os professores iniciantes no ensino superior e os dilemas ... - Pesquisar

OS PROFESSORES INICIANTES NO ENSINO SUPERIOR E OS DILEMAS DO INÍCIO DA CARREIRA: NECESSIDADES FORMATIVAS E DIFICULDADES EXPLÍCITAS Georgina Terezinha ...
2 downloads 82 Views 260KB Size

OS PROFESSORES INICIANTES NO ENSINO SUPERIOR E OS DILEMAS DO INÍCIO DA CARREIRA: NECESSIDADES FORMATIVAS E DIFICULDADES EXPLÍCITAS Georgina Terezinha Brito de Vasconcelos1 Gláucia Signorelli2 Laurizete Ferragute Passos3 Agência de fomento: CNPq Eixo: 3 – Pesquisa, Formação de Professores e Trabalho Docente (Comunicação)

Introdução A presente pesquisa é parte de uma atividade realizada, no âmbito da formação strictu sensu, do Programa de Doutorado Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação, da disciplina Profissionalidade Docente de Professores Formadores dos Cursos de Licenciatura em Início de Carreira. As pesquisas que tratam deste tema apontam que a profissionalidade docente constitui-se a partir das experiências vivenciadas pelos professores, e tem peso as acadêmicas e as profissionais. Gimeno Sacristán (1995, p.65) corrobora ao afirmar que a profissionalidade docente está associada ao “conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que constituem a especificidade de ser professor”. Esses elementos não são fixos, mas adquiridos e modificados ao longo do exercício da profissão, é processo contínuo, com suas bases nos saberes e fazeres adquiridos/construídos pelos professores. Mas, sabemos que os professores ao iniciarem na carreira, ainda carregam marcas de sua trajetória como estudantes e muitas vezes, pela inexperiência inicial, trazem para a sala de aula modelos de seus antigos professores que vão se misturando às suas crenças e concepções formuladas em seu processo de formação inicial e dando início à constituição de sua profissionalidade. Segundo Ruiz (2008), os professores iniciantes no ensino superior também passam por esse processo e aponta que em sua prática docente inicial o professor do ensino 1

Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação: Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Bolsista CNPq. 2 Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação: Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Bolsista CNPq. ³ Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação: Psicologia da Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

superior se depara e vivencia algumas dificuldades relacionadas a essa prática, entre as quais se destacam as relacionadas ao aspecto pedagógico como planejamento, aprendizagem dos alunos, avaliação, dificuldade de articulação entre a teoria e a prática, utilização de recursos pedagógicos entre outras, bem como aquelas relacionadas a aspectos administrativos, burocráticos e formais que são de total desconhecimento da grande maioria dos professores em início de carreira. Como outros professores, em qualquer nível de atuação, os iniciantes no ensino superior precisam adquirir conhecimentos sobre os alunos e sobre o ensino, conhecer o projeto político pedagógico do curso a fim de delinear adequadamente os conteúdos do currículo e, ao mesmo tempo, desenvolver um repertório docente que lhes possibilite sobreviver como professores e construir uma identidade docente. São estes alguns desafios que os professores universitários, com maior ou menor intensidade, dependendo do contexto em que atuam, enfrentam no início da carreira (MARCELO, 2008). Ruiz (2008), ao tratar desses desafios postos aos professores universitários, afirma ser um período de incertezas, angústias e inseguranças que chegam a causar temores e grandes dúvidas aos iniciantes. Argumenta que esses professores, muitas vezes, sem qualquer tipo de apoio, aprendem muito mais por ensaio e erro do que por meio de uma prática reflexiva teoricamente fundamentada. A par dessas questões apontadas pela literatura e interessadas em compreender o processo de iniciação na carreira dos professores do ensino superior, nossa pesquisa tem como objetivo, discutir as necessidades formativas e dificuldades explícitas de professores em início de carreira. O percurso metodológico desta pesquisa de abordagem qualitativa, de cunho bibliográfico e pesquisa de campo, foi buscar dados por meio de entrevistas com professores que vivenciam essa experiência em sua prática. Foram realizadas seis entrevistas com professores iniciantes que atuam em cursos de licenciatura. Mas, para este estudo utilizaremos apenas a entrevista de uma professora que atua em curso de Pedagogia, a qual foi escolhida de forma proposital a partir dos seguintes critérios: ser docente em curso de Licenciatura em Pedagogia, em IES privada, com até cinco anos de atuação no ensino superior. Denominada professora Denise para preservar seu anonimato, a professora entrevistada é uma professora que trabalha há três anos em uma IES privada do Estado de São Paulo; possui formação acadêmica na área de educação, com graduação em Pedagogia e Mestrado em Psicologia da Educação. É professora do curso de Licenciatura em Pedagogia.

