Papel dos Agentes Públicos e Privados nas Políticas Culturais - UFPa

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ CURSO DE EXTENSÃO E APERFEIÇOAMENTO EM GESTÃO CULTURAL AULA 6 TEXTO COMPLEMENTAR: PAPÉIS DOS AGENTES PÚBLICOS E PRIVAD...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ

CURSO DE EXTENSÃO E APERFEIÇOAMENTO EM GESTÃO CULTURAL

AULA 6

TEXTO COMPLEMENTAR: PAPÉIS DOS AGENTES PÚBLICOS E PRIVADOS NAS POLÍTICAS CULTURAIS

PROFESSOR: JOSIMAR OLAVO DANTAS (Zhumar)

2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO / DIRETORIA DE APOIO À CULTURA CURSO DE EXTENSÃO E APERFEIÇOAMENTO EM GESTÃO CULTURAL AULA 06 - PAPÉIS DOS AGENTES PÚBLICOS E PRIVADOS NAS POLÍTICAS CULTURAIS PROFESSOR: JOSIMAR OLAVO DANTAS (Zhumar)

Objetivos Esta nossa aula tem como objetivo introduzir a discussão sobre o papel dos gestores culturais, públicos e privados, como agentes fundamentais da dinâmica do sistema cultural contemporâneo. Objetiva, também, apresentar o papel que desempenham o Estado, o mercado e a sociedade nesse sistema e destacar, ainda, a importância do reconhecimento dos profissionais envolvidos na consolidação do sistema em questão.

Unidade 01 – Discutindo o papel do Estado, da Sociedade e do Mercado no Sistema Cultural Contemporâneo Nos últimos anos, temos discutido, com regularidade, sobre as responsabilidades do Estado e da sociedade civil com as questões que abrangem o campo da cultura. Todo esse interesse deve-se ao processo de implementação de políticas públicas de cultura, que têm, como um dos eixos centrais, a institucionalização da participação da sociedade civil. Entretanto, com a gradativa aproximação entre a cultura e o mercado, fez-se necessário, também, discutir a participação das empresas nesse campo. É preciso, portanto, pontuar e questionar que papéis essas macroestruturas: Estado, Sociedade e Mercado, enquanto agentes do sistema de cultura, podem e devem assumir, de forma articulada, em prol da dinâmica contemporânea em que opera o sistema de produção cultural. O Estado e os Direitos Culturais A ampliação do papel do Estado com relação ao setor cultural deve-se a uma maior politização da cultura e à inclusão dos direitos culturais no rol dos direitos humanos. A fragmentação das identidades coletivas e a ampliação da exclusão social em todo o mundo, provocadas pelo fenômeno da globalização econômica, suscitaram uma reação veemente,

que se traduz pela mobilização para a proteção da cultura como fator de resistência à padronização e marginalização social. No Brasil, o Welfare State (Estado de bem-estar social) não chegou a acontecer, mas legou-nos uma máquina extremamente burocrática e ineficiente e uma política cultural voltada para as ideologias das elites. O neoliberal Estado mínimo reduziu a cultura a um bom negócio. Em ambos, os direitos culturais da diversidade social não puderam constituirse como agenda de governo. A partir de 2003, os direitos culturais, como fundamento da plataforma política, passam a direcionar o discurso e a formulação de políticas culturais democratizantes e estruturantes, ditas “política de estado”. É neste sentido que o Estado começa a reclamar para si o papel estratégico de formulador, regulador, fomentador e avaliador deixando para a sociedade o que lhe é inerente: o fazer, o criar e o produzir cultura. Ao mesmo tempo, o conceito de políticas públicas assumido passa a incluir os atores culturais, não apenas como público-fim de políticas específicas, mas o absorve, como implementadores, propositores e participantes de processos decisórios. Dessa forma, o Sistema Nacional de Cultura vem institucionalizar a participação social através das conferências, de conselhos e de fortalecimento dos fóruns. Com isso, o princípio da cooperação entre os entes federados e a sociedade civil é questão basilar, para que a arquitetura criada possibilite espaço para o exercício dos direitos culturais. Nos últimos anos, foi produzido um material farto acerca da responsabilidade do Estado com a cultura, sobretudo, com expressões culturais que por suas características não possuem apelo de mercado e, por isso, devem ser salvaguardadas por aquele que, por definição tem a missão de cuidar dos bens coletivos: O Estado. As perguntas, porém, a serem feitas, agora, são: se há, ou não, responsabilidade social das empresas pelo setor cultural; e, que papel deve desempenhar o setor privado na construção das políticas públicas de cultura? A Responsabilidade Social das Empresas Apesar de controversas, as Leis de Incentivo Fiscal (LIF), como a Lei Rouanet e as Estadual Semear/Pará e Municipal Tó Teixeira/Belém, que seguem o mesmo modelo, estabelecem uma participação do setor privado na questão cultural, embora não consigam abarcar a abrangência das expressões culturais. Sabemos que o poder de apoio cultural fica

