Centro da Energia das Ondas e o investimento na central terá necessariamente de aumentar para poder passar para o regime de funcionamento permanente, contando para isso com o apoio da EDP. O Parque Pelamis desenvolvido na costa norte do país, é formado por máquinas que consistem numa série de tubos ligados entre si e que apontam na direcção das ondas. Cada máquina Pelamis tem um comprimento total de 150 metros e um diâmetro de 3,5m. O Parque Pelanis é o primeiro parque comercial de aproveitamento da energia das ondas em Portugal, tendo sido instalado em Aguçadora, na costa norte do país e é também a primeira estação do mundo de energia originada a partir das ondas, sendo a energia nele produzida, injectada depois na rede eléctrica nacional. Tem como objectivo conseguir produzir até 500 MW de electricidade, o suficiente para iluminar 350 mil casas. O parque existe desde 2007 integrando diversos protótipos ou centrais piloto offshore. O Pelamis utiliza componentes testados em ambiente offshore, os quais beneficiaram da transferência de conhecimentos do sector da exploração de hidrocarbonetos tendo sido concebido para instalações numa gama de profundidade compreendida entre os 50 e os 70 metros, tipicamente a uma distância entre 5 a 10 km da costa. Estes equipamentos têm impacto negativo ao nível do ruído e impacto nos mamíferos marinhos, devido à gama de frequência sonora. Na zona de rebentação, poderá interferir com a corrente, logo com a estabilidade na costa. Pode esse constrangimento vir a condicionar o desenvolvimento da tecnologia e a sua implantação. Quanto ao impacto visual, não existe.

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Relativamente à integração do projecto Pelamis na indústria nacional, é um ponto fraco o facto de as máquinas não terem sido desenvolvidas nem construídas em Portugal mas sim na Escócia. Já a instalação do equipamento em Portugal foi feita com recurso a empresas nacionais. O financiamento dos projectos foi feito pela Inglaterra e Escócia. A tecnologia é, no que se refere ao conceito essencialmente escocesa e no que se refere ao conceito de coluna de água oscilante, português. Os grandes obstáculos técnicos das ondas consistem na Irregularidade da sua amplitude, fase e direcção das ondas com dificuldades na maximização de captura de energia, sujeição dos dispositivos Pelamis a condições extremas, como é o caso das tempestades que podem atingir cargas cem vezes superiores à média, a exigência de uma frequência superior à da onda. A Comissão efectuou no decurso do mês de Maio de 2008, uma visita ao Projecto Aguçadora I, às instalações da Estação de Terra do Parque de Ondas e às máquinas PELAMIS estacionadas no porto de Leixões, em Matosinhos. A subestação de terra dista cerca de três milhas das máquinas PELAMIS havendo uma ligação entre ambas, feita por cabos submarinos. Uma transmissão via rádio é emitida transmitindo para Lisboa informação, cada vez que ocorre uma avaria, os dados são enviados. A decisão para o arranque deste projecto foi tomada em Julho de 2003 tendo inicialmente sido previsto para a sua instalação na Nazaré. Até à materialização do projecto, ocorreram oito anos de estudos e de modelos científicos teóricos, desenvolvidos por cientistas. O projecto de construção de uma Aguçadora II, caso venha a concretiza-se, traduzir-seá num investimento de setenta a noventa milhões de euros. Tratar-se-á de um investimento muito significativo, com capitais de risco e, os bancos, sem garantias, não disponibilizam verbas. A Comissão também recebeu em audição em Junho de 2008, um especialista em Geologia, que sustentou que os recursos geotérmicos são um recurso endógeno do País, de alguma forma bastante negligenciado durante vários anos. A energia geotérmica constitui uma energia renovável que aproveita o calor do solo para gerar energia aumentando a temperatura em profundidade na crosta terrestre. Os recursos

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geotérmicos são consequência do fluído quente do subsolo, aquecido em resultado da desintegração contínua de elementos radioactivos que entram na composição da maior arte das rochas, sobretudo granitos e cujo aproveitamento tem significado económico a nível nacional, regional, ou apenas local. Os recursos geotérmicos podem atingir temperaturas que variam entre os 20 graus e 150 ou mais graus. Tratando-se de temperaturas entre 20 e 50 graus, é possível fazer um aproveitamento directo dos recursos geotérmicos, eventualmente com recurso a bombas de calor. Quando a temperatura se situa entre os 50 e os 100 graus, o aproveitamento desse calor também pode ser directo, por exemplo para aquecimento de ambiente, de águas sanitárias, aquacultura, agricultura e estufa e processos industriais. Quando o calor atinge os 150 graus é possível o aproveitamento desse calor para a produção de energia eléctrica. No que se refere aos diferentes sistemas geotérmicos, o vapor seco, é uma situação relativamente rara, tendo como fonte de energia vapor seco a altas pressões, capazes de accionar turbinas produtoras de electricidade. Estes recursos integram-se no domínio público do Estado, tendo no Continente uma maior distribuição a norte do país, onde as temperaturas variam entre os 20 e os 75 graus, uma região predominantemente granítica onde se está perante um sistema hidrotermal do tipo “dominado

por

vapor”.

Resultados

de

pesquisas

hidrogeológicas

recentes

demonstraram que furos relativamente curtos se traduziam em ganhos de temperaturas consideráveis, como é o caso de Longrovia, Carvallhal ou Unhais. Este sistema “dominado por vapor” tem uma consequência prática importante, sendo possível encontrar temperaturas bastante mais elevadas do que as de emergência a profundidades muito inferiores àquelas que corresponderiam ao gradiente geotérmico normal (> 3 graus/100 metros). Em Portugal existem aproveitamentos geotérmicos instalados para a climatização de balneários termias e de piscinas públicas, climatização de hotéis, de estufas agrícolas de produtos tropicais ou captação dedicada, bombas de calor e finamente produção de água quente sanitária.

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Considerando as temperaturas de emergência e os caudais garantidos, o conjunto de 26 águas quentes cujo direito de exploração está concedido para termalismo, representa uma potência de 22.045 kW (22 MW). Em conclusão: ara além dos aproveitamentos instalados, que ainda são muto poucos em Portugal, existem locais francamente promissores. Aproveitamento da energia térmica permitiria aliviar a pressão sobre o consumo de electricidade e de gás para aquecimento de águas domésticas e ambiente, o que ajudaria a reduzir a factura energética nacional, urgindo por isso estudar os locais e, nos casos viáveis tecnicamente, projectar aplicações (aquecimento central de novas urbanizações, escolas, hospitais, estufas agrícolas e promover a sua utilização). A energia geotérmica ou geotermal pode ser aproveitada em locais com actividade vulcânica, onde existam águas ou rochas a temperatura elevada, e em zonas onde seja possível atingir estratos magmáticos. O calor provoca a evaporação de grandes quantidades de água nas camadas profundas do solo e a sua saída violenta para a superfície. Devido a necessidade de se obter enormes quantidades de energia eléctrica de uma maneira mais limpa, foi desenvolvido um modo de aproveitar esse calor para a geração de electricidade. A produção de electricidade é feita através de uma turbina movida a vapor de água, que é produzido pelo aquecimento do interior da terra. Este potencial é usado para produção de energia eléctrica e como fonte de calor em estufas ou em bombas de calor, para aquecimento ou arrefecimento de edifícios. A produção de energia eléctrica a partir desta fonte não produz gases responsáveis pelo efeito estufa. Os Estados Unidos são o país onde esta energia geotérmica é mais utilizada. Em Portugal existem, sobretudo, aproveitamentos de baixa temperatura ou termais. Este aproveitamento pode ser dividido em duas vias: aproveitamento de pólos termais existentes (temperaturas entre os 20ºC e os 76ºC) e aproveitamento de aquíferos profundos das bacias sedimentares.

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A Islândia, é um país de elevado potencial energético geotérmico, tendo a sua capital, Reiquiavique, cerca de 95 % das habitações e edifícios aquecidos por energia geotérmica. Os aproveitamentos geotérmicos mais interessantes em Portugal encontram-se nos Açores. Só na ilha de São Miguel, através das centrais geotérmicas de Ribeira Grande e Pico Vermelho, esta energia representou cerca de 35% da electricidade consumida na ilha em 2001. A energia geotérmica é uma fonte essencial no arquipélago dos Açores, podendo aumentar muito na próxima década. Como vantagens, enumeram-se a eficiência energética em locais de elevado potencial geotérmico, a baixa emissão de CO2 quando comparada à energia dos combustíveis fósseis, o baixo custo em zonas de elevado potencial geotérmico, a reduzida utilização e alteração dos solos, impactos ambientais moderados, potenciadora de desenvolvimento local e não está condicionada às condições meteorológicas. Como desvantagens podem identificar-se escassez de locais com potencial geotérmico, rapidamente esgotados se usados a uma taxa muito elevada, alguma poluição atmosférica na região, poluição sonora, cheiros desagradáveis e tóxicos, e elevados custos de instalação e segurança. A Escola Superior de Tecnologia de Setúbal do Instituto Politécnico de Setúbal já utiliza Energia Geotérmica no aquecimento e arrefecimento do seu edifício. Mais do que uma preocupação ambiental, o uso desta energia renovável traduz a capacidade de investigação desta instituição envolvida, enquanto parceira estratégica, em projectos europeus financiados pela Comissão Europeia. Um dos projectos tem por objectivo desenvolver novas tecnologias para aumentar a eficiência e a competitividade da produção de energia eléctrica através de energia geotérmica. Serão desenvolvidos dois ciclos de Rankine para a co-geração de calor e electricidade, permitindo a sua utilização em condições mais alargadas de temperatura do solo do que as permitidas pelas tecnologias existentes, permitindo ainda a sua utilização em condições de cogeração.

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2.9 O papel do Estado no sector da energia e as perspectivas para o futuro – as políticas europeias, o MIBEL e o mercado interno de energia. A Constituição da República Portuguesa estabelece, no seu Artigo 81.º, alínea m), como incumbência prioritária do Estado no âmbito económico e social, «Adoptar uma política nacional de energia, com preservação dos recursos naturais e do equilíbrio ecológico, promovendo, neste domínio, a cooperação internacional;». Através da Resolução de Conselho de Ministros n.º 169/2005, o Governo estabeleceu como principais objectivos da estratégia nacional para a energia: I) Garantir a segurança do abastecimento de energia, através da diversificação dos recursos primários e dos serviços energéticos e da promoção da eficiência energética na cadeia da oferta e na procura de energia; II) Estimular e favorecer a concorrência, por forma a promover a defesa dos consumidores, bem como a competitividade e a eficiência das empresas, quer as do sector da energia quer as demais do tecido produtivo nacional; III) Garantir a adequação ambiental de todo o processo energético, reduzindo os impactes ambientais às escalas local, regional e global, nomeadamente no que respeita à intensidade carbónica do PIB. 2.10 - Os compromissos, os constrangimentos e as oportunidades derivados da política internacional sobre Alterações Climáticas e limitação das emissões de Gases com Efeito de Estufa (gees); O Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC 2006), que substituiu o PNAC 2004, teve em consideração dados de base que decorreram, designadamente, das projecções do PIB, aprovadas no Orçamento do Estado de 2006 e o Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC) da Economia Portuguesa para o período 2006-2009, e melhorias no inventário nacional emissões de gases com efeitos de estuda e da monitorização do PNAC 2004. O PNAC 2006 permite obter uma projecção de emissões mais adequada aos dados que actualmente se conhecem, permitindo obter uma ferramenta mais coerente. Cabe sublinhar que o PNAC 2006 regista um alargamento do esforço de cumprimento do

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Protocolo de Quioto, através de medidas nos sectores não abrangidos pelo Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE). O PNAC 2006 pretende, ainda, acautelar que os diversos sectores desenvolvam um esforço de monitorização apertado, única forma de garantir a redução do risco de não execução efectiva das diferentes medidas. Portugal é, conjuntamente com todos os Estados-Membros (EM) da União Europeia (UE), Parte no Protocolo de Quioto (PQ) da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (CQNUAC). Nesse contexto os EM estabeleceram um Acordo de Partilha de Responsabilidades para a redução colectiva de 8% dos Gases com Efeito de Estufa (GEE) no período 2008-2012, relativamente às emissões verificadas em 1990. Segundo esse Acordo, Portugal passou a ter como meta não ultrapassar em mais de 27%, no primeiro período de cumprimento do PQ (2008-2012) as emissões de GEE registadas em 1990. O Protocolo de Quioto estabelece que a União Europeia, como um todo, está obrigada a uma redução das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) de 8%, até 2012, em relação às verificadas em 1990. No acordo de partilha de responsabilidades a nível comunitário, ficou estabelecido que Portugal poderia aumentar as suas emissões em 27%, relativamente a 1990. O montante de emissões de GEE que Portugal não poderá exceder no período 20082012, ou seja, a Quantidade Atribuída (QA), é de 382 milhões de toneladas de equivalentes de CO2 (Mt CO2e), representando um valor médio anual de 76,39 Mt CO2e. No final deste período, Portugal terá que demonstrar que esta meta não foi ultrapassada. Desde 2001 que Portugal conta com uma Estratégia para as Alterações Climáticas, documento que enquadrou o desenvolvimento das políticas sobre esta matéria e a actividade da Comissão para as Alterações Climáticas, criada em 1998. Hoje em dia, constituem instrumentos fundamentais para o cumprimento dos objectivos nacionais em matéria de alterações climáticas, o Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC), o Programa Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão para o período 2008-2012 (PNALE II) que define as condições a que ficam

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sujeitas as instalações abrangidas pelo comércio europeu de licenças de emissão de GEE (CELE)5 e o Fundo Português de Carbono. Fundamental para o controlo das nossas emissões é ainda o Inventário de Emissões Antropogénicas por Fontes e Remoção por Sumidouros de Poluentes Atmosféricos (INERPA), através do qual é possível aferir as emissões do país. As projecções efectuadas no âmbito do PNAC permitem estimar um valor médio anual de emissões de GEE de 84,60 Mt CO2e/ano em cenário de referência. Com as políticas e medidas previstas no PNAC 2006 e com as novas metas 2007, que incidem sobre políticas e medidas do PNAC 2006 dos sectores da oferta da energia e dos transportes, o valor das previsões de emissões anuais situa-se nos 79,36 Mt CO2e. A soma das políticas e medidas adicionais do PNAC 2006 e das novas metas 2007, contribuem assim para uma redução média anual de 5,25 Mt CO2e (3,7 Mt associadas às medidas adicionais e 1,7 Mt associadas às novas metas 2007). Com o esforço adicional decorrente da aplicação do Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão 20082012 (PNALE), estimado em 0,09 Mt CO2e/ano, fica ainda por suprir um défice médio anual da ordem dos 2,88 Mt CO2e/ano que deverá ser suprido através do Fundo Português de Carbono (Figura seguinte). Figura 12 – Caminho para cumprir Quioto Emissões estimadas para 2010 (PNAC 2006) 100 84,6

5,25 3,69

0,09

2,88

76,39

1,56

75

Sectores fora CELE Instalações já no CELE Reserva CELE

47,74

41,59

50

PNAC - Medidas adicionais PNAC - Novas metas 2007 Esforço CELE Fundo Português Carbono

4,30

25 36,86

36,86

0 Cená Cenário referência PNAC 2006

30,50

Esforç Esforço adicional CELE

Medidas adicionais (PNAC 2006) + Novas Metas 2007

Fonte: MAOTDR 5

Também designado por “universo CELE”.

Meta de Quioto

Fundo Português de Carbono (FPC)

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Fig 13.- O Plano Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC2006) prevê um crescimento superior a 27% vs. 1990.