A entrevista foi conduzida por um roteiro semi estruturado composto de quatorze questões. Os dados coletados foram transcritos e a análise desses dados consistiu em leitura profunda da entrevista seguida do levantamento de categorias de análise das quais retiramos apenas duas para serem discutidas neste estudo, a saber, as necessidades formativas e dificuldades explícitas. Os resultados evidenciaram dificuldades explícitas e necessidades formativas, tanto de caráter pessoal como pedagógico, que interferem em sua atuação causando certo desconforto e insegurança. Resultados da pesquisa 1. Necessidades formativas Na Língua Portuguesa, a palavra necessidade vem do latim “necessitate”, definida no Dicionário Aurélio (2008, p.428), como: 1. qualidade de ou que é necessário. 2. Aquilo que é inevitável, fatal; 3. Aquilo que é absolutamente necessário, exigência; 4. Privação dos bens necessários, indigência, míngua, pobreza. De acordo com o verbete citado, a palavra necessidade tem vários significados e apresenta certo grau de ambiguidade o que nos remete a uma reflexão sobre o significado da mesma, apresentando-se como algo que é imprescindível para nós. Nos trabalhos de Lima (2013 apud ROEGIERS, WOUTERS E GERARD), encontramos algumas definições sobre “necessidades” que servirão de apoio ao nosso estudo. Os autores asseveram que o termo necessidade é caracterizado como polissêmico, entendido como a distância entre uma situação real e uma situação ideal. Classificam o termo também como ambíguo, por comportar conotações de caráter objetivo e subjetivo. Objetivo porque reflete uma necessidade natural e social; subjetivo porque só existe por meio do filtro das percepções do indivíduo acerca da realidade, tratando-se, portanto, de uma construção mental. Seguindo a linha teórica de Lima (op. cit), essas percepções podem ser reveladas por meio de três pólos: o da representação da situação atual, que segundo a autora se expressa em termos de problemas, de disfunções, de exigências, de dificuldades, de defeitos; o da representação da situação esperada, expressa em termos de desejo, de aspiração, de motivação; e o da representação das perspectivas de ação nas quais a necessidade é expressa em termos de ações a serem realizadas. A expressão de uma necessidade não depende da existência simultânea desses três pólos, bastando que um deles seja explicitado pelo indivíduo para que se configure como tal.

Autores como Rodrigues (2006), Rodrigues e Esteves (1993) também apresentam alguns conceitos sobre necessidades. Aqui se tomam as afirmações de Rodrigues (2006), que assim postula: alguns autores consideram que os conceitos de necessidade e análise de necessidades são conceitos vazios, pois com seu uso frequente e polissêmico foram perdendo o sentido e, por este motivo, requerem o acompanhamento de um adjetivo como, por exemplo: necessidades básicas, necessidades autênticas, necessidades normativas ou necessidades formativas, etc. Portanto, em nosso estudo, consideraremos as necessidades formativas dos professores iniciantes no ensino superior, tal como Lima (2013) defende, de modo que possamos compreender o processo de construção da profissionalidade docente. A autora afirma que trabalhar em uma universidade é um desafio muito grande, pois implica na realização de um conjunto de tarefas complexas que muitas vezes amedronta o professor em seu início de carreira. Essas tarefas transformam-se em desafios, que de uma forma ou de outra vão interferir na vida profissional desses professores, causando certos desconfortos que podem afetar sua estabilidade pessoal e emocional. Algumas dessas dificuldades estão ligadas ao desenvolvimento da identidade profissional, a saber, às relações hierárquicas e normativas com os colegas e o conhecimento do ambiente organizacional (MARCELO, 2008). Ruiz (2008) confirma a existência dessas dificuldades ao expor que um dos principais desafios que os novos professores universitários enfrentam diz respeito às suas práticas de ensino. Dentre as práticas citadas pela autora, Cólen et al, (2000) e Atkinson (2002) confirmam e destacam as seguintes: como dar uma aula, como preparar um tutorial, como escolher os objetivos de uma aula, como planejar e organizar conteúdos, como escolher os melhores recursos pedagógicos para ensinar determinados temas, como motivar os alunos, além do necessário domínio do conteúdo a ser ensinado. Todo esse conjunto de desafios, que muitas vezes precisam ser vencidos concomitantemente, causam insegurança aos professores e isso faz com que as aulas transformem-se em um acúmulo de informações, chegando muitas vezes a saturar os alunos. De acordo com Cunha e Zanchet (2010, p.191): Para ensinar, o domínio do conteúdo específico é condição necessária, mas não é suficiente. Os professores universitários enquanto profissionais sejam os iniciantes ou os mais experientes, teriam de possuir conhecimentos, habilidades e atitudes próprias de suas tarefas e de seus compromissos.

