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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 A DANÇA NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO ...
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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014

A DANÇA NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO DE JUIZ DE FORA Edna Christine Silva (PUCSP)i RESUMO: Esse artigo relata a trajetória da Dança na rede municipal de ensino de Juiz de Fora desde sua inserção em 1996. Atualmente, a dança está presente em aproximadamente sessenta por cento das escolas do ensino fundamental, se configurando como uma disciplina da base diversificada. Apesar dessa maioridade cronológica, do crescimento artístico profissional e a expansão alcançada, a Dança ainda tem muito a conquistar nessa rede, para que possa ser legitimada como disciplina necessária na formação educacional de crianças e adolescentes. PALAVRAS-CHAVE: Dança. Educação Básica. Disciplina. Formação Continuada. ABSTRACT: This article reports the trajectory of Dance in municipal public schools in Juiz de Fora since its insertion in 1996. Currently, Dance is present in approximately 60% of elementary schools established as an extra subject chosen by the school administration. Besides this chronological majority, professional artistic growth and reached expansion, there is still much to be done in Dance in public schools in order to be legitimated as a subject area necessary to children and adolescent’s education. KEY-WORD: Dance. Basic Education. Discipline. Continuing Education.

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 Introdução Ao contextualizar a trajetória da dança na rede municipal de ensino de Juiz de Fora, desde os primórdios até o contexto atual, esse artigo se configura como um testemunho como propõe Agamben (2008), pois, vivenciei todo o processo desde o início das aulas de dança nessa rede e até a presente data vivencio. Ingressei nessa rede em 1996 para lecionar dança em um Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente – CAIC 1 . Durante esses dezoito anos, atuei em diversos locais, primeiramente como docente da disciplina dança e posteriormente em elaboração e coordenação de projetos. A partir de 2009, fui convidada a participara da equipe técnica da Secretaria de Educação – SE, dessa rede, para acompanhar o desenvolvimento dessa disciplina nas escolas, a interdisciplinaridade, lecionar na formação continuada de professores, assim como, na elaboração e organização de projetos e eventos. No início, as aulas de Dança eram oferecidas no contra turno do ensino regular com o propósito de integrar as atividades de atendimento à comunidade. Os discentes que queriam participar dessas aulas retornavam ao espaço escolar em horário diferenciado. Aulas de dança e aulas de outras disciplinas artísticas ou não, integravam as atividades oferecidas ao público em geral. Em 1997, a disciplina dança se ampliava para mais três escolas e após esses dezoito anos, a dança está presente em quarenta e quatro escolas do ensino fundamental, se configurando como uma disciplina da base diversificada 2. Esse número equivale dizer que a dança está presente em aproximadamente sessenta por cento das escolas da rede municipal, sendo lecionada por professores específicos. Esse órgão

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SILVA (2010) explica que os CAICs integravam as políticas sociais voltadas para a melhoria das condições de vida de crianças e adolescentes do Governo Federal. Distribuídos em diversas regiões do país, no município de Juiz de Fora, foram construídas três unidades, a princípio mantidas com recursos federais e, posteriormente, pela Prefeitura Municipal. 2 A LDB define que o currículo do Ensino Fundamental tem uma base nacional comum e uma parte diversificada. Na resolução CNE/CEB Nº 7 de 14 de dezembro de 2010, o artigo n° 11 diz que “[...] a base nacional comum e a parte diversificada do currículo do Ensino Fundamental constituem um todo integrado e não podem ser consideradas como dois blocos distintos”. 2 Lançado em 2006 pelo Ministério da Educação, o Programa Mais Educação propõe a inserção de várias disciplinas na proposta curricular, entendendo que o processo ensino aprendizagem acontece nas diversas atividades em que o aluno participa e não somente nos conteúdos obrigatórios do ensino regular. Esse programa tem como proposta a melhoria da qualidade da educação no atendimento à diversidade, ampliando o tempo do aluno na escola, traçando um caminho para a Educação em Tempo Integral.

