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Comunicação e ACV: os desafios das empresas ao comunicar resultados ambientais no atual cenário brasileiro Beatriz C. Koszka Kiss1, Luciana Stocco Bet...
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Comunicação e ACV: os desafios das empresas ao comunicar resultados ambientais no atual cenário brasileiro Beatriz C. Koszka Kiss1, Luciana Stocco Betiol2, Lígia Ramos3

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Pesquisadora do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas – FGV/EAESP, [email protected] 2 Professora e Pesquisadora da Fundação Getulio Vargas – FGV/EAESP, [email protected] 3 Pesquisadora do centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas – FGV/EAESP, [email protected]

Resumo. O presente artigo apresenta os resultados de uma pesquisa de natureza exploratória e descritiva, que relata a experiência e os desafios enfrentados por empresas membro da iniciativa Ciclo de Vida Aplicado (CiViA), do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV/EAESP), na comunicação dos resultados de seus estudos de pegada de carbono elaborados ao longo do ano de 2015. Para tanto, são explicitados os resultados de oficina específica para tratar de questões de comunicação e ACV - realizada no âmbito da iniciativa acima mencionada - bem como as dúvidas, os desafios enfrentados e alguns resultados já atingidos por três empresas do grupo na comunicação de seus resultados. Os desafios listados passam pela definição do objetivo do estudo, definição do público-alvo, direcionamento da comunicação e escolha do veículo mais adequado. Além destes fatores, o artigo apresenta os fundamentos teóricos que levaram à discussão do tema neste grupo de empresas, que passa por questões de regulação e auto-regulação no Brasil, pelo entendimento e interpretação das informações ambientais pelos diversos públicos de interesse, assim como pelo potencial ganho de competitividade e oportunidades de mercado para os produtos a partir da comunicação de seus atributos ambientais. Palavras-chave. Rotulagem ambiental, comunicação, empresas, pegada de carbono, stakeholders.

Introdução Ao realizar estudos de pegada de carbono de produtos (bens ou serviços), ao contrário do que comumente se imagina, os maiores desafios não estão nos cálculos das emissões em si, mas principalmente na definição do objetivo do estudo, no uso dos resultados e em sua adequada comunicação. Enquanto existem métodos, modelos, ferramentas e bancos de dados amplamente difundidos para a elaboração e quantificação do estudo, ainda faltam diretrizes para orientar o processo de comunicação dos resultados de estudos de avaliação de ciclo de vida (ACV) e de pegada de carbono de produtos. Segundo estudo da UNEP (2015), existem mais de 600 ferramentas que visam prover informações sobre a sustentabilidade de produtos para o consumidor. Este excesso de rótulos, padrões e ferramentas confunde os consumidores - sejam estes individuais, empresariais ou públicos - podendo desvirtuar o objetivo principal da comunicação de atributos ambientais decorrente dessas ferramentas e migrando para um ambiente de ceticismo e descrença (EDELMAN, 2008). Essa situação se concretiza, em especial, quando do uso de rótulos que não atendem às reais necessidades de melhora contínua da qualidade do produto, precisão, consistência das informações e verificabilidade das mesmas (SILVA, RIBEIRO, 2005), ou mesmo quando não geram influência positiva no produto. A norma NBR ISO 14020 evidencia este fato, esclarecendo o objetivo das rotulagens e declarações ambientais de produtos: “A meta geral dos rótulos e declarações ambientais é, através de comunicação e informações precisas e verificáveis, que não sejam enganosas, sobre aspectos ambientais de produtos e serviços, promover a demanda e o fornecimento dos produtos e serviços que causem menor impacto ambiental, estimulando, assim, o potencial para uma melhoria ambiental continua, ditada pelo mercado.” (ABNT, 2000) 824