Corroborando com Cunha e Zanchet, Lima (2013) assevera que tal modo de conceber a tarefa docente está pautada na ideia de construção de conhecimentos, ao invés de uma simples transmissão, e na concepção de conhecimento como passível de mudança e transformação e não fixo e imutável.

Compreendemos com base nos estudos realizados que o que mais angustia o professor em início de carreira é sua inexperiência em lidar com as situações cotidianas que, muitas vezes, o impede de ir adiante na tarefa de ensinar. Mas os que seguem na carreira tentam resolver seus problemas e dificuldades, adquirindo e concebendo as normas e valores que são apresentados a eles; experenciam formas de relacionamentos com os colegas e vão se ajustando de maneira mais confortável ao novo ambiente e, essas novas experiências possibilitarão sentido a sua vida profissional. Marcelo (2008), afirma que, as formas de resolver dificuldades e as percepções e atribuições que os novos docentes têm sobre sua satisfação com o trabalho impactam a evolução de suas carreiras acadêmicas. Embora os autores citados, se refiram em suas obras à realidade européia, seus pressupostos são compatíveis com a realidade brasileira, podendo, dessa forma, fundamentar este estudo nesse contexto, servindo de pano de fundo às análises das necessidades e dificuldades enfrentadas por uma professora do curso de Pedagogia em início de carreira. 2. Necessidades e dificuldades reveladas pelo sujeito Os dados apresentados a seguir demonstram a importância que a professora formadora, iniciante na docência, atribui ao ensino e como concebe ou passa a conceber a docência. Esse movimento de constituição de sua profissionalidade ocorre na direção de suas crenças, por acreditar que cabe ao professor indicar referências para ampliação dos conhecimentos de seus alunos ou na forma como pensam sua disciplina, mas não sem apresentar necessidades e dificuldades na condução de seu trabalho. Com nossa entrevistada, as dificuldades surgiram logo no primeiro dia e quando questionada sobre o desafio de enfrentar uma sala de aula pela primeira vez, expõe: “[...] quando eu assumo uma turma eu tenho que provar a que vim, veja bem, me deixa tentar explicar o que é isso. A primeira vez que eu entrei na sala, eu coloquei minha bolsa sobre a mesa e fiquei esperando, e as pessoas não entenderam que eu era a professora, porque talvez eu não tenha o estereótipo de professor universitário, acho que isso é uma coisa [...] eu sinto isso um tanto com os colegas, mas com eles menos hoje, porque eu tenho 3 anos na mesma unidade, então isso já está um pouco mais consolidado, mas, com os alunos, tinha o tempo inteiro um teste[...]” (Denise).

Seguindo em seu depoimento nossa entrevistada diz: [...] eu sou a mais nova do grupo aqui, na faculdade, ontem mesmo eu tava terminando uma aula, uma menina de outra disciplina bateu na porta, e ai ela falou: “quem É o professor que tá dando aula aqui”, falei, “eu mesma”, “ai, ai, desculpa”. (Denise).