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 público organiza eventos para apresentação de trabalhos artísticos durante o ano e há dezesseis anos é realizado um festival de dança para as escolas municipais. Existe a preocupação com a formação continuada dos profissionais que lecionam essa disciplina e para isso a rede municipal oferece cursos com encontros semanais, palestras, análise e crítica de trabalhos com convidados, estímulo a escrita acadêmica e publicação na revista “cadernos do professor – Arte e Cultura” e em outras revistas, seminários ou congressos, dentre outros. Em 2013, a rede municipal publicou sua proposta curricular e a Dança tem seu currículo próprio como linguagem da Arte. Apesar dessa maioridade cronológica, do crescimento artístico/profissional adquirido e a tentativa de situar essa disciplina com as discussões que vem sendo traçadas em diversos locais, a dança ainda tem muito a conquistar nessa rede, para que possa ser legitimada como disciplina necessária a formação de crianças e adolescentes. Contextualizando a dança na rede É possível afirmar que a expansão da disciplina dança nas escolas municipais de Juiz de Fora foi favorecida principalmente pela criação e realização, em 1999, do I Festival das Escolas Municipais de Dança Educação – FEMDE. Silva (2012) esclarece que esse festival foi elaborado por seis professoras, profissionais efetivas no cargo de Educação Física da SE/PJF que, nessa época, desenvolviam trabalhos de dança nas escolas municipais que lecionavam. Esse evento proporcionou que crianças e adolescentes das escolas públicas participassem como artista e público, assim como, seus familiares adentrassem o teatro como público. O FEMDE foi o primeiro evento de arte da rede municipal de Juiz de Fora em que os artistas eram os alunos das escolas públicas. Desde a sua primeira edição esse festival acontece anualmente no maior teatro da cidade - Cine-Theatro Central3. Esse fato aguçou o olhar da mídia e, na época, foi divulgado nos vários meios de imprensa da cidade como: rádio, televisão e jornais. É possível afirmar que esse fato ajudou a efetivação e continuidade desse evento. Este ano será realizado a décima sexta edição 3

O Cine-Theatro Central é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan. http://www.theatrocentral.com.br/historia/tombamento.

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 do FEMDE no dia 16 de novembro, cujo edital está na página eletrônica da Prefeitura de Juiz de Fora4. Nessa trajetória da dança, em 2004, a Prefeitura de Juiz de Fora publicou o primeiro edital específico para contratação temporária de professores para a disciplina. Os Editais de 2004, 2005 e 2006, especificavam a disciplina dança. A partir do edital de 2007, a disciplina dança passa a ser dividida em: dança de salão; dança clássica; dança jazz; dança folclórica; dança de rua; dança sapateado; permanecendo até 2009. Em 2010, o edital divide a dança em: dança de salão; dança jazz; dança folclórica; dança de rua; dança moderna/ contemporânea. Em uma pesquisa verbal, no período entre 2009 a 2010, sobre a fonte geradora dessas divisões e o que motivou essa prescrição a equipe integrante da SE, não soube responder a nenhuma das duas perguntas. Com intuito de aprimorar essa seleção, foi proposto para o edital de 2010 algumas modificações: a primeira foi incluir um item priorizando a formação específica na área para a seleção dos inscritos; a segunda foi incluir uma avaliação prática para os candidatos inscritos e que não possuem formação específica, para a disciplina dança. Desde então, o edital se mantém nesse formato, priorizando aqueles que possuem formação específica na área, ou seja, licenciatura em dança. Foi no ano de 2006 que a disciplina dança passou a integrar a grade curricular de quatro das seis Escolas de Educação em Tempo Integral. Silva (2011) explica que as escolas de educação em tempo integral do município contam com diretrizes próprias e consta nesse documento que será garantido condições adequadas para o tempo de permanência do/a educando/a na escola, assim como para o desenvolvimento das atividades extracurriculares. Mesmo integrando a grade curricular dessas escolas, a dança ainda é mantida como disciplina da base diversificada. Outro fato importante é a adesão ao Programa Mais Educação5 no ano de 2010, pela Secretaria de Educação – SE. Atualmente as 74 escolas de ensino fundamental do

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http://www.pjf.mg.gov.br/secretarias/sel/femde2014/inscricoes.php Lançado em 2006 pelo Ministério da Educação, o Programa Mais Educação propõe a inserção de várias disciplinas na proposta curricular, entendendo que o processo ensino aprendizagem acontece nas diversas atividades em que o aluno participa e não somente nos conteúdos obrigatórios do ensino regular. Esse programa tem como proposta a melhoria da qualidade da educação no atendimento à diversidade, ampliando o tempo do aluno na escola, traçando um caminho para a Educação em Tempo Integral. 5

