O Julgamento: Sobre drogas, verdades e  sentenças 

 

Oi, pessoal!    Para  quem  não  conseguiu  entender  a  entrevista  com  o  delegado  na  íntegra,  segue  abaixo  a  transcrição!    ENTREVISTA - EPISÓDIO 3: As testemunhas    Boa  tarde,  sou  o  Rafael  Soares  Pereira,  trabalho  no  Denarc,  delegado  de  polícia.  Estou  no  DENARC há 3 anos e meio e tenho 7 anos de carreira policial.     Sobre  as  prisões  que  ocorrem  por  tráfico,  se  muitas  delas  estão  relacionadas  à  maconha.  A  resposta  é  sim.  Grande  parte  das  prisões  ligadas  ao  tráfico  estão  relacionadas  sim  ao  tráfico  da  droga  maconha.  Questiona  sobre a nossa experiência quais os malefícios da droga. A gente  que  trabalha  diariamente  com  os  traficantes  e  viciados,  consegue  perceber  os  malefícios  da  maconha  de  forma  muito  clara.  Questões  como  déficit  de  atenção,  transtornos  e  doenças  psiquiátricas,  geralmente  os  presos  vêm  acompanhados  de  remédios  de  tarja  preta,  algumas  questões de saúde relacionadas às drogas.     Quanto  a  descriminalização  da  maconha,  a  pergunta  é  "se  eu  acredito  que  vai  diminuir  a  violência  do  tráfico".  Não.  Eu  tenho  como  certo  que  via  de  regra  a  descriminalização  das  drogas  fará  com  que  aumente  a  violência.  Primeiro  porque  permitindo  a  venda  e  o  uso,  um  maior  número  de  adeptos  provavelmente  passarão  a  existir.  Segundo,  e  mais  importante,  é  porque a nossa experiência trabalhando no combate a crimes organizados demonstra de forma  muito  clara  que  grande  parte  dos  narcotraficantes  que  atuam  no  crime  organizado,  se  fosse  permitida  a  maconha  eles  jamais  deixariam  de  ser  criminosos,  eles  passariam  a  intensificar  o  narcotráfico  de  crack,  cocaína  ou  começar  cometer  outros  tipos  de  crimes  que  até  então  o  estado  do  Rio  Grande  do  Sul  não  tem.  Como  roubos  a  residências,  que  é  um  percentual  muito  pequeno  e  de  muito  furto,  o  qual  não  tem  violência,  mas  o  roubo  grande  à  residência  é  um  percentual  muito  pequeno  comparado  a  criminalidade  de  Porto  Alegre  e  também  por  exemplo  como  sequestros, que o número é quase que irrisório comparado à quantidade de violência que  tem no estado do Rio Grande do Sul.    A  questão  número  5  pergunta  se  existe  algum  padrão  no  usuário  de  maconha,  classe  social,  idade.  Não.  A  maconha  é  uma  droga  utilizada  por  todas  as  classes  sociais  e  em  diferentes  idades.  Ela  tem  adeptos  de  diferentes  regiões,  diferentes  condições  sociais,  diferentes  idades  no  sentido  de  ter  tanto  traficante  quanto  usuários  de  maconha,  principalmente dos 14  até uns  60, 70 anos.    Você  acredita  que  a  legalização  aumentaria  o  número  de  usuários?  Sim,  respondi  anteriormente  que  sim.  Acho  que  ainda  há  pessoas  que não fazem uso de drogas em razão de  respeitar  a  lei.  Nós  vivemos  tempos  no  país  de  desrespeito  completo  às  leis  como  se  vê  em   

 