Comumente, empresas se deparam com uma grande variedade de interesses e públicos para quem comunicar, dificultando o processo de tomada de decisão. Neste contexto, é válido lembrar que a comunicação e o uso dos resultados de estudos deste tipo devem estar alinhados aos objetivos definidos em sua etapa inicial, nos termos da norma ISO/TS 14067. Quando extrapolamos a análise para outras categorias de impacto ambiental, como na realização de estudos de avaliação de ciclo de vida (ACV “completa”46), o desafio é ainda maior: como analisar e comunicar mais de uma categoria de impacto ambiental e ainda ponderar eventuais trade-offs entre elas? Esse é um questionamento comumente feito pelas empresas. Da mesma maneira, a forma de priorizar as categorias mais relevantes para um determinado produto passa pela discussão interna da organização. Em decisões deste tipo, faz sentido analisar também possíveis riscos em comunicar ou não resultados ambientais, considerando que cada público de interesse pode ter percepções e níveis de conhecimento diferentes sobre a temática, e pode interpretar que a falta de informação ou de transparência sobre o impacto completo do produto pode ser uma estratégia da organização para não dar visibilidade às potenciais vulnerabilidades do produto ou da própria empresa. Um exemplo é o da empresa Levi Strauss, que realizou estudo de ACV da calça jeans Levi’s 501. O estudo levou em consideração 6 categorias de impacto ambiental: mudanças climáticas, captação de água, consumo de água, eutrofização, ocupação do solo e depleção abiótica. Porém, ao transmitir os resultados do estudo, a empresa optou por selecionar as duas categorias mais relevantes para seu público-alvo, sendo mudanças climáticas e consumo de água o foco de sua estratégia de comunicação. Desta maneira, a Levi’s pode focar e aprofundar-se em mostrar não apenas os resultados, mas também as estratégias adotadas para minimizar estes impactos nas etapas diretamente ligadas à fabricação do produto. Além disso, a empresa optou por incluir em seus produtos uma etiqueta que comunica ao usuário (consumidor) sua responsabilidade na fase de uso do produto, incentivando-o a tomar atitudes mais responsáveis, como por exemplo: “Ao utilizar a calça jeans 10 vezes antes de lavá-la, consumidores americanos podem reduzir seu impacto climático e de água em 77%; consumidores franceses e do Reino Unido em 75% e consumidores Chineses em 61%” (LEVI STRAUSS&CO, 2015). É notável a preocupação da empresa com a transparência do processo, uma vez que os documentos relacionados ao estudo e informações adicionais estão disponíveis publicamente em seu site. Outra questão que se levanta é a real necessidade da empresa comunicar os impactos ambientais de seus produtos, especialmente no Brasil, em que ainda não existem regulações específicas que as obriguem a fazê-lo. Algumas normas e programas (como a Política Nacional de Mudanças do Clima; Política Nacional de Resíduos Sólidos e Política Nacional de Educação para o Consumo Sustentável47) referenciam a ACV e evidenciam a importância da comunicação ambiental de produtos, mas não demandam a rotulagem ou a comunicação de atributos ambientais de produtos. Já no ambiente auto-regulado, existem iniciativas que auxiliam na construção de comunicação ambiental como, por exemplo, as normas ISO que definem os critérios gerais e específicos para as rotulagens de tipo I, II e III, respectivamente (Erro! Fonte de referência não encontrada.). Outra iniciativa relevante é a ISO 20.40048, ainda em elaboração, que trata de compras sustentáveis e busca oferecer diretrizes para que produtos ou serviços adquiridos por uma organização ofereçam o menor impacto negativo possível para o meio ambiente e que busquem maior impacto ambiental e social positivos, além de serem vantajosos economicamente, mencionando expressamente a ACV como ferramenta para a tomada de decisão.

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Para fins deste artigo, considera-se “ACV completa” um estudo de ACV que considere diversas categorias de impacto ambiental (aquelas relevantes para o produto estudado), a fim de diferenciá-la do estudo que considera apenas uma categoria de impacto ambiental, como por exemplo, a pegada de carbono (apenas categoria de mudanças climáticas). 47 Leis 12.187/2009, 12.305/2010 e 13.186/2015, respectivamente 48

http://abnt.org.br/images//boletim/janfev2016/Boletim_ABNT_149_jan_fev_2016_NET.pdf (acesso em 14jul2016)

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Tabela 36: Tipos de rotulagem ambiental.

Princípios gerais

Norma de referencia ISO 14020

Rotulagem tipo I

ISO 14024

Rotulagem tipo II

ISO 14021

Rotulagem tipo III

ISO 14025

Tipo de rotulagem

Critérios

-

Rótulos e declarações ambientais - princípios gerais Diversos critérios ambientais (pode contemplar 1 ou mais categorias de impacto da ACV). Verificado por terceira parte

Rótulo ambiental Auto-declaração ambiental Declaração ambiental

Auto-declaração Todos os impactos ambientais (ACV “completa”) Verificado por terceira parte independente

Fonte: compilado pelos autores.