nas mãos das diretorias de marketing das empresas, mas não podemos negar que um grande volume de recursos, frutos de impostos devidos pelas empresas, vem sendo investido no setor cultural, por meio destes instrumentos. Porém, pouco ou quase nada do lucro dessas empresas é investido diretamente, quer seja no setor cultural, quer seja no setor ambiental ou mesmo no social, isto, porque, o recurso que recolheriam ao imposto de renda é revertido em marketing para a empresa e credibilidade social junto à sua marca. Por que será que, via de regra, as empresas não assumem para si o ônus da responsabilidade social? Por que será que esta matéria se traduz mais como marketing do que como participação das empresas na transformação do mundo em algo melhor? Será que é possível lucrar e ao mesmo tempo contribuir com o bem coletivo? São questões a serem debatidas e estudadas para rompermos essa fronteira. Mattar (2001) nos aponta que podemos apelar para a ética, mas que não é o suficiente e nos apresenta algumas razões que dificultam a possibilidade de atuação social da empresa. Ela se dá por alguns atores independentes como o consumidor, o investidor, o governo e a mídia. Esses atores independentes são aqueles cujas demandas podem levar a empresa a tomar uma ou outra direção nas suas ações e atividades. E o que os principais destes atores - o consumidor e o investidor - têm demandado? O investidor quer o retorno do seu investimento. O consumidor, de um modo geral, tem demandado fundamentalmente produtos com qualidade, preço e marca adequados.

Os indicadores de sucesso de uma empresa sempre estiveram associados ao produto. Só mais recentemente, com a crise ambiental, a pressão social, através das ONGs, e a veiculação da problemática ambiental na mídia é que fatores extraproduto passaram a ser objeto de preocupação de algumas empresas. Por uma questão conceitual e ideológica, a cultura sempre esteve dissociada do mercado, com riscos para aqueles que mantiveram estreita relação com essas instâncias. Entretanto, hoje, a realidade da economia criativa nos leva a pensar em possível forma de abrirmos a relação mercado-cultura, sem prejuízo dos ideários culturais, trazendo as empresas privadas a participarem como agentes da construção de políticas públicas de cultura.

As Parcerias Público-Privadas Historicamente, são comuns e legais as parcerias público-privadas (PPP), em vários setores da economia, como transporte, radiodifusão e, também, na área social, como educação e saúde. A Constituição de 88 prevê, em diversos artigos, formas de relacionamento entre os setores público e privado ou autoriza a exploração de determinadas atividades, notadamente, aquelas ligadas à prestação de serviços. Nos últimos anos, o motivo principal para o aumento das parcerias, como uma solução de determinados problemas, foi provocado pelo crescimento de demandas em razão da complexidade da própria sociedade, em contraposição a um Estado que tem se mostrado ineficiente para a gestão, principalmente, de políticas sociais. A descentralização do Estado e a ampliação das PPP legaram, na área econômica, a existência de empresas de economia mista, com capital público e privado e, na área social, a criação das Organizações Sociais – OS (Museu de Arte do Rio) e das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP (Ponto de Cultura Mana Mani/PA). Entretanto, Lubambo (2014) nos alerta, para compreendermos, “em que medida esse processo de interação entre as partes reflete um avanço na forma de gestão da coisa pública ou um retrocesso no sentido do patrimonialismo, da promiscuidade entre o público e o privado ou de um retorno ao liberalismo”. Para reflexão, a autora nos faz um lembrete interessante sobre os conceitos de governo, governança e governabilidade, como patamar para reavaliarmos, constantemente, os papéis que o Estado, o mercado e a sociedade devem assumir, numa perspectiva atual do interesse público. Enquanto o termo governo se refere à “estrutura e à função das instituições públicas”, a governabilidade consiste na “capacidade política de governar, derivada da relação de legitimidade do Estado e do seu governo com a sociedade” e a governança pode ser definida como “a forma como o governo é operado”. Governança, nesta perspectiva, seria a ação de chegar a uma acepção centrada na sociedade, na ideia e na mediação política entre sociedade civil, mercado e Estado, o que nos faz refletir sobre governabilidade.

