Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
A PUBLICIDADE DE MODA NA FIGURA DO ATOR DE CINEMA Nayara Tognere Gonçalves (U.V.A-RJ)
Resumo: Este artigo investiga a influência do cinema sobre a moda vigente por meio da trajetória do trabalho do figurinista, ao vestir um ator-personagem - o qual dita a moda através dos filmes - até a atuação do personal stylist com o ator-pessoa que, em sua vida fora das telas, continua a ditar tendências. Esta análise tem o objetivo de expor a relação entre figurinista e o surgimento do profissional stylist. Palavras-chave: Moda. Cinema. Styling. Abstract: This article investigates the unfolding of the personal stylist career as a gradual transformation of the costume designer career. While the costume designer used to dictate fashion through the dressing of the characters, the personal stylist later does the same though the dressing of the actors in their normal lives. From this point of view, the transition and unfolding of the personal stylist is revealed. Keywords: fashion, cinema, styling.
Introdução Durante a década de 30, o cinema norte-americano era usado para transmitir ideologias, hábitos de consumo, e comportamento. Naquela época, os produtos eram introduzidos sutilmente nas cenas e os personagens eram associados a eles para que os fãs pudessem se identificar, utilizando a figura dos seus grandes astros para vender ideologias, lifestyle e consumo. O cinema e a moda são indústrias que transmitem ideia de glamour. Cada qual com seus objetivos, apoiando-se mutuamente na divulgação de produtos praticamente desde o surgimento da sétima arte. Os atores de cinema são modelos a serem copiados aos olhos do público na medida em que se opera a dialética do ator e seu papel, quando o nome do intérprete se torna tão ou mais forte que o do personagem. “Hollywood criou uma arte que não apenas diminui a distância do espectador e o universo do filme, mas também cria a ilusão de que o espectador está no meio da ação reproduzida no espaço ficcional do ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
filme” (BALAZS, 1931, p. 50). A cultura de massa dessa época funcionou como agente difusor de uma forma de comportamento. De acordo com MORIN (1989), contratos eram fechados entre estúdios e indústrias para que certos produtos aparecessem em filmes, algumas lojas, inclusive, tinham seções de roupas e acessórios utilizados em filmes, que eram reproduzidos em série. “Através das estrelas e do erotismo, dos esportes e da imprensa feminina, dos jogos e das variedades, a cultura de massa exaltou a vida de lazer, a felicidade e o bem-estar individuais, promoveu uma ética lúdica e consumista da vida.” (LIPOVETSKY, 2009, p. 258). Para Joffily (1991, p. 13), a moda está diretamente ligada aos hábitos e crenças de uma população. Mesmo sem perceber ou afirmando que “não se importam com a moda”, as pessoas a consomem através da indumentária. E é exatamente de forma despercebida que a moda se transmite para um grande número de pessoas as quais a assimilam por meio dos diversos veículos de informação (impressos, tv, on line, etc) e também do cinema e notícias relacionadas a este. Morin (1990, p. 33) chama as estrelas de “donas da moda”, capazes de quebrar tabus e ditar tendências que serão copiadas pelas massas através do star system, uma “máquina de fabricar, manter e promover as estrelas sobre as quais se fixaram e se divinizaram as virtualidades mágicas da imagem na tela” (MORIN, 1990, p. 37), como Brigitte Bardot, ao aparecer na praia usando um biquini no filme “E Deus Criou a Mulher”, em 1956. “a estrela é um produto específico da civilização capitalista. Ela responde ao mesmo tempo a necessidades antropológicas profundas que se exprimem no mito e na religião. A espantosa coincidência do mito com o capital, da deusa com a mercadoria, não é casual nem contraditória. Estrela-deusa e estrela-mercadoria são as duas faces de uma mesma realidade: as necessidades do ser humano no estágio da civilização capitalista do século XX” (MORIN, 1990, p. 77)
Tais estrelas, os atores, vendiam um estilo baseado nos tipos lançados pela indústria a fim de engendrar identificação com cada público; como James Dean e sua imagem rebelde associada à jaqueta de couro vermelha, ou Brigitte Bardot e seu jeito ingenuamente sexy que popularizou o xadrez vichy, hoje uma das estampas clássicas da moda. O Stylist De acordo com a obra de MCASSEY e BUCKLEY (2013), o styling de moda “é uma maneira de combinar roupas e acessórios, exibindo-os do modo mais atraente ou desejável possível para que sejam vendidos”. Antes de a profissão stylist ser denominada como tal, os próprios editores de revistas de moda ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