No Brasil existem duas iniciativas recentes que englobam a rotulagem ambiental de produtos, em caráter voluntário, descritas a seguir. Estes programas visam atender a um anseio de clientes, compradores institucionais ou investidores, antecipando-se a uma futura demanda, podendo ser um diferencial competitivo para produtos e empresas, criando novas oportunidades para as marcas reforçarem a sua relação com os stakeholders. O Sistema ABNT de Medição e Certificação da Pegada de Carbono e Água de Produtos49 foi lançado em abril de 2016, tendo sido desenvolvido em parceria com a consultoria britânica Carbon Trust e apoio da Embaixada Britânica no Brasil e do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços do Brasil (MDIC). Este programa tem como objetivo estabelecer um padrão para rotulagem de carbono para produtos no Brasil, baseado em padrões utilizados no Reino Unido e visando a maior competitividade dos produtos brasileiros no exterior por meio da evidência de seus atributos de carbono. Esse sistema é baseado nos conceitos de ACV, mas engloba apenas uma categoria de impacto ambiental – as mudanças climáticas. Já o Programa Brasileiro de Avaliação do Ciclo de Vida (PBACV)50, coordenado pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) e IBICT (Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia) tem como objetivo dar continuidade e sustentabilidade às ações de ACV no Brasil, com vistas a apoiar o desenvolvimento sustentável e a competitividade ambiental da produção industrial brasileira e a promover o acesso aos mercados interno e externo. Este programa propõe uma rotulagem ambiental de produtos (rotulagem tipo III) por meio de declarações ambientais de produtos, baseada na ACV completa. Ambas são iniciativas que buscam atender demandas nacionais e internacionais de informações ambientais de produtos brasileiros, visando ampliar sua competitividade no mercado global. Por enquanto, ainda de maneira voluntária. Perante o contexto apresentado, o presente artigo tem como objetivo apresentar os desafios reais enfrentados pelas empresas participantes da iniciativa CiViA – Ciclo de Vida Aplicado - na comunicação dos resultados de seus estudos de pegada de carbono de produtos desenvolvidos no ano de 2015. A partir da apresentação das barreiras e questionamentos levantados pelas empresas e pela equipe da CiViA, pretende-se trazer luz à complexa temática da comunicação da ACV e quais são as regulações e diretrizes que podem guiar os praticantes neste caminho.

Metodologia A iniciativa Ciclo de Vida Aplicado (CiViA)51, do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas (GVces) trabalhou ao longo de 2015 com 14 grandes empresas, das quais 11desenvolveram projetos piloto de pegada de carbono de produtos. A partir das diretrizes

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Mais informações podem ser obtidas no site: http://www.abntonline.com.br/sustentabilidade/Pegada/

50

Mais informações podem ser obtidas no site: http://acv.ibict.br/pbacv/o-que-e-o-pbacv/

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Mais informações podem ser encontradas no site www.civia.com.br