Essa abordagem propicia a reflexão sobre os papéis que o Estado e o mercado podem assumir nas políticas culturais, tanto em suas responsabilidades específicas, quanto na articulação público-privada, em consonância com o interesse público do setor cultural, coadunado com as demandas e necessidades da sociedade. Vale lembrar que não estamos falando apenas de patrocínios ou apoios para ações sazonais, mas, de articulações em torno de ações estruturantes e sustentáveis, a médio e longo prazo.

Como podemos mobilizar empresas para discutir, de fato, a responsabilidade social, incluindo aí as questões culturais e ambientais? Como podemos trazê-las para a construção das políticas públicas, sob a ótica do desenvolvimento local, onde os fatores econômicos, culturais, sociais e ambientais devem se articular, numa perspectiva sustentável para todos? Devem ser extensivas as ações das empresas à área da cultura ou as PPP e a responsabilidade social empresarial só devem cobrir a área econômica e as áreas assistenciais? Um espaço emergente, e que nos possibilita essa reflexão, são os arranjos locais produtivos no âmbito da economia criativa. Unidade 02 – Agentes Culturais e Profissionais da Cultura Vamos começar nossa aula com uma enquete. Você vai avaliar o seu perfil profissional, atribuindo pontos, conforme sua identificação e prática nas funções que você desempenha no setor cultural. Papel

00

01 02

03 04

05

Artista fazedor de cultura produtor cultural promotor de eventos gestor cultural captador de recursos articulador/ mobilizador de cultura oficineiro, instrutor, professor Pesquisador técnico de som, luz, etc curador de artes

Com certeza, você deve ter lembrado de outras habilidades e competências suas, que não se enquadram nas funções aqui apresentadas, ou lembrado de outras funções não inclusas; também deve ter ficado surpreso com os vários papéis que desempenha, o que já dá para vislumbrar a amplitude dos agentes que atuam na área cultural.

A função social do artista é a mais antiga e conhecida, entre os papéis desempenhados no âmbito da cultura. Entretanto, são muitas as funções surgidas, ao longo da história ou que vêm, recentemente, ganhando contornos específicos. Isto se deve a ampliação do papel social da cultura, nas últimas décadas, tanto em seus conceitos, quanto em suas ações, empreendidas pela sociedade civil e pelas políticas governamentais e empresariais.

O Sistema Cultural Contemporâneo De meados do século XX, para cá, a cultura vem se firmando, cada vez mais, como uma área social específica e como uma área com grande potencial para a transversalidade, essa realidade é sintomática, em tempos em que se discute a necessidade de uma relação sistêmica entre as áreas do conhecimento, em virtude do cartesianismo positivista não dar mais conta da complexidade social emergente. Rubim (2007) fala da feição contemporânea da cultura, e aponta os eixos sobre os quais se configuram as novas dinâmicas: a politização da cultura e a culturalização da política; a mercantilização da cultura e a culturalização da mercadoria. Por um lado, a cultura rompe a sua concepção transcendente e circunscrição religiosa, passando a ser legitimada pelo Estado moderno e laico. Por outro lado, vários assuntos de teor fortemente cultural passam a invadir a pauta política, como a questão ecológica, a das minorias étnicas e a das identidades de gênero, por exemplo. O outro eixo, o da mercantilização da cultura, consiste na maior marca do avanço capitalista sobre os bens simbólicos, centro do sistema cultural, atestam os autores: A emergência das indústrias culturais faz com que os bens simbólicos não sejam produzidos como também mercadorias, porque capturados apenas na esfera da circulação, mas que já sejam concebidos no momento mesmo da produção como mercadorias. Com a mercantilização potencializa-se a tecnologização da cultura, a proliferação das mídias e o aparecimento da cultura midiática, como componente vital da circunstância cultural, em especial dos séculos XX e XXI.