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 município estão no Programa Mais Educação 6 . Aproximadamente, sessenta por cento dessas escolas oferecem a Dança como disciplina para seus discentes. Nessas escolas a dança também integra a carga horária do aluno constando como disciplina da base diversificada. O destaque do Programa, é que a escola recebe recursos financeiros diretamente na escola, esse fato potencializa a disciplina, pois, ela tem um valor para ser gasto com os alunos inscritos. Dessa maneira, a escola que faz adesão ao macro campo “Cultura, Artes e Educação Patrimonial” e faz opção pela dança, receberá um valor específico para a disciplina, podendo investir em figurino, objetos cênicos para as apresentações, equipamento e material para as aulas. No intuito de ampliar as discussões sobre o processo de ensino aprendizagem, no período de 2010 a 2012, a SE, por meio de seminários e grupos de estudos, dialogou com seus profissionais para a criação do currículo. Esse diálogo teve o apoio de consultores da UFJF, UFF e Colégio de Aplicação João XXIII. Em 2012, o currículo foi publicado apontando direcionamentos para a Arte na escola. A SE trabalha na perspectiva de um profissional especialista para cada uma das quatro linguagens – Artes Visuais, Dança, Música e Teatro - de acordo como os Parâmetros Curriculares Nacionais. A função central do currículo é: [...] oferecer diretrizes orientadoras para o ensino de Arte na rede municipal de Juiz de Fora. Não pretende ser um documento prescritivo e inflexível, no entanto objetiva apresentar pontos importantes, considerados indispensáveis para o que, hoje, se espera de um ensinar/aprender significativo em Arte (Proposta Curricular Arte – SEPJF).

A existência de documentos de referência, que são utilizados pelos professores em todas as etapas do Ensino Fundamental, Educação Infantil e EJA, constitui a base para o desenvolvimento de muitas experiências, cujos resultados são a eles incorporados, num movimento contínuo de alimentação, enriquecimento e fortalecimento das concepções e abordagens estabelecidas no processo de ensino e aprendizagem. 6

Vale ressaltar que em relação ao Programa Mais Educação/MEC, a Secretaria de Educação de Juiz de Fora aderiu nos seguintes termos: “A política municipal de implementação de projetos que visam à ampliação da jornada escolar dos alunos é regida por legislações que prevêem a contratação de professores com formação específica na área de atuação dos projetos, conforme o Quadro de Carreira do Magistério Municipal. Propomos a adesão ao Mais Educação dentro desse contexto, uma vez, que já temos muitos profissionais envolvidos no desenvolvimento de tais propostas.” http://www.pjf.mg.gov.br/secretarias/se/documentos/miolo_artes.pdf

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 A perspectiva desse currículo é que o professor tenha uma prática artística no seu cotidiano, fora do universo escolar. Com o objetivo de provocar essa prática a SE oferece formação continuada para seus docentes em diversos formatos, proporcionando momentos de trocas de experiências e discussões teórico-práticas, atendendo as especificidades da rede de ensino e valorizando o direito à formação continuada dos seus profissionais. Dessa maneira, oferece: grupos de estudos; cursos; oficinas; palestras; e vivências artísticos-culturais. Os grupos para estudos são oferecidos em diversos formatos: 

cursos específicos para professores de dança com encontros semanais de duas horas;



cursos de dança para professores de outras disciplinas com encontros semanais de duas horas e trinta minutos;



Grupo de Estudo com encontro mensal para o encontro de todos os professores de arte da rede;



Ciclo de Palestras – encontro anual que acontece no mês de outubro, dentro do evento denominado “Professor Também Faz Arte”. O ciclo acontece em três dias e conta com palestras de profissionais para os professores da rede.

No fomento a escrita acadêmica, desde 2010 é produzida a “Revista Cadernos do Professor – Edição Especial de Arte e Cultura” e incentiva aos profissionais de Arte nas suas várias linguagens, escrever suas experiências e pesquisas. A realização de eventos também é considerada uma proposta de formação continuada, tanto os eventos direcionados para os professores, nos quais eles podem vivenciar como artistas ou platéia, assim como, para os discentes com o mesmo propósito. A proposta não é produzir para apresentar, mas, sim apresentar o que está sendo produzido em sala de aula. Dessa maneira, o currículo é colocado em prática contribuindo para uma formação calcada no conhecer, no apreciar, no criticar e no fazer.