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PARTE III - A URGÊNCIA DE UM NOVO PARADIGMA 3.1. As energias renováveis. Portugal possui abundantes e importantes recursos energéticos renováveis, cuja utilização deverá ser potenciada, permitindo uma diminuição da dependência externa, uma maior segurança no abastecimento, uma diminuição nos impactos ambientais decorrentes da utilização dos combustíveis fósseis e, por último, uma oportunidade de desenvolvimento económico com criação de emprego e de riqueza. O recente aumento do preço dos combustíveis fósseis, associado às questões ambientais, trouxe para a ordem do dia a necessidade de uma melhor utilização destes recursos. A aposta nas energias renováveis assenta em duas linhas: no seu carácter tendencial de inesgotabilidade e, no caso português, na aposta em recursos endógenos até agora pouco ou muito pouco aproveitados. Acresce ainda o carácter positivo e sustentável que as energias renováveis acrescentam na relação com o ambiente. Independentemente de qualquer valoração política ou partidária, é indesmentível que Portugal tem apresentado nos últimos anos valores que apontam para o reforço da capacidade de produção renovável. Na eólica, as estatísticas de Março de 2009 da Direcção-Geral de Energia e Geologia (DGEG) indicam que o total da potência instalada em Portugal atingiu 8502MW. Os mesmos dados indicam que a produção eólica de Janeiro a Agosto de 2008, cresceu 34% relativamente a igual período de 2007. Em Agosto a produção foi 17% superior à registada no mês homólogo do ano anterior. Em 2008, cerca de 43,3 % da energia eléctrica produzida era originária de renováveis, contra 42,3 % em 2007, e 36% em 2006. A potência eólica instalada no final de Dezembro de 2008 estava distribuída por 181 parques, com um total de 1.680 aerogeradores, ao longo de todo o território Continental. Quarenta por cento da potência instalada situava-se em parques com potência igual ou inferior a 25 MW.

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O investimento médio por megawatt declarado ao programa MAPE (MAPE - Medida de Apoio ao Aproveitamento do Potencial Energético e Racionalização de Consumos) foi de 1,18 M€/MW, estando, até final de Agosto, 715 MW ligados, dos 1 533 MW que obtiveram financiamento (~47%). No total do programa MAPE, foram aprovadas candidaturas para 1.533 MW de eólicas, num total de investimento de € 1.815mM. A produção, em 2007, ficou nas 2.066 horas equivalentes por MW, com 56% da energia gerada em instalações com mais de 2.000 horas, em 2007. Os distritos com maior potência instalada em Março de 2009 foram Viseu, Castelo Branco, Viana do Castelo, Coimbra, Lisboa, Vila Real, Santarém, Leiria e Braga. Os distritos com maior recurso a vento, em 2007 e 2008, foram Bragança, Guarda, Lisboa, Vila Real, Santarém, Porto, Viana do Castelo e Aveiro. Relativamente à energia hídrica, foram autorizados pontos de Recepção para 922 MW de novas grandes Centrais Hidroeléctricas, com um investimento previsto superior a 1.000 M€. Neste domínio, está em curso o Plano Nacional de Barragens de Elevado Potencial, com 8 novas barragens e upgrade de 6, as primeiras grandes centrais hidroeléctricas dos últimos 30 anos que totalizam cerca de 2000 MW, num investimento de 1.140 milhões de euros. Estas novas barragens vão permitir a Portugal passar a fazer um aproveitamento de 70% do seu potencial hídrico, bem acima dos actuais 46%. Em 2007, as grandes barragens nacionais já produziam 21 por cento da electricidade consumida em Portugal, e, tendo em consideração as contas nacionais de 2007, o investimento anual previsto entre 2008 e 2015 na construção das novas barragens, pode acrescentar 0,15% à taxa do PIB, bem como, sete mil empregos a partir de 2010. Muito importante é igualmente o carácter de reversibilidade que algumas destas barragens incorporam e que permitirá “acumular” energia produzida pela eólica. Quanto à energia solar, em Portugal calcula-se que o período médio de exposição solar anual varie entre as 2.200 e as 3.000 horas. Em termos comparativos refira-se que nos países da Europa central essa incidência não ultrapassa as 1.200 a 1.700 horas. E, mesmo assim, alguns desses países, como, por exemplo, a Alemanha, fazem um excelente aproveitamento dessa riqueza gratuita.

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Para além do programa de microgeração (http://www.renovaveisnahora.pt/ ) e da campanha do solar térmico (http://www.paineissolares.gov.pt/ ), foram concedidas licenças de estabelecimento das duas maiores centrais do mundo: uma com uma potência de 50 MW e uma produção prevista de 76GWh/ano, envolvendo um investimento global de 253 M€, a criação de uma fábrica de módulos fotovoltaicos, a criação de cerca de 100 postos de trabalho e a instalação de um laboratório de investigação. A outra, de Serpa (visitada pela CEAQE) com uma potência instalada de 11 MW e uma produção prevista superior a 18 GWh/ano, envolvendo um investimento de 62 M€. 3.2. O potencial do seu desenvolvimento em Portugal e a relevância dos impactes económicos e ambientais delas decorrentes 3.2.1 Energia das ondas De acordo com os dados disponíveis da DGEG, “exceptuando as Berlengas, a costa de S. Vicente e o Sudoeste Alentejano”, não há interferências associadas à instalação de parques de dispositivos de energia das ondas com reservas naturais, à profundidade de 50 metros. No Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina, a plataforma continental apresenta um declive suave e os dispositivos podem ser instalados a uma profundidade de 60 m, ainda relativamente perto da costa. Portugal, com um recurso energético médio-alto (fluxo médio anual de 30 MW por cada quilómetro de frente de onda em águas com 50 metros de profundidade), dispõe de um potencial de utilização de energia das ondas de onde poderá resultar uma produção de energia eléctrica de 10 TWh/ano aproximadamente (cerca de 20% das nossas necessidades de consumo). O potencial de produção de energia eléctrica na costa atlântica portuguesa é estimado admitindo um recurso de 30 kW por km de costa. Uma percentagem média de 15% da energia incidente poderá ser convertida em energia eléctrica.

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Tendo em conta os 335 km de costa para instalação de potenciais parques offshore e a necessidade de manter corredores para a navegação associada à pesca, resulta um potencial de utilização de mais de 250 km” da nossa costa. 3.2.2. Energia solar “Em Portugal, a utilização de sistemas solares térmicos ou fotovoltaicos está ainda longe de corresponder ao potencial deste recurso disponível no País”. Estima-se que em 2003, a capacidade instalada de sistemas solares fotovoltaicos seria cerca de 2 MW, dos quais apenas 20% se referiam a instalações ligadas à rede pública. Não obstante, foram já aprovados pedidos de informação prévia que totalizam cerca de 128 MW, o que deixa uma capacidade não comprometida de 22 MW, face à meta de 150 MW, para o horizonte temporal de 2010. Na sequência do programa E4 - Eficiência Energética e Energias Endógenas (2001), foi lançado o Programa "Água Quente Solar para Portugal" que previu a instalação, até 2010, de um milhão de metros quadrados de colectores solares. Embora os resultados alcançados até agora se encontrem muito distantes daquele objectivo, os resultados do último inquérito realizado pelo Observatório para o Solar Térmico, com vista a determinar a área instalada no nosso país em 2004, apuraram a instalação de 16.088 m2 de colectores solares, 44% dos quais em pequenos sistemas domésticos e o restante em grandes sistemas. Já referido anteriormente, o Programa de Apoio à instalação de painéis solares térmicos no segmento residencial (http://www.paineissolares.gov.pt/), tem como objectivo estimular a procura e atingir a meta de 300.000 m2 de painéis em mais de 60.000 habitações residenciais, durante o ano de 2009 (cerca de 4 vezes superior a área anual instalada em 2007 e 2008). Este Programa tem €95 Milhões de dotação orçamental, no âmbito da Lei n.º 10/2009, de 10 de Março. O Programa em causa baseia-se na disponibilização de “soluções chave-na-mão” (incluindo equipamento, sua instalação, garantia e manutenção durante 6 anos).

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Fig 14 - Evolução da área de colectores solares instalados em Portugal

Fonte: DGEG

3.2.3 Energia eólica Em Portugal, devido à sua situação geográfica e geomorfológica, apenas nas montanhas a velocidade e a regularidade do vento tornam susceptível o seu aproveitamento energético. Apesar da evolução tecnológica permitir sucessivas melhorias actualmente, em regra um sistema de produção eólica necessita de uma velocidade média anual do vento de 15 km/hora ou seja 4,2 m/s e para que um aerogerador funcione é necessária uma velocidade de vento superior a 9 Km/h. O Departamento de Energias Renováveis do INETI produziu uma base de dados do potencial eólico do vento em Portugal, denominado EOLOS2. De acordo com o documento “Energias Renováveis em Portugal”, do Ministério da Economia e Inovação, em 2005, Portugal reviu os objectivos estabelecidos em 2003 e decidiu aumentar em 1.950 MW a meta da capacidade instalada, para 5.100 MW, em 2012 (com um acréscimo em 600 MW por “upgrade” do equipamento), promovendo simultaneamente a criação de um “cluster” tecnológico e de investimento associado à energia eólica. Este objectivo representará uma contribuição de 20% para a satisfação do consumo, no final desta década.

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Embora os parques eólicos tenham reduzido impacto sobre o ambiente, quando comparados com as centrais convencionais, há alguns aspectos a considerar, como sejam o ruído provocado pela deslocação das pás e o impacto visual na paisagem. Também segundo as conclusões de diversos estudos referentes a parques eólicos no estrangeiro, a maior parte das aves evita a colisão com os aerogeradores. A energia eólica evita a importação de petróleo ou de gás natural, contribuindo por desse modo para aliviar a dependência e a factura energética do País. Por outro lado, evita também as emissões de CO2 e os custos associados à poluição (custos ambientais e de saúde pública), bem como o esgotamento dos recursos energéticos não renováveis. A energia eólica é um recurso nacional, fiável e que gera cinco vezes mais emprego por Euro investido, do que as tecnologias associadas ao carvão ou ao nuclear. 3.3. O futuro do aproveitamento da energia das ondas e das marés; Um pouco mais de 70% da superfície do nosso planeta encontra-se coberta por oceanos, nos quais a água se encontra em permanente circulação. Os ventos dominantes, que sopram em direcção ao Equador, originam as grandes correntes de superfície que, em conjunto com as de profundidade, transportam a água fria das regiões polares para o Equador e vice-versa. A utilização do mar territorial, da zona contígua e da Zona Económica Exclusiva (ZEE) pelos países soberanos, resulta da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) assinada em Montego Bay, em 1982, que veio substituir o direito tradicional assente no princípio da liberdade dos mares, um regime fundado numa divisão do espaço oceânico, prevalecendo, nos termos do artigo 311.º, n.º1, as relações entre os Estados Partes, sobre as Convenções de Genebra sobre o Direito do Mar de 29 de Abril de 1958 (aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 44 490, de 3 de Agosto de 1962). Habitualmente definem-se como usos possíveis do mar – alguns deles conflituantes, mesmo considerando-o como fazendo parte do domínio público - a navegação, a

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aquicultura, a pesca, a recreação, a arqueologia, o uso científico, os oleodutos e a colocação de cablagens. Portugal, com uma costa atlântica bastante extensa (cerca de 1.230 km em Portugal Continental, 667 km nos Açores e 250 km na Madeira) tem uma tradição e uma relação forte com o mar desde sempre e em especial desde a época dos Descobrimentos. A Directiva n.º 2001/77/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Setembro, relativa à promoção da electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis no mercado interno de electricidade, veio consagrar o reconhecimento da prioridade atribuída pela União Europeia e pelos Estados Membros à promoção do aumento da contribuição deste tipo de fontes primárias, para a produção de energia eléctrica no mercado interno da electricidade e criar uma base para um futuro quadro comunitário neste sector (Artigo 1º). Estabeleceu-se ainda a obrigatoriedade de todos os Estados Membros publicarem relatórios que definam metas indicativas nacionais, relativas ao consumo futuro de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis, de 5 em 5 anos e para os 10 anos seguintes, bem como relatórios de análise da realização das metas, de dois em dois anos (Artigo 3º). Foram ainda estabelecidos sistemas de garantia de origem da electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis (Artigo 5º) e definidos os quadros legais a criar, relativos às redes de transporte e distribuição, bem como, a prioritização de electricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis, à rede. Existem várias formas potenciais de aproveitamento da energia dos oceanos (que tradicionalmente engloba as marés, as correntes, a temperatura, a salinidade, já para não falar da exploração de petróleo e gás natural no mar…). A maior dificuldade humana em explorar o mar, reside especialmente na impossibilidade de controlar uma massa gigantesca que afinal ainda é praticamente desconhecida do Homem. No século XX, a partir dos anos 70 e na sequência do primeiro choque petrolífero, houve uma retoma de atenção por parte da comunidade científica para o desenvolvimento de tecnologia de aproveitamento de energia das ondas, para a produção de energia eléctrica em mais larga escala, em especial nos EUA, mas também

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em países do norte da Europa (com “know-how” na prospecção petrolífera no Mar do Norte e também em Portugal). A Comissão Europeia, no seu LIVRO VERDE6 – Estratégia Europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura, aponta para a necessidade de um encorajamento à exploração de algum tipo de energias como esta (bem como à energia eólica offshore e à oceânica). Relativamente à energia das ondas do mar, a tipologia dos dispositivos costeiros utilizados para a produção de energia das ondas do mar distingue-se em “on shore” 7 , “near shore” ou “offshore”. Existem ainda e essencialmente, quatro tecnologias distintas de extracção de energia das ondas com protótipos a serem (ou em vias de serem) testados no mar: a Coluna da Água Oscilante (CAO), o Pelamis, o Wave Dragon e o Archimedes Wave Swing (AWS). A Central de Coluna de Água Oscilante é o sistema mais investigado, tendo sido construídas várias centrais a nível mundial. Tipicamente a CAO é um sistema costeiro (embora também possa ser instalado ao largo) que é particularmente adequado para a integração em estruturas de protecção costeira. Presentemente existem duas centrais piloto deste tipo, uma na Escócia, a Central LIMPET, e a Central do Pico, nos Açores. Os restantes dispositivos são sistemas offshore, completamente submersos ou semi-submersos. Existem outras tecnologias em desenvolvimento, mas numa fase menos avançada. Podemos apontar para um período de dois a três anos como o tempo necessário para obtermos mais informação quanto à avaliação da viabilidade tecnológica e económica destas tecnologias e seu impacte ambiental em resultado directo dos ensaios no mar dos protótipos. Em Portugal é de salientar o extraordinário trabalho que o Wave Center Energy (WCE), uma associação de que fazem parte o Instituto Superior Técnico (IST), o Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Inovação (INETI) e algumas empresas, têm realizado nesta área.

6

http://europa.eu/scadplus/leg/pt/lvb/l27062.htm Na costa, com facilidade de acesso e ausência de amarrações, mas de menor potência. É o caso da central do Pico ou da central que irá ser instalada na foz do Rio Douro e da qual existem, no momento em que escrevo este trabalho, algumas dúvidas que mais adiante abordarei. 7

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As zonas costeiras portuguesas (em especial a costa ocidental do continente e as ilhas dos Açores) têm condições naturais, de entre as mais favoráveis do mundo, para o aproveitamento da energia das ondas. Em funcionamento desde 15 de Julho, o projecto da Aguçadoura visitado pela CEAQE, apresentava dois dias depois, resultados já bastante interessantes e promissores (mapa a seguir). Fig 15 - Mapa da potência de 16 de Julho de 2008.