Em contrapartida, também observamos como as mercadorias tradicionalmente produzidas pela indústria de bens de consumo material vem se revestindo de conteúdos simbólicos; trata-se da culturalização da mercadoria. Cada vez mais, são feitos investimentos em design de carros, móveis e sapatos, para diferencial competitivo no mercado.

Alinhado a este contexto, temos na política cultural a tridimensionalidade da cultura regendo a formulação das políticas públicas nacionais, a partir da visão de abrangência da cultura, tônica da gestão do ministro Gilberto Gil, mencionado já em seu discurso de posse em 2003. A centralidade da dimensão simbólica, em interface com a dimensão cidadã e econômica da cultura materializam-se institucionalmente, por exemplo, na criação da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural e da Secretaria da Economia Criativa.

É nessa nova dinâmica nacional e internacional que surgem ou se redimensionam os vários papéis e funções no sistema cultural. Faz-se necessário conhecermos e reconhecermos tais agentes culturais como passo importante para o fortalecimento do setor cultural, diante da sociedade, tanto na perspectiva profissional, quanto da qualificação dos mais diversos agentes, ativistas e voluntários. Tipologia dos Agentes Culturais A partir da classificação das práticas sociais relacionadas à cultura contemporânea de Rubim (2007), fiz uma associação com os agentes culturais mais conhecidos, para termos uma visão panorâmica dos múltiplos agentes culturais. práticas sociais relacionadas à cultura

agentes culturais

criação, inovação e invenção

artistas, fazedores de cultura, cientistas

difusão, divulgação e transmissão

professores, comunicadores,

oficineiros,

instrutores,

articuladores

mobilizadores, vendedores

e

circulação,

cooperação,

intercâmbios, articuladores

trocas

e

mobilizadores,

vendedores

análise, crítica, estudo, investigação, analistas,

críticos,

estudiosos,

reflexão, pesquisa

investigadores e pesquisadores

fruição, consumo e públicos

consumidores, vendedores, articuladores e mobilizadores

conservação e preservação

museólogo, educadores patrimoniais

organização da cultura

gestores culturais, produtores culturais, curador, consultores,

promotores

de

eventos,

captador

de

recursos,

articuladores e mobilizadores

A transversalidade da cultura exige um perfil multifacetado de habilidades e competências, sendo comum um agente cultural agregar mais de uma função dentro de um mesmo projeto ou instituição. Entretanto, se faz necessário conhecermos e delinearmos perfis específicos, para uma melhor definição de papéis e valorização desses agentes. Exporemos aqui algumas características assumidas nos circuitos culturais. a) Artista – Ligado ao conceito de arte, mutável entre as culturas e os períodos históricos, o artista é um profissional do universo da criação simbólica. É um “inaugurador

de ideários, práticas e produtos culturais”. Sua criação expressa e

fortalece a identidade dos grupos sociais, propiciando para que os grupos desenvolvam autoconsciência; b) Fazedor de Cultura – Esta expressão, muito utilizada nos editais do MinC, geralmente, refere-se àqueles que produzem no âmbito cultural; diferenciando-os dos artistas. Geralmente, está vinculada aos agentes da cultura popular, numa relação imbricada da cultura com o cotidiano, sem um vínculo específico com uma determinada linguagem artística canonizada. Definem os detentores de saberes tradicionais, como benzedeiras, parteiras, contadores de histórias;

c) Professores - Os professores da área cultural lecionam a Disciplina Artes ou similares, em instituições de ensino, seja na Educação Básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental, Educação de Jovens e Adulto, Ensino Médio) ou no Ensino Superior; d) Oficineiros e Instrutores – Também desempenhando o papel de mediadores do processo ensino-aprendizagem, como os professores, estes profissionais ocupam na cadeia cultural o papel de focar o aprendizado com métodos e fins eminentemente

práticos.