A professora revela ter que “provar” ser a professora. Talvez o fato de ser jovem possa ser um dificultador no início da docência universitária, pois o estereótipo de professor

universitário, apontado na pesquisa de Coelho (2012) é de homem, calvo, que usa óculos, autoritário, amigo, sem dinheiro, preocupado com a família e sem tempo para o lazer e,não condiz com uma jovem professora, às vezes confundida com os alunos da classe e, por isso, submetida a testes constantes. Mas, não são somente os alunos os autores dessa versão de professor universitário, pois os colegas, conforme nos relatou, também colocaram em cheque o fato de ser uma professora jovem. Ser jovem pode pesar, mas será determinante para sua profissionalidade, a forma com atua, a postura que adota e a responsabilidade que assume frente ao seu trabalho e a professora entrevistada está tentando superar este desafio: [...] estou num lugar que tenho o tempo inteiro acesso às pesquisas acadêmicas, às questões teóricas, eu trabalho com professores aqui que são muito experientes, que viveram gestões muito importantes [...] então eu aprendo muito, então aqui tem sido um lugar muito importante pra pensar meu fazer na licenciatura. (Denise).

São grandes os desafios colocados aos professores iniciantes, para os quais precisam buscar soluções e Denise encontrou, na formação continuada, um caminho que a ajuda a superar as dificuldades. [...] vejo dois movimentos: a pós-graduação lato sensu, ela me amplia o olhar para algumas questões que hoje são bem importantes para alguns conceitos teóricos [...] algumas questões que são bem importantes na minha atuação, mas o mestrado eu acho que ele dá uma profundidade, uma leitura teórica que até então eu não tinha...nem no meu processo de escolarização; uma relação diferente com o conhecimento, uma relação de profundidade mesmo, de leitura da totalidade. (Denise).

A docente em toda sua fala vai expondo a necessidade de leituras de aprofundamento que segundo ela, só teve a “oportunidade” de realizar, com profundidade, na formação continuada. Entendemos que uma sólida formação continuada no início da docência como forma de obter apoio pedagógico, pode dar maior segurança profissional aos docentes. A fala da professora nos remete a Libâneo (1994, p. 28) ao ponderar que “o domínio das bases teórico-científicas e técnicas e sua articulação com as exigências concretas do ensino, permitem maior segurança profissional, de modo que o docente ganhe base para pensar sua prática e aprimore sempre mais a qualidade do seu trabalho”. Apropriamo-nos também das palavras de Gauthier (1998, p.24), que a esse respeito afirma: “em sua prática, o docente não pode adquirir tudo por experiência. Ele deve possuir também um corpus de conhecimentos que o ajudarão a “ler” a realidade e enfrentá-la”. Uma necessidade sentida pela professora em sua prática é de um conjunto de conhecimentos teóricos que possam subsidiar o seu ensino e ao mesmo tempo contribuir com a formação de seus alunos licenciandos. Na sua visão o conhecimento que é dado na

graduação, nos cursos de formação de professores é superficial e ela sente necessidade de um aprofundamento desse conhecimento. Quanto a isso expõe: [...] eu sinto que a graduação ainda sofre esse movimento, então quando eu dava a disciplina de Metodologia da Alfabetização, eu estava discutindo [com os pares] para construir o plano de ensino [...] E aí eu falei: olha eu acho que é bacana a gente colocar um texto da Emília Ferreiro e aí eles falaram: não esse texto é de pós-graduação e é muito complexo, aí eu falei - é mas as alunas tem o direito de ter acesso ao conhecimento gente, não o caco do conhecimento...Fiz escondido mas eu dei (risos). (Denise).

São muitos os elementos de análise encontrados neste extrato do depoimento da professora:

