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Marcas nas Mídias Sociais: Poder e Atenção ao Consumidor

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Sílvia Almeida da Costa2 Universidade Federal de Pernambuco – Recife/PE

Resumo A importância de pensar no cliente não é uma abordagem nova. No entanto, o que propomos neste artigo é compreender como se dá a relação das empresas com os consumidores num cenário comunicacional em que os consumidores estão empoderados e exigem respostas em tempo real. Para isso, relembraremos a importância da marca numa sociedade em que o valor simbólico dos produtos é maior que seu valor de uso; citaremos características fundamentais do novo fluxo comunicacional possibilitado pelos meios de função pós-massiva; e analisaremos um caso de sucesso no Brasil: o Pontofrio.com.

Palavras-chave: Marca; Mídias Sociais; Novo fluxo comunicacional; Humanização das marcas.

Introdução É senso comum que, atualmente, o valor de uma empresa está nos ativos intangíveis. Patentes, direitos autorais, licenças e marca são importantes a qualquer corporação. Mais que isso, o principal valor das empresas está no cliente. Essa abordagem não é nova, Peter Drucker, pai da Administração, há mais de 40 anos já falava da importância de pensar no cliente. Contudo, faz-se mister pensar no relacionamento com o cliente num cenário em que tanto os processos de consumo quanto os processos de comunicação se complexificaram. Dentre as características da cultura de consumo contemporânea, a atribuição de um valor crescentemente simbólico aos bens figura como protagonista. Em geral, consumimos para nos afirmar socialmente, para construir uma identidade, para pensar nossa condição no mundo, e não só para satisfazer necessidades. Nesta cultura de consumo complexa, fundamentada em elementos tanto sociais quanto individuais, estamos negociando os significados do consumo a todo momento. 1

Trabalho apresentado no Grupo de Trabalho Comunicação, Consumo, Entretenimento e Cultura Digital, do 3º Encontro de GTs - Comunicon, realizado nos dias 10 e 11 de outubro de 2013. 2 Bacharela em Publicidade e Propaganda pela Universidade Federal de Pernambuco e Mestranda em Comunicação pela mesma instituição. E-mail: [email protected]

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Nesse sentido, as marcas assumem relevância no cenário mercadológico, diferenciando os produtos estandardizados, estimulando o consumo e ressignificando as relações dos consumidores com os objetos. Por outro lado, a contemporaneidade vive um momento de informatização ubíqua, e o advento da internet acelerou e expandiu um processo de comunicação em escala global. Dispositivos móveis, plataformas de sociabilidade digital e mídias sociais mudaram o cotidiano das pessoas, fazendo surgirem vários tipos de relações entre os indivíduos. Esse novo fluxo comunicacional possível nos meios pós-massivos, acompanhado da saturação da audiência às mensagens publicitárias e da segmentação do público, também gerou mudanças na maneira de pensar a publicidade para os meios digitais e na maneira de as empresas se relacionarem com os consumidores. Entre as estratégias utilizadas pelas empresas nos ambientes virtuais, destacam-se a personificação das marcas, a presença nas mídias sociais e o apelo ao engajamento. O esforço em utilizar as redes sociais digitais para manter o relacionamento com os clientes se justifica pelo poder que esses clientes assumem na influência de compra de outros consumidores. Outra vantagem está em manter a imagem positiva das marcas. Em pesquisa recente divulgada pela E-Life3, as redes sociais aparecem como o quarto canal mais utilizado pelos internautas para se comunicar com o atendimento das empresas nos últimos seis meses (52%) ― atrás de telefone (78%), e-mail (73%) e site (72%) ―; 67% dos internautas afirmaram seguir páginas de empresas, produtos e serviços para receber atendimento sempre que precisar. No Facebook, 93,3% dos internautas curtem páginas de marcas que admiram ― a grande maioria para manifestar apoio. Destes, 48% disseram que passaram a admirar mais as marcas após acompanhá-las pela rede social. Assim, a humanização das marcas tem se apresentado como uma maneira de estabelecer uma relação mais próxima com o público e indica uma tendência a ser seguida nos ambientes online. Ao longo deste artigo, recordaremos a importância da marca na sociedade de consumo contemporânea e mencionaremos as características fundamentais do novo fluxo comunicacional possibilitado pelos meios de função pós-massiva. Finalmente, trazemos à tona um caso de sucesso de relacionamento entre clientes e empresa através das mídias sociais no Brasil: o Pontofrio.com.