Independente

da

formação

escolar,

detêm

conhecimento da área em que atuam e possuem metodologia de ensino. São oficineiros de dança popular, teatro de rua; são instrutores de audiovisual, de arte circense; e) Comunicadores – Jornalistas, radialistas, blogueiros, apresentadores de TV. Disseminam e produzem conteúdos culturais, através de meios de comunicação comunitários ou de massa; f) Articuladores e Mobilizadores - A expertise em articulação institucional e mobilização social vem se tornando função primordial na contemporaneidade, em virtude da Cultura de Redes. Programas como o Cultura Viva (MinC), que tem a Rede como conceito, deve muito, a estes agentes, na mobilização em torno dos pontos de cultura, como uma corrente impulsionadora de recepção e disseminação cultural. As ações de grande participação social, como as conferências de cultura, necessitam de agentes com esse perfil; g) Vendedores – Os vendedores de produtos e serviços culturais são fundamentais para a economia da cultura e nas especificidades que este setor exige - um olhar diferenciado em relação a mercadorias de outros setores; h) Analistas, Críticos, Estudiosos, Investigadores e Pesquisadores – São os pensadores do sistema cultural, submetem o campo da cultura a um crivo de discussões e avaliações públicas que o legitimam ou, ainda, questionam ou desqualifica ideias, práticas e valores; i) Consumidores – São todos os cidadãos consumidores da cultura, independentes do consumo estar vinculado a um produto ou serviço submetido á lógica de mercado.

Os Profissionais da Organização da Cultura Entre os profissionais da organização da cultura, merecem destaque o produtor e o gestor cultural, muitas vezes confundidos como agentes de uma mesma profissão. Maria Helena Cunha (2013) lembra que, o primeiro, tem um perfil mais executivo e, o segundo, mais estratégico. A profissão do produtor cultural é uma das que mais vêm crescendo no setor, principalmente a partir do final dos anos 1980 com o financiamento de projetos, através das Leis de Incentivo Fiscal. Não há um perfil preciso deste profissional. Pode agregar habilidades do gestor ou do captador de recursos, mas não necessariamente é a sua função primordial. De forma genérica, seu trabalho consiste em prover condições materiais e ambientais necessárias à realização de um projeto artístico-cultural. Ele organiza todas as etapas da produção, inclusive daquelas com a participação de públicos: espetáculos, shows, mostras, exposições. Dada à ampliação do raio de atuação do setor, o produtor cultural vai da organização de projetos artísticos à organização de eventos (promotor de eventos) e, mais recentemente, a ações ligadas à comunicação e tecnologias digitais, como a produção de sites, blogs, redes sociais. Com o aumento da responsabilidade pública pelo setor, passa a haver uma aproximação entre os órgãos governamentais, o mercado empresarial e o setor artístico-cultural. Neste mesmo período, também ascende a profissão do Gestor Cultural. É importante, pois, diferenciar essa profissão. O cargo de gestor é restrito aos dirigentes públicos de cultura quando assumem a administração como secretários de cultura, presidentes de fundações culturais, diretores de cultura ou chefes de departamento culturais. Por ser um cargo político, nem sempre é exigido um profissional com o perfil para a gestão cultural. O gestor cultural pode assumir cargos e funções, tanto em instituições públicas, quanto privadas, atuando em vários setores. ÁREAS DE ATUAÇÃO DO GESTOR CULTURAL • atuação em áreas artísticas culturais específicas, como: teatro, dança, música, artes visuais, literatura, patrimônio cultural, o que significa trabalhar em espaços públicos, privados ou do terceiro setor como teatros, museus, bibliotecas, centros culturais, galerias, circo, ou ainda em festivais, circuitos, indústria fonográfica, setor editorial; • atuação como gestores em instituições públicas, nos âmbitos municipal, esta-

- dual e federal, em órgãos diretos e indiretos, autarquias, fundações e institutos; • atuação no mercado privado, ou seja, em departamentos e diretorias de comunicação, marketing e de desenvolvimento cultural em empresas privadas, prestação de serviços especializados de forma autônoma ou com empresas culturais de gestão e/ produções.