3.4. Os combustíveis derivados de resíduos A possibilidade de obtenção de combustível derivado de resíduos (CDR), pressupõe o tratamento de Resíduos Sólidos Urbanos (RSUs). Tal processo inicia-se com o tratamento mecânico-biológico desses RSUs – operações que já são determinadas objectivamente pelo Plano Estratégico dos RSUs 2007/2016 (PERSU). O CDR é obtido a partir da parte não orgânica dos RSUs, isto é, dos plásticos e de grande parte do papel - que, para todos os efeitos, acaba por ser, na sua essência petróleo e, por isso, com um forte poder calorífico - podendo vir a substituir, por exemplo, os combustíveis fósseis utilizados nas cimenteiras ou nas cerâmicas, ou

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ainda, vir a ser queimado em instalações dedicadas à eliminação das lamas das estações de tratamentos de águas residuais (ETARs), com produção de energia. As primeiras instalações no nosso País que aproveitam CDR, pertenceram à Empresa Geral de Fomento (EGF) – um sub-grupo empresarial da holding Águas de Portugal (AdP) – que no início de 2008 possuía apenas duas unidades, com capacidade instalada para a produção de 150 GW e 200 GW, respectivamente. 3.5. A Geotermia A energia disponível sob a forma de calor emitido do interior da Terra é conhecida como energia geotérmica. Dependendo da estrutura geológica, por cada 100 m de profundidade, a temperatura do planeta eleva-se entre 2º a 3ºC, podendo atingir temperaturas muito mais elevadas nas zonas vulcânicas. Esta energia é utilizada desde a Antiguidade para o aquecimento termal. A geotermia, diversamente de outras fontes de energia renováveis, não está dependente das condições atmosféricas (sol, chuva, vento), revelando-se, por isso, uma fonte estável e duradoura. É possível, através de sistemas geotérmicos, utilizar esse imenso e inesgotável reservatório de energia para climatizar qualquer edifício. A energia é captada do solo, junto às habitações e, mediante a utilização de um gerador termodinâmico, conduzida para o interior do espaço sob a forma de aquecimento/arrefecimento do ambiente, aquecimento de águas sanitárias e aquecimento de piscinas. Sublinha-se que as tecnologias actualmente disponíveis, possibilitam já a utilização do calor da terra em actividades económicas como, por exemplo, a agricultura ou a piscicultura. As calorias geotérmicas são absolutamente gratuitas o que se poderá traduzir, portanto, numa redução drástica dos consumos energéticos associados à produção de energia calorífica, os quais constituem a grande fatia das despesas mensais das famílias portuguesas.

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Em Portugal, o aproveitamento da energia geotérmica é uma solução com sucesso nos Açores, onde estão inventariados cerca de 235,5 MW. 3.6. A micro-geração A possibilidade de cada um dos consumidores de energia eléctrica em Portugal poder, ele próprio, através de equipamentos de pequena escala, (normalmente solares ou microaerogeradores) ser um produtor de energia e injectar energia na rede, sendo remunerado por isso, designa-se por microgeração. Estes sistemas são aplicáveis em prédios de habitação, com várias unidades individualizadas, sendo, nestes casos, o serviço repartido por todos os moradores, mas atingem o seu mais alto expoente de aproveitamento, nos casos das construções unifamiliares – como as moradias ou vivendas -, pois aí o calor acrescentado pelo Sol ao aquecimento da água acaba por ser integralmente aproveitado pelas respectivas famílias proprietárias das mesmas. O regime da microgeração em Portugal foi definido pelo Decreto-Lei 363/2007, de 2 de Novembro, que avança com o regime simplificado aplicável à microprodução de electricidade, também designado por "Renováveis na Hora". O Decreto-Lei entrou em vigor a 2 de Fevereiro de 2008 3.7. A fusão nuclear Existem actualmente no Mundo cerca de 440 reactores nucleares em funcionamento. Produzem 7% da energia consumida e 16% de toda a electricidade produzida, podendo em alguns Países atingir percentagens muito elevadas (75% em França). Apenas existem reactores da 1ª geração instalados na Europa de Leste, sendo a maioria de 2ª geração.

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Fig. 16 - Distribuição de Reactores Nucleares em funcionamento na Europa e na Europa de Leste País



País



Bélgica

7

Bulgária

4

República Checa

6

Finlândia

4

França

59

Alemanha

18

Hungria

4

Lituânia

1

Holanda

1

Roménia

1

Rússia

31

Eslovénia

1

Espanha

9

Suécia

11

Suíça

5

Ucrânia

15

Reino Unido

23

Eslováquia

6

A energia nuclear tem vindo a assumir recentemente uma importância acrescida no mix energético de vários países. Designadamente, porque não produzindo praticamente emissões de GEEs, o recurso à sua utilização tem, por vezes, sido invocado como adequado ao combate ao aquecimento global e às Alterações Climáticas. Trata-se de uma forma de produção energética que o nosso País não deverá, em princípio, descurar, sobretudo se a evolução dos consumos energéticos passar a tender para cenários de uma intensa e acrescida procura de energia eléctrica – por exemplo, em virtude da transformação dos veículos dos actuais motores de combustão para eléctricos.

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De qualquer modo, o recurso do nosso País a esta forma de energia parece ser de afastar para já. Quanto mais não seja, pelos seguintes motivos: Não é válido o argumento dos que defendem que o recurso ao nuclear iria fazer diminuir expressivamente a nossa dependência energética externa. Desde logo porque a energia nuclear nunca contribuiria para mais de ¼ das necessidades energéticas do País, já que: 1º) A energia nuclear só produz electricidade; 2º) A electricidade só representa ¼ de todas as necessidades energéticas do País; 3º) As energias renováveis já conseguem produzir actualmente 40% das necessidades eléctricas do País. 4º) Em Portugal não se produz electricidade com recurso a derivados do petróleo. Ao longo dos últimos 50 anos, a totalidade dos subsídios estatais atribuídos ao sector do nuclear rondaram os USD 145.000 milhões. Enquanto isso, os subsídios à produção a partir de Fontes de Energia Renováveis (FER) (solar e eólica) totalizaram perto de USD 5.000 milhões. Isso resulta do facto de a produção de energia nuclear ser muito cara. Se ponderarmos os custos de construção e de desmantelamento de uma destas centrais face ao seu período médio de vida, constatamos que apenas os sistemas solares fotovoltaicos são mais dispendiosos – muito embora neste último caso, os valores tendam a reduzir-se por efeito de economias de escala, face à sua expressão cada vez maior.

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Fig. 17 - Custos por Kilowatt-hora da energia

Fonte de Energia

Custos por kilowatt-hora

Eficiência energética

0-5 cêntimos

Hidroeléctrica

2-8 cêntimos

Carvão

5-6 cêntimos

Vento

5-8 cêntimos

Petróleo

6-8 cêntimos

Solar térmica

9 cêntimos

Nuclear

10-12 cêntimos

Solar fotovoltaico

15-20 cêntimos

Fonte - http://www.net.org/proactive/newsroom/release.vtml?id=18534

Uma central nuclear típica, encerra no seu seio o equivalente a cerca de 1.000 vezes mais o potencial de radioactividade do que o libertado pela bomba de Hiroshima. Os planos de emergência e de evacuação para as áreas envolventes de muitas centrais nucleares não são accionáveis e seriam muito difíceis de aplicar no caso de ocorrência de uma verdadeira emergência. De acordo com estudos realizados pelo Rocky Mountain Institute, dos E.U.A., a energia nuclear constitui o meio mais lento e caro de reduzir as emissões de CO2 e de combater as Alterações Climáticas. Uma análise séria e completa do ciclo de vida demonstra que, quando o sistema é integralmente tido em conta, a produção de electricidade a partir do nuclear, leva afinal a uma emissão de 20% a 40% de dióxido de carbono por/kilowatt/hora, a partir de um sistema de queima de gases. Não existem formas seguras de armazenar os resíduos nucleares, e, até hoje, nenhum País conseguiu resolver de forma satisfatória o problema da armazenagem e da gestão dos resíduos radioactivos.

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Os resíduos nucleares permanecem activos por centenas de milhares de anos e podem, por isso, constituir seríssimos perigos para a saúde humana e o ambiente, se se espalharem na água, no ar ou no solo. Deverá ser dada prioridade absoluta, no plano nacional, ao potencial de cerca de 60% de poupança de consumos, por aplicação de regras de eficiência energética. Tendo em conta as necessidades específicas de uma central nuclear, nomeadamente ao nível da disponibilidade abundante de água e em face de factores de segurança, como a necessidade de evitar zonas de maior actividade sísmica, e tendo, ainda, em conta a exiguidade do território português, a definição e a aceitação da localização de uma central nuclear seria uma tarefa muito difícil em Portugal. 3.8. O futuro: A passagem dos sistemas actuais de fissão nuclear para os de fusão de átomos de elementos leves Os actuais sistemas baseiam-se na divisão do núcleo de átomos de elementos químicos pesados como o urânio. Porém, no futuro, poderemos vir a alcançar um processo de produção de energia que seja em tudo semelhante ao que constitui o motor da energia das estrelas: Ou seja, um sistema de fusão de átomos de elementos leves. Neste cenário ainda hipotético, uma matéria-prima da fusão nuclear poderá vir a ser o elemento químico lítio. Calcula-se que bastaria 1,8 kg de lítio para produzir um megawatt de energia por ano – dispondo o Mundo de cerca de dez milhões de toneladas desse elemento. Por outro lado, a economia e a produção de energia poderão ainda vir a ser optimizadas, graças a tecnologias baseadas na supercondutividade, que consiste na capacidade de certos materiais, como algumas cerâmicas especiais, poderem oferecer uma grande diminuição da resistência eléctrica e, com isso, a corrente eléctrica poder fluir pelo material sem perda de energia (pelo calor, por exemplo) no percurso. Teoricamente, a supercondutividade permite uma transmissão mais eficiente da energia eléctrica, com os consequentes ganhos daí decorrentes.

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3.9 - As necessidades de adaptação das redes de transporte e de distribuição de electricidade Para o especialista Carlos Pimenta as “redes do futuro da parte eléctrica são redes inteligentes, são redes bidireccionais, têm um modelo tipo Internet e não são redes top down” o que, aliás, é um retorno à origem. Quando Edison concebeu aquela lâmpada tão ineficiente e pensou o modelo da rede eléctrica, preconizou um modelo em que cada quarteirão seria auto-suficiente em termos de electricidade. Nos nossos dias trata-se de quarteirões interligados, numa filosofia semelhante à da Internet”. A expressão é particularmente feliz e resume o desafio que as redes de energia vão enfrentar nos próximos anos, possibilitando que as redes interliguem milhares de consumidores/produtores. 3.10 - A oferta energética em termos gerais e particularmente nas renováveis – eólicas, hidroeléctricas, biocombustíveis Normalmente consideram-se biocombustíveis, todos os carburantes de origem biodegradável, obtidos a partir de fontes renováveis. A importância atribuída a esta fonte de energia justifica-se, desde logo, porque se afigura que os biocombustíveis são a via mais disponível a médio prazo para que o sector dos transportes seja mais amigo do ambiente, sabendo-se que os transportes produzem quase um terço das emissões de CO2 e têm uma dependência de 98% relativamente ao petróleo. Mas a UE reconhece também que uma maior utilização dos biocombustíveis se traduz em benefícios, que vão da redução da dependência da Europa em relação às importações de combustíveis fósseis, à redução das emissões de gases com efeito de estufa, mas extravasam esses efeitos, pela capacidade de escoamento da produção para os agricultores e pelo potencial de emprego e crescimento económico que representam para diversos países em desenvolvimento. Em Portugal, são considerados biocombustíveis, no âmbito do Decreto-Lei nº 62/2006 (decreto-lei que transpôs para o ordenamento jurídico português a Directiva nº 2003/30/CE e que criou mecanismos para promover a colocação no

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mercado de quotas mínimas de biocombustíveis), os seguintes produtos: a) «Bioetanol», etanol produzido a partir de biomassa e ou da fracção biodegradável de resíduos para utilização como biocombustível; b) «Biodiesel», éster metílico produzido a partir de óleos vegetais ou animais, com qualidade de combustível para motores diesel, para utilização como biocombustível; c) «Biogás», gás combustível produzido a partir de biomassa e ou da fracção biodegradável de resíduos, que pode ser purificado até à qualidade do gás natural, para utilização como biocombustível, ou gás de madeira; d) «Biometanol», metanol produzido a partir de biomassa para utilização como biocombustível; e) «Bioéter dimetílico», éter dimetílico produzido a partir de biomassa para utilização como biocombustível; f) «Bio-ETBE (bioéter etil-ter-butílico)», ETBE produzido a partir do bioetanol, sendo a percentagem volumétrica de bio-ETBE considerada como biocombustível de 47%; g) «Bio-MTBE (bioéter metil-ter-butílico)», combustível produzido com base no biometanol, sendo a percentagem volumétrica de bio-MTBE considerada como biocombustível de 36%; h) «Biocombustíveis sintéticos», hidrocarbonetos sintéticos ou misturas de hidrocarbonetos sintéticos produzidos a partir de biomassa; i) «Biohidrogénio», hidrogénio produzido a partir de biomassa e ou da fracção biodegradável de resíduos para utilização como biocombustível; j) «Óleo vegetal puro produzido a partir de plantas oleaginosas», óleo produzido por pressão, extracção ou métodos comparáveis, a partir de plantas oleaginosas, em bruto ou refinado, mas quimicamente inalterado, quando a sua utilização for compatível com o tipo de motores e os respectivos requisitos relativos a emissões. Reconhecidamente, os biocombustíveis podem contribuir para a redução do consumo de combustíveis fosseis, sendo um factor muito importante para redução da emissão de gases com efeito estufa e dando também uma oportunidade à investigação científica e tecnológica para descobrir novos combustíveis e criar e optimizar processos para a sua real utilização. A vertente de desenvolvimento da fileira dos biocombustíveis, pode ser também um factor importante para a diversificação das fontes de abastecimento energético potenciando o desenvolvimento agrícola e a fixação de populações no meio rural –

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em muitas situações votado hoje ao abandono -, bem como novos investimentos em áreas com uma elevada componente tecnológica. Quanto à produção de biodiesel, é bom referir que na Índia e na China, existem experiências muito interessantes com plantas como a “jatropha” ou “sorgo doce”, que não competem com a produção de alimentos. A “jatropha”, por exemplo, pode ser plantada em áreas quase desérticas, onde alimentos não poderiam ser cultivados. Por outro lado, o sorgo doce produz combustível e também alimento em partes diferentes da mesma planta. De referir ainda que a refinaria de Sines desenvolve neste momento alterações na fábrica, para a produção de biodiesel de segunda geração já a partir de 2011, com uma qualidade superior à do diesel fóssil, produzido a partir que qualquer óleo vegetal ou animal, com uma produção estimada de duzentos e cinquenta mil toneladas/ano. Como matéria-prima para a produção desse biocombustível, a opção da refinaria é o binómio “ser amigo do ambiente”, “não comestível” e que não exija muita água. Presentemente, a GALP incorpora já entre três e meio a quatro por cento de biodiesel, adquirido à Ibersol e Torrejana. Na UE, o Conselho Europeu de Março de 2007, aumentou a meta de biocombustíveis de 5,75% para 10% do consumo dos transportes e definiu esse objectivo como obrigatório até 2020, para todos os Estados Membros. O carácter vinculativo desta meta é adequado ainda que haja condições a respeitar, entre as quais: - a sustentabilidade da produção de biocombustíveis, garantindo-se que há um ganho ambiental em termos líquidos, sem que tal ponha em causa o abastecimento de alimentos; - o início da comercialização dos biocombustíveis de segunda geração. Neste particular, o Conselho reiterou apelos para a total e rápida implementação das medidas salientadas nas conclusões do Conselho de Junho de 2006 sobre o Plano de Acção da Comissão para a Biomassa, nomeadamente em matéria de projectos de demonstração de biocombustíveis de segunda geração.