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Empresa líder em monitoração, análise da mídia gerada pelo consumidor e gestão de relacionamento em mídias sociais na América Latina e em Portugal. A pesquisa anual Hábitos de Uso de Redes Sociais está em sua 4ª edição e pode ser encontrada na íntegra no endereço: http://elife.com.br/elife_estudo_de_habitos_em_redes_sociais_2013/.

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Cultura do Consumo e Marcas Consumir é uma atividade presente em todas as sociedades humanas. No entanto, a sociedade de consumo contemporânea se diferencia pela posição central que o consumo assume em nossa vida. No cenário de consumo simbólico vigente, sobressaem, dentre tantas outras, características como o consumo de e para as massas, a alta taxa de consumo e descarte de mercadorias, a moda e a insaciabilidade. Ainda que o capitalismo seja uma civilização material, é possível perceber uma visão idealizada e ingênua do consumo, que estimula o repúdio moral e intelectual à dimensão material da existência. Essa visão pressupõe que é possível prescindir das relações com os objetos e ignora que estes sempre mediaram as relações das pessoas com o mundo (BARBOSA, 2006). Pensar assim é deixar de perceber o consumo dentro de um contexto capitalista como crucial à manutenção do trabalho e da economia, mantenedor de uma ordem social específica, agente de integração e da realização de desejos e relevante à reflexão sobre a condição dos indivíduos no mundo (CANCLINI, 1999). Muito mais que o suprimento de carências, o consumo em nossa sociedade é um processo social que diz respeito a múltiplas formas de provisão de bens e serviços e a diferentes formas de acesso a esses mesmos bens e serviços; um mecanismo social percebido pelas ciências sociais como produtor de sentido e de identidades, independentemente da aquisição de um bem; uma estratégia utilizada no cotidiano pelos mais diferentes grupos sociais para definir diversas situações em termos de direitos, estilo de vida e identidades; e uma categoria central na definição da sociedade contemporânea (BARBOSA, 2006, p.26).

Nesse sentido, a cultura de consumo se mostra ainda mais complexa, trazendo em suas bases fundamentais intricados elementos sociais e individuais. A passagem da sociedade de produção à sociedade de consumo se fundamenta em características culturais: antes da Revolução Industrial, o consumo era orientado pela tradição e pelo costume; depois, viu-se efetivar uma revolução de consumo, determinante para equilibrar a oferta e a demanda de produtos. Gisela Taschner (2009) fala de uma “educação para o consumo” realizada pelas lojas de departamento sobre a sociedade burguesa do século XIX. “Os trabalhadores, que tinham se habituado à retórica do comedimento, trabalho árduo e sobriedade, tiveram de ser educados para apreciar um novo discurso centrado no estilo de vida hedonista, que redundava em novas necessidades e desejos” (FEATHERSTONE apud BARBOSA, 2010, p.39). Essa educação para o consumo pós-Revolução Industrial também deu origem às marcas modernas: 3

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a partir da segunda metade do século XVIII, quando o uso de técnicas de promoção de vendas determinou a importância da seleção de nomes e marcas reconhecidos. Desenvolveram-se as técnicas promocionais como alternativa de atrair a atenção, pois os mercados começaram a se tornar mais competitivos. (PEREZ, 2004, p.8)

