Relatório
Caminhos da Transparência A Lei de Acesso à Informação e os Tribunais de Justiça Sumário-Executivo
INTRODUÇÃO A cada aniversário da Lei de Acesso à Informação (LAI), que completa quatro anos em vigência no dia 16 de maio de 2016, a ARTIGO 19 publica um relatório que analisa sua implementação em órgãos públicos do Brasil. Neste ano, o trabalho focou na avaliação do Poder Judiciário. Intitulado “Caminhos da Transparência – A Lei de Acesso à Informação e os Tribunais de Justiça” o mais novo relatório da ARTIGO 19 analisou os níveis de transparência dos Tribunais de Justiça de todos os 27 entes federativos do Brasil. O trabalho se baseia nos dispositivos contidos na LAI (Lei de Acesso à Informação) e na Resolução nº 215 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). A decisão de se restringir ao Judiciário ocorreu em função da importância dos órgãos ligados a ele no futuro da LAI. Vale lembrar que esse Poder tem uma dupla relação com a transparência na administração pública na medida que tem que se submeter aos dispositivos da LAI e atuar como última instância de interpretação e aplicação da lei. Outro motivo que influenciou a escolha feita foi o de que, em estudos anteriores, órgãos relacionados ao Judiciário apresentaram os piores resultados quando comparados com o Executivo e o Legislativo. Além disso, a lei brasileira de acesso à informação determina que todas as esferas e níveis do Estado estão sujeitos a seus ditâmes, mesmo o Judiciário - fato que não se repete em outros marcos legais semelhantes ao redor do mundo. Afinal, o Judiciário também deve se abrir ao escrutínio e à participação da sociedade, principalmente em tempos em que exerce uma função cada vez mais significativa na definição de grandes temas sociais, assegurando direitos fundamentais, exercendo controle sobre outros poderes (na lógica dos freios e contrapesos), assim como analisando e apoiando o desenvolvimento de políticas públicas.
METODOLOGIA O relatório avaliou a transparência dos tribunais quanto a suas funções administrativas e quanto a suas funções jurisdicionais (relacionadas à concretização da justiça). A transparência administrativa foi avaliada segundo quesitos de “transparência ativa” e “transparência passiva” . Em “transparência ativa”, o relatório analisou informações disponibilizadas de forma espontânea nos sites dos tribunais. Foram verificados seis critérios, sendo eles divididos em 18 subitens, todos determinados como informação de divulgação obrigatória pela LAI e pela resolução 215 do Conselho Nacional de Justiça. Já em “transparência passiva”, a ARTIGO 19 buscou saber como os tribunais respondem a pedidos de informação enviados pela sociedade sobre assuntos relacionados à atividade do órgão. Para isso, foram elaboradas três perguntas para cada um dos tribunais, num total de 81 pedidos. No capitulo sobre a “Transparência na Função Juridiscional”, a análise se deu sobre o acesso a informações relativas ao funcionamento do sistema judicial, como o andamento de processos, a jurisprudência, a designação de magistrados, as eleições de presidentes de tribunais, entre outras informações.
Transparência Ativa Nenhum dos órgãos cumpriu todos os requisitos de transparência estabelecidos pela LAI. O Tribunal de Justiça de Sergipe foi aquele que cumpriu o maior número de critérios (cinco dos seis), apresentando no entanto falhas no critério de participação popular. Já os tribunais pior avaliados foram o do Piauí e o de Rondônia, que só cumpriram um critério cada. Por outro lado, o critério relativo a informações sobre orçamentos e sobre programas e projetos tiveram um alto cumprimento – 81,5% e 85,2%, respectivamente. Apenas o Tribunal de Justiça de Sergipe divulga a lista de documentos classificados e desclassificados em seu site, uma das obrigações que a LAI prevê. O número baixo também foi registrado na análise das informações sobre participação popular no Judiciário: só três tribunais as divulgavam (os de Goiás, Minas Gerais e Maranhão).
Transparência Passiva Uma das constatações mais alarmantes foi o número de pedidos que foram simplesmente ignorados. Em mais da metade dos casos (56,8%) não houve resposta aos pedidos enviados. Para agravar, do total de respostas que os tribunais concederam, menos de um terço (29,6%) foram classificadas como satisfatórias, sendo que o tempo médio no qual elas foram enviadas foi longo: 26 dias.
A ARTIGO 19 precisou ainda de um alto número de recursos para obter as respostas. Diante dos 81 pedidos de informação enviados, foi preciso entrar com 57 recursos em primeira instância diante de respostas que foram negadas. Desses, 43 foram para a segunda instância e 3, para a terceira instância. Outro fator preocupante é que menos da metade dos tribunais (10 de 27) disponibilizam formulários específicos para o envio de pedidos de informação por meio do próprio site.
