Produção científica sobre violência doméstica
A PRODUÇÃO CIENTÍFICA SOBRE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NA ÁREA DA SAÚDE PÚBLICA SCIENTIFIC PRODUCTION ABOUT DOMESTIC VIOLENCE IN THE PUBLIC HEAL TH AREA EALTH Lucia Helena Garcia Penna* Neuci Cunha dos Santos** Edinilsa Ramos de Souza***
RESUMO: A violência é reconhecida como um problema de saúde publica e, numa estrutura social com características historicamente patriarcais, a violência doméstica constitui uma forma peculiar de expressão desse fenômeno. Buscou-se descrever criticamente, sob a ótica da saúde pública, a produção científica dos últimos 11 anos na América Latina e Caribe sobre violência doméstica, considerando tendências conceituais, de classificações e de metodologias utilizadas. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, envolvendo as atividades básicas de identificação, compilação e fichamento de trabalhos localizados através de consulta à Biblioteca Virtual de Saúde Pública. Os resultados mostram que a produção científica sobre violência doméstica vem se intensificando gradativamente nos últimos anos. Cerca de 73% dos artigos foram publicados a partir de 1995; 40% dos estudos são epidemiológicos descritivos, seguidos de revisões teóricas (23%) e de avaliações de serviços (16%). O tipo de violência doméstica mais registrado foi a perpetrada contra a mulher (56%) e a criança (36%). Palavras-chave: Criança; mulher; saúde da família; saúde pública; violência doméstica. ABSTRACT ABSTRACT:: Violence is recognized as a public health problem and, in a social structure with patriarchal characteristics historically demonstrated, the domestic violence constitutes a peculiar form of expression of this phenomenon. This study describes critically, under the public health optic, the scientific production of the last 11 years in Latin America and Caribe concerning domestic violence, considering the conceptual tendencies, the classifications and the usual methodologies. It is a bibliographic research, involving the basic activities of identification, compilation and recording of works localized through consultation to the public health virtual library. The results showed that the scientific production about domestic violence is having a gradual increase in the last years. About 73% (seventy-three percent) of the papers have been published after 1995. Forty percent of the studies were epidemiological descriptions, followed by theoretical revisions (23%) and service evaluations (16%). The most frequently registered domestic violence types were against the (56%) and the (36%). Keywords: Child; woman; family health; public health; domestic violence..
I NTRODUÇÃO
É
recente a projeção do tema violência doméstica nos foros acadêmicos, como um fenômeno social. Esta é concebida como as variadas formas de violência interpessoal (agressão física, abuso sexual, abuso psicológico e negligência), que ocorrem no seio da família, sendo perpetradas por um agressor (que possui laços de parentesco, familiares ou conjugais) em condições de superioridade (física, etária, social, psíquica e/ou hierárquica)1. A produção científica sobre violência doméstica tem aumentado nos últimos anos, entretanto, ainda é considerada pequena. Existem vários fap.192 •
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tores que dificultam a produção de registros sobre a violência doméstica, entre eles, os fatores históricos. Durante séculos, num sistema patriarcal puritano e conservador, a família era, e ainda é, vista como sagrada, inviolável, considerada como instituição possuidora de uma barreira de proteção em torno do que de melhor e de pior acontecia dentro das casas2. Com os movimentos feministas e suas conquistas, denúncias, pesquisas e adesões por parte de vários grupos da sociedade, começaram então os registros sobre a violência doméstica e a dessacralização da famí-
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lia. Para Soares2, um novo campo profissional é delineado, o qual ganha sentido quando se constituem e se consolidam certas idéias sobre a violência doméstica: a idéia de que existe tal fenômeno, de que ele ocorre em proporções alarmantes, de que ele circunscreve um certo conjunto de ações, atitudes, envolvendo um leque determinado de relações, e de que se trata de um problema social e não dos indivíduos isoladamente ou de suas redes particulares de parentesco. É através das produções e publicações de novos saberes acerca da violência doméstica que ela se caracteriza em sua existência, evidencia seus contornos e determina sua magnitude, exatamente pela capacidade de suscitar e legitimar o debate sobre sua existência e importância. A produção reduzida de trabalhos sobre o tema no âmbito da saúde pública também pode ser explicada pela dificuldade de os profissionais de saúde lidarem com situações de violência; a falta de uma linguagem comum em relação ao tema, e a falta de conceitos que reunam o conhecimento em saúde ao de outras áreas, como a jurídica, por exemplo3. Em um levantamento realizado pelo Centro Latino-americano de Estudos de Violência e Saúde4, identificou-se que, no Brasil, até a década de 90, somente 3% da produção acadêmica sobre violência eram anteriores ou da década de 60; 11% eram dos anos 70 e 86% da década de 80, quando então os estudos tomaram uma direção de crescimento em número, abrangências, inclusão de temáticas e complexidade das abordagens. Já na área de saúde coletiva, os estudos sobre violência eram de autoria de um grupo restrito de pesquisadores e versavam em sua maioria sobre: violência, acidente e morte no trabalho (35 artigos); tentativa, ideação e morte por suicídio (32); violência e maus tratos contra criança e adolescentes (26); mortalidade e morbidade por causas externas em geral (25); e acidentes e morte no trânsito (17). Sobre violência doméstica foram publicados apenas dois artigos4,5. Dando continuidade a essa linha de investigações, o presente estudo pretende contribuir com uma reflexão do conhecimento já produzido sobre violência doméstica, a fim de fornecer aos profissionais da saúde um panorama sobre o tema e reduzir o percurso de busca. Esta pesquisa, então, compreende uma análise da produção científica sobre a violência doméstica divulgada como artigo científico em revistas indexadas da área de saúde pública, considerando tendências conceituais, classificações e metodologias utilizadas, no período de 1990 a 2001.