lutas

simbólicas

travadas

nos

interior

dos

cursos,

professores

preparados/despreparados para lidar com saberes disciplinares, os currículos dos cursos de formação de professores, entre outros. Mas o que nos interessa aqui é a percepção que a professora iniciante tem sobre o conhecimento e a forma que encontrou para por em movimento as suas concepções e crenças. A professora declara a necessidade de os alunos terem acesso ao conhecimento e “não o caco do conhecimento”. Sendo iniciante, seria até compreensível que estivesse do outro lado, ou seja, concordando que o texto era realmente complexo e inapropriado para ser trabalhado na graduação, mas não se abalou e manteve suas convicções, mesmo tendo que fazer escondido. Neste sentido, recorremos a Nóvoa (2009), que explica que a forma como cada docente ensina depende do que ele é como pessoa quando exerce o ensino e, sua autoconsciência tem relação com o processo de reflexão sobre sua ação docente, colocando-a numa dimensão crítica da profissão docente, fundamental para se inovar e realizar mudanças. E, é isso que parece ocorrer com a professora Denise que se firma em suas convicções e em sua autoconsciência para superar os desafios encontrados no início da docência. Sabemos da importância do “outro” na constituição da docência. Nossa entrevistada também sabe: [...] eu sou uma pessoa pidona, se eu não entendo, eu vou atrás eu pergunto. A L. foi uma parceira, porque nós entramos juntas e embora a gente ministrasse disciplinas diferentes, eu sempre estava lá mandando email, se tem um texto, o que você vai fazer, e eu não tenho muito problema em me aproximar das pessoas e perguntar o que você tá fazendo? Você pode me ajudar? Eu não acho isso ruim, na verdade é, eu não tenho mesmo problema em lugar nenhum, aqui também eu faço isso, assim você cria um campo de abertura com as pessoas que é muito bacana, então, depois da L., eu tenho outras parceiras na faculdade, esse grupo que eu falo que planeja junto, então eu tenho algumas parceiras que a gente troca e-mail. (Denise).

Denise expressa a importância do diálogo, das trocas com seus pares que parece ter grande importância na sua atuação como docente.

Esse elemento da formação docente é defendido por Nóvoa (2009), pois dessa forma o trabalho ganha força. Ao compartilhar saberes, trocar experiências, atuar conjuntamente, todos aprendem e podem ter melhores resultados em suas ações. E, em se tratando de professores iniciantes, essa forma como nossa entrevistada lida com os colegas pode ser promissora ao seu desenvolvimento profissional e amenizar as dificuldades iniciais, pois segundo Tardif e Raymond (2000), o início da carreira docente é marcante para o professor, pois é aí que toda a prática profissional pode se estruturar em ações educativas que o acompanharão por toda a carreira docente. Por isso justifica buscar boas práticas como essas que a professora tem, a fim de se aproximar cada vez mais da profissão. No entanto, essa prática não é uma cultura acadêmica institucionalizada e isso pode ser um aspecto negativo aos docentes, principalmente aos iniciantes. Professora Denise reclama: Garantido institucionalmente a gente tem um encontro no início do semestre, o resto é muito sozinho, as minúcias é muito sozinho. (Denise). Sentir-se sozinha como nossa entrevistada é algo muito comum aos docentes iniciantes e um dos fortes indícios das dificuldades dos professores em início de carreira apontados pela literatura e, confirma Marcelo (2008, p.05) “poucas profissões se caracterizam por uma maior solidão e isolamento”. E foi, provavelmente, este isolamento que fez professora Denise sentir na pele a não existência de uma cultura acadêmica que emperra algumas ações na universidade: Na verdade o que eu sinto falta, muita falta é de ter uma cultura acadêmica, a gente não consegue ter um convidado para fazer outras conversas com outras faculdades[...] sinto muita falta e acho que isso é bacana de ser vivenciado pelas alunas, então eu sempre tenho que fazer uns movimentos isolados e ai fica isolado mesmo. (Denise).

Outros dados expostos no depoimento da professora ainda com relação às dificuldades explícitas foram as turmas com grande número de alunos, o que inviabiliza realizar um bom trabalho.

A professora relatou que já trabalhou com seis turmas,

aproximadamente 500 alunos no semestre: [...] então isso é uma coisa que para mim é um desafio porque eu já cheguei a ter 500 alunos num semestre; é uma relação com o conhecimento que é muito complicado [...] as salas são diferentes. (Denise).

Diante disso, a professora evidencia uma dificuldade no seu trabalho causada por uma decisão institucional, ou seja, os entraves proporcionados pela lucratividade da empresa, e para garantir o seu emprego, ter que aceitar as regras estabelecidas pela

instituição e dar conta de um trabalho bem árduo que é trabalhar com várias turmas e com um grande número de alunos. Na hora da avaliação a coisa fica ainda mais complicada: [...] e ai, eu não conseguia lembrar quem era quem, pra ter um cuidado maior de pensar no processo, isso pra mim é um desafio. (Denise).