Assim, associava-se consumo a lazer, prazer e ao lúdico e desenvolviam-se variadas técnicas para seduzir os consumidores ― técnicas estas que perduram até hoje: vitrines, publicidade, marketing, parques temáticos, shopping centers, etc. ―, criando um mundo de símbolos e imagens ao redor dos produtos. Segundo Maria Eduarda da Mota Rocha (2002), a cultura de consumo contemporânea possui três características centrais: a estilização, a estetização e a moda. A estilização diz respeito ao uso crescentemente simbólico dos produtos como senhas de distinção social. A estetização refere-se ao enorme volume de imagens que circundam os produtos. E a moda é caracterizada pela frequente renovação dos produtos, o que permite a manifestação e variação das representações que os consumidores fazem de si mesmos por meio dos produtos e serviços. Decorrem dessas características centrais muitos outros aspectos da cultura de consumo. Eles variam da insaciabilidade à pressa, do individualismo à perda de responsabilidade, da comodificação dos bens à comodificação das relações; passando pelo papel da comunicação na disseminação de ideias e padrões de comportamento. Se antes se vendiam coisas, atualmente vendem-se, sobretudo, imagens e modos de ser. Verifica-se um investimento mais sutil do mercado nos próprios processos de subjetivação. Nesse sentido, a mídia desempenha uma função primordial ao veicular e induzir ideias, atitudes e padrões de comportamento que podem servir de modelo para a construção de identidades em nossos dias (CASTRO, 2008, p.139).

Antes de abordarmos as questões referentes aos meios de comunicação ― em especial os de funções pós-massivas ―, trataremos de identificar o papel das marcas como signos de posicionamento social e bem maior das empresas.

Marca e Ideologia das Empresas Na sociedade pós-industrial em que vivemos, a exasperada concorrência mercadológica entre as empresas e a semelhança de produtos decorrente da padronização industrial incentivam as buscas por audiência, atenção e pela reação do público, fundamentando-se no consumo de imagens e sensações. Neste cenário de consumo de signos, a marca assume um papel importante na decisão de compra, evidenciando-se como “a convergência semiótica de elementos reticulares resultante de 4

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uma negociação constante entre os diversos atores sociais do processo comunicacional.” (PEREZ, 2004, p.14) Além de ser o pontapé inicial na construção de uma identidade do produto, a marca é “uma conexão simbólica e afetiva entre uma organização, sua oferta material, intangível e aspiracional e as pessoas para as quais se destina” (ibidem, p.10). Ela se resume à conjunção de uma expressão gráfica (ela tem uma cara), de uma expressão filosófica (ela tem alguma coisa a dizer) e de uma experiência (ela tem alguma coisa a trocar). Cada um desses momentos remete à origem da marca e à confiabilidade de seus propósitos. Por isso a imagem, o discurso e a ação devem fazer sentido entre si, como membros de uma mesma família ética. (VIEIRA, 2008, p.141)

Para Kotler, a marca serve para poupar o tempo das pessoas, o que vale dinheiro ― por isso o enorme valor da marca como ativo intangível de uma empresa. Ela “é um depósito de confiança cada vez mais importante, à medida que as opções se multiplicam. As pessoas querem simplificar a vida.” (FITZGERALD apud KOTLER, 2003, p.119) Nesse sentido, a marca oferece três vantagens aos consumidores: identifica a origem do produto e, portanto, protege o consumidor; facilita a compra e reduz o tempo de decisão; e confere status diferenciado (PEREZ, 2004). Assim, é importante destacar que grandes marcas trazem benefícios emocionais, e não só racionais. Para isso, as empresas devem definir a sua ideologia, os princípios e valores que as norteiam. Essa ideologia é partilhada pelas pessoas que gravitam em torno da empresa (a “comunidade de marca”) e reflete um compromisso de conduta que deve primar pela ética. Nesse sentido, “é importante que parceiros da empresa assumam a personalidade da marca” (KOTLER, 2003, p.121). Assim, além de se preocupar com as questões relativas aos produtos e serviços que oferecem, as corporações precisam atentar para as relações internas da empresa (com empregados e fornecedores, por exemplo), satisfazendo também os seus funcionários. Por outro lado, é fundamental que as empresas prezem pelo relacionamento com o cliente, pois, como afirmam Ruão e Farhangmer (2000), a imagem das marcas é um conceito de recepção, e o valor das marcas está ancorado na consciência do consumidor. Mais que isso, “a comunicação está na base da construção e transmissão da identidade da marca” (p.8). Sendo assim, não se pode supor uma imagem positiva da marca sem que haja uma comunicação adequada por parte do anunciante, visando construir uma relação proveitosa, amistosa e humana com o público. A satisfação ou a insatisfação dos consumidores vão determinar o sucesso ou o fracasso das empresas; e essa satisfação não advém da relação do consumidor com o produto simplesmente, mas da relação