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 Entre os eventos direcionados para a dança ou para as quatro linguagens e que são específicos para apresentações cênicas dos alunos, podemos relacionar: A Dança da Escola no Calçadão: criado em 2012, “A Dança da Escola no Calçadão” é uma intervenção realizada por professores e alunos adolescentes participantes das aulas de dança nas escolas da rede. A intervenção acontece em uma das principais ruas do centro da cidade, o Calçadão da rua Halfeld. A intervenção surgiu da proposta de falar sobre a dança contemporânea na escola e amenizar as dificuldades enfrentadas nas tentativas de expor a discentes e docentes sobre essa arte. Além disso, foram agregados os seguintes objetivos: integrar as celebrações do Dia Internacional da Dança – UNESCO – 29 de abril; expor sobre a relevância da Dança na educação e mostrar que essa arte é acessível a todas as pessoas; intervir artisticamente no cotidiano dos transeuntes e comerciantes, estabelecendo provocações, diálogos e trocas. A preparação para a intervenção é iniciada no final do ano anterior com uma breve discussão entre os professores e essas discussões são retomadas em março com o retorno do curso. Vale destacar que somente participa da intervenção as escolas municipais em que os professores de dança participam da formação continuada. A discussão é um ponto importante do evento, pois, é nesse momento que se constrói o que deseja conversar com quem participa e assiste, seja no calçadão, na escola, com o poder público, dentre outros. Essa é a regra, discutida entre os professores que entendem que ampliar para quem não está participando das discussões é correr o risco de descontextualizar. Esse é um preceito que restringe muitas escolas de participar, porém, o grupo entende que existem outros momentos ou eventos cuja participação depende apenas da inscrição. Mostra de Dança Educação: realizada anualmente desde 2007, no primeiro semestre, a mostra acontece todos os anos no Cine-Theatro Central. A proposta é muito similar ao FEMDE, porém, desde 2013, professores e equipe organizadora tem se reunido para discutir e construir uma proposta que seja significativa nesse universo da dança na educação básica. Nesse sentido, em 2013, buscando provocar mudanças e desorganizar o que vinha sendo reproduzido há anos, foi criado um regulamento com objetivos e conceitos

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 norteadores. Incluiu-se a seguinte proposta: analisar os trabalhos apresentados logo após as apresentações, a fim de tecer considerações que pudessem contribuir para a continuidade e crescimento dos mesmos. A análise que no regulamento foi denominada como avaliação formativa foi realizada por duas profissionais da dança, que aceitaram contribuir com o evento. Essa ação reverberou na ampliação dos trabalhos dos professores e isso pode ser visto tanto na mostra como em apresentações posteriores. Circuito de Leituras: essa é uma ação realizada na escola e entre escolas desde 2010. É desenvolvido sempre no final de agosto e da seguinte maneira: durante uma semana as escolas se organizam para mostrar seus trabalhos artísticos nas quatro linguagens. Em um determinado dia escola A visita a escola B levando um trabalho artístico como um presente. Na mesma semana, a escola A recebe a escola C que também leva seu trabalho artístico como presente. É uma troca de presentes artísticos, ou seja, é um intercâmbio de arte na escola entre escolas. Mostra Estudantil de Arte: A mostra é realizada também desde 2010 e integra a Mostra do Professor Também Faz Arte que será explicada adiante. O contexto da mostra é expor todos os trabalhos artísticos desenvolvidos nas escolas. A mostra ocupa o Centro Cultural Bernardo Mascarenhas – CCBM, com as exposições de artes visuais, e o teatro Pró-Música, local em que são realizadas as apresentações de dança, música, teatro e vídeo. Durante quatro dias, manhã e tarde, as escolas apresentam seus trabalhos artísticos. O destaque da mostra é o encontro das várias linguagens artísticas e a ampliação de conhecimento sobre a arte na escola. Vale lembrar que a dança, assim como, as artes visuais, a música e o teatro, compõe as disciplinas da base diversificada. São poucas as escolas que desenvolvem as quatro linguagens. Esse é o momento em que alunos e professores podem conhecer as diversas linguagens da arte. A mostra acontece nos meses de outubro e novembro durante aproximadamente vinte dias. Festival das Escolas Municipais de Dança Educação - FEMDE: Como já relatado anteriormente, esse festival foi criado em 1998 e é o primeiro evento de arte da rede envolvendo alunos. Após quatorze anos de realizações em um mesmo formato, em 2013, o FEMDE foi pauta de discussões e transformações. A proposta de cada escola fazer