desempenhavam este papel. Durante a década de 60, o editor era responsável por dirigir o fotógrafo e modelo durante a sessão de fotos sendo comum que a própria modelo fizesse sua maquiagem e cabelo. As revistas que não contavam com um setor voltado para a moda precisavam contratar profissionais freelancers para as matérias de moda. Dessa forma foram surgindo os primeiros stylists no decorrer dos anos 80 e, a partir de então, tornaram-se parte crucial de um editorial de moda, “um colaborador essencial para o processo de criação de imagens, que não estava vinculado a uma única revista ou ponto de vista” (MCASSEY e BUCKLEY, 2013, p. 309) O stylist pode atuar em diferentes setores dentro de sua área: desfiles, editoriais, campanhas publicitárias, produção de figurinos, e também atendendo pessoas (geralmente personalidades públicas). De acordo com a declaração de Alexandre Nunes, o stylist ou “produtor de moda”, é um “profissional que ganhou destaque e projeção no mercado brasileiro a partir dos anos 90.” (MCASSEY e BUCKLEY, 2013, p. 310). É ele o responsável por transformar as peças de um vestuário em signos, inserindo-os em um contexto com o objetivo de tê-los consumidos por um público-alvo específico anteriormente definido. O stylist atribui um significado à imagem como um todo através de seus signos, ele constrói essa imagem para que ela adquira um sentido o qual gere consumo. “De acordo com Luis Antonio Coelho, a palavra styling, no âmbito do design, foi introduzida nos EUA entre os anos 30 e 40 para estimular o consumo, durante a Grande Depressão por meio da recontextualização de produtos antigos de uma forma mais atraente. De fato, a etimologia de style faz referência à um instrumento de escrita e mais especificamente a renomear alguma coisa. Dessa forma, styling indicaria dar um novo nexo a esses produtos, basicamente modificando sua função estética para que o mesmo pudesse ser consumido mais rapidamente.” (MCASSEY e BUCKLEY, 2013, p. 34)
O figurino de cinema, a roupa utilizada pela estrela, as imagens reproduzidas dos mesmos, tudo isso é carregado de signos e significantes que atribuem status e geram o apelo do sonho de consumo. “Aquilo que permite ao leitor (espectador) consumir o mito inocentemente é o fato de ele não ver no mito um sistema semiológico, mas sim um sistema indutivo: onde existe apenas uma equivalência, ele vê uma espécie de processo causal: o significante e o significado mantêm, para ele, relações naturais.” (BARTHES, 2003, p. 223)
Para Barthes (2003), qualquer coisa pode se tornar mito, dependendo da forma como é vista ou mostrada, ou seja, o mito não é definido pela sua mensagem e sim pelo modo como esta mensagem é
ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
transmitida, “é um sistema de comunicação, uma mensagem (...), um modo de significação, uma forma (...) conduzida por um discurso. (pág. 199). A imagem é percebida visualmente e passa a receber um significado a partir dos olhos de quem a vê através de um sistema de significação. Qualquer objeto tem o “poder de fala” quando se atribui a ele um significado. Sendo o significante a coisa em si, ou seja, o objeto apresentado, o significado é o sentido atribuído - que depende de convenções sociais e/ou culturais - e o signo configura-se como a junção destes dois termos: o objeto (figura) e sua interpretação. “Stylist e figurinista são profissões separadas por uma linha muito tênue” (FAÇANHA e MESQUITA, 2012, pág. 27). Quer seja por stylists quer seja por figurinistas, os signos são usados de forma consciente e percebidos de forma inconsciente pelo público. Essa estratégia é aplicada pelas indústrias que, utilizando o estilo para estimular o consumo, geram uma composição que aposta em tendências, elementos clássicos e/ou referências aos grupos urbanos a fim de criar um panorama cuja tradução visual é exatamente àquilo que atingirá seu público alvo. “Enquanto os ídolos são anexados pela versatilidade da moda, o look, correlativamente, ganha uma importância maior.” (LIPOVETSKI, 2009, p. 251). Os vestidos de festa são os mais copiados. Por exemplo, o vestido de Julia Roberts no filme “Uma linda Mulher”, figurino de Marilyn Vance; o vestido longo amarelo usado por Jennifer Lopez em “Encontro de Amor” (2002), do estilista Bob Mackie; e