Interações ecológicas e o ser humano Queridos estudantes do MeSalva! Como conversamos durante nossas aulas, o ser humano é um ser vivo. Vimos que somos parentes de todos os organismos conhecidos. Além disso, trocamos energia e matéria com o ambiente. Podemos dizer, metaforicamente, dando um novo sentido à frase quéchua famosa na voz de Atahualpa Yupanqui: “Runa, Allpa Kamaska” (O homem é terra que anda). Também discutimos como estamos afetando os demais seres vivos e o planeta como um todo. Nesse texto eu gostaria de trazer uma discussão relacionada com um aspecto diferente de interações entre humanos e outros humanos, ou de humanos com outros organismos. Como aparentemente estou com certa predisposição para citações bonitas, podemos começar falando (novamente dando um novo sentido) que “Nenhum homem é uma ilha isolada...”. Essa citação de John Donne serve de introdução para a discussão do presente texto. Vocês provavelmente viram em seus estudos sobre Ecologia que os diferentes organismos de uma comunidade biológica interagem e afetam uns aos outros. O ser humano não é exceção, não somos ilha isolada. Apesar das interações entre os organismos serem muito diversas, algumas categorias nos ajudam a entender melhor a teia da vida. Podemos iniciar classificando as interações entre intraespecíficas (entre organismos de uma mesma espécie) ou interespecíficas (entre organismos de espécies diferentes). Além disso, relações ecológicas podem ser classificadas em harmônicas (+), quando não ocorre prejuízo para nenhum dos participantes da relação, ou desarmônicas (-), nas quais pelos um dos organismos envolvidos é prejudicado. Algumas vezes um dos envolvidos é beneficiado ou prejudicado e o outro não é afetado e para esse a relação é neutra (0). Veja na tabela abaixo:
Esquema sobre as relações ecológicas. Os sinais de +, - e 0 indicam se o organismos é beneficiado, prejudica ou se a relação não afeta o organismo.
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Como esse é um módulo “avançado”, você já deve ter estudado essas relações. Entretanto, a ideia aqui é trazer exemplos diferentes dos classicamente dados quando se fala dessas do assunto E! que envolvam o ser humano como uma das espécies participantes (lembre-se, humano como parte do todo). Então vamos lá! Talvez a mais simples de perceber nos seres humanos seja a sociedade. Sabemos que vivemos em sociedades, mas pensando na relação ecológica sociedade, ou seja, indivíduos independentes que se organizam de forma cooperativa, os humanos também se encaixam. Os humanos possuem uma tendência de se organizar em grupos (gregarismo) além de existir divisão de tarefas (como nas abelhas). Um exemplo de colônia parece pouco provável de encontrar em humanos, uma vez que essa relação envolve organismos unidos fisicamente (anatomicamente) e com divisão de trabalho, como ocorre em certos cnidários e algas. E mutualismo? Nessa relação as duas espécies participantes obtêm benefícios e além disso não conseguem viver sem a interação. No corpo humano existem trilhões de células de bactérias. Para você ter uma ideia, em nosso corpo algumas estimativas dizem que existem 30 trilhões de células próprias e 40 trilhões de células bacterianas! Apesar de possivelmente não existir uma única espécie de bactéria sem qual não possamos viver, em conjunto, podemos dizer que dependemos desses micro-organismos (o nosso microbioma) para uma vida saudável. Essa relação nos ajuda em diversos aspectos como a absorção de nutrientes e proteção contra outros micro-organismos patogênicos. Em tese, daria para viver sem nenhum micro-organismo no corpo, apesar de ser uma vida de qualidade duvidosa. Pensando por esse lado, daria pra dizer que essa associação não se enquadraria como mutualismo e sim como protocooperação, quando ambos os organismos se beneficiam da interação mas não precisam dela para sobreviver. Existem casos de protocoperação entre humanos e outros animais muito legais. Por exemplo, algumas populações de golfinhos interagem com pescadores facilitando a vida de ambos. A ideia é mais ou menos a seguinte, os golfinhos conduzem os cardumes de peixes na direção dos pescadores. Quando os cardumes estão próximos o pescador lança a rede. O pescador pega mais peixes sabendo que tem um cardume