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do consumidor com a empresa como um todo, e principalmente com o atendimento de suas demandas através dos mais variados canais de comunicação. Considerando-se que os consumidores têm um maior poder de produção e emissão de conteúdos nas mídias atuais, o sucesso das marcas depende da credibilidade que elas tiverem entre os seus clientes. Assim, anunciantes já sensibilizados às práticas comunicacionais contemporâneas buscam estabelecer um diálogo diferenciado com seus consumidores, reagindo de imediato às demandas do público. Porém, não só é importante reagir prontamente, como o é agir de acordo com a ideologia da empresa e manter uma conduta humanizada. Ouvir os outros aumenta a credibilidade de várias maneiras importantes. Em primeiro lugar, o processo de obter críticas abertas e honestas humaniza a empresa, forçando-a a descer de seu pedestal corporativo e entrar realmente em contato com os seus consumidores, de igual para igual. (BLACKSHAW, 2010, p.33)

Responder pronta, educada e humanizadamente ao consumidor em qualquer situação, seja diante de crítica, elogio ou sugestão, contribui na construção de um relacionamento sincero e transparente com os clientes. Buscar esse relacionamento é uma abordagem em voga atualmente, em tempos de acesso constante à internet, múltiplos dispositivos de comunicação, plataformas sociais cada vez mais cheias de ferramentas; enfim, tempos de informatização ubíqua e fluxos comunicacionais novos.

Novo Fluxo Comunicacional Numa reflexão sobre o que seria a “contemporaneidade”, Gisela Castro (2008) atenta para a noção de progresso ilimitado como uma das bases deste período de transição no qual “velhos e novos paradigmas convivem, exibindo graus variáveis de turbulência, ruptura e (re)acomodação (p.132)”. A autora também aponta a “informatização dos mercados financeiros e a criação da rede mundial de computadores como marcos na aceleração, expansão e consolidação da globalização no bojo do chamado „turbocapitalismo‟ pós-industrial (p.134)”. Como vimos, na sociedade capitalista contemporânea, o consumo assume um papel fundamental nas disputas pela identidade, pelo poder e pelas escolhas individuais e coletivas. Ademais, mercadorias e marcas estão presentes no nosso cotidiano, e mantemos com elas uma relação significativa que nos acompanha em diversos âmbitos de nossa vida. Desse modo, o consumo também perpassa nossas experiências nos ambientes digitais.

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As mídias sociais disponibilizam variados recursos aos usuários ― ferramentas que permitem curtir, comentar e compartilhar conteúdos; marcar pessoas e páginas institucionais; localizar geograficamente; etc. ―, e podemos presenciar interações com as marcas de uma forma nunca vista antes. Os usuários multiplicam mensagens exponencialmente e agregam à marca valores relevantes para o seu círculo de amizades virtual. Vão se apresentando aos seus pares, formando comunidades, influenciando ações/reações as mais diversas, inclusive em relação às marcas ― é comum encontrar grupos e comunidades que declaram amor e ódio por certas marcas ― e fazendo surgirem discursos de consumo em escala global. Em se tratando das estratégias de estímulo ao consumo no ambiente digital, observa-se a vinculação das experiências na rede a momentos de prazer e entretenimento. Maria Eduarda da Mota Rocha (2009) analisa o fenômeno da saturação da audiência, marcado pela sensação de banalidade e inoportunidade propiciada pela quantidade excessiva de mensagens publicitárias à qual o consumidor é exposto diariamente. Na internet, acrescenta-se a essa sensação o caráter ativo do usuário diante das mensagens e do próprio meio. Pode-se observar, assim, o surgimento de novos e variados formatos de anúncios publicitários que tentam captar e manter a atenção dos consumidores (e não mais a audiência propriamente dita). A contemporaneidade lida com um receptor disposto a substituir a passividade do consumo pela laboriosa conexão entre linguagens que transforma a publicidade instrumental em comunicação lúdica e partilhada entre consumidores que se conectam não pela mágica do produto, mas pelas interações que, através dele, se disponibilizam (FERRARA apud COVALESKI, 2010, p.12).