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do método The Greenhouse Gas Protocol: Product Life Cycle Accounting and Reporting Standard52 (WRI / WBCSD) e de uma ferramenta de cálculo elaborada pela equipe da CiViA, foram desenvolvidos os projetos piloto para os seguintes produtos: (i) calça jeans; (ii) óleo de soja engarrafado; (iii) óleo e farelo de soja; (iv) interruptor; (v) lata de aço; (vi) liga de ferroníquel; (vii) planta de geração de energia eólica; (viii) distribuição de energia; (ix) cimento; (x) frango (para consumo); e (xi) pacote de dados 4G. Desde o início dos estudos, na etapa de definição de objetivo e escopo, o grupo de empresas discutiu eventuais desdobramentos dos resultados e mostrou-se preocupado com a forma como os mesmos seriam comunicados ao final do processo. Foram levantadas importantes diferenças entre as formas e objetivos de comunicação para produtos finais com função definida e para produtos intermediários (sem função definida). Também foram discutidas questões relacionadas aos diferentes stakeholders e potenciais públicos interessados nestas informações, que variam de acordo com cada empresa e produto estudado. Em agosto de 2015 foi realizada uma oficina53 específica para tratar das questões de comunicação, tendo como pergunta norteadora: “tenho um número, e agora?”. Esta oficina teve como objetivo compreender as relações existentes e as possibilidades que se abrem para a comunicação (interna e externa) no contexto da ACV, tanto no momento pré-estudo, quanto após a obtenção dos resultados. Na ocasião foram apresentados casos de outras empresas e os aspectos normativos relacionados ao tema, culminando em uma discussão com especialistas. Foi sugerido às empresas que representantes de suas equipes de comunicação participassem da oficina, a fim de aproximá-los da equipe técnica (responsável pelo estudo), facilitando, assim, a “tradução” dos resultados do estudo para futuros materiais de comunicação institucional. O caráter prático da oficina se deu por meio de um exercício para mapeamento de stakeholders e sua relação com a comunicação ambiental de produtos (Tabela 37). O exercício propiciou às empresas repensar as estratégias de comunicação dos resultados dos projetos piloto de pegada de carbono, revisitando os objetivos como parte do processo iterativo. A equipe da CiViA também desenvolveu um modelo simplificado (denominado sumário executivo) para comunicação dos resultados de estudos de pegada de carbono de produtos, cujo objetivo era sintetizar em um documento único e padronizado as informações essenciais destes estudos que teriam que ser comunicadas aos públicos. O sumário executivo do estudo foi baseado nos itens apresentados no Apêndice C do método The Greenhouse Gas Protocol: Product Life Cycle Accounting and Reporting Standard e serviria para qualquer empresa comunicar os resultados de seu estudo de ACV sem comprometer o entendimento mínimo do leitor. As informações contidas no sumário executivo se referem a: informações sobre a empresa, informações gerais do produto (como função, unidade funcional e fluxo de referência adotados), informações sobre escopo e abrangência do estudo, coleta de dados e resultados (quantitativos e qualitativos).

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O método pode ser acessado em: http://www.ghgprotocol.org/standards/product-standard

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Um relato da oficina pode ser encontrado em: http://www.civia.com.br/desafios-da-comunicacao-de-resultados-de-acv-sao-destaque-em-oficina-da-

civia/?locale=pt-br

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Tabela 37: Principais públicos a serem considerados na análise e decisão de comunicação de estudos de ACV e pegada de carbono de produtos.

COMPRADORES PÚBLICO INTERNO CADEIA DE VALOR

EXTERNOS

PÚBLICOS Consumidor individual/ final Consumidor intermediário (empresa compradora) Colaboradores Acionistas e investidores Parceiros Fornecedores Academia e formadores de opinião Mídia Governo

RELAÇÃO COM A COMUNICAÇÃO AMBIENTAL Decisão de compra de produtos Decisão de compra de produtos (insumos) e impactos destes em seus próprios produtos Reputação e preocupação ambiental da empresa Decisão de investimentos Oportunidades de parceria Fornecimento de dados para o estudo e oportunidades de parceria para melhoria do produto Desenvolvimento de métodos e ferramentas Benchmark de produtos a partir de suas qualidades ambientais Decisão de compras (compras públicas sustentáveis) e desenvolvimento de programas de rotulagem ambiental

Fonte: construído a partir dos resultados da oficina e de dados de UNEP, 2015.

Resultados e discussão As empresas que desenvolveram projetos piloto no âmbito da iniciativa CiViA e que finalizaram54 a quantificação da pegada de carbono de seus produtos (os estudos foram finalizados entre novembro e dezembro de 2015) se depararam com diversos desafios em comunicar os resultados obtidos. Ainda que nem todas estas empresas não tenham, ainda, decidido se comunicarão ou não a pegada de carbono de seus produtos, nem a quais públicos esta será direcionada, a discussão que se deu em torno destes resultados é relevante para este artigo. Independentemente do meio de comunicação escolhido, o importante é que a transparência deve ser colocada como prioridade para todo e qualquer produto estudado, pois esta é fundamental para incentivar a credibilidade e uma aplicação adequada das informações ambientais deste. O lema “transparency is the new green” deve ser altamente difundido, colocando à disposição dos públicos informações que vão além dos resultados da ACV, como estudos completos, informações sobre benchmark, referências setoriais, premissas utilizadas, entre outros. Big Room e WRI (2010) afirmam que muitas vezes as informações sobre os próprios programas de rotulagem não são claramente divulgadas, existindo uma demanda por maior transparência de critérios e facilidade de acesso aos diversos dados. A seguir são apresentados alguns exemplos reais das inquietações, dúvidas e desafios enfrentados por estas empresas na comunicação (atual ou futura) de seus resultados para diferentes públicos. Os exemplos escolhidos buscam representar a diversidade de produtos (bens e serviços), assim como de setores. Não foi possível incluir neste documento todos os resultados por conta do escopo limitado imposto a esse artigo, o que não significa, necessariamente, a ausência de desafios para os demais setores e produtos estudados no âmbito do ciclo 2015 da CiViA.