também os figurinos de filmes como os fenômenos “Sex & The City” e “O Diabo Veste Prada”. Para Façanha e Mesquita (2012, p. 21), “stylist é o profissional responsável pela criação e organização de uma imagem de moda”. Essa imagem é constituída por conceitos e códigos semióticos a serem interpretados por quem as vê. Um “look” é uma história a ser contada e, portanto, interpretada. Então, o papel do stylist é agregar valor àquelas peças de roupas criando uma linguagem. Cada veículo tem um perfil de público, tanto as imagens publicadas quanto suas matérias são pensadas de modo a conversar com esse público o qual enxerga fontes de inspiração em suas publicações. “Há uma conceituação geral, que vai se consolidando a partir das respostas do público às propostas apresentadas sob a forma de matérias publicadas.” (JOFFILY, 1991, p. 69). “[...] o pesquisador norte americano Stuart Ewen (1999) relata que, desde os anos 30, com o reverso na economia do consumo, o styling obsolescence - isto é, a obsolescência programada do styling - vieram à tona como métodos para estimular os mercados e mantê-los estimulados” (FAÇANHA e MESQUITA, 2012, pág. 64).
ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
As imagens estão ali formadas objetivando vender um estilo de vida por meio da junção de vários elementos (roupas e acessórios) no look (imagem). O leitor que observa as imagens e identifica-se com o todo (ator/atriz e seu look) adquire o desejo de consumir. O surgimento da publicidade de moda no cinema Concomitantemente ao surgimento do cinema, percebeu-se que os lucros não viriam somente da venda de ingressos para os filmes. Desde os anos 1910-20, o cinema jamais deixou de fabricar estrelas – são elas que os cartazes publicitários exibem; são elas que atraem o público para as salas; foram elas que permitiram recuperar a enfraquecida indústria do cinema nos anos 1950. Veio destas décadas de ouro o mimetismo das estrelas. Tanto o que elas vestiam nas telas quanto sua postura comportamental eram emulados pelos espectadores. Nos tempos atuais, o que elas vestem fora do screen e nos eventos aos quais comparecem possui força ainda maior do que o figurino de seus personagens: as vestimentas de suas vidas pessoais é que são largamente copiadas. Acontece que, na maioria das vezes, estas roupas tão cobiçadas não as pertencem, são emprestadas pelas marcas cujo objetivo é ter suas imagens associadas às atrizes as quais, com o apoio da (o) stylist que as veste, transmutam-se em instrumentos publicitários selecionados a dedo para a marca em questão. No passado, haviam os figurinistas, por exemplo, Edith Head, quem ganhou Oscars por figurinos de estrelas vestidas por ela em filmes como “A Princesa e o Plebeu” (1954) e “Sabrina” (1955), ambos estrelados pela atriz Audrey Hepburn, um dos grandes ícones da chamada sétima arte - e também da moda. Hoje, apesar de figurinistas, designers, e stylists serem profissões bem distintas, grandes marcas são frequentemente chamadas para assinar figurinos, fato que torna os filmes parte ainda mais próxima do mundo da moda. Este é o caso da versão de “O Grande Gatsby” (2013) o qual contou com roupas da Prada e jóias da Tiffany – marca comumente associada à Audrey Hepburn devido ao filme “Bonequinha de Luxo” em que, na famigerada primeira cena, a personagem Holly Golightly toma seu café da manhã em frente à vitrine da joalheria. “o star system fabrica a superpersonalidade que é a grife ou a imagem da marca das divas da tela (...) o “tipo” que personifica a estrela é sua grife do mesmo modo que o estilo de um costureiro; a personalidade cinematográfica procede de um artificialismo das superfícies de mesma essência que a moda” (LIPOVETSKY, 2009, p. 249/250)
ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
Um exemplo clássico e ainda atual é dos óculos Ray-Ban e a imensa lista de celebridades que usam seus modelos em filmes ou no seu estilo fora das telas. O modelo mais antigo, o Aviator (Aviador), por exemplo, foi criado para os pilotos da Força Aérea Americana, em 1937, e ficou famoso para o público na década de 60, quando astros da música, como Paul McCartney adotaram seu uso. Mais recentemente, atores como Zac Efron e Lindsay Lohan são adeptos do modelo. Outra referência clássica de estrela usando o modelo é a personagem de Audrey Hepburn em “Bonequinha de Luxo”, conforme citado anteriormente, reunindo vários objetos e estilos que viriam a se tornar moda copiadas exaustivamente até os dias de hoje. Amaral (2012) afirma ainda