Os discursos sobre consumo na internet chamam a atenção especialmente no que diz respeito às estratégias utilizadas pelas empresas ao se apropriarem dos ambientes virtuais, a exemplo da personificação das marcas, da ubiquidade e do apelo ao engajamento. É uma tendência fazer a empresa estar presente nos ambientes online e diminuir os discursos imperativos característicos dos intervalos comerciais dos meios de comunicação de massa tradicionais. Tem-se mostrado importante para o sucesso dos anunciantes agregar um enorme número de consumidoresfãs e fazer com que eles mesmos produzam conteúdos positivos relacionados à marca. Isso porque, sendo os consumidores os garotos-propaganda, a mensagem tende a ser mais creditada4.

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Segundo pesquisa da The Nielsen Company (2009) sobre confiança, valor e envolvimento com publicidade, a recomendação de amigos, os sites de marcas e a opinião de consumidores online despontam entre os três tipos de abordagem publicitária que têm mais confiança do público.

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A publicidade, com toda a sua complexidade midiática, é fundamental para disseminar os símbolos marcários. Mas, em muitos sentidos, ela está se tornando indesejada. Refletindo sobre os motivos pelos quais a propaganda está se tornando obsoleta, Kotler ressalta que ela é um monólogo; não abre espaço para o feedback dos clientes. “O verdadeiro desafio não consiste em publicar um anúncio, mas conseguir que a mídia fale sobre a marca”. (2003, p.119) Embora o autor se refira à mídia como sendo os grandes veículos de comunicação massiva, o desafio se aplica também para outras mídias ― e as mídias sociais em particular. Mais do que publicidade e propaganda, nos ambientes digitais, a relação entre empresas e consumidores pede comunicação. Um relacionamento transparente e sincero é fundamental para que as corporações mantenham a imagem da marca. Nesse sentido, além de produzirem formatos inovadores de anúncios publicitários para a internet, as empresas têm envidado esforços em abrir canais de comunicação e relacionamento com os clientes. As diferenças trazidas pelos meios de comunicação pós-massivos são muitas e facilmente identificadas. A principal delas é a abertura do polo de emissão ― o que revolucionou o esquema de comunicação um-todos tradicional e delegou mais poder aos receptores. Segundo Clay Shirky (2011), enquanto os meios massivos se voltavam para o consumo do conteúdo gerado pelos emissores, as mídias pós-massivas permitem aos espectadores três enfoques diferentes: o consumo, a produção e o compartilhamento. A cultura da participação diz respeito principalmente ao comportamento assumido pelas pessoas no uso da tecnologia social, cuja maior vantagem é permitir o acesso dos usuários uns aos outros. Vivemos um momento de informática ubíqua, ou seja, presente a todo o momento no cotidiano das pessoas, através de diversos dispositivos eletrônicos, e potencializada com o advento da banda larga, que permite conexão mais rápida com a internet. Numa época em que “as câmeras e os microfones estão sempre ligados, captando tudo à sua volta” (BLACKSHAW, 2010, p.52) e “ser parte de um grupo globalmente interconectado é a situação normal da maioria dos cidadãos” (SHIRKY, 2011, p.27), o poder que o espectador/usuário/colaborador assume no cenário comunicativo é muito maior. A comunicação unidirecional característica dos meios massivos começa a mudar quando o consumidor passa a ter possibilidade de produzir e disseminar conteúdos. Para Perez, “No Brasil, no fim dos anos 1980 e início dos 1990, essa realidade [da comunicação unidirecional, dos anunciantes para os consumidores] começa a se alterar em razão da simples lei de mercado da concorrência: a 8