Transparência na Função Jurisdicional Uma constatação que chamou bastante atenção foi a de que a consulta ao teor de processos judiciais digitalizados só pode ser feita por pessoas que estejam diretamente ligadas ao caso ou por advogados que tenham seu número de identificação profissional. Tais prerrogativas não existem para consultas a processos feitas presencialmente em fóruns de Justiça e representam um obstáculo ao acesso à informação. Em relação à disponibilização de informações claras sobre como ingressar com uma ação judicial, apenas dois sites apresentavam a orientação em locais de fácil acesso: de Minas Gerais e Roraima. Outro problema é a linguagem utilizada nos sites, que, de forma geral, é pouco amigável e compreensível ao cidadão sem conhecimentos jurídicos. Tal fato confronta o que diz o artigo 5º da Resolução 215 do CNJ, que determina que os órgãos do Judiciário devem informar à população sobre seus direitos e o funcionamento da Justiça em linguagem simples e acessível.
CONCLUSÕES Nos últimos anos, temos visto alguns grandes avanços relacionados à transparência no Judiciário, mas o caminho adiante ainda é muito longo. Nossa análise demonstrou que os tribunais ainda estão muito aquém das expectativas cinco anos após a aprovação da LAI. Quaisquer iniciativas destinadas a aprimorar a abertura no Judiciário devem atentar para os vários aspectos da transparência: tanto ativa quanto passiva, assim como a disponibilização referente às atividades-meio e fim exercidas por esse Poder. A observância à LAI e à Resolução 215, no entanto, é apenas parte dos desafios para a maior transparência no Judiciário. Outros pontos devem ser debatidos e aprofundados, especialmente aqueles que dizem respeito a informações sobre a atuação jurisdicional dos órgãos do Judiciário e os magistrados e os processos de designação e sua colocação em posições de direção e em cortes superiores.
RECOMENDAÇÕES Recomendações para ampliar o cumprimento da transparência ativa: • Divulgação das informações sobre participação popular por meio de seções específicas. • Divulgação dos horários e dos locais de atendimento ao público, com a sistematização de todos os • dados correlatos em uma mesma seção. • Divulgação de contratos, convênios, editais e resultados das licitações. • Utilização de linguagem e formato mais acessíveis. • Divulgação das pautas de julgamento e da agenda de presidentes de tribunais e ministros de cortes superiores. Recomendações para ampliar o cumprimento da transparência passiva: • Aprimoramento da responsividade a pedidos de informação, com ações tomadas pelos órgãos decontrole interno, a fim de garantir que se reverta no curto prazo o alto índice de não respostas a • demandas da sociedade. • Maior controle sobre o cumprimento dos prazos de resposta a pedidos de informação. • Facilitação do regime de recursos, inclusive com a indicação dessa via de ação ao usuário no • momento da resposta a seu pedido de informação (preferencialmente por um e-SIC), ou em casos de não resposta. • Eliminação das exigências adicionais de identificação e de motivação para registro dos pedidos deinformação. • Sistematização dos relatórios estatísticos referentes aos pedidos de informação recebidos e sua utilização para aprimoramento dos serviços de informação. Recomendações de médio e longo prazos para a implementação da LAI • Aprimoramentoconstante da gestão documental dos tribunais. • Capacitação dos servidores para conhecimento da LAI. • Elaboração das listas de documentos classificados e desclassificados ou publicação explícita desua não existência. • Maior abertura em relação aos processos judiciais, viabilizando buscas mais amplas e acessíveis àqueles que não estão diretamente envolvidos em um processo, resguardadas as informações sensíveis, interpretadas restritivamente e com o uso de tarjas. • Ampliação da divulgação de informações sobre acesso à Justiça, em especial com a divulgação deinformações sobre o funcionamento do sistema, sobre como ingressar com uma ação em defesa de direitos e como obter assistência jurídica.
• Alocação de orçamento específico para aprimoramento do sistema de acesso à informação previsto pela LAI. • Monitoramento da implementação da LAI nos tribunais e conselhos e apresentação de relatórios • periódicos sobre seu cumprimento, com efetivo acompanhamento do progresso observado. • Aprimoramento dos sistemas de informação e participação na alocação de magistrados em cargos diretivos e representativos, em especial maior transparência nos critérios de designação na eleição e na nomeação de presidentes de tribunais e ministros de cortes superiores. • Elaboração de estudos sobre transparência no Judiciário voltados a identificar pontos de • aprimoramento que ultrapassem os limites da LAI e da Lei de Transparência e suas regulações.