Varejo – pegada de carbono da calça jeans O estudo realizado apontou que a etapa de maior impacto climático (com maiores emissões de GEE) está na fase de uso do produto, ou seja, o potencial de redução deste impacto está diretamente relacionado ao consumidor final, e a principal discussão relacionada à comunicação dos resultados do estudo se deu em torno deste. Diante dessa especificidade, a empresa se questionou sobre a maturidade de seus clientes para entender e poder tomar sua decisão de compra baseada na quantidade de carbono associada ao ciclo de vida do produto. Também foi discutido o formato mais adequado de comunicar, se este se daria de forma quantitativa (toneladas de CO2 equivalente à pegada de carbono) ou informativa (por exemplo, com dicas ao consumidor sobre o uso do produto, focando no potencial de redução de emissões atrelada a esta etapa do ciclo de vida).

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Dos 11 projetos piloto iniciados, 6 foram concluídos dentro do prazo do ciclo 2015 da CiViA.

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Decidiu-se, nesse momento, que os resultados do estudo seriam comunicados no Relatório Anual 2015 da empresa55 (publicado em julho de 2016), onde foi dada ênfase para o papel do consumidor e sua contribuição na etapa de uso da calça jeans. Além dos principais dados de emissão de GEE de cada etapa do ciclo de vida, são apresentados três cenários de uso da calça e como cada um irá impactar nas emissões ao longo do ciclo de vida do produto, deixando claro como o consumidor pode contribuir para a redução deste impacto ambiental a partir de escolhas de uso.

Telecomunicações – pegada de carbono de um pacote de dados 4G A comunicação não era o objetivo principal desta empresa ao elaborar a pegada de carbono deste serviço, mas sim a gestão interna. Os resultados deste estudo apontaram a etapa de operação e manutenção dos sistemas de transmissão de dados como a de maior emissão de GEE. Porém, após a finalização do estudo a empresa se deparou com dois grandes desafios: como comunicar os resultados para o público interno sem a existência de uma referência (benchmark) para comparabilidade; e se os resultados deveriam ou não ser comunicados de alguma forma para seus clientes e investidores. A empresa elencou a qualidade dos dados e, consequentemente, dos resultados obtidos como um dos fatores decisivos para a tomada de decisão. Concluiu que enquanto o estudo não tiver sido verificado por terceira parte, e os dados de alguns fornecedores não forem aprimorados, entende que a comunicação não será feita.

Construção civil – pegada de carbono comparativa de dois tipos de cimento (com e sem adição de escória de alto-forno) Esta empresa desenvolveu o projeto piloto em um contexto de P&D, sendo o principal objetivo comprovar que a alternativa de cimento contendo escórias de alto-forno possuía pegada de carbono inferior à alternativa tradicional. Os resultados deste estudo apontaram a etapa de produção do cimento como maior emissora, sendo que o estudo foi feito do berço ao portão. Neste caso, o foco da comunicação era o público interno da empresa, visando evidenciar as vantagens de um produto perante outro com foco na gestão interna. Outra questão que foi discutida é se esta informação deveria ser relatada ao comprador institucional, ou não, e qual seria o melhor formato, considerando que se trata de um produto de base, onde alternativas de etiqueta e rotulagem são mais limitadas. O estudo acabou sendo transformado em um artigo, apresentado no 7º Congresso Brasileiro do Cimento56 (CBCi - junho de 2016), tendo direcionado os resultados do estudo para o público acadêmico e demais profissionais participantes do evento. No artigo foi evidenciado o diferencial competitivo do cimento estudado a partir da redução de emissões potencial, em relação à alternativa tradicional.