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todas  as  esferas,  desde  a  esfera  da  criminalidade  violenta  como  a  criminalidade  do  colarinho  branco.  Contudo  acredito  sim  que  diversas  pessoas  respeitam  a lei e deixam de fazer o uso da  droga porque ela é proibida.    A  questão  9  traz  aquela  ideia  que  os  países  que  legalizaram  o  uso  começaram  a  arrecadar  recursos  através  dessas  taxas.  Por  exemplo,  no  Uruguai,  já se tem a notícia de que o tráfico de  maconha  aumentou  ainda  mais  com  a  legalização.  Ocorre  que  no  momento  que  o  estado  começa  a  tributar  uma  mercadoria  ela  passa  a  ter  um  valor  muito  maior  de  mercado  do  que  uma  ilegal  que  vem  sem  tributação.  Ainda  que  pareça  não  ter  relação  eu  vou  dar  um exemplo,  por  exemplo,  todos  nós  sabemos  que  é  permitido  fumar  cigarro  no  Brasil  e  até  hoje  o  contrabando  de  cigarros do Paraguai pra cá é gigantesco. Por quê? Por causa do preço. Vamos  para  outra  área.  É  permitido  o  uso  de  agrotóxicos  e  a  compra de agrotóxicos pra agropecuária  no  estado  do  Rio Grande do Sul? Sim. E mesmo assim ainda há o crime de contrabando que vai  trazer  os  agrotóxicos  de  outro  país.  E  isso  não  é  permitido  e  as  pessoas  continuam  trazendo,  por  quê?  Oferta,  procura  e  preço.  A  mesma  coisa,  todos  sabem  que  se  for  numa  farmácia  vão  comprar,  por  exemplo,  e  a  gente  encontra  muito  aqui  no  DENARC,  principalmente  em  apreensões  de  drogas  sintéticas,  vão  comprar  por  exemplo  viagra,  vão  comprar  o  viagra  sem  receita  médica.  Mas  por  que  então se traz aquelas cartelas paraguaias do Pramil com diversos  comprimidos,  e  os  traficantes  revendem  em  festas eletrônicas, por causa da oferta e procuro e  o  preço.  No  momento  que  tu  passa  a  legalizar  a  situação  e  tributar,  não  vai  ter  um  preço  competitivo e o tráfico pode sim, inclusive, se acentuar.    Na  questão  10  fala  sobre  as  drogas  serem  vistas  como  doenças.  Sim  eu  acredito  que  a  drogadição,  o  uso  de  drogas,  pode ser visto sim como doença. Há relatos e há contatos diários  nossos  com  usuários  na  qual se percebe que ele realmente é um viciado. Não faz uso mais por  gosto  e  não  consegue  abandonar  a  droga.  Eu  acredito  sim  que  o  combate  ao  uso  de  drogas,  atualmente,  com a legislação que enfraqueceu, é muito mais uma luta da área da saúde pública  propriamente  dita  e  da  prevenção com educação, do que com a repressão policial. A repressão  policial é muito forte na questão vinculada ao tráfico de drogas.    A  11  pergunta  sobre  o  protocolo  repassado  aos  policiais  para  diferenciação  entre  usuário  e  traficante.  Isso  é  indicado  por  eles  ou  pelo  delegado  quando  o  suspeito  é  encaminhado  à  delegacia?  Isso  a  legislação  de  tráfico  permite  uma  análise  mais  ampla  da  conduta  para  identificar  se  é  tráfico  ou  uso.  O  grande  exemplo  que  nós  damos,  por  exemplo,  é  uma  pessoa  que  está  sendo  investigada  e  que  tem  áudios  em  uma  interceptação  telefônica  comercializando  drogas,  mas  que  no  momento  em  que  a  polícia aborda, se encontra com uma  pequena  quantidade  de  droga.  Ora,  como  o  contexto  probatório  comprovava  que  a  droga  que  ela  tinha  era  destinada  à  venda  e  que  grande parte já havia sido vendida, a lei autoriza que seja  feito  flagrante  por  tráfico  ainda  que  em  quantidades  diminutas  de  drogas.  Por  outras  vezes,  outros  elementos  de  prova  podem  fazer  com  que  se  aborde  o  indivíduo  com  uma  quantidade  um  pouco  superior  de  drogas  mas  se  descubra  que  o  fim  sim  é  o  uso.  Já  houve  casos  que   

 

