PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE MARINGÁ - FORO CENTRAL DE MARINGÁ 1ª SECRETARIA DA FAZENDA PÚBLICA DE MARINGÁ - PROJUDI Avenida Cerro Azul, 245 - Zona 02 - Centro - Maringá/PR - CEP: 87.010-000 - Fone: (44) 3266-7123 Classe Processual: Ação Civil Pública Assunto Principal: Defeito, nulidade ou anulação Processo nº: 0018649-24.2012.8.16.0017 Autor(s): Ministério Público do Estado do Paraná Réu(s): Dulce Barros Perioto Fábio Barros Perioto Município de Maringá/PR Joice Marisa Barros Treichel
Vistos e examinados esses autos de ação civil pública sob o n. 18649-24.2012.8.16.0017, proposta pelo Ministério Público do Estado do Paraná em face do Município de Maringá e outros, todos qualificados.
1. RELATÓRIO O autor ingressou com ação civil pública em face do Município de Maringá, Dulce Barros Perioto, Joice Maria Barros Treichel e Fabio Barros Perioto e aduziu, em apertada síntese, que em 01 de abril de 2009 instaurou procedimento preparatório sob n. 20/2009 e, posteriormente, o converteu em inquérito civil público sob n. MPPR-088.09.000050-1, visando apurar eventual irregularidade na destinação de área de equipamentos comunitários no Jardim Itália II, nesta cidade, levado a efeito pelo Município de Maringá. Asseverou ter o Município de Maringá desafetado a data de terras 40, da quadra 248, com 2.806,53 m² do loteamento Jardim Itália II, destinada a equipamento comunitário, através da lei municipal n. 7.506/2007. Do mesmo modo, a citada lei, desafetou a data de terras 25-A, da quadra 214, com 983,38 m² do Jardim Botânico. Ainda na referida lei municipal, o primeiro réu permutou as referidas áreas com a faixa de terras destacada do lote 21, do Recanto dos Magnatas, destinadas à abertura da Rua Tupã (conforme Decreto n. 1446/2002), área de 1.863,92 m² e com o lote de terras 21-A, também do Recanto dos Magnatas, área de
Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em http://portal.tjpr.jus.br/projudi - Identificador: PJ684 DE9DX VH3MD EGJ5K
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662,69 m², ambos de propriedade dos outros réus arrolados na inicial, que se tornaram inconstruíveis com a abertura da Rua Tupã. Alegou, ainda, que por força dessa operação negocial, o Município de Maringá, atendendo a requerimento dos permutantes, ora réus, expediu alvará de subdivisão da primeira área (data de terras 40, quadra 248, área de 2.806,53 m², Jardim Itália II) em vários lotes, até então destinada a equipamento comunitário. Esses lotes foram alienados para: Arqmais Planejamento, Projetos e Obras; Adelcio Polizeli e Cleuza Meneguin Polizeli; Dulcineiea Ferreira Neves e Omar José Teixeira; Rodrigo Hatori e Caroline Mya Shimizu Hatori Andrian. Do mesmo modo, atendendo a requerimento dos permutante, ora réus, o Município de Maringá, expediu alvará de subdivisão da área de 7.393,08 m² (data de terras 25, quadra 214, Jardim Botânico), inclusive abrindo novas matrículas, em dois lotes, área que até então era destinada a equipamento comunitário. A data 25-A, da quadra 214, foi alienada à empresa Linkage Incorporadora S.A. Posteriormente, a área de terras da data 25, quadra 214 remanescente foi subdivida em vários lotes de terras, inclusive, abrindo-se novas matrículas. Observou que nas datas de terras 25-B a 25-I, da quadra 214, do Jardim Botânico, foram edificadas casas de 40,80 m.² pelo Município de Maringá. Por fim, afirmou que o Jardim Botânico que tinha uma área inicial de 7.393,08 m² (lote 25, quadra 214), restou tão somente uma área de 4.798,50 m² de equipamentos comunitários, enquanto o Jardim Itália II, sem qualquer área. Ressaltou que as referidas áreas, tanto do Jardim Itália II quanto do Jardim Botânico, foram repassadas pelo loteador ao Município de Maringá para atender a um dos requisitos de aprovação e registro do loteamento, ou seja, a implantação de equipamentos comunitários e em atenção à proporcionalidade da densidade de ocupação prevista no Plano Diretor do Município. Asseverou a inconstitucionalidade da Lei Municipal 7.506/2007, uma vez que em confronto com a CF, a qual estabelece a competência da União, dos Estados e do Distrito Federal legislar concorrentemente sobre direito urbanístico, bem como afronta às disposições contidas nos arts. 6.º e 182, § 2.º, da Carta Magna. Aduziu que as áreas destinadas a equipamentos comunitários são áreas de uso comum do povo e que não podem ser desafetadas. Alegou, também, que o Município de Maringá ignorou as disposições contidas no art. 28, da Lei 6.766/79, ficando a destinação social da propriedade urbana seriamente comprometida. Requereu a antecipação dos efeitos da tutela, a fim de declarar nula a desafetação das áreas mencionadas destinadas a equipamento comunitário e, o registro da escritura de cada matricula, evitando-se a irreversibilidade de dano de incerta reparação.