exatamente onde jogou. E o golfinho ganha o que? A hipótese é que a rede caindo na água confunde o cardume fazendo alguns peixes voltarem, voltando na direção do golfinho. Banana né? Existe a possibilidade, inclusive de os golfinhos sinalizarem para que o pescador lance a rede, pois eles elevam a cabeça para fora da água, o que é entendido pelos pescadores como “vai tchê”. Coloquei o tchê porque existem exemplos dessa interação aqui no Rio Grande do Sul. Entretanto é possível que esse comportamento de elevar a cabeça seja um comportamento usual dos golfinhos quando caçam. Mais estudos são necessários. Um exemplo de protocoperação no qual a comunicação entre humanos e outros animais é mais evidente vem de um caso com aves. As aves são chamadas Honeyguides (guias para o mel). Como muitas aves elas são capazes de vocalizar e algumas espécies possuem uma vocalização que só utilizam com humanos. Os humanos vão seguindo a aves que os guia até uma colmeia de abelhas. A ave sozinha não consegue acessar o nutritivo favo de mel. Entretanto os humanos conseguem (levando umas picadas no caminho). E o que a ave ganha com isso? Os humanos muito agradecidos deixam um bom pedaço do favo para o passarinho! Você pode ver um vídeo aqui. Exemplos ainda mais evidentes de protocooperação podem ser pensados relacionados com a domesticação de organismos realizada pelos humanos. É possível que a evolução dos cachorros domésticos tenha ocorrido a partir de lobos selvagens que começaram a viver próximos de aldeias humanas. Eles consumiam restos de alimentos deixados pelos humanos (poderia ser um exemplo de comensalismo) e ao longo do tempo sendo domesticados. Os cachorros recebem benefícios relacionados
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com recursos alimentares e os humanos possuem guardas atentos que avisam e protegem as aldeias sobre eventuais perigos. Mesmo se você pensar em um cachorro doméstico atual, muito menos ofensivo do que um lobo, ele traz benefícios para os donos como diminuição do estresse e carinho sem ter fim, e em troca recebe alimento, segurança e carinho também. Bem, sobre o comensalismo acabamos de comentar que ancestrais dos cachorros talvez tenham dado início ao processo de domesticação a partir da interação com aldeias humanas antigas, das quais consumiam restos de alimentos. Esse tipo de recurso, alimento, é o tradicionalmente utilizado para exemplificar o comensalismo. Entretanto, atualmente é possível definir comensalismo como qualquer relação na qual um organismo se beneficie sem causar prejuízo ao outro organismo envolvido. Nesse sentido, o inquilinismo (uma espécie vive dentro ou sobre outra sem prejudicá-la) poderia ser considerado, então, uma espécie de comensalismo. No inquilinismo a o recurso obtido pelo inquilino é obviamente, moradia ou abrigo. Os peixes palhaços são um exemplo que causa confusão entre a ideia mais geral de comensalismo (obter alimento) e inquilinismo (obter abrigo). Eles vivem em interação com anêmonas e com essa interação conseguem proteção/abrigo (inquilinismo). Entretanto também utilizando restos da alimentação da anêmona para sua própria nutrição (comensalismo clássico). Algumas vezes o “não causar prejuízo” pode não ser tão claro. Por exemplo, epífitas são plantas, como as orquídeas, que vivem sobre outras plantas (inquilinismo). Mas caso existam tantas orquídeas que acabem rachando o galho da planta sobre as quais vivem? Enfim, só pra brincar um pouco mais com a complexidade da cousa toda. Daria pra pensar em exemplos de comensalismo com humanos. Muitos animais utilizam restos de alimentos humanos. Entre eles podemos citar baratas, roedores e urubus. Seriam comensais de humanos. Entretanto, apesar de não causar prejuízos diretamente (tirando uns sustos e corridas para cima da cadeira) eles estão relacionados com a transmissão de várias doenças (no caso de baratas e roedores pelo menos). Podemos ter inquilinos em nosso corpo também, se você pensar em alguma espécie de micro-organismo que possa viver dentro de nosso corpo sem nos prejudicar e sem trazer benefícios. As relações desarmônicas intraespecíficas (competição e canibalismo) envolvendo humanos são facilmente reconhecidas. Por exemplo, duas pessoas com um mesmo crush podem ser vistas como competindo por