Conclusão Analisando as experiências dos projetos piloto da iniciativa CiViA, e considerando outras referências em comunicação de atributos ambientais, é possível concluir que a comunicação dos resultados de estudos de ACV, assim como a rotulagem de produtos e as diversas formas de comunicação com stakeholders ainda é um campo a ser explorado e que pode apresentar muitas oportunidades, tanto para empresas quanto para compradores (individuais e institucionais). Dentre os principais desafios enfrentados pelas empresas neste tipo de comunicação, podemos citar: i) a escolha do público-alvo; ii) a definição da forma e veículo de comunicação, e iii) a definição dos objetivos a serem atingidos com a comunicação. Os exemplos citados na seção de resultados relatam como estes aspectos se traduzem na realidade empresarial. Há, ainda, um outro aspecto, relacionado ao tempo de comunicação dos resultados, sendo possível observar um grande período de amadurecimento entre a

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O Relatório Anual pode ser acessado neste endereço: http://www.mzweb.com.br/renner/web/download_arquivos.asp?id_arquivo=C257AF35-4A86-

40F3-B383-58C492CD75E9 56

A apresentação no 7º CBCi pode ser acessada em: http://www.7cbci.com.br/assets/arquivos_sessao/7aaa9-14h50_pegada-carbono-comparativa-

concreto-ecoeficiente_intercement-e-fgv.pdf

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conclusão do estudo e a divulgação dos resultados: em dois dos três casos apresentados (varejo e construção civil), as empresas divulgaram os resultados do estudo apenas após 6 meses de sua conclusão. A partir das observações de casos reais foi possível concluir também que a ausência de padrões e modelos para a comunicação de informações ambientais no Brasil dificultou ainda mais o processo, sendo as próprias empresas as responsáveis pela escolha de quais informações deveriam ser comunicadas, como e onde. Além deste ser mais um desafio no processo de comunicação dos resultados, as consequências são negativas também para os usuários da informação, dificultando a comparabilidade de produtos. Nos exemplos citados neste artigo vemos que cada empresa optou por comunicar as informações da pegada de carbono de seu produto em um meio específico; ou simplesmente não comunicar. Ainda sobre os padrões de comunicação, o fato de existirem no Brasil dois programas distintos voltados à comunicação de atributos ambientais de produtos é um ponto de atenção. Enquanto o PBACV (Inmetro e Ibict) direciona esforços para a rotulagem tipo III por meio de declarações ambientais de produtos (baseada na ACV completa, ou seja, contempla diversas categorias de impacto ambiental), o programa da ABNT considera apenas a pegada de carbono de produtos. Considerando que a pegada de carbono se refere à categoria de mudanças climáticas da ACV, ou seja, é um recorte do método, é possível afirmar que existe duplicidade entre os programas. Neste caso, a falta de alinhamento entre ambos programas é vista como prejudicial ao avanço da comunicação no contexto da ACV, independentemente da ênfase que é conferida ao estudo do produto. Conforme exemplificado neste artigo, faz-se necessário maior alinhamento no desenvolvimento de modelos, seja de rotulagem de produtos, seja de padrões de comunicação, facilitando o entendimento por todas as partes interessadas nas informações. Especialmente para as empresas, a duplicidade e sobreposição de rótulos pode gerar confusão ou, ainda, desincentivar a comunicação pública dos resultados dos estudos de impacto ambiental de seus produtos. Finalmente, é importante lembrar que todos os atores envolvidos na temática de comunicação de aspectos e impactos ambientais de produtos, seja por meio da ACV, seja por meio de alguma categoria específica como a pegada de carbono, têm responsabilidade compartilhada. Assim, potenciais melhorias nas formas de relato e comunicação de dados ambientais de produtos se dará, primordialmente, pela demanda por informações, que pode vir do consumidor individual, do comprador institucional – privado ou público, ou do investidor. Mas este fato não impede que os dados sejam comunicados voluntariamente pelos desenvolvedores dos estudos, contribuindo para a criação de uma consciência dos impactos nos mais diversos processos e nos elos da cadeia do ciclo de vida do produto, maior entendimento sobre os conceitos de ciclo de vida de produtos, bem como suporte a futuro banco de dados nacional.

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