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Pugnou pela declaração de nulidade do ato de permuta das áreas de terras destinadas a equipamento comunitário, por desvio de finalidade, bem como para a condenação do Município de Maringá e demais réus, na obrigação de fazer solidária consistente no restabelecimento da área a ser destinada a equipamento comunitário como previsto quando da aprovação dos loteamentos do Jardim Itália e Jardim Botânico, sob pena de aplicação de multa diária. Alternativamente, requereu, a condenação dos réus na obrigação de fazer solidária consistente em adquirir outra área no referido loteamento, em idêntica metragem quadrada e mesmo valor, para a destinação de equipamentos comunitários como previsto na aprovação dos loteamentos. Analisada a inicial, determinou-se a notificação dos réus para a apresentação de defesa prévia, ocasião que, também, foi indeferido o pedido de antecipação de tutela (seq. 7.1). À seq. 12, o autor requereu a reconsideração da decisão de seq. 7, no que tange ao procedimento adotado, pois não se trata de ação civil pública de improbidade administrativa, mas sim, de ação civil pública que visa a defesa do patrimônio público e da ordem urbanística. O que restou deferido pelo juízo, sendo determinada a citação dos réus (seq. 18). Citados, os réus Dulce Barros Perioto, Joice Marisa Barros Perioto Treichel e Fabio Barros Perioto apresentaram contestação à seq. 31, asseverando que todo o processo de negociação com a permuta dos terrenos foi feito dentro da lei, havendo lisura na negociação, que a permuta beneficia os moradores do Conjunto Itália II e Jardim Botânico, uma vez que permitiu o acesso ao centro da cidade passando pela Rua Tupã. Asseveraram que a ilegalidade da destinação dos imóveis, que deveriam ser para implantação de equipamentos comunitários, não pode ser atribuída à família Barros Perioto, uma vez que para concretização do negócio foi obedecida toda a tramitação exigida pela lei. No mais aduziu que não há qualquer prejuízo para os moradores dos bairros relacionados na inicial, pois o Município de Maringá desapropriou área contígua aos loteamentos Itália I e II para cumprir a finalidade de equipamentos comunitários. Citado, o Município de Maringá apresentou contestação à seq. 36.17 e alegou que a matéria trazida na inicial, destinação de áreas de equipamentos comunitários, é matéria afeta à competência municipal e não da concorrente como alegado pelo autor. Asseverou que os dois loteamentos combatidos possuem equipamentos comunitários de modo a atender a necessidade da população, tais como, Escola Municipal Professora Agmar dos Santos; CMEI Purificação de Jesus Valente; Academia da Terceira Idade; Unidade Básica de Saúde, bem como de outras áreas livres para futuras instalações, cujas áreas livres ultrapassam 19.000 m². Observou que os equipamentos já edificados, assim como os lotes
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de propriedade do Município estão localizados a menos de 1000 metros dos loteamentos Jardim Itália II e Botânico. Aduziu que as permutas realizadas foram concretizadas visando atender o interesse público e o bem estar da comunidade local, pois permitiu a abertura da Rua Tupã e ao mesmo tempo indenizou a família Barros Perioto pela inutilização do lote remanescente. Ademais, na área remanescente do lote 25, quadra 214, o Município promoveu a subdivisão em lotes menores, a fim de atender demanda de moradias para famílias de baixa renda. Requereu a improcedência da demanda, com a condenação do autor em custas e honorários advocatícios. Réplica à seq. 42, onde ratificou os termos da petição inicial. Instados a se manifestarem acerca da produção de provas (seq. 45), as partes requereram o julgamento antecipado da lide (seq. 55, 57). É o relatório. Passo à decisão.