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3.11.– As biomassas agrícolas As biomassas agrícolas podem constituir um forte contributo para a redução da dependência da biomassa florestal residual para a produção de energia e subdividem-se, em atenção à sua especificidade, em três tipos distintos: Biomassa de Produção Agrícola Dedicada; Biomassa de Resíduos Agrícolas; Biomassa de Resíduos das Indústrias Agrícolas. As

biomassas

agrícolas

anteriormente

elencadas

caracterizam-se,

mais

detalhadamente, da seguinte forma: Biomassa de Produção Agrícola Dedicada A agricultura pode prestar um forte contributo para a produção de energia eléctrica em centrais termoeléctricas, pela promoção e dinamização de produções agrícolas dedicadas, nomeadamente ao nível das culturas energéticas, que podem ser utilizadas como biomassa. Estas culturas energéticas pelo seu elevado poder calorífico, podem substituir, ou funcionar em complemento da utilização de biomassa florestal residual nas centrais termoeléctricas. As culturas energéticas com maior potencial e rendimento de produção são o cardo e a cana. Biomassa de Resíduos Agrícolas Os resíduos da actividade agrícola, como sejam os resultantes da actividade de produção, recolha e processamento de matérias-primas dentro do sector agrícola, podem ser utilizados como biomassa. Os resíduos agrícolas susceptíveis de aproveitamento como biomassa são: - Resíduos herbáceos como a palha de cereais e resíduos que se deixam na terra depois da sua recolha, tais como:

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- Resíduos do cultivo de cereais, como sejam a palha de trigo, cevada, aveia, centeio, arroz e sorgo; - Resíduos de produções hortícolas; - Resíduos da produção de frutos secos; - Resíduos da produção de arroz; - Resíduos provenientes do cultivo para o sector agro-industrial, como sejam os resíduos do cultivo de algodão, girassol e colza; - Resíduos de cultivos dedicados à produção de legumes para alimentação humana e animal; - Os Resíduos provenientes das podas, como sejam podas de olival, vinhas, citrinos e árvores de fruto. Biomassa de Resíduos das Indústrias Agrícolas Os resíduos das indústrias agrícolas resultantes das actividades de processamento de matérias-primas dentro do sector agrícola, têm forte potencial de utilização como biomassa para a produção de energia. Os resíduos susceptíveis de aproveitamento como biomassa são: - Resíduos da produção de azeite, como sejam o bagaço de azeitona; - Resíduos da produção de azeitona, como sejam o caroço da azeitona e resíduos de lavagem; - Resíduos da extracção de óleos vegetais, com sejam o óleo de girassol e de colza; - Resíduos das indústrias de produção de vinho; - Resíduos das indústrias de produção de frutos em conservas; - Resíduos das indústrias de produção de cerveja; - Resíduos das indústrias de produção de sumos de frutas. Desde que política e legislativamente sejam previstos valores remuneratórios minimamente atractivos para a energia produzida a partir destas biomassas, poderemos estar, também, aqui perante um potencial de autonomia energética não negligenciável.

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3.12. O papel do Estado articulação com orientações comunitárias Tendo em conta a análise atrás expendida, vejamos o que consta dos objectivos do Livro Verde da Comissão Europeia sobre uma “Estratégia europeia para uma energia sustentável, competitiva e segura” *SEC(2006) 317 - Bruxelas, 8.3.2006 COM(2006) 105 final]. Este documento determina aos Estados-membros da UE a adopção de medidas que visem, designadamente: Realizar os mercados internos do gás e da electricidade – com o reforço, uma melhor interconexão e competitividade entre as redes, o apoio aos investimentos no seu melhoramento, a criação de um regulador europeu e o reforço da compatibilização e cooperação entre os reguladores dos vários Estados-membros; Assegurar que os seus mercados internos da energia garantam a segurança do aprovisionamento e a solidariedade entre Estados-Membros – com a revisão, face aos desafios actuais, da legislação comunitária ainda vigente sobre reservas de petróleo e de gás, a criação de um Observatório Europeu do Aprovisionamento Energético para garantir maior transparência e, ainda, o reforço da cooperação entre operadores de rede; A abertura de um debate a nível comunitário sobre as diversas fontes de energia, incluindo os seus custos e contributos para as alterações climáticas; A gestão, pela Europa, dos desafios das alterações climáticas em harmonia com os objectivos de Lisboa – designadamente, com um objectivo claro de dar prioridade à eficiência energética, com uma meta de poupança de 20% da energia que a UE utilizaria até 2020, adoptando uma série de medidas concretas para atingir este objectivo e, ainda, com a adopção de um roteiro a longo prazo para as fontes de energia renováveis; A adopção de um plano estratégico para as tecnologias energéticas – para a utilização o melhor possível dos recursos europeus; A adopção de uma política energética externa comum - para dar resposta aos desafios dos preços elevados e voláteis da energia, do aumento da dependência das importações, de uma procura energética em forte crescimento a nível global e do aquecimento do clima.

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PARTE IV - A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA Estima-se que em Portugal mais de metade da energia consumida seja desperdiçada. E, mais grave, quando se consome energia não renovável, consome-se algo que não voltará a existir, isto para além de se contribuir irremediavelmente para o aquecimento do planeta (e o território português já hoje começa a ser afectado)! Fig 18 Crescimento do consumo de electricidade versus crescimento do PIB 7,0 6,0

Variação, %

5,0 4,0 3,0 2,0 1,0 0,0 -1,0 1996

1997

1998

1999

2000

2001 2002

Procura de electricidade

2003

2004

2005

2006

PIB

Fonte: REN

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 80/2008, aprovou o Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética, o qual engloba um conjunto alargado de programas e medidas consideradas fundamentais para que Portugal possa alcançar e suplantar os objectivos fixados no âmbito da Directiva n.º 2006/32/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril, relativa à eficiência na utilização final de energia e aos serviços energéticos. O PNAEE vem trazer uma maior ambição e coerência às políticas de eficiência energética, abrangendo todos os sectores e agregando as várias medidas entretanto aprovada, apresentando um conjunto alargado de novas medidas em 12 programas específicos, cujo objectivo é obter até 2015 uma redução de 10% dos consumos energéticos (a meta europeia é de 8%).

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Reconhecidamente, uma parte substancial da ineficiência energética em Portugal encontra-se no sector dos edifícios. Com objectivo de aumentar a eficiência energética nos edifícios e nos transportes, foi criado o Sistema de Certificação Energética dos Edifícios, em aplicação desde Julho de 2007, segundo o qual todos os edifícios terão um certificado de consumo energético com informação sobre o consumo do edifício e medidas para a sua redução. No sector automóvel, com a aprovação do Orçamento de Estado de 2007, iniciou-se uma alteração fundamental ao nível da fiscalidade automóvel: 10% do imposto automóvel passou a depender das emissões de gases de efeito de estufa. Na área do sector residencial e serviços, são identificadas medidas na área da iluminação, electrodomésticos, equipamento informático e de escritório e é feita uma quantificação do impacto da certificação energética dos edifícios. No sector dos transportes é dada especial atenção à questão dos incentivos à aquisição de veículos energeticamente

eficientes

(menores

emissões

de

CO2),

bem

como

aos

biocombustíveis e ao gás natural rodoviário.

73

20 DE JULHO DE 2009 73 ____________________________________________________________________________________________________________

CONCLUSÕES O tema energia está, como não poderia deixar de estar, na agenda do país. Essa é claramente a primeira e mais importante conclusão dos trabalhos desta Comissão. Quer por razões ambientais – nelas se incluindo o cumprimento dos compromissos internacionais de Portugal de Quioto – ou por razões económicas tão evidentes no ano de 2008, a energia está mesmo e forçosamente na agenda nacional. 1. Um desafio incontornável – um paradigma energético baseado e dependente maioritariamente

de

matérias-primas

fósseis,

e

fundamentalmente

de

hidrocarbonetos – petróleos e gás natural – é insustentável. Multiplicam-se os sinais de estar em curso a transição para a saturação da respectiva capacidade de produção, sem que estejam asseguradas outras fontes de energia primária de comparáveis qualidades e a ritmo de substituição que assegure essa transição, isenta de sobressaltos. A subida estrutural e continuada dos preços do petróleo bruto e do gás natural é a mais clara evidência desse facto. Por outro lado, os hidrocarbonetos são hoje igualmente matérias-primas com um papel único e ainda insubstituível em fileiras industriais como a química. A questão ambiental ligada às emissões de CO2, no actual quadro de conhecimentos, torna igualmente inadiável o consumo da energia com outras origens que não fóssil. O actual paradigma energético em Portugal e no mundo, porque é insustentável, exige uma revolução profunda. 2. Uma situação insustentável – o paradigma energético centrado nas energias fósseis confronta o País com uma situação insustentável, pondo em causa o seu desenvolvimento económico e a qualidade de vida dos portugueses. O País apresenta de há muito e com tendência crescente, um elevado défice energético – dependência superior a 80% dos consumos –, profundamente preocupante, seja em termos da segurança do abastecimento, seja em termos dos efeitos sobre a balança de pagamentos – o défice da balança energética atingiu em 2006 o astronómico valor de 8900 milhões de euros (só petróleo e gás natural), um

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acréscimo de 177% para o petróleo e 91% para o gás natural face a 2002. A agravar a situação, o facto de tal dependência estar afunilada no petróleo, cujos derivados, em 2005, já representavam 68% do consumo final de energia. Os estrangulamentos das políticas energéticas identificam-se nesse défice mas também na elevada irracionalidade dos consumos de energia, de que decorrem baixas eficiências, desperdícios e elevados impactos ambientais, no subaproveitamento do potencial endógeno e agravada dependência do exterior. Com uma poderosa factura energética, elevadas e crescentes intensidades energética e carbónica, elevados preços comparativos para consumidores e empresas, temos hoje em Portugal uma questão energética. O País apresenta ainda a contradição de, simultaneamente, ter uma enorme dependência face aos combustíveis fósseis, ao mesmo tempo que dispõe de elevados e diversificados potenciais em energias renováveis (solar, eólica, oceânica, biomassa e hídrica) largamente inexplorados. 3. Uma conclusão objectiva – a necessidade de revolucionar / mudar de paradigma energético. Uma mudança que reduza drasticamente a dependência das energias fósseis, aumente significativamente a eficiência energética do consumo, trave as emissões de CO2 e aproveite o potencial endógeno do País em energia a um ritmo sustentado. O novo paradigma passará obrigatoriamente por um mix de diversas formas e origens. Um mix onde as energias fósseis têm de perder significativamente peso, a par da crescente presença das renováveis e aproveitamento dos recursos endógenos, e onde a eficiência energética é uma exigência transversal a toda e qualquer política. O que exige a mudança de paradigma nos transportes. A sustentabilidade como principal critério decisor. Sustentabilidade como um conceito que integra três dimensões: as fontes de energia «não devem ser substancialmente exauridas pelo uso continuado»; a sua exploração e usos «não devem gerar emissões poluidoras e outros riscos para o ambiente a uma escala significativa» e «não envolvam a perpetuação de riscos para a saúde humana, assim como de injustiças sociais».

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A sustentabilidade, com as três dimensões, económica, ambiental e social, deve assumir-se como «uma noção relativa e nunca absoluta». E deve ser ainda um paradigma que assuma a cooperação internacional entre países com níveis diferentes de desenvolvimento, para vencer as enormes assimetrias hoje existentes no acesso e fruição dos recursos energéticos. 4. Uma questão chave, a participação dos cidadãos – uma transição de paradigmas adequada às necessidades do tecido económico e qualidade de vida dos portugueses, assegurando um desenvolvimento sustentado. Esta é a questão chave que se coloca à política de energia em Portugal, nomeadamente na avaliação e gestão dos seus custos económicos, ambientais e sociais. A definição de objectivos localizados no espaço do novo Paradigma, exige que se seja capaz de estabelecer a progressividade e metas intermédias susceptíveis de «aterragens suaves» por parte do tecido económico e social. Nomeadamente não devem nem podem contribuir para uma maior fragilização dos sectores produtivos, a mobilidade das populações já hoje mais «distantes e isoladas», ou o agravamento das desigualdades sociais. A urgência da mudança exige o bom senso de a considerar um processo, que deve ter a obrigatória participação dos cidadãos e atenção às suas condições de vida, emprego e direitos. 5. Um quadro constitucional que deve ser respeitado – a Constituição da República Portuguesa estabelece, no seu Artigo 81.º, alínea m), como incumbência prioritária do Estado no âmbito económico e social, «Adoptar uma política nacional de energia, com preservação dos recursos naturais e do equilíbrio ecológico, promovendo, neste domínio, a cooperação internacional;». 6. Eficiência energética, o novo e necessário paradigma - Apesar de a estratégia nacional para energia, aprovada pelo Governo em 2005, considerar como um objectivo a eficiência energética, mesmo apesar de Portugal ter, desde 2008 um plano nacional para a eficiência energética o que é inédito na política portuguesa, muito há a fazer. As escolas, ao nível da formação cívica, e quer o ensino superior e politécnico devem ter um papel ainda maior no reforço dos conteúdos programáticos sobre eficiência energética.