parceiros sexuais. E você pode ter entrado em uma competição por recursos (no caso o último quadradinho da barra de chocolate) com aquele seu tio que só aparece no final de semana. Brincadeiras a parte, competição intraespecífica realmente envolve recursos como parceiros reprodutivos e alimento, bem como por coisas menos óbvias, como luz (no caso de plantas de uma mesma espécie) ou locais adequados para construir um ninho. Além da competição, podemos citar o canibalismo. Apesar de talvez ser mais adequado separar canibalismo de antropofagia, porque no segundo caso o comportamento está relacionado com cerimonias não sendo necessariamente um hábito alimentar, é fácil lembrar de casos de pessoas que acabaram se alimentando de outras em cenários como acidentes nos quais a única fonte alimentar é, hum, outra pessoa. Temos também casos reais de pessoas como o personagem Hannibal Lecter, que são considerados comportamentos patológicos. E as desarmônicas interespecíficas? Como afetamos ou somos afetados de uma forma (-) por outras espécies. Somos predadores de outras espécies, tanto animais como vegetais (daí se fala em herbivoria). Se você consome alimentos como carne ou vegetais, e não está obtendo eles coletando e caçando, a relação é um pouco maluca. Como assim? Bem, pegando o gado por exemplo. Por um lado fornecemos abrigo e alimento para ele e aumentamos o número de suas populações para valores que possivelmente nunca seriam tão elevados sem nossa ajudinha. Por outro lado, nos alimentamos deles (predação) e de forma geral os criamos em condições não muito agradáveis. Mas também somos presas. Volta e meia um grande
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carnívoro, como leões, tigres ou ursos, ainda consegue pegar um humano dando uma volta por aí. O parasitismo é talvez a forma de vida mais difundida entre os seres vivos. Tem parasita pra todo lado. E nem estamos falando daquele cunhado. Os humanos são afetados tanto por ectoparasitas, que se instalam na parte de fora de nosso corpo, como carrapatos e sanguessugas, como por endoparasitas (que vivem no interior do corpo do hospedeiro), como muitas bactérias, protozoários, fungos e vermes. E competição interespecífica? Ela ocorre quando duas espécies diferentes competem pelos menos recursos do ambiente. Alguns grupos humanos ainda competem com outros predadores por caça. Existem muitos vídeos engraçados de animais “roubando” comida de seres humanos, principalmente envolvendo aves e mamíferos. Dá uma olhada: https://www.youtube.com/watch?v=9NEB3WVjPnY. Além disso, de forma geral, podemos pensar na ocupação de boa parte do ambiente terrestre pelos humanos como uma competição com outros organismos que dependem dos recursos presentes em determinadas áreas. O uso da terra para grandes monoculturas, por exemplo, está relacionado com a perda de habitat e extinção de outras espécies. Por fim, o amensalismo ocorre quando uma espécie afeta negativamente o desenvolvimento de outra. Exemplos mais clássicos envolvem espécies que secretam alguma substância que inibe o crescimento de outra espécie. Como fungos que produzem antibióticos que prejudicam bactérias que poderiam ser competidoras por recursos ou plantas que secretam substâncias que impedem o desenvolvimento de outras espécies de plantas. Outro exemplo seria o deslocamento de animais de grande porte, que podem pisotear animais de pequeno porte. Os animais pequenos podem morrer (-) mas os grandes nem ficaram sabendo (0). Os humanos utilizam produtos de outras espécies (como os próprios antibióticos) para impedir o crescimento de outras e também sintetizam substâncias não encontradas no ambiente com propósitos parecidos (pesticidas para evitar o desenvolvimento de pragas). Entretanto, não estamos secretando essas substâncias. Estamos utilizando substancias produzidas por outros organismos ou produzindo elas em laboratório. Então não seria um amensalismo mesmo. De qualquer forma, se você Bom, acho que viajamos bastante. Mas acredito que o texto serviu para você revisar as relações ecológicas, um tema que normalmente aparece em provas. O texto também ajuda a dar uma ideia do que falamos durante todo esse módulo – OS HUMANOS SÃO PARTE DO TODO! Bons estudos!
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