2. FUNDAMENTAÇÃO A controvérsia centra-se em saber se a permuta de uma área pública destinada a equipamentos comunitários deve ser anulada, (inciso I do art. 4º da Lei n.º 6.766/79).
2.1. DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE De acordo com os elementos trazidos pelo autor quando da propositura da demanda, e o fato de não haver direitos indisponíveis, infere-se que a demanda está pronta para ser decidida. Assim, como não há provas a serem produzidas em audiência, já que a lide versa sobre matéria de direito e eventuais questões de fato já estão devidamente delineadas por prova documental, o caso é o da aplicação do art. 330, I do Código de Processo Civil. Sendo assim, passo à análise do mérito.
2.2. DO MÉRITO 2.2.1. Da competência para legislar Assevera o autor a inconstitucionalidade da lei municipal n. 7.506/2007, uma vez que em confronto com as regras estatuídas na Constituição Federal, a qual atribuiu competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre direito urbanístico (art. 24, I, CF/88). De outro lado, o Município de Maringá aduz que a matéria trazida na inicial (destinação de equipamentos comunitários) é de competência dos Municípios, sendo a
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Constituição Federal expressa ao dispor que os Municípios possuem competência para legislar sobre assuntos locais. Pois bem. Por certo a Magna Carta atribuiu competência concorrente à União, Estados e Distrito Federal para legislar acerca de direito urbanístico. No âmbito dessa competência concorrente, cabe à União estabelecer normas gerais (art. 24, § 1.º, CF), tendo o Estado competência suplementar (art. 24, § 2.º, CF). O Supremo Tribunal Federal, assim dispõe acerca da competência concorrente: "O art. 24 da CF compreende competência estadual concorrente não cumulativa ou suplementar (art. 24, § 2º) e competência estadual concorrente cumulativa (art. 24, § 3º). Na primeira hipótese, existente a lei federal de normas gerais (art. 24, § 1º), poderão os Estados e o Distrito Federal, no uso da competência suplementar, preencher os vazios da lei federal de normas gerais, a fim de afeiçoá-la às peculiaridades locais (art. 24, § 2º); na segunda hipótese, poderão os Estados e o Distrito Federal, inexistente a lei federal de normas gerais, exercer a competência legislativa plena ‘para atender a suas peculiaridades’ (art. 24, § 3º). Sobrevindo a lei federal de normas gerais, suspende esta a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário (art. 24, § 4º). A Lei 10.860, de 31-8-2001, do Estado de São Paulo foi além da competência estadual concorrente não cumulativa e cumulativa, pelo que afrontou a CF, art. 22, XXIV, e art. 24, IX, § 2º e § 3º." (ADI 3.098, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 24-11-2005, Plenário, DJ de 10-3-2006.). Do mesmo modo, o Estado, o qual detém competência concorrente e suplementar à União, na Constituição Estadual, ao dispor a sobre competência municipal, assegurou que os Municípios do Estado do Paraná têm competência para legislar sobre assuntos de interesse local, suplementar à legislação federal e a estadual, no que couber, a fim de promover o adequado ordenamento territorial do parcelamento e ocupação do solo urbano (art. 17, I, II e VII, Constituição Estadual). Assim, indubitável a competência dos Municípios para legislar sobre assuntos locais, de forma a dispor sobre o adequado ordenamento territorial do parcelamento do solo urbano (art. 30, VIII, CF). Contudo, o STF entende que "a competência municipal, para promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano – CF, art. 30, VIII – por relacionar-se com o direito urbanístico, está sujeita a normas federais e estaduais (CF, art. 24, I). As normas das
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entidades políticas diversas – União e Estado-membro – deverão, entretanto, ser gerais, em forma de diretrizes, sob pena de tornarem inócua a competência municipal, que constitui exercício de sua autonomia constitucional." (ADI 478, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 9-12-2006, Plenário, DJ de 28-2-1997).