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Com efeito a promoção da eficiência no uso da energia é prioritária para a redução da dependência energética portuguesa, que continua a ser avaliada em mais de 80%, um valor substancialmente superior ao da média Europeia, cerca de 50% (média entre 2000 e 2004). O Plano Nacional para a Eficiência Energética (aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 80/2008 de 20 de Maio) foi o primeiro documento do género aprovado em Portugal e estabelece metas mais ambiciosas que a média da U E (as metas em Portugal estão avaliadas em €600M e em cerca de 10%) mas deverão ser de facto integral e rapidamente implementadas e complementadas com acções mais fortes de sensibilização dos cidadãos e o reforço de componentes pedagógicas, em especial nas escolas portuguesas e em todos os graus de ensino. O bom exemplo ao nível da separação dos lixos foi por diversas vezes referido e apontado como um exemplo a seguir na questão da eficiência energética. Apesar de 2007 e 2008 terem sido os primeiros anos, desde o inicio da década, em que o consumo de energia cresceu menos que a economia, Portugal continua a ter no capítulo da intensidade energética resultados que demonstram não existir racionalidade e eficiência no seu consumo pela generalidade das empresas e das famílias. Uma evidência foi a de que os consumidores de energia, pequenos consumidores familiares, grandes consumidores industriais ou de serviços e o próprio sector público, precisam de ser sensibilizados para a poupança, para a eficiência energética. E essa é a conclusão mais evidente dos trabalhos desta Comissão. Na legislatura que agora termina apostou-se no ensino do inglês no ensino básico e nas novas tecnologias. A próxima legislatura deverá apostar e reforçar, em todos os níveis de ensino,

a

componente pedagógica da eficiência energética. 7. Energias renováveis - Não se consegue entender nem encontrar uma justificação para que Portugal, um país que sempre comprou ao exterior quase toda a energia que consumiu e que consome, não tenha desenvolvido, durante décadas e décadas, tecnologia e fontes de energia alternativas que garantissem quer um maior equilíbrio

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das contas externas, quer o desenvolvimento de uma verdadeira fileira tecnológica nacional na área da energia, que finalmente agora começa a tomar forma. Há todavia factos novos: quer a produção, quer o consumo de energia em Portugal são hoje mais renováveis do que eram no início da década e no inicio desta legislatura. De referir que nesta década, os anos de 2007 e 2008 são mesmo uma marca quanto a esta questão. Nestes dois anos, mais de 40% da electricidade consumida teve origem renovável. Tendo começado mais tarde do que muitos outros, Portugal está actualmente em 10 º lugar nos países do mundo com maior capacidade eólica instalada. Na hídrica está em curso o reforço da capacidade hidroeléctrica de Portugal. Portugal tem já hoje um grande aproveitamento da força dos rios com cerca de 46% do potencial aproveitado. O Governo pretende aumentar esse potencial, não sem polémica, com um Plano Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico. A reversibilidade de algumas barragens (e a sua ligação à energia eólica) é já hoje possível de realizar com as barragens já existentes, o que pode ser um factor chave na aposta e no investimento nos existentes 181 parques eólicos e nos 1680 aerogeradores. Em Portugal nos últimos anos foram aprovadas medidas decisivas na área das fontes renováveis de energia colocando o nosso país como o mais ambicioso da União Europeia em termos de emissão per capita de gases de efeito estufa (7,6 t de CO2/ habitante versus uma média comunitária de 10,0 t de CO2/habitante) e o terceiro país da Europa na utilização de fontes de energia renovável na produção de electricidade, já em linha com os objectivos para 2010 (45%), e em 2020 (60%). Apesar desta aposta o peso das energias fósseis (carvão, petróleo e gás natural) tem vindo a diminuir apenas moderadamente nos consumos de energia primária, em Portugal (era em 2000 de 85% e em 2007 de 82%). A aposta na diversidade de fontes primárias é um dos caminhos que a comissão entende como essenciais. Sendo um factor de divisão na sociedade portuguesa, extremamente polémico, sem consenso e incapaz de resolver no curto médio prazo os

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problemas energéticos nacionais, sendo que não é uma fonte primária renovável, a energia nuclear, pode ser alvo de debate, amplo e esclarecedor, que terá sempre como resultado uma maior consciencialização por parte dos consumidores sobre os consumos de energia e das opções que acarretam. 8. As políticas ambientais e o desenvolvimento tecnológico - Há espaço, oportunidade e estratégia para crescer e para inovar em todos os componentes do mix energético português. Há um conjunto de tecnologias e de formas de produção de energia que nos poderão permitir diminuir a nossa dependência dos combustíveis fosseis, e em especial do petróleo. Todavia, mesmo ao nível mundial, muitas dessas tecnologias só muito recentemente começam a estar suficientemente maduras do ponto de vista tecnológico que permitam a sua comercialização. É o caso da utilização de novas fontes de energia nos transportes, com a utilização da electricidade, dos biocombustíveis e do hidrogénio (sem qualquer expressão em Portugal). Em relação aos biocombustíveis, o objectivo de incorporação de 10% em 2010, está sujeito às obras de adaptação da refinaria de Sines e de um mercado externo e interno que tarda em funcionar, sendo que não se deve perder do horizonte os riscos inerentes em relação aos agrocombustíveis (dedicados e de 1ª geração) pela competição que faz aos bens alimentares e impactos na floresta nalguns locais do globo. Acrescente-se que, dada a nossa realidade do território, para aquelas metas, Portugal continuará sempre a importar matéria-prima, não sendo vantajoso do ponto de vista da independência nacional. Já nos automóveis eléctricos foram dados grandes e passos firmes no sentido da sua implementação em Portugal, quer através de medidas fiscais que favorecem os automóveis menos emissores de CO2 quer na candidatura portuguesa para receber a futura fábrica europeia de baterias da Nissan-Renault, destinada a alimentar carros eléctricos, quer no compromisso para o desenvolvimento de pontos de carregamento de baterias de veículos eléctricos nos municípios de Lisboa, Porto, Coimbra, Sintra, Vila

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Nova de Gaia, Loures, Cascais, Almada, Braga, Guimarães, Leiria, Setúbal, Viana do Castelo, Aveiro, Torres Vedras, Santarém, Faro, Évora, Beja, Castelo Branco e Guarda. A rede piloto, recentemente subscrita por aqueles municípios, terá cem pontos de carregamento ainda em 2009 e cerca de 1300 em 2011, instalados em parques de estacionamento públicos, centros comerciais, bombas de gasolina, hotéis, aeroportos, garagens particulares e vias públicas. Na área da investigação em energia, deverão ser reforçadas as ligações entre as Universidades, as empresas e o Laboratório Nacional de Energia e Geologia, potenciando ainda o programa MIT Energia. 9. A democratização da produção de energia: A Comissão considerou muito interessante, inovador o actual regime aprovado pelo Governo relativo à microgeração. A geração de energia pelo próprio consumidor (utilizando equipamentos de pequena escala, nomeadamente painéis solares, microturbinas, microeólicas ou outro tipo de tecnologia, possibilita para alem de um grau elevado de eficiência energética (especial no respeita às redes), o aproveitamento da energia solar. Concluída a primeira fase deste processo a CEAQE entende que devem ser dados passos no sentido de aumentar a capacidade de resposta deste programa junto dos cidadãos. 10. Automóveis eléctricos. A aposta do Governo nos carros eléctricos é inovadora e importante colocando Portugal na vanguarda dos países da Europa. Deverão ainda ser tomadas medidas administrativas e fiscais que facilitem e simplifiquem a transformação das actuais viaturas poluentes para eléctricos ou GPL. 11. Os edifícios do Estado e a eficiência energética. Nos edifícios públicos do Estado devem ser estudadas fórmulas de prémio (orçamentais ou outros) em função de objectivos de eficiência energética. 12. No sector dos transportes entende-se que é fundamental uma aposta mais forte no incentivo e financiamento dos transportes públicos colectivos, bem como do transporte ferroviário que deve ter consequência na definição e no planeamento de uma rede nacional de transporte ferroviário convencional, utilizando energia de fonte renovável.

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13. Segurança energética - Na segurança do abastecimento é de notar a importância estratégica do complexo de Sines, nomeadamente permitindo uma alternativa ao gás natural proveniente do Norte de África e a possibilidade de colocar, através de um oleoduto os diversos combustíveis na zona da Grande Lisboa. Notou-se pela negativa, a inexistência de uma ligação desse tipo ao aeroporto de Lisboa o que contribui para um tráfego diário de dezenas de autotanques de combustível entre Aveiras e o aeroporto de Lisboa. A ver da CEAQE perde o ambiente e perde a segurança dos portugueses 14. Regulação, concorrência e formação de preços - Uma palavra fundamental: transparência na formação de preços. Respeitando os princípios da sã concorrência entre as empresas, a CEAQE vê com muito interesse o estabelecimento de um princípio que consagre a exigência de ser dado ao consumidor final informação transparente sobre as diversas parcelas que compõem o preço final da energia em Portugal. 15. Uma nova fiscalidade para a política energética - A tributação das actividades e os respectivos índices constituem, quiçá, o instrumento político mais eficaz e de efeitos mais imediatos para a modelação dos comportamentos dos agentes económicos e dos cidadãos. Assim sendo, em face de tudo o que antecede, torna-se prioritário que uma nova política fiscal venha privilegiar e dar cobertura, designadamente, a todas os objectivos prioritários que atrás ficaram traçados para a política energética, com especial relevo para as questões da eficiência energética, nomeadamente com discriminação fiscal positiva para as famílias com maior eficiência energética per capita. A CEAQE entende ainda que se deve prosseguir um caminho de menor taxação das actividades de eficiência energética. 16. Mais acompanhamento parlamentar das questões da energia - A actualidade, a dimensão global e as interdependências de que se revestem as questões energéticas, designadamente, para com o Ambiente em geral e, em especial, para com a matéria das Alterações Climáticas, mas, também, para com a Economia, os aspectos sociais e, até, os próprios regimes políticos, pois os condicionamentos que as questões energéticas poderão exercer sobre as suas opções e acções são cada vez mais

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potencialmente expressivos, levam a que se registe uma premência das questões energéticas a todos esses níveis referidos: Ambiental, Social, Económico, Político e, por isso também, da Qualidade de Vida dos cidadãos. Estas serão, pois, em nosso entendimento, razões mais do que suficientes para que se recomende, neste final dos trabalhos da CEAQE, que no Parlamento seja criada uma sub-Comissão para, de forma permanente, acompanhar as questões energéticas e os consequentes interfaces atrás referidos – entre outros eventualmente possíveis. Entende-se ainda que seria de todo o interesse que a Assembleia da República, passe a organizar, através da comissão parlamentar competente, uma conferência sobre energia, bem como a criação de um premio nacional de boas práticas sobre energia e sustentabilidade.

Lisboa, 9 de Julho de 2009

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Grupo Parlamentar

Declaração de Voto Os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata vêm, nos termos do disposto nos números 1 e 3 do artigo 87º do Regimento da Assembleia da República, apresentar a seguinte declaração de voto relativa ao debate sobre o Relatório Final da Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas, com os seguintes fundamentos: 1. A

Comissão

Eventual

de

Acompanhamento

das

Questões

Energéticas (CEAQE), foi criada pela Resolução da Assembleia da República nº 66/2006, publicada no Diário da República I – A Série, nº 234, de 6 de Dezembro, e surgiu na sequência do Projecto de Resolução n.º 158/X, do Grupo Parlamentar do PSD, que recolheu a unanimidade de todas as bancadas parlamentares. 2. A CEAQE iniciou os trabalhos em Maio de 2005, com o objectivo expresso, no seu acto constitutivo, de acompanhar a política energética e ainda, por acordo entre os diversos Grupos Parlamentares e Sua Excelência o Presidente da Assembleia da República, organizar uma conferência parlamentar sobre o tema, para além da realização de visitas a equipamentos da área da energia. 3. Assim, a CEAQE levou a cabo dezenas de audições com especialistas na matéria, através das quais foi possível apurar, com um elevado grau de cristalinidade, não apenas a realidade energética – e os correlativos aspectos ambientais, económicos e sociais – nacional, como o seu enquadramento mais amplo no actual contexto energético internacional.

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4. Por isso, ficaram também muito claros e evidentes, para todos os Srs. Deputados membros da CEAQE, os contornos da história e dos factos da política energética nacional, pelo menos desde as últimas três décadas do séc. XX até aos nossos dias. 5. Não podem, desta forma, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata subscrever a forma absolutamente parcial, sempre em tom favorável às actuações do actual Governo e com desprimor para todos os restantes, eleitoralista e, sobretudo, as omissões e distorções que, intencionalmente, se inscrevem tanto no corpo do Relatório Final, como nas suas conclusões. 6. Não aspirando sequer a ser exaustivos nesta curta análise refira-se, apenas, que, por exemplo, o Relatório Final: Omite por completo a referência ao nascimento e desenvolvimento da política de promoção das energias renováveis no nosso País a partir do marco de referência que constitui o Decreto-Lei nº 189/88, de 27 de Maio, que aprovou o regime jurídico-legal para a produção de energia eléctrica a partir da utilização de “recursos renováveis, combustíveis nacionais ou resíduos industriais, agrícolas ou urbanos”, ou, ainda em instalações de co-geração;

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Recusa

qualquer

referência

às

várias

iniciativas

parlamentares apresentadas, designadamente nesta mesma Legislatura, pelo Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata no sentido da promoção do aproveitamento energético a partir de centrais mini-hídricas – Iniciativas essas cuja aprovação o Grupo Parlamentar do Partido Socialista impediu, apesar de, no seu conjunto nacional, a soma do potencial destes aproveitamentos representar, entre pequenos e médios aproveitamentos hidroeléctricos, perto de 1.000 MW por explora, e isso, somado à potência já instalada no País, perfazer um total de 1.580 MW, ou seja, 500 MW a mais do que a potência total prevista para a concretização do Programa Nacional de Barragens lançado pelo actual Governo; Ignora, em consonância com o ponto anterior, o facto de o actual Governo praticamente não emitir licenças para aproveitamentos mini-hídricos há quase quatro anos consecutivos; Não respeita – omitindo-os deliberadamente – nem o esforço, nem todo o trabalho desenvolvido, ao longo de anos, em prol do interesse nacional, pelos anteriores Governos Sociais Democratas no lançamento e promoção da instalação do Gás Natural no nosso País, quando reporta,

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na página 12, ao ano de 1995 e seguintes a “aposta clara na criação de uma rede de gás natural”, quando foi o DecretoLei nº 374/89, de 25 de Outubro, que aprovou, nesse ano, “o regime do serviço público de importação de gás natural liquefeito e gás natural, da recepção, armazenagem e tratamento do gás natural liquefeito, da produção de gás natural e dos seus gases de substituição e do seu transporte e distribuição”; Omite qualquer referência ao concurso público lançado pelo anterior Governo em 17 de Fevereiro de 2005 para a atribuição de um total de cerca de 1.100 megawatts (Mw) de nova potência para produção de electricidade em centrais eólicas, bem como da correlativa instalação em Portugal de fábricas de produção de componentes para as torres eólicas; Alude, na sua conclusão nº 6, ao Plano Nacional para a Eficiência Energética (aprovado pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 80/2008 de 20 de Maio) como “o primeiro documento do género aprovado em Portugal”, que “estabelece metas mais ambiciosas que a média da U E “, o que, pura e simplesmente, não corresponde à verdade. Refere-se, na conclusão nº 7, ao nosso País, como tendo o actual Governo aprovado, nos últimos anos, medidas decisivas na área das fontes renováveis de energia que o

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colocaram “como o mais ambicioso da União Europeia em termos de emissão per capita de gases de efeito estufa”, o que também não é fiel à realidade. 7. Enfim, entre muitos outros aspectos que, por fastidioso e exaustivo, nos abstemos de aqui ora elencar. Nestes termos, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata entendem apresentar a presente Declaração de Voto, justificando, assim, a posição deste Grupo Parlamentar contra o Relatório Final da Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas, por considerarem pecar o mesmo por inexactidões e omissões graves e pelo recurso insistente ao uso de um tom eleitoralista.

Palácio de São Bento, 14 de Julho de 2009.

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Partido Popular CDS-PP Grupo Parlamentar Declaração de Voto

A questão da energia tem sido tratada em Portugal essencialmente no âmbito da economia, por ser considerada meramente um dos seus sectores ou um factor de produção. O CDS-PP Entende que essa perspectiva é redutora e insuficiente para encontrar as respostas para uma questão que cada vez mais irá ocupar um lugar central nas nossas preocupações e no debate político. A energia é também uma questão ambiental e de segurança nacional, que condiciona a sobrevivência do nosso modo de vida, sendo afectada pelo fenómeno das alterações climáticas, pelo protocolo de Quioto, pelo comércio de emissões e todas as decisões que a nível europeu e internacional têm vindo a ser tomadas, em que, as relações internacionais e a geopolítica, a inovação e a ciência ocupam um papel central. A energia passou, por isso, a ser um tema com importância própria.

Consideramos por isso que a criação da Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas teve o mérito de tratar a questão com a interdisciplinaridade que, nos dias de hoje, é a abordagem mais desejável.

Lamentamos que a Comissão não tenha ouvido especialistas na área da geopolítica, apesar do CDS-PP o ter por várias vezes sugerido, pois os seus trabalhos ficariam a ganhar com o aprofundamento dos problemas da questão energética para a segurança global, europeia e nacional.

Sabemos que o desenvolvimento económico em Portugal se tem baseado essencialmente na utilização de recursos energéticos fósseis importando cerca de 85% da energia total que consome, apesar do potencial de utilização de fontes renováveis ser grande e do elevado potencial em economia de energia das diversas actividades.