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procura e oferta. A competição começa a surgir com mais intensidade e as organizações, na busca de seus „consumidores‟, passam a tentar ouvi-los e criam-se os canais de relacionamento, por meio do correio do telefone, da internet, entre outros.” (PEREZ, 2004, p.105) A disseminação e o fácil acesso ao conteúdo produzido pelo usuário geraram mudanças na comunicação como um todo e, especialmente, nas relações entre anunciantes e consumidores. O empoderamento do consumidor exige mais atenção às maneiras como as empresas se relacionam com seus clientes. Isso reflete no posicionamento das empresas: O pensamento em marketing está evoluindo da maximização do lucro em cada transação para a maximização do lucro em cada relacionamento. O futuro do marketing está no database marketing, pelo qual sabemos o suficiente sobre cada cliente para fazer ofertas customizadas e personalizadas relevantes e oportunas a cada cliente. Em vez de ver um cliente em cada indivíduo, devemos ver um indivíduo em cada cliente. (KOTLER, 2003, p.28)

Mais que isso, o cenário atual exige das empresas o investimento em Marketing de Relacionamento, o qual possui quatro características principais: [1] Concentra-se nos parceiros e clientes, em vez de nos produtos. [2] Atribui mais ênfase à retenção e cultivo dos clientes existentes do que à conquista de novos clientes. [3] Confia mais no trabalho de equipes interfuncionais do que nas atividades de departamentos isolados. [4] Ouve e aprende mais do que fala e ensina. (ibidem, p.134).

Ora, manter um relacionamento próximo com os clientes e fazê-los produzirem e compartilharem conteúdos positivos sobre a marca ― consequentemente influenciando sua rede de amigos e possíveis clientes ― é o objetivo maior das empresas que se inserem nos espaços de mídias sociais. As empresas devem observar o comportamento dos consumidores nesses ambientes visando interagir com a comunidade de marca de igual para igual. Também é importante considerar que, nesses espaços, a comunicação deve ser rápida e transparente, havendo mais lugar para um pedido de desculpa em caso de falhas do que para dissimulação e indiferença. Para ilustrar os fenômenos vivenciados nas mídias sociais no que diz respeito à relação das empresas com os consumidores, abordaremos o caso do Pontofrio.com na próxima parte deste trabalho.

Pontofrio.com: Um Caso de Sucesso Pontofrio.com é uma empresa varejista de comércio eletrônico nascida em agosto de 2008 a partir da segregação da operação de vendas pela internet e televendas do Pontofrio ― rede varejista com mais de 60 anos de atuação e, em termos de receita líquida, a segunda maior do Brasil em seu 9

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segmento. Segundo texto do site da empresa, “o Pontofrio.com tem como objetivo servir bem, oferecendo aos nossos clientes um serviço ágil, de confiança e um atendimento de excelência. Queremos que nossos clientes tenham uma experiência positiva durante o processo de compra”. Buscando atingir esses objetivos, o Pontofrio.com apostou em interagir com os consumidores através da redes sociais Twitter e Facebook ― além, é claro, de manter os canais de comunicação mais comuns, como telefone, formulário e chat. Hoje, o perfil da empresa no Twitter é seguido por quase 120 mil pessoas, e mais de 900 mil curtiram a sua página no Facebook. É interessante perceber que, nessas plataformas sociais, quem fala em nome da empresa é o Pinguim, personagem dirigido por quatro profissionais da Nova Pontocom. Segundo Clotilde Perez (2004), a utilização de mascotes tem o objetivo de humanizar a marca, sendo esses representantes portadores de sorte e alegria, que têm vida própria e participam do cotidiano das pessoas. De fato, o Pinguim utiliza os temas em pauta nas mídias sociais para fazer graça ou lançar promoções exclusivas. Seu tom de comunicação informal e irreverente faz sucesso com o público, que curte, comenta e compartilha suas publicações. É também curioso notar que as mensagens do Pinguim não dizem respeito somente a ofertas, produtos e outros temas relacionados à empresa; elas trazem fotos, dicas de filmes e livros, citam outras marcas (como McDonald‟s e Netflix), acompanham tendências do universo digital (especialmente interagindo com os conteúdos televisivos). Enfim, o Pinguim age como qualquer outro usuário de mídias sociais. Expondo o seu dia a dia de maneira informal e bem humorada, ele tenta estabelecer uma relação de igual para igual com os seus seguidores. Como é comum nas mídias de função pós-massivas, não há uma hierarquia ou protocolos a serem obedecidos. Não podemos deixar de lembrar que, independentemente de vir de um mascote ou de um comunicado oficial da empresa, os discursos são produzidos por pessoas. Portanto, “é importante que parceiros da empresa assumam a personalidade da marca” (KOTLER, 2003, p.121) para se comunicar com a comunidade da marca. Especialmente no caso das mídias sociais, em que exige-se rapidez nas interações, é imprescindível que a pessoa em contato (direto e em tempo real) com os consumidores assuma a postura da marca no relacionamento com o cliente. Pelo trabalho realizado nas mídias sociais, o Pontofrio.com ganhou o Prêmio #EPIC de Melhor uso do Twitter por uma marca em uma campanha publicitária; o Prêmio do Blog Jotacê como Melhor relacionamento com o consumidor e Melhor Twitter de loja online; foi eleita a marca mais útil presente na internet pela RMA Comunicação; e foi reconhecida pela Social Bakers 10