2.2.2. Da inconstitucionalidade da Lei Municipal 7.506/2007 A Lei Federal n. 6.766/1979, estabeleceu regras (gerais) para o parcelamento do solo urbano, fixando, ainda, requisitos para a aprovação e registro de loteamentos, os quais deverão conter (requisitos mínimos): áreas destinadas a sistemas de circulação, implantação de equipamento urbano e comunitário, espaços livres de uso público, proporcionais à densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou aprovada por lei municipal para a zona em que se situem; lotes com área mínima de 125m² e frente mínima de 5 metros, salvo quando o loteamento se destinar a urbanização específica ou edificação de conjuntos habitacionais de interesse social, previamente aprovados pelos órgãos públicos competentes; ao longo das águas correntes e dormentes e das faixas de domínio público das rodovias e ferrovias, será obrigatória a reserva de uma faixa não-edificável de 15 metros de cada lado, salvo maiores exigências da legislação específica; as vias de loteamento deverão articular-se com as vias adjacentes oficiais, existentes ou projetadas, e harmonizar-se com a topografia local (art. 4º, Lei 6.766). Ora, se quando da aprovação dos Loteamentos (tanto Jardim Itália II quanto Jardim Botânico), se reservou áreas destinadas à implantação de equipamentos urbanos (requisito para aprovação desses loteamentos), é inconstitucional a lei que desafeta essas áreas, pois sem elas o loteamento não teria sido aprovado. Ademais, no que tange à aludida lei municipal (7.506/2007), cumpre-me ressaltar que as leis municipais que alteraram a destinação da área de bem de uso comum, no caso em comento, áreas destinadas a equipamentos urbanos e comunitários, são leis de efeitos concretos que, na dicção de Hely Lopes Meirelles, são normas “que trazem em si mesmos o resultado específico pretendido, tais como as leis que fixam limites territoriais, as leis que aprovam planos de urbanização, as que criam municípios ou desmembram distritos, as que concedem isenções fiscais; as que proíbem atividades ou condutas individuais; os decretos que desapropriam bens, os que fixam tarifas, os que fazem nomeações e outros dessa espécie. Tais leis ou decretos nada têm de normativos; são atos de efeitos concretos, revestindo a forma imprópria de lei ou decreto, por exigências administrativas. Não contêm mandamentos genéricos, nem apresentam qualquer regra abstrata de conduta; atuam concreta e imediatamente como qualquer ato administrativo de efeitos individuais e específicos, razão pela qual expõem ao ataque pelo mandado de segurança” (Mandado de Segurança, Ação Popular e Ação Civil Pública, p. 15, 11ª edição, 1987, Editora RT).