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 uma coreografia e apresentar no palco do teatro havia perdido o encantamento. Um dos pontos marcantes da discussão foi a reflexão que não era possível cada escola apresentar seu trabalho coreográfico e depois somente se encontrar no ano seguinte, na próxima edição do festival. Era necessário discutir sobre aquele acontecimento em todos os âmbitos. Com esse pensamento, a proposta inicial foi realizar um encontro com todos os professores que participaram do festival com trabalhos coreográficos para dialogar sobre os trabalhos, as concepções, contextos, figurinos, espaço, e todos os assuntos pertinentes a área. O FEMDE é realizado no final do mês de novembro. Esses são os eventos em que a linguagem dança está presente e os alunos participam como artistas e platéia. Abaixo serão revelados os eventos em que os alunos participam como público. Ciranda das Artes: quinzenalmente um artista (voluntário) é levado a uma escola para falar sobre seu trabalho e sua vida de artista para os alunos. Com um período de aproximadamente dois meses de antecedência, o professor realiza um trabalho sobre o artista que visitará a escola. Os alunos têm contato com a obra e a vida profissional daquele artista. No dia da visita a escola os alunos assumem o direcionamento da conversa e questionam o que mais os interessa. Propostas Externas: são trabalhos artísticos levados para se apresentarem nas escolas. Essa é uma proposta dos grupos ou artistas aprovados na lei de incentivo a cultura municipal. Inicialmente é feito um contato desse grupo ou artista com a SE para contatos com as escolas que irão recebê-los. A proposta de todos esses eventos é manter a arte viva na escola e proporcionar para que discentes e docentes tenham o maior número de experiências artísticas possíveis. É dessa maneira que se propõe conhecer, apreciar, criticar e fazer arte na escola. Talvez, ao olhar despretensiosamente para esse rol de eventos é possível imaginar “quanta coisa”, no entanto, se quantificarmos as escolas e o número de alunos a única certeza será que a arte da dança ainda permanece distante para alguns. Nesse contexto, o professor não fica de fora e também participa como artista na Mostra do Professor Também Faz Arte que é realizada desde 2004. A mostra tem como proposta incentivar professores no seu fazer artístico nas diversas linguagens. Essa

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 mostra é realizada entre outubro e novembro no CCBM, local onde os professores expõem seus trabalhos de artes visuais ou apresentam trabalhos de dança, música, teatro e vídeo. Assim como, para os discentes, os docentes são convidados a ser platéia e mensalmente é enviada para todas as escolas e para os professores uma agenda com toda a programação artística da cidade. Esse projeto de divulgação virtual da arte chamase Vivências Culturais e integra a proposta de formação continuada. Esse é o contexto, na rede municipal de ensino de Juiz de Fora, no qual a dança está inserida. A dança existe independentemente, mas, também se relaciona com as várias linguagens da arte. Esse cenário provoca um crescimento para toda comunidade escolar, assim como, para os órgãos que organizam e acompanham as disciplinas artísticas desenvolvidas na escola e para a própria dança na educação básica. É importante destacar que a maioria dessas propostas e realizações é advinda da equipe de docentes em arte, tanto dos que atuam em sala de aula, como da equipe que atua na SE. A partir de 2009, essa equipe 7 foi contemplada com pelo menos um profissional de cada linguagem e isso potencializou o trabalho de arte na escola. Todos esses profissionais trabalham há vários anos na rede e antes de integrarem a equipe técnica da SE lecionavam nas escolas. É preciso esclarecer que este ainda é um trabalho de resistência dentro de um órgão público, que às vezes desconhece a importância desse fazer e visualiza apenas como evento. Apontamentos A dança na rede está completando 18 anos. Apesar dessa maioridade cronológica, do crescimento artístico/profissional adquirido e a tentativa de situar essa disciplina com as discussões que vem sendo traçadas no universo acadêmico e artístico, a dança ainda tem muito a conquistar nessa rede, para que possa ser legitimada como disciplina necessária a formação de crianças e adolescentes.