O CDS-PP considera também que, ao contrário do que ficou expresso nas conclusões do relatório dos trabalhos desta comissão, a energia, seja nos combustíveis ou na electricidade, apresenta graves problemas no funcionamento do mercado, com a existência de monopólios

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privados de facto, que têm sérios reflexos na formação dos preços e que a regulação se tem revelado incapaz de resolver.

Ao contrário da extrema-esquerda, que exige o regresso ao sistema de fixação de preços, a nossa resposta deve ser que a missão fundamental do Estado é a de criar verdadeiras condições de mercado, onde ele na realidade não existe.

O problema está por isso a montante da regulação dos preços, realizada de forma deficiente pela Autoridade da Concorrência, ou pela Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos. A regulação deve incidir na excessiva concentração no mercado e nas situações suspeitas de configurarem abuso de posição dominante, actualmente existentes, separando actividades, em particular as que têm tendência em se tornar monopólios naturais.

O CDS-PP considera que em relação aos combustíveis, se deve caminhar no sentido de separar a actividade de produção e distribuição, da propriedade e gestão dos terminais marítimos de produtos petrolíferos nos portos de Leixões e Sines, das infra-estruturas de armazenamento e dos oleodutos. Só colocando esses equipamentos à disposição dos diferentes operadores em condições de igualdade será possível criar condições de efectiva concorrência, permitindo o seu acesso à matéria-prima no mercado global, seja petróleo ou derivados, beneficiando realmente os consumidores.

Problema semelhante, embora com uma complexidade ainda maior, tem o sector eléctrico, em que a separação entre produção e propriedade da rede de alta tensão, não se tem revelado suficiente para resolver o problema da concorrência. A falta de ligações eléctricas ao resto da Europa, a atitude agressiva do operador monopolista de facto nos leilões de acesso à rede, o facto de a média tensão continuar a ser de sua propriedade, a verdadeira inexistência do MIBEL, a forma como foi prorrogada a concessão das barragens, leva a que não existam condições de acesso ao mercado que permitam a concorrência entre operadores.

O acesso às redes eléctricas constitui uma das questões centrais do problema e conduz tendencialmente à existência de um monopólio natural, o que deve ser impedido. Essa dificuldade de acesso é particularmente sentida pelos novos produtores, que viram os pedidos de informação prévia congelados pela Direcção Geral de Energia e Geologia (DGEG); mas também pelos consumidores, não apenas nos preços mais altos que pagam, mas também na exiguidade dos leilões de acesso à rede para a micro-geração, o que permitiria a sua conversão em consumidores-produtores. A rede deve ser considerada um bem público e cabe ao Estado garantir a liberdade de acesso, dentro dos condicionalismos técnicos existentes, pois é condição fundamental para a existência do mercado da electricidade.

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Está a avolumar-se no mercado, e em particular nos consumidores, a suspeita de que o sistema de inscrição para a micro-geração, com dificuldade de acesso informático para uns e facilidade para outros, não funciona de forma transparente, o que é um sinal contrário ao que deveria ser dado para haver um avanço significativo nesta forma de produção de energia.

Apesar da recente baixa do preço do petróleo, a questão da composição do preço da electricidade deve ser analisada e repensada com o maior cuidado: seja por causa da questão do deficit tarifário, seja por causa do impacto do financiamento das energias renováveis. O aumento que a parcela de custos gerais vai ter na tarifa, sem que o consumidor sinta contrapartidas reais pelo facto de estar a financiar as políticas do Estado, vai levar a uma situação de insustentabilidade do sistema com consequências perniciosas para todos nós. É fundamental propor critérios de justiça na repartição do esforço e explicá-los pedagogicamente.

Todos estes factos foram apurados ao longo das audições realizadas por esta Comissão, sem que tenham sido devidamente vertidos nas conclusões do Relatório, o que se traduz na ocultação dos principais problemas no funcionamento da concorrência no sector da electricidade.

Face ao aumento dos custos, tem havido quem proponha que Portugal recorra à energia nuclear, à semelhança do que fez Espanha e outros países europeus de onde importamos electricidade. Consideramos que a energia nuclear não é, neste momento, uma solução para o problema português, desde logo por razões económicas: não temos escala para o fazermos sozinhos e Espanha está a repensar essa opção, a tecnologia teria que ser importada (com um período de espera superior a 10 anos) e com custos nem sempre correctamente estimados (a central finlandesa de nova geração, só na placa teve um sobrecusto de mais de 30%); mas também por razões ambientais, os resíduos continuam a não ter outra solução a não ser o armazenamento e o dificílimo desmantelamento das centrais tem tido que ser financiado com dinheiros públicos, que não são verdadeiramente contabilizados.

A tecnologia, na questão da energia, ocupa também um papel central - sejam refinarias, geradores hidroeléctricos, centrais nucleares, etc. – ela em regra é cara, é importada, apenas um número reduzido de empresas as produzem e têm listas de espera de anos. Nas energias renováveis, apesar do seu custo e de em algumas tal poder também começar a acontecer, face ao seu estado de desenvolvimento actual é ainda possível inovar, pelo que nelas se deve investir, pois aproveitam-se os nossos recursos endógenos, ao mesmo tempo que se cria valor acrescentado para o país, podendo exportar a tecnologia criada pelas nossas empresas e universidades.

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No sentido do desejável incremento de fontes de energia consideradas renováveis, na medida em que estão constantemente a ser repostas e a sua utilização não conduz à sua exaustão, é com agrado que se vê empresários esclarecidos e ambientalistas a pugnarem pela aplicação da directiva europeia sobre o comércio europeu do carbono, sendo que até 2007 mais de 5.000 empresas produtoras e consumidoras de recursos energéticos transaccionaram direitos de emissão de gases com efeito de estufa no chamado “mercado de carbono”. Em Portugal o Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE) concretizou-se no Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão de CO2 (PNALE) na sua revisão para os anos 2008-2012.

Segundo estudos efectuados, o comércio de emissões permitirá reduzir em 35% os custos de cumprimento do Protocolo de Quioto, ou seja, a economia europeia poupará aproximadamente 1.500 milhões de Euros/ano.

Dado que Portugal ultrapassou o limite em mais de 25% em termos de emissões de gases com efeito de estufa, o comércio de emissões configura sempre uma forma económica de cumprir o Protocolo de Quioto, dado que a nossa opção não é entre cumprir ou não Quioto, mas sim a que preço é que se quer cumprir Quioto, sendo que esta directiva permite cumpri-lo de uma forma mais económica. A criação do Fundo Português de Carbono e o seu financiamento com as taxas sobre as lâmpadas incandescentes e o gasóleo para aquecimento, acrescido de verbas directas do Orçamento do Estado, sem que seja suficiente para cumprir os nossos compromissos internacionais, demonstra o impacto que a economia e os portugueses vão sofrer, se nada for feito.

Deve-se contudo considerar, que a aplicação desta directiva deve ser baseada em efectivas políticas que promovam em primeira instância a economia de energia e por consequência o recurso às energias renováveis, à eficiência energética e à agricultura biológica, complementadas com a tributação sobre o CO2 nos transportes. Para tanto é fundamental ter um Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética (PNAEE), aprovado em 2008, que seja realmente eficaz e que seja centrado na energia primária consumida, o que não foi o caso.

O CDS-PP verifica com preocupação que o actual Governo do Partido Socialista tem subfinanciado o Fundo Português de Carbono conscientemente, o que é um erro, que vai onerar os próximos Orçamentos Gerais do Estado.

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Tendo sido a energia hidroeléctrica e a energia da biomassa as principais fontes renováveis utilizadas em Portugal, existe uma atenção renovada sobre as potencialidades decorrentes da utilização da energia eólica e da energia solar.

Fazendo uma resenha sobre o “peso” das fontes energéticas mencionadas, verifica-se que a produção hidroeléctrica representa em anos hidrológicos normais, cerca de um terço da produção total, sendo que além do Plano Nacional de Barragens, defendemos que se devem promover os projectos de mini e micro hídricas como reforço de instalações existentes, pois têm impactes ambientais e sociais reduzidos. O potencial total para este último tipo de projectos é estimado em cerca de 1 GW, sendo razoável considerar uma capacidade instalada de cerca de 400 a 500 MW até 2010.

Refira-se ainda que relativamente às micro hídricas (abaixo de 10 MW), existe um enorme potencial de reduzido impacte ambiental, mas a custo elevado. Surge aqui uma enorme potencialidade para a recuperação de antigos moinhos de azenhas., contudo a valia essencial destes projectos deve ser a lúdica, educativa e só depois a económica.

Salienta-se que o desenvolvimento e a aplicação da energia hidroeléctrica configura uma contribuição positiva para o objectivo nacional em termos de limitação das emissões de gases com efeito de estufa e outras emissões atmosféricas nocivas (ex: NOx, SO2, etc.), assim como para o objectivo de redução da dependência energética.

Em relação à biomassa (matéria orgânica de origem vegetal ou animal) verifica-se a sua utilização, directamente através de combustão directa para aquecimento ou após transformações químicas ou biológicas de forma a aumentar o poder energético do biocombustível: gaseificação (conversão de biomassa num combustível gasoso e/ou líquido utilizado para aquecimento, co-geração ou em motores (transportes)), pirólise (conversão de biomassa num combustível gasoso utilizado directamente para aquecimento ou para produção de electricidade em co-geração) e digestão anaeróbica (conversão de biomassa em biogás utilizado para a geração de calor e/ou electricidade).

Sublinha-se que o incremento do uso energético da biomassa é também uma contribuição positiva no que respeita ao controle das emissões de gases com efeito de estufa e outras emissões atmosféricas, sendo que a tratamento dos resíduos e efluentes com aproveitamento do biogás pode trazer importantes benefícios, tais como: evitar a libertação de metano para a atmosfera (um dos gases responsáveis pelo efeito de estufa); produzir um fertilizante natural para a agricultura, substituindo desta forma os fertilizantes químicos, altamente consumidores de energia (note-se que cada kg de azoto de síntese na forma de fertilizante despendeu pelo

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menos 16 kWh na sua formação); evitar a poluição das linhas de água pela sua eutrofização e o aproveitamento de resíduos florestais, combatendo desta forma as infestantes (como por exemplo, as acácias na serra de Sintra) e a praga dos fogos florestais (retirando matéria orgânica excedentária e abandonada).

No que respeita à produção de electricidade a partir da energia eólica tem-se verificado um incremento nos últimos anos um pouco por todo o mundo e particularmente em Portugal, sendo que a Europa representa mais de 2/3 da capacidade instalada a nível mundial. Em Portugal nota-se um forte incremento, estando projectado alcançar em 2010 uma potência instalada da ordem dos 2.500 a 3.000 MW.

Também o desenvolvimento desta fonte de energia renovável ao contribuir positivamente para a limitação das emissões de gases com efeito de estufa, confere também o objectivo de redução da dependência energética do exterior.

Por sua vez, a disponibilidade do recurso solar em Portugal é grande, nomeadamente quando comparada com a situação dos outros países da UE, pelo que é incompreensível o nosso atraso nos seu aproveitamento, quando comparado com eles. O potencial técnico aproveitável é elevado, quer através da utilização directa em edifícios aproveitada através da sua correcta localização, orientação, concepção e construção, reduzindo fortemente as suas necessidades energéticas, da conversão directa de energia solar em calor para aquecimento e produção de electricidade – Energia Solar Térmica; quer através da conversão directa de energia solar em energia eléctrica – Energia Solar Fotovoltaica.

A energia fotovoltaica é uma tecnologia com uma gama de aplicações muito diversificada e de grande flexibilidade, podendo ser utilizada para revestir edifícios, não consumindo espaço e dando melhores condições de conforto no seu interior, sendo de salientar o projecto de microgeração iniciado em 2008 de modo ainda insuficiente.

O CDS-PP lamenta a forma pouco transparente e atabalhoada como o Governo do PS procurou favorecer duas determinadas empresas de instalação de painéis solares para aquecimento de água, prejudicando centenas de outras, através de um acordo com a Banca por ele patrocinado. Foi uma interferência censurável e ilegítima no mercado, que estranhamente não consta da visão idílica do Relatório.

Finalmente, mencionam-se também os recursos geotérmicos (energia associada ao calor armazenado no interior da Terra, confinando-se aos Açores, onde existe uma central

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geotérmica) e a energia das marés, das correntes marítimas e do gradiente térmico das mares e a energia das ondas, onde vemos com preocupação que há empresas portuguesas que estavam a investir liderando na inovação, que agora estão com sérias dificuldades.

Da descrição sumária às fontes de energia renováveis passíveis de serem incrementadas em Portugal, o CDS-PP defende, em primeiro lugar, a necessidade de introdução de medidas de utilização racional de energia e utilização de energias renováveis, através da integração e desenvolvimento de projectos que contenham soluções economicamente mais rentáveis, mais favoráveis em termos ambientais e que sejam o garante de uma melhor qualidade vida para os portugueses.

O CDS-PP elenca algumas iniciativas que considera que devem ser prosseguidas: Produção e distribuição de água quente solar (AQS) ao sector doméstico e terciário produzida com recurso à energia solar, com regras transparentes que não perturbem ilegitimamente o mercado; Integração de energia solar, como energia principal, para a produção de águas quentes sanitárias (AQS) em infra-estruturas colectivas (ex: polidesportivos; piscinas; etc.); Definição de sistemas de aquecimento ambiente e de produção de AQS nas escolas, museus e outros edifícios públicos existentes e futuros; Definição de medidas de conservação de energia em edifícios novos e na reabilitação de existentes, integrado na implementação em Portugal da Certificação Energética de Edifícios, baseada na Directiva Europeia sobre Desempenho Energético em Edifícios (2002/91/CE), que baseado nos novos Regulamentos Térmicos dos Edifícios (RCCTE e RSECE), objectivam prioritariamente informar e sensibilizar utentes ou locatários de edifícios públicos e privados sobre as características térmicas, desempenho energético e sistemas consumidores de energia dos imóveis a eles adstritos, assim como informar quando necessário sobre possíveis reabilitações energéticas, e vemos com preocupação que o Governo do PS no novo Regime de Reabilitação Urbana tenha optado por, conscientemente, esquecer estas preocupações; Intervenção na iluminação pública, quer na substituição de lâmpadas por outras mais eficientes, quer na regulação dos fluxos luminosos, através da definição dos Planos Directores Municipais de Iluminação Pública; Introdução de combustíveis alternativos, incluindo o gás natural e o biodiesel, com o paralelo estabelecimento de incentivos fiscais que promovam a sua produção e o consumo em detrimento dos combustíveis fósseis, à semelhança da autorização dada pela Comissão Europeia à Suécia para favorecer os biocombustíveis neutros do ponto de vista de emissões de CO2 através de uma redução dos impostos. Esta medida foi aprovada no âmbito da Directiva 92/81/EEC sobre combustíveis fósseis, que estabelece os impostos mínimos a aplicar pelos estados membros;

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Valorização energética de biogás nas ETAR's; Criação de sistemas de tratamento de resíduos sólidos urbanos integrados para obtenção das sinergias necessárias à sua maior valorização e aproveitamento em termos energéticos, quer no aproveitamento da produção de biogás, quer na recolha e reciclagem de óleos alimentares usados para produção de biodiesel.

Não deixa de ser surpreendente que o Governo do PS tenha esquecido a função de valorização dos óleos alimentares, que podem ser usados na produção de biodiesel, que algumas autarquias tinham procurado realizar para consumo próprio, favorecendo nos concursos os grandes produtores, que neste momento estão atrasados. Mais censurável ainda é o facto de ter optado por multar, por exemplo a Freguesia da Ericeira, que actuou de forma duplamente responsável para o ambiente: valorização de resíduos e diminuição na emissão de CO2.