que outro modelo famoso da marca, o Wayfarer deve grande parte do seu sucesso ao cinema já que, para o filme “Negócio Arriscado”, a marca fez um acordo com a produtora do filme e, com o sucesso de bilheteria, as vendas do modelo aumentaram em 50%. Assim como o modelo Aviador que, depois de “Top Gun”, aumentou em 40% em vendas. Na década de 60, Marilyn Monroe afirmou em uma famosa entrevista que para dormir usava apenas uma gota de Chanel nº 5. Durante quase um século de existência da fragrância, várias atrizes foram musas da maison sendo em 2013 novamente a própria Marilyn através de imagens de arquivo. “A sobrevivência aos inevitáveis efeitos do tempo se deve em boa parte a essa aura mitológica e cool, conquistada com presença massiva no figurino de personalidades e filmes que marcaram época, transformando-a numa fábrica de clássicos” (AMARAL, 2012, p. 56) Morin (1989) afirma que as estrelas de cinema tornam-se “mito” em seus papéis influenciadores de consumo. É um “conjunto de condutas e situações imaginárias” que são interpretadas pelos fãs, uma influência que não se limita apenas ao público que assiste ao filme. Por meio da imprensa e mimetismos em cadeia, a estrela influencia o público o qual se identifica com sua personalidade real ou fictícia. O styling das estrelas do Red Carpet As imagens construídas em decorrência do trabalho do profissional stylist contêm estímulos visuais cujo objetivo é induzir o consumo. A imagem da estrela de cinema atravessando um tapete vermelho, com cabelo e maquiagem impecáveis, vestida em um traje da marca X, selecionado especialmente para ela – o qual pode não ter sido sequer comprado pela atriz Y e sim emprestado pela marca X, que se interessa pela imagem que a estrela pode transmitir – agrega valor à marca, elevando o status da peça utilizada. Isso resulta do poder de influência da estrela aliado ao responsável pela criação dessa imagem, o stylist (no caso, personal stylist) responsável por compor o look da estrela. “Devemos entender por look o conjunto de ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
elementos organizados e combinados de maneira harmônica para a composição de uma imagem tais quais: roupas, acessórios, maquiagem e penteado associados à postura corporal” (Alexandre Nunes, 2012, pág. 309) A forma como as estrelas aparecem no imaginário do público não surge do acaso e sim da manipulação da imagem delas e dos seus trajes, para que possam ser, aos olhos dos fãs, modelos de identificação. A estrela dita moda porque a ela foi dado este poder, ela é referência e pode ser ousada, este é um dos motivos que a elas é dado o privilégio de vestir as roupas dos desfiles antes mesmo que as mesmas cheguem às lojas, elas são colocadas em um patamar diferente das clientes das marcas e do público que as admira. Uma noite de premiação, como o Oscar, ganha atenção de nível equiparável ao de um desfile de moda. Canais de TV, sites e blogs exibem, em tempo real, os “looks das estrelas” - look composto pelo personal stylist da celebridade em questão. No dia seguinte elas estão nos principais sites e blogs de moda, ensinam-se truques para reproduzir seus looks, suas maquiagens, e revelam-se as marcas das roupas e acessórios desfilados no red carpet para quem puder comprar. Algumas matérias comumente chamadas de “Get the Look” mostram onde comprar as peças utilizadas pela estrela ou, ao menos, peças semelhantes às do look exibido. Para o Globo de Ouro 2012, a atriz Charlize Theron atravessou o tapete vermelho do evento em um look que somava mais de US$ 8 milhões. “A headband era uma joia vintage da Cartier da década de 20. O custo aproximado é de US$ 2,5 milhões, e foi emprestado para a atriz pela Cartier. O vestido era emprestado pela maison Dior e custa US$ 30.000 para quem quiser comprar. Anel, brincos e broche - tudo da Cartier e também emprestados - passou dos US$ 5.5 milhões. A bolsa também era emprestada da Dior e custa aproximadamente US$ 20.000, já os sapatinhos foram presente da Givenchy para Charlize e custam US$ 1.150 nas lojas. Quem pagou? Ninguém, pois foi tudo devolvido para as lojas no dia seguinte do evento.” (PETISCOS, 2012, artigo “Beleza Emprestada”)
Em setembro de 2013, quando Nicole Kidman foi atropelada por um paparazzi de bicicleta na porta de um hotel após assistir a um desfile da Calvin Klein, uma foto revelou a etiqueta na sola do sapato e marcas de fita adesiva, mostrando que o produto, provavelmente, seria devolvido a alguma marca logo depois (PETISCOS, 2013).
ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
Mais do que a publicidade convencional, uma estrela vestindo uma marca agrega maior valor ao produto. Se antes as estrelas apareciam apenas nos cartazes de divulgação de filmes, hoje, atrizes de Hollywood aparecem em capas de revistas de moda substituindo top models, pois, através de seus personagens, alcança-se maior identificação do público para com elas. Além das capas de revistas, as próprias marcas usam as estrelas para as representarem em suas campanhas, valorizando a marca com a imagem da “estrela”. Esta, por sua vez, é vista em sua vida cotidiana (exibida também em revistas) falando sobre os pontos positivos da marca em questão, contando fatos de sua vida pessoal, provando terem algum ponto em comum com seus fãs. Humanizando-se, as próprias celebridades admitem serem “pessoas normais” até mesmo ao dizer que não têm dinheiro para consumir tanto quanto aparentam. Por exemplo, a atriz Kate Hudson afirmou em recente entrevista para a Harper’s Bazaar dezembro/2013 que costumava consumir bastante de grandes marcas como Isabel Marant as quais, após tornarem-se marcas de luxo, deixaram de ser acessíveis para ela. (PETISCOS, 2013, artigo “Caríssimo”). Assim como elas revelam o glamour, elas também são livres para destruir a fantasia criada em torno delas. Contudo, isso não diminui seu poder de influência, pelo contrário, aumenta o desejo de ser como elas, de adquirir os produtos de estrela. “jamais se consome um objeto por ele mesmo ou por seu valor de uso, mas em razão de seu “valor de troca de signo”, isto é, em razão do prestígio, do status, da posição social que ele confere” (LIPOVETSKY, 2009, pág. 199) O traje deixou de ser apenas “roupa” para se tornar uma fantasia publicitária, algo que é cedido ou emprestado para ser usado e depois devolvido. Uma fantasia a ser desfilada em festas e grandes eventos divulgados pela mídia logo depois de serem desfiladas em passarelas de moda e, às vezes, antes de chegar às lojas, acarretando assim um desejo ainda maior por algo que, aparentemente, apenas as estrelas possuem. Morrison (2011) afirma que o papel do stylist de uma atriz é garantir que todos os detalhes da roupa sejam exibidos adequadamente no red carpet. Segundo a autora, é uma ótima ocasião para ser fotografada e exibir o look previamente escolhido. É importante que sejam feitos todos os ajustes necessários para que o traje seja exibido sem defeitos e divulgado positivamente pela mídia. Por isso a escolha da stylist tem relevância para o sucesso da estrela, para os canais em que o look é divulgado e para a marca que empresta o traje.
ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
Considerações finais Ao perceber-se que os lucros advindos do cinema poderiam ir além dos valores de seus ingressos, a imagem de seus atores é utilizada para incentivar algum tipo de consumo. A princípio, os figurinistas eram responsáveis pelas criações dos tipos mais comuns a serem direcionados para um público específico o qual poderia se identificar com eles. Enquanto antes os personagens que eram retratados nas revistas de moda, atualmente, as atrizes não mais se prendem a um único estilo de personagem. O mito da estrela permanece, porém de outras formas, ela sai do personagem e mescla-se com o ator e sua “vida real”. O mito é estabelecido no próprio ator como profissional, um instrumento do seu trabalho utilizado pela moda e publicidade como meio de propaganda na medida em que sua imagem é aliada a um sistema semiológico. Isso também reflete a moda atual a qual não se prende somente a um estilo, mas vários, uma conjuntura onde cada indivíduo expressa seu estilo publicamente e o compartilha para que outros possam espelhar-se. Quando tal papel era do figurinista, o cinema e suas técnicas (luz, som, montagem, etc.) eram responsáveis pelo processo de projeção-identificação do expectador, quem mantinha uma relação quase pessoal para com o ator admirado na tela, e é essa identificação que o levaria a consumir algo relacionado ao ator-personagem. Hoje são os veículos de comunicação, por meio de linguagem, imagem e seus códigos que transformam o ator (e não o personagem) em um modelo a ser seguido ora no red carpet ora em sua “vida real”, ou seja, copiado pelo que ele veste/usa. A pessoa que consome esses objetos passa a se sentir um pouco estrela: o batom da Rihanna, a bolsa da Sofia Coppola, o perfume da Natalie Portman, os óculos da Audrey Hepburn – isso configura o objeto adquirindo valor. As motivações são todas de cunho psicológico visto que as imagens atingem o espectador em sua subjetividade. Tudo funciona através de uma cadeia constituída por marcas, designers, stylists, celebridades e veículos de comunicação/publicidade. O público consumidor dessas imagens não adquire apenas um produto, mas sim um estilo de vida por meio da imagem da atriz. O desligamento da figura do ator dos personagens que ele interpreta acarretou um ambiente propício para a atuação do personal stylist. A moda, como parte de um sistema, transmite significados interpretados como bens de consumo. O cinema, como parte do processo de formação cultural e transmissor de ideologias durante sua história, se transformou em um instrumento de publicidade - quase velada aos olhos de grande parte do público. ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
Aliado a outros meios de comunicação, como revistas e, principalmente, a internet, a moda encontrou no Cinema um poderoso canal transmissor de tendências e consumo. Assim, duas indústrias glamourizadas se tornam uma indústria de sonhos que podem se tornar realidade através do consumo.
Referências Livros AMARAL, Sergio. Testemunha Ocular. Revista L’Officiel Brasil. Junho de 2012. BALASZ, Bela. Theory of the Film. Londres: Dennis Dobson, 1931. BARTHES, Roland; Sistema da Moda. São Paulo: Nacional, 1979. FAÇANHA, Astrid e MESQUITA, Cristiane; Styling e Criação de Imagem de Moda. São Paulo: Senac, 2012. JOFILLY, Ruth. O jornalismo e produção de moda. Rio de Janeiro: José Olympio, 1991 LIPOVETSKY, Gilles; O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. METZ, Christian. A significação no cinema. São Paulo: Perspectiva, 2007. MORIN, Edgar; As estrelas. Mito e sedução no cinema. Rio de Janeiro: José Olympio, 1990. MCASSEY, Jacqueline e BUCKLEY, Clare; Styling de Moda. Porto Alegre: Bookman, 2013. MORRISON, Sasha Charnin. Secrets of Stylists. San Francisco: Chronicle BooksLLC, 2011. Revistas FARAH, Alexandra. Um casamento mais que perfeito. Em: Plastic Dreams. Edição 9, 2013.21. Sites COUTINHO, Camila. Get the look. Disponível em Acesso em 02 Ago 2013
ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015
Moda Documenta: Museu, Memória e Design – 2015
Life&Style. Disponível em Acesso em 18 de janeiro de 2014. PETIT, Julia. Petiscos. Beleza Emprestada. Disponível em Acesso em 13 de janeiro de 2014. PETIT, Julia. Petiscos. Caríssimo. Disponível em Acesso em 13 de janeiro de 2014. PETIT, Julia. Petiscos. Virou circo. Disponível em Acesso 13 de janeiro de 2014.
ISSN: 2358-5269 Ano II - Nº 1 - Maio de 2015