De modo geral, a gestão origina-se e encontra assento na administração pública e privada. Os processos e fluxos institucionais têm o aporte de uma doutrina já estabelecida, porém, é típico da gestão uma certa autonomia e criatividade, que concorrem para o alcance do máximo de eficiência e eficácia nos resultados esperados. A gestão cultural, entretanto, tem seu diferencial: já nasce sendo uma contradição conceitual. Como gerir objetivamente o subjetivo, o fluido, a expressão da alma humana, como opina Martineli? “valoriza o intangível – assume a gestão do opinável e subjetivo” (Martineli, 2003)

O gestor cultural tendo como insumo de trabalho o inefável humano deve buscar seus próprios critérios de eficiência, eficácia e avaliação. Maria Helena Cunha (2013) confirma que a profissão realmente é complexa, pois além de estabelecer um compromisso com a realidade de seu contexto sociocultural, político e econômico, tem pela frente o desafio primordial de delinear o perfil de seus agentes e definir suas necessidades formativas. Martineli (2003) insere a profissão do gestor cultural entre os setores emergentes da cena contemporânea.

De modo genérico, ele aponta algumas

habilidades e competências atribuídas a esse profissional. o capacidade de estabelecer uma estratégia e política de desenvolvimento de uma organização; o capacidade de definir objetivos e finalidades a desenvolver; o capacidade de compor os recursos disponíveis: humanos, econômicos, materiais e outros; o capacidade de aproveitar as oportunidades de seu entorno; o capacidade de desenvolver um conjunto de técnicas para o bom funcionamento de uma organização;

o capacidade de relação com o exterior; o capacidade de adaptar-se às características do conteúdo e setor profissional de seu cargo.

Faz-se Necessário Reconhecer os Profissionais da Cultura Nos últimos anos, o debate sobre o sistema cultural vem abrangendo uma gama imensa de conteúdos e interfaces, entretanto, a pauta da profissionalização no setor ainda não ocupa o espaço devido. Discutimos o papel do Estado, da sociedade civil e até da iniciativa privada, enquanto macroestruturas do sistema cultural, discutimos, também, diretrizes, propostas, planejamento e planos de cultura. Estamos implementando o Sistema Nacional de Cultura - SNC, mas, pouco se vê, no plenário das conferências, a reflexão sobre os agentes culturais individuais, sejam eles profissionais, ativistas ou voluntários. Um dos principais pilares para a consolidação do setor é a profissionalização desses agentes; não podemos mais restringir o setor ao espaço do espontaneísmo, do ativismo e de cargos públicos Préplano Nacional de Cultura. É preciso identificar em nossa comunidade e reconhecer os agentes culturais, delineando seus perfis, em conformidade com a dinâmica do sistema cultural contemporâneo, discutido neste texto. É preciso mapeá-los e inseri-los no sistema de informação do município; é preciso criar mais cargos públicos na área cultural, pois, os poucos que existem não refletem o momento atual e isso, aumenta a vulnerabilidade do setor, com a alternância de governo, principalmente nos municípios. É preciso discutir previdência, regimes de contratação de serviços e todos os aspectos trabalhistas; é necessário ver o agente cultural como um trabalhador e reconhecê-lo como tal. Na Classificação Brasileira de Ocupações, do Ministério do Trabalho e do Emprego encontram-se registros de profissões de artista e de músico, por exemplo, mas não são encontros registros das profissões de produtor e gestor cultural, porque falta legislação específica. Rubim (2007) afirma essa necessidade: Será preciso que tais atividades, agora autonomizadas, ganhem distinção social. Isto é, sejam reconhecidas pela sociedade como atividades diferenciadas e especializadas. Mais que isto, o reconhecimento social pode se transformar em algo ainda mais substantivo, ou seja, em leis determinadas. Tem-se assim o reconhecimento oficial da atividade, através de legislações especializadas, que regulam a sua prática e definam exigências para os atores sociais legitima e legalmente encarregados de exercer tais profissões.