Face às conclusões do relatório da Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas e apesar do seu mérito o CDS-PP não o pode votar favoravelmente. Em causa, está no entender do CDS-PP a visão deturpada e demasiado idílica que o relatório dá da realidade energética e das acções desenvolvidas pelo actual executivo. Este relatório, apenas refere o que foi feito pelo Governo e omite o que ficou por fazer e a ausência de iniciativas legislativas em áreas como a valorização de óleos alimentares bem como a intervenção atabalhoada do Governo no concurso para a instalação de painéis solares.

O Deputado do CDS-PP, António Carlos Monteiro

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PARTIDOCOMUNISTAPORTUGUÊS GrupoParlamentar

Declaração do PCP Sobre o Relatório da

Comissão Eventual a para o acompanhamento das Questões energéticas

1. O Grupo Parlamentar do PCP avalia de forma muito positiva o balanço global do trabalho da CEAQE (Comissão Eventual para o Acompanhamento das Questões Energéticas). O significativo número de qualificadas audições, o debate travado na Conferência parlamentar realizada e as visitas efectuadas constituem um importante acervo de informações, análises e propostas sobre a questão energética. Problema crucial para o País, pela sua transversalidade a todas as áreas e sectores de actividade, pelos enormes défices que enfrentamos, pela sua dimensão estratégica para o nosso futuro colectivo. Considera o Grupo Parlamentar do PCP que o Relatório aprovado, e particularmente as suas Conclusões, não conseguiram reflectir e interpretar de forma suficiente e adequada o trabalho realizado pela CEAQE.

2. O voto de abstenção do Grupo Parlamentar do PCP sobre o corpo do Relatório reflecte a forma diferenciada com o avaliamos, na generalidade e especialidade, e que, sinteticamente, a seguir enunciamos.

2.1. O corpo do Relatório, que tem sempre inevitavelmente a «marca» ideológica e partidária do Relator, faz uma abordagem das audições e debates que estiveram presentes no trabalho da Comissão. Mas integra e adere, com longas citações, à política de energia do Governo e às orientações traçadas pelos órgão da União Europeia, com que o Grupo Parlamentar do PCP discorda na generalidade. Não avalia nem reflecte sobre as origens e razões que estão na base dos problemas energéticos que o País enfrenta, e que o Relatório anota. Nomeadamente, as consequências de uma política energética que há décadas trocou o planeamento pela lógica e anarquia das intervenções do capital privado, sobretudo a partir do momento da privatização das grandes empresas públicas do sector (EDP e GALP) e da opção estratégica de

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liberalização dos mercados de energia em Portugal. A imagem e síntese desses processos foram as quatro «reestruturações» empresariais levadas a cabo, duas pelos governos do PSD (e CDS) e duas pelos governos PS, com os resultados conhecidos: um enorme défice energético, o peso dominante e determinante das energias fósseis, uma elevada intensidade energética e intensidade carbónica, uma absurda ineficiência energética, fundamentalmente centrada nas opções de política de transportes. O Relatório não aborda essa questão central e decisiva da passagem do centro decisor da política energética do sector público para o capital privado.

2.2. Numa breve consideração de alguns aspectos principais de especialidade do corpo do Relatório, avaliamos negativamente: – A avaliação que é feita ao PNBEPH (Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico) onde, não discordando do objectivo – vencer o défice de aproveitamento do potencial hídrico nacional – nos afastamos da forma, metodologia e instrumentos empresariais e financeiros para a sua concretização; – A avaliação e considerações tecidas a propósito dos biocombustíveis; – A análise que é feita à utilização do gás natural, sem anotar a necessidade de expandir o seu uso directo como energia propulsora de meios de transporte, versus uso desproporcionado na multiplicação de centrais de ciclo combinado; – A abordagem insuficiente da problemática do transporte / energia, previsivelmente o maior «cancro» da eficiência energética em Portugal; – A avaliação positiva e valorativa que é feita ao Relatório da Autoridade da Concorrência sobre os combustíveis (Março de 2005), que constitui apenas um documento inflacionado de dados numéricos para justificar a «colusão tácita» do «monopólio colectivo» das principais empresas de combustível que operam no País (GALP, REPSOL, BP) sobre o mercado nacional de produtos petrolíferos; – A avaliação «ligeira» feita a um problema central da problemática energética em Portugal: o elevado custo da energia para consumidores domésticos e para as empresas, afectando dramaticamente a competitividade do tecido económico português. Isto, quer se trate de tarifas da electricidade e gás natural, quer dos preços dos combustíveis.

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2.3. Em contraponto, avaliamos de forma positiva: – A consideração do problema do pico petrolífero (HUBBERT), pico que «mede» o nível de esgotamento das matérias-primas que suportam as energias de origem fóssil, com a implicação lógica da necessária mudança de paradigma energético; – Uma abordagem da energia nuclear que julgamos razoável e adequada aos interesses nacionais; – A defesa da necessidade de o País apostar nos recursos endógenos e renováveis, nomeadamente o aproveitamento do potencial hídrico, eólico, das ondas, solar, geotérmico e da biomassa (de resíduos orgânicos e produção não dedicada); – O relevo dado ao problema da eficiência energética, mesmo que não se partilhe do «entusiasmo» com que se aborda a Resolução do Conselho de Ministros n.º 80/2008, que aprovou o Plano Nacional de Acção para a Eficiência Energética. O voto de abstenção do Grupo Parlamentar do PCP sobre o corpo do Relatório reflecte a avaliação feita anteriormente, na sua generalidade e especialidade.

3. Na avaliação das Conclusões do Relatório, o Grupo Parlamentar do PCP votou a favor das conclusões n.os 1, 2, 2, 4, 5, 15 e 16, absteve-se nas conclusões n.os 6 e 7, e votou contra as conclusões n.os 8, 9, 10, 11, 12, 13 e 14, tendo votado contra as conclusões na sua globalidade. Posição que, sinteticamente justificamos:

(i) As cinco primeiras conclusões, 1. Um desafio incontornável 2. Uma situação insustentável 3. Um conclusão objectiva – a necessidade de revolucionar / mudar de paradigma energético 4. Uma questão chave, a aprticipação dos cidadãos 5. Um quadro constitucional que deve ser respeitado correspondem quase que integralmente a propostas do Grupo Parlamentar do PCP, que julgamos de grande importância terem tido o apoio unânime dos Grupos Parlamentares.

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(ii) A abstenção nas conclusões 6. Eficiência energética, o novo e necessário paradigma 7. Energias renováveis resulta da consideração de que, abordando questões estratégicas, a formulação das conclusões e propostas é manifestamente insuficiente e por demais sobreposta às actuais políticas do Governo.

(iii) O voto contra nas conclusões 8. As política ambientais e o desenvolvimento tecnológico 9. A democratização da produção de energia 10. Automóveis eléctricos 11. Os edifícios do Estado e a eficiência energética 12. No sector dos transportes 13. Segurança energética 14. Regulação, concorrência e formação de preços resulta da completa discordância da sua formulação, onde se confunde o que deveriam ser critérios, propostas e medidas sobre os temas com algumas decisões do Governo, algumas delas a raiar a pura propaganda, como sucede na conclusão n.º 10, «Automóveis Eléctricos), para lá da manifesta insuficiência do que é avançado;

(iv) O voto favorável nas conclusões 15 e 16, traduzindo propostas coerentes com problemas debatidos e considerados nos trabalhos da CEAQE, mesmo se a conclusão n.º 15, «Uma nova fiscalidade para a política energética», necessitasse de outra estrutura e desenvolvimento.

(v) O voto contra na apreciação global das conclusões resulta da não consideração da questão chave do papel do Estado, consentânea da política energética de que o País precisa, incluindo na operacionalização adequada da matéria das propostas aprovadas. Questão esta que integrava a proposta do Grupo Parlamentar do PCP de conclusão, com a seguinte redacção: «6. A exigência de uma natureza empresarial do sistema energético português com presença dominante e determinante do Estado, no contexto dos desafios

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colocados à política energética – A energia constitui um dos mais críticos e estratégicos sectores face à elevadíssima incorporação de energia na economia e na vida das sociedades. A problemática da sua escassez e futuro esgotamento; o peso da sua dependência e custos nas contas do Estado, a necessidade primária de assegurar a sua acessibilidade, em preço e qualidade, a todos os portugueses e a todos os pontos do território, obrigando a uma gestão complexa e conflituante (nomeadamente na transição de paradigma), com a necessária perequação de custos da sua produção, transporte e distribuição, e a imposição de princípios e regras de sustentabilidade ambiental e geracional (entre gerações), quer por compromissos internacionais, quer porque assim o exige o futuro de um país soberano e independente, colocam obrigatoriamente o Estado no centro das políticas energéticas.»

4. Resta, nesta declaração do Grupo Parlamentar do PCP, fazer duas referências obrigatórias. 4.1. A situação do País em termos energéticos seria bem diferente, e para melhor, se sucessivos governos do PS, PSD (com ou sem CDS-PP) não tivessem feito orelhas moucas às inúmeras orientações e medidas que o PCP foi estudando, concluindo e propondo. Se a política de direita desses governos não tivesse concretizado políticas ao serviço do grande capital nacional e estrangeiro de sentido completamente contrário. Vale a pena sublinhar que algumas das mais recentes «descobertas» sobre energia dos últimos governos, incluindo o actual – o aproveitamento do potencial hídrico, os recursos endógenos e renováveis do eólico, solar, a eficiência energética e o problema dos transportes, etc. – há muito tinham sido colocadas na agenda política pelo PCP. Recordamos, para memória, as referências ou abordagens temáticas das Conferências «Saída da Crise» (1977), «As Vias de desenvolvimento para Vencer a Crise» (1985), ou os Seminários sobre política energética realizados em 1984, 2003 e 2007. As dúvidas que possam haver sobre estas considerações podem facilmente ser eliminadas pela consulta à documentação existente sobre essas iniciativas, alguma da qual foi editada.

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4.2. No quadro das seis conclusões que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou ao Deputado Relator, cinco das quais integradas nas Conclusões apresentadas, e a sexta referida em 3. (v) e não considerada, foram ainda avançadas seis grandes orientações e recomendações e medidas específicas, que a seguir transcrevemos.

«II – Grandes orientações para um sector energético orientado para o pleno aproveitamento dos recursos energéticos nacionais

1. A definição de uma estratégia que, no contexto do esgotamento dos combustíveis fósseis (o Estado português deve subscrever o Protocolo de Esgotamento), reduza os consumos energéticos, com programas consistentes de utilização racional de energia e diversifique as fontes de energia;

2. O reassumir pelo Estado do seu papel de Autoridade no aprovisionamento, produção, transporte e comercialização das diferentes formas de energia, inclusive na retoma urgente do planeamento energético;

3. A reorganização empresarial das fileiras energéticas do sector público, que deve recompor a cadeia de valor das empresas de electricidade e de gás natural, desagregada pelas reestruturações levadas a cabo pelos governos PS e PSD;

4. A inventariação, planeamento e utilização integrada e coerente de todas as potencialidades nacionais em energias renováveis – hidroeléctrica, solar térmica, fotovoltaica, eólica, biomassa, geotérmica e as ligadas ao mar – e uma reconsideração crítica do recurso aos agrocombustíveis de produções dedicadas, bem como a programada intensificação do uso do gás natural em centrais térmicas;

5. A consolidação e reforço da base científica e técnica necessária ao desenvolvimento de investigação científica e desenvolvimento tecnológico, orientados para o acompanhamento da evolução das inovações energéticas a nível mundial, e a cooperação internacional;

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6. Uma política de transportes que privilegie o transporte público e colectivo de passageiros, particularmente o modo por carril accionado electricamente, e incentive o transporte de mercadorias por ferrovia e ainda pelo modo fluvial e marítimo; em particular, deve ser generalizado o uso do gás natural nas frotas urbanas e intensificada a sua utilização nos veículos ligeiros e pesados.

III – Recomendações e medidas específicas

1. Enquadramento político e institucional do sector energético O Estado deverá assumir com verdadeira plenitude uma incontornável intervenção respeitante ao sector energético e a todos os que dele dependem, actuando não somente como regulador e regulamentar/legislador, mas também como gestor e investidor, através de adequada presença nas empresas e entidades estratégicas. O papel do Estado deverá pautar-se por princípios de rigor, transparência e cooperação institucional, sendo dispensável que não se limite à intervenção governamental, mas que a Assembleia da República e as Autarquias, Regionais e Locais, sejam chamadas a intervir nos campos que lhes são próprios. Assim, propõem-se, entre outras, as seguintes medidas: –

Relançar e actualizar o Plano Energético Nacional, criando em simultâneo, as

condições institucionais, orgânicas, financeiras e materiais para a sua efectivação. –

Implementar a inclusão da perspectiva energética como disciplina de

planeamento e gestão do território, ao nível dos PDM, PU e PP. –

Reassumir pelo Estado, em plenitude, o seu papel de Autoridade (ou actor

fundamental) na esfera do aprovisionamento, produção, transporte e distribuição/comercialização das diferentes formas de energia, através do exercício das suas funções normalizadora/regulamentadora e fiscalizadora do sector energético. –

Interromper os processos de privatização em curso nas empresas estratégicas

do sector energético (EDP, REN e GALP), com vista à recuperação da real capacidade de intervenção e direcção política do Estado neste domínio, e no interesse do país e do povo português. –

Criar condições para que o Estado reassuma maiorias determinantes no

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capital social das empresas estratégicas do sector energético, que, nos últimos anos têm estado submetidas a processos de privatização e transferência para propriedade de interesses estrangeiros.