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internacional pela atuação nas redes sociais5, além de gerar mídia espontânea entre os próprios internautas. No entanto, todo esse reconhecimento não é suficiente para manter uma empresa. Não podemos perder de vista que o objetivo de toda corporação inserida num sistema capitalista é obter lucro. Ainda que seja difícil definir as consequências que uma boa atuação nas mídias sociais traz para o balanço financeiro das empresas, o caso do Pontofrio.com revela um horizonte promissor. No evento IAB Social Media Insights ― promovido pelo Interactive Advertising Bureau (IAB) em São Paulo, no dia 14 de maio deste ano ―, Guilherme Perez, coordenador de Marketing da Nova Pontocom, afirmou que o faturamento em vendas do Ponto Frio.com através das ações integradas com Facebook e Twitter no ano de 2012 foi de 20 milhões de reais. Até hoje, o maior faturamento de ações integradas em redes sociais já declarado por uma empresa no Brasil. Sucesso de público que se traduz em vendas, portanto.

Considerações Finais No cenário de consumo simbólico característico da cultura de consumo contemporânea, os significados dos bens são constantemente negociados. E, embora a imagem e o valor das marcas sempre tenham sido atribuídos pelo consumidor, hoje ele assume um papel importantíssimo nessas negociações. Antes dos meios de comunicação pós-massivos, espectadores e clientes não tinham poder de produzir e divulgar suas opiniões, experiências e anseios com tanta facilidade quanto hoje em dia. Além do aumento da quantidade de discursos possível com a abertura do polo de emissão, dispositivos portáteis e móveis e mídias sociais com recursos cada vez mais fáceis de usar equiparam usuários para que, em tempo real e a baixíssimo custo, possam participar ativamente no processo de comunicação e de produção e negociação de sentidos. Assim, tornou-se frequente encontrar discursos sobre marcas nas redes sociais digitais. Nessas mídias, estabelecem-se caminhos de mão-dupla e nega-se uma hierarquia consolidada nos meios de comunicação de massa tradicionais. Essa bidirecionalidade comunicacional propicia a consumidores e marcas um estreitamento de relações; e a humanização de discursos é uma maneira de as corporações se mostrarem emotivas, atenciosas e compreensivas. 5

Ver informações no site da empresa de comércio eletrônico Nova Pontocom, responsável pela comunicação online da Pontofrio.com. http://www.novapontocom.com.br/

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É preciso destacar que, a relação com os clientes é fortalecida através do humor, da rapidez na interação e da excelência no atendimento. O caso do Pontofrio.com mostrou que, muitas vezes, mensagens que não dizem respeito ao segmento de atuação da empresa diretamente ajudam a construir a imagem da marca e torná-la popular entre os usuários das mídias sociais. Na realidade dos meios de comunicação pós-massivos e com o empoderamento do consumidor e sua busca por atenção das empresas, afirmações como “A melhor propaganda é feita por clientes satisfeitos” ou “O cliente é quem manda” nunca estiveram tão certas. Resta às corporações definir sua ideologia, manter uma conduta ética em todos os níveis de atuação e prezar por um bom relacionamento com os clientes. Estar presente no dia a dia dos consumidores, mantendo com eles uma relação transparente, humana e prazerosa parece ser o caminho para obter uma imagem de marca positiva e aumentar o faturamento.

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