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Hely Lopes Meirelles ainda pontua que “tais leis só o são em sentido formal, visto que materialmente se equiparam aos atos administrativos” (obra já citada, p. 93) e por isso mesmo são atacáveis por ação popular ou por ação civil pública ou por mandado de segurança, conforme o direito ou o interesse por elas lesados. Por esta razão, leis municipais que ocasionam a desafetação de equipamentos urbanos possuem natureza formal de lei e natureza material de ato administrativo. Assim, desde a publicação de tais leis de efeitos concretos, é cabível o controle jurisdicional. Observa-se, ainda, que todo o ato administrativo, para ser legítimo e eficaz, deve observar alguns princípios, dentre os quais a legalidade, a moralidade, a finalidade e a publicidade. Assim, o ato administrativo dever ser praticado em conformidade com a norma legal de regência, com a moral da instituição, com a destinação pública própria e com a divulgação oficial necessária. A não observância de tais disposições contamina o ato de ilegitimidade, passível de desconstituição via controle de legalidade pelo Poder Judiciário. Impende ainda ressaltar, que a própria lei complementar municipal n. 334/99 (vigente à época dos fatos), em seu art. 12 dispunha que as áreas de equipamentos comunitários não poderão ter a sua destinação alterada pelo poder público municipal: Art. 12, LC 334/99. Os imóveis constituídos por espaços livres de uso público e por áreas de equipamentos comunitários não poder ter a sua destinação alterada pelo parcelador ou pelo Poder Público Municipal, a partir da aprovação do projeto de parcelamento, salvo ocorrência das hipóteses previstas na legislação federal. Portanto, ao editar a Lei Municipal n. 7.506/2007, o Poder Público Municipal violou, não só a legislação federal e estadual, como também a própria legislação.
2.2.3. Da destinação dos equipamentos comunitários José Cretella Júnior assevera que os bens públicos são dotados de diversas cargas de inalienabilidade: “a principiar pelo bem de uso comum – ‘carga máxima’, passando-se pelo bem de uso especial – ‘carga média’, terminando-se pelo bem dominial, dotado de ‘carga mínima’ de inalienabilidade, sempre levando em conta a afetação, porque desafetado, o bem se desveste do mencionado atributo” (Bens Públicos, p. 340, Editora Universitária de Direito, 2ª edição, 1975). Assim, dentro de um juízo axiológico apriorístico, considerada a discricionariedade absoluta dos Municípios, nos termos do art. 30 da CF, há que se entender como possível a alienação, cessão ou concessão de bem público, se previamente desafetado, em seu peculiar interesse local, no caso, as regras urbanísticas de parcelamento. No entanto, tal princípio não prevalece frente às áreas reservadas de
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loteamento. Com efeito, a Lei nº 6.766/79, com as alterações introduzidas pela Lei nº 9.785/99, ao disciplinar a questão do parcelamento do solo urbano, estabeleceu, no inciso I do artigo 4º, que as áreas institucionais (sistema de circulação e implantação de equipamentos urbanos e comunitários) a as áreas livres de uso público (praças e parques), deverão ser proporcionais à densidade de ocupação prevista no plano diretor ou aprovada por lei municipal para a zona em que se situem. Ainda, o art. 17, da supracitada lei, estabelece que “os espaços livres de uso comum, as vias e praças, as áreas destinadas a edifícios públicos e outros equipamentos urbanos, constantes do projeto e do memorial descritivo, não poderão ter sua destinação alterada pelo loteador, desde a aprovação do loteamento, salvo as hipóteses de caducidade da licença ou desistência do loteador, sendo, neste caso, observadas as exigências do art. 23 desta Lei” (destaquei). Trata-se de norma geral urbanística, com força