2. Utilização racional da energia e aproveitamento sustentável dos recursos endógenos, em particular das fontes de energia renovável

A URE – Utilização Racional da Energia, em particular as utilizações da energia final, e o aproveitamento sustentável, e não economicamente especulativo, das fontes de energia disponíveis no território nacional, particularmente as energias renováveis e os resíduos apropriados para o efeito, constituem a grande oportunidade nacional para inverter o quadro de grande dependência e crescente desperdício verificado nos últimos anos. Assim, propõem-se, entre outras as seguintes medidas/acções: –

Prosseguir com os estudos, a prospecção e a cartografia dos recursos

energéticos em território nacional, incluindo também a extensão da plataforma continental, no que se refere, quer a jazidas de recursos geológicos, quer a fluxos de energia renováveis, para tal seguindo uma política de activo apoio às instituições científicas e técnicas competentes nestes âmbito, designadamente Laboratórios do Estado, unidades de investigação e centros tecnológicos empresariais. –

Adoptar um regime fiscal sobre as formas de energia final, os combustíveis e a

electricidade, bem como sobre os equipamentos de utilização intensiva de energia, que contribua para a elevação da eficiência energética global, desde a energia primária até ao efeito final, mesmo que isso signifique, no curto prazo, diminuição das receitas fiscais globais. –

Promover o aproveitamento dos recursos hidroeléctricos ainda não

aproveitados, através de um programa ambicioso de investimentos particularmente em grandes e médias hídricas, seja através de novos empreendimentos, seja por aumento de potência de alguns dos actuais. O Estado, através das empresas estratégicas, deverá assumir um elevado protagonismo no desenvolvimento deste programa. –

Criar as condições institucionais, legislativas, administrativas, financeiras e

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outras, para que os objectivos de aproveitamento das energias renováveis (de novas tecnologias) – eólica, solar, biomassa, geotérmica, do mar, etc. – sejam efectivamente alcançados nos prazos previstos e num quadro de aplicação de incentivos financeiros justos e não especulativos. –

No aproveitamento de biomassa, dar especial importância à produção de

biogás e à sua transformação em biometano. Neste quadro, promover a valorização energética da biomassa de origem urbana (ETRSU e ETAR) e rural (resíduos e efluentes agro-pecuários), nomeadamente através da gaseificação e da electroprodução, bem como a reciclagem de materiais. –

Promover a efectiva instalação de diversas centrais térmicas a biomassa, com

vista a contribuir de forma importante, simultaneamente para a prevenção dos fogos florestais - e também para a criação de postos de trabalho nas zonas do interior do país - prevenindo contudo, que estas sejam efectivamente abastecidas com resíduos florestais ou de actividades industriais ligadas à floresta. –

Não apoiar a produção de biocombustíveis, designadamente bioalcoóis e

biodiseis, particularmente quando isso implique produções agro-energéticas dedicadas em território nacional, face aos impactes negativos que podem trazer à actividade agrícola, particularmente à produção alimentar e ao reduzido ou mesmo nulo saldo energético. –

Incrementar de forma permanente e efectiva, a Utilização Racional de Energia

(URE), particularmente na gestão dos sistemas energéticos da indústria transformadora e dos edifícios. –

Continuar, de forma efectiva e consequente, com programas públicos de apoios

e incentivos que permitam diminuir de forma sustentada a intensidade energética da nossa produção industrial, incidindo designadamente sobre processos de fabrico, tipos de combustível, produção e transporte de fluidos especiais – vapor, ar comprimido, etc. – e equipamentos térmicos e eléctricos. Neste quadro, é de destacar a necessidade de incrementar a co-geração, demais oportunidades de produção combinada, em quadro industrial, embora não permitindo a subversão do princípio, transformando assim a co-geração num negócio de produção térmica autónoma. No quadro da política industrial, apontar para um perfil de especialização tendencialmente menos energívoro.

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Actualizar e dar operacionalidade à legislação e regulamentação técnica que

permita tornar energeticamente mais eficientes os novos edifícios, sejam de habitação, sejam de serviços e equipamentos públicos, facultando informação técnica e actuando normativamente nas vertentes do projecto, dos materiais, dos equipamentos, da construção e da informação climatológica. –

Dar consequente aplicação prática à legislação aprovada ou a aprovar, com

vista a generalizar a instalação de solar térmico em os edifícios novos, ampliados ou reconstruídos.

3. Ordenamento dos Sistemas de Transportes com base em princípios sustentáveis de ordenamento e gestão do território Sendo um dos grandes factores de desperdício e aumento da dependência externa, o sector dos transportes deverá ser profundamente alterado de uma forma coordenada com políticas que visem o ordenamento e a gestão sustentável e democrática do território. Deverá dar-se prioridade aos sistemas relacionados com as duas regiões metropolitanas, Lisboa e Porto, de uma forma articulada com os grandes eixos nacionais. Mais em particular, propõe-se: –

Proceder decididamente ao ordenamento e reforço da rede de transportes

intermodal de passageiros, de forma a oferecer transportes colectivos rápidos e eficientes, particularmente ao modo transporte sobre carris electricamente accionado, em efectiva alternativa ao transporte individual ou colectivo propulsionado a combustíveis líquidos derivados do petróleo, tendo em vista redução substancial de tempos e de distâncias, dos consumos específicos de energia e a das cargas poluentes associadas. –

Promover a generalização dos veículos a gás natural comprimido e híbridos

nas frotas urbanas e metropolitanas de transportes colectivos (táxis, autocarros, frotas municipais, utilitários de entregas urbanas, etc. ), e dos veículos a gás natural liquefeito, nas frotas de transporte de mercadorias de médio e longo curso. –

Criar condições institucionais, legislativas e operacionais, para que se promova

a substituição, de forma intensa, dos combustíveis derivados do petróleo, em veículos particulares, ligeiros e pesados, por gás natural, aumentando em

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simultâneo a eficiência energética dos veículos e ordenando melhor o território.

4. Política ambiental correlacionada com o sector energético –

Criar um sistema nacional de inventário e monitorização de emissões

atmosféricas, designadamente de dióxido de carbono e outros gases de efeito de estufa, que produza dados segundo métodos fiáveis e disponíveis em tempo útil, para informação do público e do governo, e que sirvam de suporte à intervenção deste nas instâncias internacionais. –

Promover o estudo detalhado do ciclo do carbono sobre o território nacional,

identificando fontes anormais de emissão, assim como os sumidouros naturais que existam e possam ser valorizados, colaborando, eventualmente, em programas de cooperação internacional. –

Gerir as emissões de carbono a nível nacional no interesse do país,

controlando a atribuição de direitos de emissão e a sua transacção, por forma a assegurar a valorização económica da utilização da energia e a negar quaisquer oportunidades de especulação financeira com esses direitos de emissão.

5. Critérios para os investimentos prioritários em novos centros de produção de energia eléctrica –

Travar os processos de concessão e de instalação de novas centrais de ciclo

combinado a gás natural, porquanto aumentam a dependência energética do país, delapidam um importante recurso que é o gás natural e contribuem para o desequilíbrio ambiental. –

Nos casos em que seja absolutamente necessário instalar novas centrais

térmicas à base de combustíveis fósseis para a geração de energia eléctrica, deverá preferir-se carvão em detrimento do uso de gás natural , com a adopção simultânea de fortes medidas anti-poluição. –

Intensificação da construção dos grandes e médios aproveitamentos

hidroeléctricos que estão por realizar, em particular dos que representem menores impactes ambientais e na biodiversidade.

6. Investigação, desenvolvimento e organização empresarial e institucional

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Promover decisivos programas de investigação científica e desenvolvimento

tecnológico e de demonstração, bem como de normalização e regulamentação de equipamentos, de produtos e processos, dirigidos à criação, assimilação, difusão de tecnologias e procedimentos, que promovam a utilização racional de energia, a poupança de energia e a melhoria de eficiência energética de equipamentos e sistemas. –

Recuperar e manter ou reforçar as competências humanas e infraestruturais

em domínios tecnológicos de interesse básico para o aprovisionamento presente e futuro de energia, particularmente no plano da Administração, nomeadamente no que toca à energia hidroeléctrica, à energia nuclear para fins pacíficos, à energia da biomassa, à energia eólica, à energia oceânica, à energia geotérmica, etc.. –

Organizar empresarialmente, de uma forma dinâmica, as diversas fileiras

energéticas, em conformidade com uma efectiva política energética nacional, organização que contribua para o desenvolvimento sustentável do país e seja simultaneamente garante da nossa soberania, independência e segurança, no quadro das profundas interdependências ibéricas (designadamente do MIBEL), europeias e mundiais.

7. Cooperação Internacional e política de aprovisionamento energético –

Cooperar no âmbito da União Europeia na criação de um sistema de

observação sobre o aprovisionamento energético, tendo como atribuição, o estudo e a monitorização da evolução a prazo da capacidade de produção de hidrocarbonetos (petróleo e gás natural) a nível mundial, antecipando os seus futuros estrangulamentos. –

Assumir uma política activa de contratação em base bilateral de

aprovisionamentos a prazo de hidrocarbonetos, procurando contratações mutuamente vantajosas e aprovisionamentos seguros, incluindo oportunidades de participação de capital, técnicos e tecnologia nacionais em tais contractos.

8. Indústria de equipamentos e infra-estruturas energéticas –

Apoiar o desenvolvimento de indústrias de bens de equipamento nacionais e

em território nacional, para suportar a exploração de energias renováveis –

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particularmente solar, hidroeléctrica, térmica da biomassa, eólica e oceânica – com vista à produção alternativa de energia eléctrica. –

Recuperar a capacidade nacional de produção de bens de equipamento para

centrais térmicas e hidroeléctricas de potência, seja em termos de projecto, seja de produção. 9. Política de preços das energias finais Uma boa política energética é indissociável de uma adequada política de preços para os diversos vectores energéticos finais, aqueles de onde os consumidores retiram a energia útil, que promova a racionalidade económica, sempre balanceada pelas mais abrangentes perspectivas sociais e ambientais. Nesse sentido, é indispensável a intervenção do Estado no sentido de introduzir harmonicamente os interesses comuns das populações, dos territórios e do tecido económico. A política de preços dos vectores energéticos deverá: –

Promover o uso de vectores energéticos que desonerem a balança comercial,

privilegiando os recursos endógenos em detrimento da energia importada, principalmente as ramas petrolíferas; –

Incentivem os usos mais racionais dos sistemas de transportes de passageiros e

mercadorias; –

Contribuam para a diminuição dos impactes ambientais de diverso tipo, desde o

atmosférico ao desordenamento do território; –

Promovam a integração social, protegendo os consumidores carentes e

dependentes e penalizando o desperdício e o fausto; –

Contribua para o aumento sustentável da competitividade económica nacional,

privilegiando o incremento da coesão sócio-económica em detrimento das perspectivas estreitas de estímulo e protecção à concorrência pura. Assim, e mais particularmente no caso da electricidade, propõe-se alterar os critérios que vêem suportando os algoritmos de cálculo das tarifas eléctricas, qualquer que seja o escalão de fornecimento de tensão e cujos crescentes impactes nos diversos sectores se verificam ser prejudiciais à convergência social e económica no espaço europeu.» Assembleia da República, 14 de Julho de 2009 Agostinho Lopes

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Grupo Parlamentar DECLARAÇÃO DE VOTO

O Relatório Final produzido e aprovado pela Comissão Eventual de Acompanhamento das Questões Energéticas traduz naturalmente os consensos construídos sobre a centralidade de eixos da política energética mas ao mesmo tempo não retira do extenso trabalho realizado todas as conclusões que o Bloco de Esquerda considera fundamentais. É ao nível da caracterização do sector energético que a apreciação resulta de uma análise das fragilidades do país produz uma observação mais consensual. Num contexto de agravamento da maior crise económica que o país vem atravessando a importância da política energética reveste-se de um valor fundamental para diminuir as fragilidades da nossa economia e promover o seu relançamento. Os eixos considerados como prioritários são os que se prendem com a constatação da elevada intensidade energética, da dependência portuguesa face aos combustíveis fósseis que são importados O ponto número dois das conclusões do relatório salienta – e bem – a urgência da descarbonização da economia portuguesa e da necessidade de melhorar significativamente a diversificação e a capacidade instalada das fontes de energia renováveis. Mas o ponto número sete do mesmo relatório mistura energia nuclear com renováveis, numa leitura geradora de equívocos e em matéria de fontes renováveis parece conhecer apenas a de origem hídrica o que é, do ponto de vista teórico no mínimo redutor e enganador. Em matéria de recomendação sobre as renováveis – solar e eólica – que são aquelas que apresentam na actualidade melhor estádio de desenvolvimento tecnológico, o relatório desvaloriza na sua componente recomendatória a necessidade de definir metas mais exigentes para o desenvolvimento do aproveitamento destas fontes de energia. Esta deveria ser a conclusão óbvia deste relatório dada a análise que é produzida ao longo de todo o corpo de informação nele contido que resultou da audição de inúmeros especialistas.

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No que diz respeito à energia hídrica, o Bloco de Esquerda tem manifestado a sua discordância sobre a sua classificação no campo das renováveis. Sendo uma fonte de energia mais benigna do que qualquer modo de transformação térmica, a energia hídrica tem impactos negativos consideráveis sobre a qualidade da água e produz GEE que agravam o efeito de estufa. Numa altura em que a energia de origem hídrica é ainda imprescindível para fazer face às necessidades de electricidade do país impõe-se por maioria de razão uma reavaliação do Plano Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico no sentido de avaliar o equilíbrio entre os impactos negativos da construção de dez novas barragens por contraponto com a potência instalada daí decorrente. Esta avaliação nunca foi feita de uma forma global, determinando o impacto das novas barragens sobre a sustentabilidade das bacias hidrográficas que já se encontram actualmente fortemente diminuídas pelas barragens existentes. O Bloco de Esquerda considera que as Barragens previstas para Fridão, Tua e Sabor representam um acréscimo de pressão sobre a bacia hidrográfica do Douro e constituem um acréscimo de potência instalada desprezível face ao que é possível obter a partir de fontes renováveis. A mais importante mudança de paradigma energético que importa produzir situa-se ao nível do sector de transportes. Segundo o relatório do progresso da Estratégia para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) da União Europeia, aprovado em 29 de Fevereiro de 2008, o aumento do consumo de energia relacionada com transportes excedeu o aumento do consumo de energia em todos os sectores, e o petróleo constitui 98% da fonte de energia neste sector o que se traduz num aumento do seu contributo para as emissões de GEE. O relatório faz-lhe uma sucinta referência no ponto 12. Contudo em sede de recomendação de um relatório desta amplitude e abrangência deve apontar-se para aquilo que merecia ser a sua constatação óbvia. O transporte privado que recebeu toda a prioridade no período da industrialização pós-fordista tem necessariamente que ceder o lugar ao transporte público, colectivo. Do ponto de vista das ligações internacionais, do ponto de vista das conexões territoriais inter-urbanas e das acessibilidades peri-urbanas e urbanas é imperioso que o investimento do estado se dirija, na óptica da prestação de serviço público para a promoção de transportes de pessoas e bens num modo de transporte menos poluente, menos dispendioso, mais eficaz e mais seguro. É esta nova racionalidade que falta fazer caminho na política nacional de transportes. A energia mais barata e mais sustentável é que não se consome. O relatório reconhece que melhorar os indicadores de eficiência energética é uma das prioridades face à necessidade de limitar drasticamente as emissões de GEE mas aponta na sua componente resolutiva apenas para uma orientação pedagógica e para a intenção de melhorar a eficiência energética nos edifícios públicos. É demasiado pouco para um

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país que sofre na sua economia a consequência de ser um dos países europeus com maior intensidade energética. O Bloco de Esquerda defende que devem ser aprovadas metas de redução do desperdício de energia muito mais exigentes. O país precisa de um programa de reabilitação urbana que coloque no centro das prioridades a melhoria da eficiência energética dos edifícios. Em matéria de política tarifária não basta exigir maior transparência na formação dos preços. Tem sido transmitida aos consumidores a ideia errada de que existe um défice tarifário que agrava o custo com electricidade. Por outro lado a Autoridade da Concorrência é incapaz de explicar como é que a pretensa bondade do mercado não se traduz numa diminuição do preço dos combustíveis nos momentos de baixa dos mercados internacionais com a mesma rapidez com que aumentam nos momentos de alta do petróleo. No entanto as empresas de energia são anualmente, mesmo em período de profunda crise económica aquelas que apresentam resultados positivos de vulto ano após ano. A política tarifária precisa de tomar o interesse público, a sustentabilidade económica dos consumidores privados ou empresariais como a sua lógica essencial. Para obter esse efeito é preciso uma convergência de políticas para a energia que passam em primeira instância pela apropriação pública das empresas de produção e distribuição de energia. Os serviços de energia precisam de ser objecto de subordinação ao interesse público no que diz respeito às suas escolhas estratégicas e isso é incompatível com a lógica do negócio privado e da valorização nos mercados de valores. É por este conjunto de razões que se prendem com o valor da política energética para a qualidade da democracia, com as escolhas estratégicas que melhor possam servir a sustentabilidade ambiental, com a orientação programática que deve promover a coesão social do território e colocar a energia ao serviço do progresso colectivo que o Bloco de Esquerda afirma a sua discordância com as conclusões do Relatório Final da Comissão Eventual de Acompanhamento das Questões Energéticas.