É importante lembrar que, em termos legais, já estamos mais avançados do que imaginamos. Falta uma melhor mobilização dos agentes culturais, em torno desta causa. No Plano Nacional de Cultura, lei 12.343/2010, as metas 7, 11, 12, 13, 15, 16, 17, 18, 35 e 36 tratam das ações públicas voltadas para a qualificação profissional, regulamentação e outros aspetos do reconhecimento público do profissional da cultura. Entre elas, merece destaque:

Meta 11) Aumento em 95% no emprego formal do setor cultural; Meta 12) 100% das escolas públicas de educação básica com a disciplina de Arte no currículo escolar regular; Meta 15) Aumento em 150% de cursos técnicos, habilitados pelo MEC; Meta 16) Aumento em 200% de vagas de graduação e pós-graduação nas áreas do conhecimento, relacionadas às linguagens artísticas, patrimônio cultural e demais áreas da cultura, com aumento proporcional do número de bolsas; Meta 17) 20 mil trabalhadores da cultura com saberes reconhecidos e certificados pelo MEC; Meta 36) Gestores de cultura e conselheiros capacitados em cursos promovidos ou certificados pelo Ministério da Cultura.

Observamos aí a importância da qualificação e certificação institucional, para validação dos profissionais da cultura. O Programa de Formação Cultural não é um componente obrigatório do SNC, porém, é necessário pensarmos na formação, como uma ação sistemática, estruturante e vinculada ao mundo do trabalho. Para o gestor cultural, especialmente, Maria Helena Cunha (2013) assim se refere ao perfil e ao campo de atuação do gestor cultural: Para uma profissão relativamente nova, é preciso analisar também o seu processo formativo, considerando como base de sustentação teórica conhecimentos multidisciplinares, que deve estabelecer uma relação entre as questões artísticas e culturais associadas aos conhecimentos sociológicos, antropológicos e políticos, bem como aos conhecimentos mais técnicos da comunicação, economia, administração e direitos aplicados à esfera cultural. Assim, a formação do gestor cultural deve ser entendida como uma composição de elementos, em que só o autodidatismo não consegue mais responder a todas as demandas do processo formativo e nem o ambiente estritamente acadêmico, que ainda não é suficientemente específico.

Aqui, fiz uma introdução ao assunto, para chamar atenção à necessidade de debate e ações práticas, no sentido de conhecermos e reconhecermos oficialmente os profissionais da cultura e seus demais agentes. Enquanto isso não ocorrer, teremos sempre uma força de trabalho flutuante ou pela metade, pois os trabalhadores da cultura, como quaisquer profissionais, dependem de condições apropriadas para o sustento de suas famílias: financeiras, legais, formativas, previdenciárias. A consolidação do sistema cultural dá-se pela objetividade, de forma a garantir que o inefável subjetivo da arte e da cultura possam fluir com mais segurança.

Referências Bibliográficas CUNHA, Maria Helena Melo da. Gestão cultural: profissão em formação. Belo Horizonte: DUO, 2007. LUBAMBO, Cátia. Módulo IV: Aulas 1,2,3: Princípios e modelos da gestão pública, Gestão compartilhada e autogestão, Modelos de articulação público-privada. . Eixo III: Planejamento e Gestão Pública da Cultura. Curso de Extensão e Aperfeiçoamento em Gestão Cultural. UFPA, 2014. MATTAR, Hélio.

Os novos desafios da responsabilidade social empresarial.

Reflexão, Ano 2, n. 5. São Paulo: Instituto Ethos, julho de 2001. RUBIM, Antônio Albino Canelas. Formação em organização da cultura no Brasil. Revista Observatótio Itaú Cultural, n.6. São Paulo: Itaú Cultural, julho/setembro 2008.