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A relação nominal dos docentes que integram essa equipe encontra-se na primeira página do currículo de arte: http://www.pjf.mg.gov.br/secretarias/se/documentos/miolo_artes.pdf

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 Embora, a disciplina dança se encontra inserida no contexto educacional da rede municipal de ensino de Juiz de Fora, a grande maioria dos professores não possui formação específica na área. Ainda que haja uma avaliação específica para esses professores atuarem durante o ano letivo, percebe-se que muitos têm um conhecimento empírico e ignoram a dança como área de conhecimento. A SE tenta preencher essa lacuna oferecendo cursos de formação continuada em Dança, com profissionais especializados na área, propondo reflexões a cerca da Dança na Escola. Essa lacuna poderia ser amenizada com a criação da Licenciatura em Dança. A cidade de Juiz de Fora possui uma Universidade Federal e várias faculdades particulares, constando como cidade pólo na formação de profissionais, porém, ainda não foi proposta essa formação. Essa é uma situação ambígua, ao mesmo tempo em que há a necessidade do profissional, não existe formação. No primeiro edital específico para a seleção de professores temporários da disciplina dança que teve início em 2004 apenas candidatos licenciados em qualquer área com formação complementar em dança se inscreveram. A partir de 2011, teve início a inscrição de licenciados com formação específica e foram publicadas duas listagens. Uma primeira listagem de seleção de licenciados com formação específica na área e em segunda

listagem,

selecionados licenciados

em qualquer

área

com formação

complementar em dança. Isso acontece para que a demanda das escolas seja contemplada. No entanto, mesmo com essa situação, é necessário enfatizar que vários profissionais da rede desenvolvem um trabalho de qualidade. É possível perceber que o pensamento em dança na rede está se modificando tanto pelos professores de dança como pelos docentes de outras disciplinas. Vale ressaltar que os professores de dança são contratados em iguais condições de trabalho como qualquer docente da rede. Contemplado pelo quadro de carreira do magistério. Isso garante a equidade e o respeito do órgão público e de toda a classe docente. Além disso, a dança é uma disciplina na rede municipal de ensino de Juiz de Fora e aos poucos vem se integrando a grade curricular das escolas. Confabulações

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 Durante esse período de docência nessa rede de educação básica venho tecendo algumas confabulações que gostaria de compartilhar: Em relação ao processo de contratação temporária em que docentes com formação específica ou não, precisam enfrentar, sem uma proposta de efetivação e a cada ano paira a incerteza se estará empregado ou não no próximo ano, recorro a Agamben (2008) para comparar esse fato a um estado de exceção. Ou seja, o que deveria ser provisório ou temporário para suprir uma demanda excepcional tornou-se regra, a medida excepcional desapareceu por que virou a regra. Não existe provisoriedade ou exceção em dezoito anos de existência de uma disciplina em uma rede de educação. E o que parece é que esse assunto não é sequer discutido entre as instituições competentes como o sindicato dos professores - SINPRO, a Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF, a própria rede municipal, PJF e até os professores de dança da rede. É como se todos estivessem imunizados, como afirma Esposito (2010), ou seja, os três primeiros imunizam-se, isentam-se das responsabilidades políticas às quais deveriam estar vinculados. Os professores, por sua vez, se imunizam com o objetivo de conservarem o seu emprego, nesse caso, a conservação da vida. Dessa maneira, todos permanecem na condição de imunizados por meio de uma proteção negativa, que é a não realização do concurso, no entanto, a situação que os favorece é preservada como: os professores continuam com seu emprego anual, mesmo sem serem efetivados, a prefeitura mantém as aulas nas escolas, o sindicato diz que continua a cumprir sua função de defender os professores e a universidade se mantém no topo olhando ao horizonte sem interferir na sociedade. Além disso, o edital se mantém equivocado, quando faz uma subdivisão da disciplina dança em: dança de salão; dança jazz; dança de rua; dança contemporânea. Essa situação reduz as possibilidades do aluno conhecer a dança, pois, enquanto a seleção for realizada dessa maneira, para o aluno restará aprender apenas uma dança. É necessário refletir que a escola é local de ampliação do conhecimento, é lá que alunos diversos, na maioria das vezes, têm acesso aos bens culturais. Rengel (2008) esclarece que não é apenas uma dança que deve ser ensinada na escola e sim todas as danças. A