Nesse contexto, e a partir dos resultados apresentados na entrevista com a docente e retomando o conceito de necessidades assumido por essa pesquisa como sendo a distância entre uma situação real e uma situação ideal, vimos que há dificuldades em jogo e que os professores iniciantes apresentam necessidades formativas em sua carreira que, dependendo da forma como forem assumidas, irão interferir positiva ou negativamente na constituição da sua profissionalidade docente. Considerações finais A análise dos dados apresentados revela alguns aspectos do processo da constituição da profissionalidade docente do professor formador iniciante. Aqui foram apresentadas apenas algumas das necessidades e dificuldades sentidas por uma professora em início de carreira, que na maioria das vezes passam despercebidas pelos sujeitos que atuam nesse contexto. Inferimos que é necessário um olhar investigativo sobre essas questões para que possamos entender que as necessidades e as dificuldades são geradoras de desafios para os sujeitos que as identificam, por isso defendemos que essas necessidades e dificuldades a partir do momento que são identificadas pelos sujeitos que as vivenciam, podem servir como condição de superação das mesmas e traduzidas em melhorias das condições de seu trabalho como docente. Nos dizeres de Rodrigues (2006, p.116), o levantamento e a análise de necessidades configuram-se como uma estratégia de desenvolvimento da competência reflexiva do educador. Referências bibliográficas: ATKINSON, T. Aprender a enseñar: habilidades intuitivas y objetividadrazonada. In; ATKINSON, T.; CLAXTON G. (Eds). El profesor intuitvo. Barcelona: Octaedro, 2002. CÓLEN, M. T. et. al. Las necesidades formativas del profesorado universitário novel para el ejercicio de la función docente. Barcelona: IUB, UAB y UPC, 2000. COELHO, M. L. O processo de constituição da docência universitária: o Reuni na UFMG. 2012. 268 f. Tese (Doutorado em Educação), Faculdade de Educação. Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. 2012. CUNHA, M. I. O professor iniciante: o claro/escuro nas políticas e nas práticas de formação profissional. Actas do III Congresso Internacional sobre professorado principiante e

inserción profissional a La docência. Santiago de Chile: Universidad de Sevilha e Universidad Autonoma de Chile, 2012, p.1-10. CUNHA, M. I., ZANCHET, B. M. A problemática dos professores iniciantes: tendência e prática investigativa no espaço universitário. Educação, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 189197, set./dez. 2010. GAUTHIER, C. Por uma Teoria da Pedagogia: pesquisas contemporâneas sobre o saber docente. Trad. Francisco Pereira. Ijuí: Ed.UNIJUÍ: 1998. GIMENO SACRISTÁN, J. Consciência e acção sobre a prática como libertação profissional dos professores. In: NÓVOA, António (Org.). Profissão professor. Porto: Porto Editora, 1995. p. 63-92. LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 1994. LIMA, E. F. Análise de Necessidades Formativas de Docentes Ingressantes numa Universidade Pública. In: 36ª Reunião Nacional da ANPEd – 29 de setembro a 02 de outubro de 2013. Goiânia-GO. MARCELO, C. (org.). El Profesorado Iniciante. Inserción en La Docencia. Barcelona: Octoredo, 2008. NÓVOA. A. Professores: imagens do futuro presente. Lisboa: EDUCA, 2009 RODRIGUES, A.; ESTEVES M. A análise de necesidades de formação de profesores. Portugal: Porto Editora, 1993. RODRIGUES, A. Análises de práticas e de necesidades de formação. Lisboa: Direção Geral de Inovação e de Desenvolvimento Curricular, 2006. RUIZ, C. M. El desafio de los profesores principiantes universitarios ante su formación. In: GARCIA, C.M. (coord.) El profesorado principiante – inserción a la docência. Sevilha: Octaedro, 2008. TARDIF, M.; RAYMOND, D. Saberes, tempo e aprendizagem do trabalho no magistério. Educação & Sociedade, Campinas, n.73, p. 209- 244, 2000. VALENZUELA, C. G.; BARNETT, R. O desenvolvimento da autocompreensão em posturas pedagógicas: explicitando o implícito entre os novos docentes. Educ. Pesqui., São Paulo, v. 39, n.4, p.891-906, out/dez.2013.