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usuários  pegos  pelo  DENARC  com  em  torno  de  50-100  gramas  de  maconha  e  comprovaram  que  passariam  um  mês  de  férias  e  provavelmente  levariam  a  droga  para  consumo,  seria  possível.  Então  é  importante  que  se  abra  essa  brecha  para  interpretação  do  caso  concreto.  Com  isso  visa-se  evitar  injustiça,  que  eventual  usuário  responda  como  traficante  ou  que  eventual  traficante  também  fique  somente  com  poucas  quantidades  para  tentar  se  passar por  usuário.    Para  o  senhor,  qual  seria  a  ação  de  curto  prazo  mais  efetiva  para  o  combate  às  drogas?  Eu  acredito  que  a  ação  mais  efetiva  nesse  momento  pro  combate  ao  narcotráfico,  seria  o  fechamento,  ou  melhor,  o  monitoramento  muito  forte  das  fronteiras.  E  convém  dizer  que  a  cocaína  não  é  processada  no  Brasil,  nós  não  temos  solo,  não  temos  clima  pra  plantação  de  cocaína.  O  crack  é  produto  da  cocaína.  Então  se  as  duas  grandes  drogas  que  vem  de  fora, e a  própria  maconha  também  vem  de  fora,  o  fechamento  da  fronteira  evitaria  a  chegada  da  droga  no estado e isso diminuiria a guerra e diminuiria o número de traficantes.    Quais  os danos que o senhor considera mais relevantes para a sociedade brasileira. São vários.  É  difícil  de  elencar,  mas  tentando  elencar,  eu  elenco  o  seguinte  dano:  que  é  a  violência  gerada  pelo  tráfico  de  drogas.  O  tráfico de drogas tem um regramento próprio entre os bandidos, onde  o  não  pagamento  resulta  em  morte  onde  a  venda  em  área  diversa  do  ponto  da  pessoa  resulta  em  morte,  onde  há  um  financiamento  da  aquisição  de armamentos pesados oriundos também  pelas  fronteiras  para  ser  utilizado  nessa  guerra.  Eu  acho  que  do  tráfico  de  drogas  demanda  diversos  prejuízos,  há  também  o  prejuízo de saúde pública, afinal é dinheiro do estado, dinheiro  do  SUS  que  deixa  de  ser  empregado  em  cirurgias  diferenciadas,  por  exemplo,  também  para  casos  de  atendimentos  a  usuários.  Então,  há  que  ser  visto  como  prejuízos  amplos  e  de  diversas modalidades.    Quais  as  ações  do  serviço  de  inteligência  do  DENARC  ao  combate  do  crime  organizado  de  drogas?  O  serviço  de  inteligência  do  DENARC  ele  tenta  reunir  a  maior  quantidade  de  informações  possíveis  seja  de  denúncias  anônimas,  seja  de  colaboradores,  que  vem  na  delegacia  nos  prestar  informações  que  seja  até  de  inquéritos  policiais.  Acredito  que  com  um  maior  aparelhamento  da  inteligência  com  maior  acesso  a  informações  se  consiga  aperfeiçoar  as investigações.    Quais  os  maiores  desafios  que  se  encontra  no  exercício  do  trabalho?  Nesse  momento,  que  a  polícia  civil  do  estado  do  rio  grande  do  sul  encontra  no  desenvolvimento  do  trabalho,  é  a  carência  de  recursos  humanos  que  vem  sendo  recentemente  combatida  com  a  chamada  de  novos  integrantes,  policiais  jovens  de  novas  turmas,  mas  nesse  momento  a  polícia  civil,  eu  acho  que  ela  ainda  está  carente  de  efetivo  e  essa  talvez seja a maior mazela atualmente que a  gente  encontra  no  trabalho.  Aqui  nós  titularizamos  uma  delegacia  de  investigação  do  narcotráfico  importantíssima  que  tem  atribuição  para  investigar  no  estado  inteiro  e  o  número  de  efetivos  é  diminuto.  A  maior  dificuldade  é  não  contar  com  o  número  de  efetivos  ideal  em   

 

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termos de números de policiais para auxiliar no combate à repressão de drogas.    Muito obrigado pela oportunidade e até mais.   

 

 

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