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 manutenção do edital nesse formato retira do aluno o seu direito de aprender a dança em sua amplitude. Em relação aos eventos em dança, há algum tempo reflito que os eventos funcionam como uma ação afirmativa para a dança. As mostras ou festivais de dança podem ser considerados como uma política focal que proporciona o aumento da participação de minorias no acesso à educação no ensino da dança e no reconhecimento cultural dessa arte. Cada evento realizado é uma medida que engloba tanto a promoção da igualdade de direitos básicos de cidadania como também formas de valorização étnica e cultural como explica o Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa GEMAA (2011): Ações afirmativas são políticas focais que alocam recursos em benefício de pessoas pertencentes a grupos discriminados e vitimados pela exclusão sócioeconômica no passado ou no presente. Trata-se de medidas que têm como objetivo combater discriminações étnicas, raciais, religiosas, de gênero ou de casta, aumentando a participação de minorias no processo político, no acesso à educação, saúde, emprego, bens materiais, redes de proteção social e/ou no reconhecimento cultural.

Partindo desse princípio, o FEMDE pode ser considerado como a primeira ação afirmativa para a ampliação e efetivação da disciplina dança na rede municipal de ensino de Juiz de Fora. Foi a partir da primeira realização do festival que muitas escolas solicitaram essa disciplina para seu contexto. É necessário refletir também que os eventos oferecem vida ao fazer em dança na sala de aula. Participar de um festival ou mostra é um momento de realização para o aluno. O espaço físico do teatro é algo desconhecido para muitos alunos da rede pública, principalmente o palco. Propiciar ao aluno da escola pública a vivência artística, tanto na escola como no palco do teatro, é promover a igualdade de direitos básicos de cidadania. Nesse contexto, os alunos têm a oportunidade de vivenciarem o fazer em dança na rua, na escola e no teatro. São espaços cênicos ou espaços que se tornam cênicos para a arte da dança. Essa é uma ação de direitos que inclui o direito a arte. Do mesmo modo que, participar desses encontros, mostras e festivais é ampliar as experiências em dança. A experiência faz parte da formação do ser humano e pode

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ANAIS DO III CONGRESSO NACIONAL DE PESQUISADORES EM DANÇA Comitê Dança em Mediações Educacionais – Setembro/2014 disparar a criatividade. Para Foulcault (2007), a experiência é assinalada como forma histórica das práticas de constituição do sujeito, ou seja, são práticas que permitem ao sujeito se transformar a partir de suas próprias práticas e das práticas externas a ele. Essas práticas externas podem ser produzidas por pessoas, objetos ou natureza. Para Katz (2005), a experiência estrutura o processo pelo qual as informações que nos constituem compõem a forma do nosso corpo e, nesse caso, se refere a um estado cognitivo durável que tenha resultado da percepção. Para a autora, é dessa maneira que o ser humano inicia sua história pessoal. Greiner e Katz (2005, p.132) fazem a relação da experiência com o ato de dançar e afirmam que: As experiências são fruto de nossos corpos (aparato motor e perceptual, capacidades mentais, fluxo emocional, etc.), de nossas interações com os ambientes através das ações de se mover, manipular objetos, comer, e de nossas interações com outras pessoas (em termos sociais, políticos, psicológicos, econômicos e religiosos) e fora dela. Nessa perspectiva o ato de dançar, em termos gerais, é o de estabelecer relações testadas pelo corpo em uma situação, em termos de outra, produzindo, neste sentido, novas possibilidades de movimento e conceituação.

Considerações Essas reflexões não se esgotam aqui. Talvez, o que possa ser considerado de tudo isso é que a dança na educação básica necessita de muita discussão em todos os âmbitos. A ênfase é para a presença da dança na educação básica oportunizando aos discentes conhecerem e experienciarem a dança nas suas mais diversas formas de existência.

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Artista, pesquisadora em Dança e Movimento. Doutoranda e Mestre em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUCSP. Idealizadora e fundadora da Ekilíbrio Cia de Dança. Professora de Dança da Rede Municipal de Ensino de Juiz de Fora, atualmente, atuando na assistência técnica aos projetos de arte, desenvolvidos nas escolas e na docência do curso de formação continuada para professores da rede - SPAC/DPPF/SE/PJF. Nome artístico: Christine Sílmor - Email: [email protected]

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