vinculante para os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios. Na dicção de Lúcia Valle Figueiredo é “dever do Município o respeito a essa destinação, não lhe cabendo dar às áreas que, por força da inscrição do loteamento no Registro de Imóveis, passaram a integrar o patrimônio municipal qualquer outra utilidade. Não se insere, pois, na competência discricionária da Administração resolver qual a melhor finalidade a ser dada a estas ruas, praças, etc. A destinação já foi preliminarmente determinada” (Disciplina Urbanística da Propriedade, p. 41, Editora Revista dos Tribunais, 1980). Corroborando tal entendimento, Paulo Affonso Leme Machado, assevera que o poder municipal só teria discricionariedade nas áreas do loteamento que desapropriasse e não nas áreas reservadas legalmente: “do contrário, estaria o Município se transformando em Município-loteador através de verdadeiro confisco de áreas, pois receberia as áreas para uma finalidade e, depois, a seu talante, as destinaria para outros fins” (Direito Ambiental Brasileiro, p. 244, Editora Revista dos Tribunais, 1989). Assim, não é forçoso concluir que a limitação imposta ao loteador visa à proteção ambiental, cuja finalidade legal é tutelar um direito coletivo difuso, não cabendo ao Município dar outro destino à parcela oriunda de parcelamento de solo, em observância à lei de regência. Não bastasse isso, a norma contida nos artigos 4º, 22 e 28, da Lei 6.766/79, não pode ser esquecida, ao caso concreto, tampouco divorciada do comando do artigo 17 desse mesmo diploma legal. Assim, não é razoável que o Município, após receber gratuitamente área de uso comum, por determinação legal expressa, venha dispor da forma que melhor lhe aprouver, em afronta ao disposto na Constituição Federal, conforme pode-se verificar a seguir:
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A propósito, o art. 225, caput, dispõe: Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. O julgado do Superior Tribunal de Justiça que segue, esclarece a matéria: (...) Quando o artigo177 da Lei Federal nº 6.766/79 afirma que não pode o loteador alterar a destinação da área reservada, não está dirigindo-se apenas a ele e sim, à Municipalidade, que a recebe para a finalidade descrita, sendo sua obrigação respeitar, por força de lei, a vontade do mencionado loteador. Ele cria uma verdadeira instituição no loteamento, que deve prevalecer em benefício do povo, para seu uso comum, sendo despiciendo dissertar aqui sobre a importância das áreas verdes na preservação da qualidade da vida urbana, dado aos constantes argumentos que se fazem a respeito desse tema, que acabou sendo de notório conhecimento (REsp 77721/SP, Ministro João Otávio de Noronha, DJ em 24.3.2003, p. 164)
2.2.4. Da colisão de princípios Em que pese as alegações dos réus que as áreas foram desafetadas visando permutar uma área para abertura da Rua Tupã, a qual facilita o acesso dos moradores dos bairros (Jardim Itália II e Botânico) para o centro da cidade e que estes bairros dispõe de equipamentos comunitários a menos de quinhentos metros de um bairro e mil metros de outro, tais alegações, por tudo o quanto já foi explanado não podem prosperar, uma vez que não se pode alterar a destinação às áreas de equipamentos comunitários. De igual forma, não prospera a aquisição de outras áreas nas adjacências desses loteamentos, pois não substituem as áreas permutadas, as quais eram afetadas à destinação específica. O Município recebeu a área que era dos demais réus (pessoas físicas) e em troca permutou com os terrenos mencionados no Jardim Itália II e Jardim Botânico, nos moldes previstos na legislação municipal editada para tal fim. Por seu turno, como bem assentado na inicial, pelo representante do Ministério Público, essas pessoas comercializaram estes terrenos a terceiros de boa-fé.
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Desse modo, em que pese o reconhecimento da inconstitucionalidade da lei municipal que desafetou os imóveis, objeto da presente lide, não se pode deixar de reconhecer que o negócio jurídico celebrado entre os réus consumou-se, irradiando-se para terceiros de boa-fé e gerando direitos constitucionalmente protegidos, v.g., propriedade. Um dos princípios gerais de direito, que deve orientar a interpretação e a aplicação da lei, é o da relevância da boa-fé, sendo, sempre prestigiada. Outro, o de que o julgador deve considerar, razoavelmente, as condições do caso concreto, as circunstâncias de natureza subjetiva a revelar aquilo que seria exigível de cada uma das partes. Assim, considerando o conflito de valores coligidos nos autos, passo a me socorrer da hermenêutica constitucional para solucionar a presente lide. Por certo que os atos administrativos realizados pelo Município ferem a supremacia e a indisponibilidade do interesse público. Do mesmo modo, que os terceiros de boa-fé, se anulado o ato de permuta, sofrerão restrições em seu direito de propriedade, sem contar que em vários lotes já há, inclusive, edificações. Assim, a fim de evitar maiores prejuízos para todos (comunidade, terceiros adquirentes de boa-fé, etc) entendo que deve o Município adquirir outras áreas em igual metragem, dentro dos jardins Itália II e Botânico, a fim de destiná-las a construção de equipamentos comunitários e urbanos, no prazo de um ano, sob pena de incorrer em multa, a ser arbitrada por este juízo.
2.2.5. Da solidariedade O MP pretende a condenação solidária dos réus, consistente na obrigação de fazer, com o restabelecimento da área permutada para ser destinada a equipamento comunitário ou a declaração de nulidade do ato de permuta. É cediço que a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes, portanto, inexiste razão jurídica para acatar o pedido de condenação solidária dos réus, porque não há relação obrigacional entre os adquirentes e o Município de Maringá. De igual modo, não há determinação legal que estabeleça essa solidariedade. O fato do Município de Maringá haver permutado as áreas com os demais réus, que a parte autora entende como nulo, não é suficiente para admitir a responsabilidade solidária entre eles. Compraram legalmente e pagaram, de um vendedor idôneo (Município de Maringá). Não faz qualquer sentido lhes impor obrigação de adquisição de um novo terreno para utilização comunitária.
Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em http://portal.tjpr.jus.br/projudi - Identificador: PJ684 DE9DX VH3MD EGJ5K
PROJUDI - Processo: 0018649-24.2012.8.16.0017 - Ref. mov. 74.1 - Assinado digitalmente por Frederico Mendes Junior:9932, 19/09/2013: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: CONCLUSÃO
3. DISPOSITIVO Isto posto, julgo procedente, em parte, o pedido deduzido na petição inicial, a fim de condenar o Município de Maringá na obrigação de fazer, consistente em adquirir outra área, dentro do Jardim Itália II (2.806,53 m²) e Jardim Botânico (983,38 m²), em idênticas metragens e de mesmo valor, devendo sua destinação ser afetada a equipamentos urbanos e comunitários, tal como previsto na aprovação dos referidos loteamentos, no prazo máximo de um ano. Diante do princípio da sucumbência, condeno o Município de Maringá ao pagamento das custas e das despesas processuais. Deixo de condená-lo, entretanto, ao pagamento de verba honorária, tendo em vista que a propositura de ação civil pública para defesa do patrimônio público é função institucional do Ministério Público, de acordo com o disposto no artigo 129, inciso III, da Constituição da República. Com a inclusão da presente sentença no sistema, dou-a por publicada. Registro conforme item 2.20.1.4, do Código de Normas da Eg. Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná. Intimem-se.
Maringá, 19 de setembro de 2013.
FREDERICO MENDES JÚNIOR – Juiz de Direito
Documento assinado digitalmente, conforme MP nº 2.200-2/2001, Lei nº 11.419/2006, resolução do Projudi, do TJPR/OE Validação deste em http://portal.tjpr.jus.br/projudi - Identificador: PJ684 DE9DX VH3MD EGJ5K
PROJUDI - Processo: 0018649-24.2012.8.16.0017 - Ref. mov. 74.1 - Assinado digitalmente por Frederico Mendes Junior:9932, 19/09/2013: JULGADA PROCEDENTE EM PARTE A AÇÃO. Arq: CONCLUSÃO