METODOLOGIA
Fez-se uma revisão da literatura sobre vio-
lência doméstica, a partir da área de saúde pública da América Latina e Caribe, publicada em periódicos indexados, no período de janeiro de 1990 a dezembro de 2001. Adotou-se os princípios da pesquisa bibliográfica, envolvendo as atividades básicas de identificação, compilação e fichamento dos trabalhos. A Biblioteca Virtual de Saúde Pública (BVS) foi consultada através do site http:// www.saudepublica.bvs.br, e a partir dela foram pesquisadas algumas das principais bases bibliográficas de dados: Literatura Latino-Americana e do Caribe em Saúde Pública (LILACS SP); Administração de Serviços de Saúde (AdSaúde); e a base MEDlars on LINE (MEDLINE). Ainda foram consultados os acervos das bibliotecas da Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Instituto Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), da Faculdade de Saúde Pública (FSP) e da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS). Foram localizados 29 artigos sobre violência doméstica publicados no período pesquisado. Esses foram submetidos a uma classificação tendo como base as seguintes categorias: ano e local de publicação, metodologia empregada e identificação do grupo populacional alvo da violência. Para esta etapa, utilizou-se a abordagem quantitativa com aplicação do programa Epi-Info 6.0, tendo sido os dados analisados através de freqüências absolutas e relativas, com distribuições bivariadas. Os artigos foram classificados em estudos de caso clínico, quando tinham por base a análise de casuística; estudos epidemiológicos, quando abordavam a distribuição de taxas relativas a eventos violentos segundo o local, espaço e grupo populacional; estudos quantitativos descritivos, quando trabalham os dados quantitativamente, mas não envolvem metodologia epidemiológica; pesquisas qualitativas, referem-se a estudos etnográficos baseados em trabalho de campo; e, finalmente, revisão bibliográfica, baseada em consulta bibliográfica6. Num segundo momento, realizou-se uma abordagem qualitativa dos dados utilizando-se a técnica de análise temática7,8. Conforme Bardin7:105, essa técnica "consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem a comunicação e cuja presença de aparição podem significar alguma coisa para o objetivo analítico escolhido. Além de se buscar respostas para questões com essa técnica, pode-se caminhar na direção da "descoberta do que está por traz dos conR Enferm UERJ 2004; 12:192-8.
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teúdos manifestos, indo além das aparências do que está sendo analisado"9:74.
RESUL TADOS ESULT
E
DISCUSSÃO
A
produção de artigos sobre violência doméstica, publicados em revistas da área de saúde pública, tem se caracterizado pela maior concentração de estudos sobre alguns elementos da família através do recorte de gênero (15 artigos abordam a mulher e apenas um focaliza o homem) ou de grupos do ciclo vital (11 trabalhos são voltados para crianças e adolescentes; um enfoca o adulto e um artigo aborda os idosos). Por vezes, os textos são relativos a um tipo específico de evento violento (maus tratos, negligência, violência sexual). É importante destacar que essa produção está diretamente relacionada aos resultados alcançados por movimentos sociais de direitos humanos em especial o feminista, de direito da criança e do adolescente, e também de outros processos mais amplos e presentes em toda a sociedade, como o da consolidação democrática. Uma questão importante que se coloca como indagação é: qual a finalidade do trabalho dos pesquisadores? Ou seja, é a intencionalidade da produção publicada, que por vezes é apresentada de forma explícita, ora surge apenas nas entrelinhas. A resposta a essa questão indicaria a relação entre origem/ destino. No conjunto, identificou-se que em muitos estudos buscou-se enunciar o propósito estratégico de colaborar ou formular projetos de prevenção ou intervenção, e de contribuir para a melhor adequação dos serviços de atenção e de formação de profissionais. No entanto, a maioria buscou descrever situações de violência doméstica com o objetivo de produzir conhecimento acadêmico (entre eles os de verificação da associação entre fatores de risco e violência, análise de confiabilidade de instrumentos de pesquisa), valorizando o mérito da socialização dessa produção. A análise revelou que 79,3% dos trabalhos foram publicados a partir do ano de 1995. Uma possível explicação para isso deve-se à ocorrência de diversas conferências internacionais, realizadas nesse período, aprovadas pela Organização das Nações Unidas (ONU), que tinham por perspectiva a prevenção e erradicação da violência no mundo. Entre elas, a Convenção Interamericana para Prevenir e Erradicar a Violência Contra a Mulher10, realizada em Belém do Pará (1994), que tem especial importância por ter força de lei em diversos países, estabep.194 •
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lecendo marcos no avanço da proteção dos direitos humanos. Identificou-se que, dos 35 países da América Latina e Caribe cadastrados no sistema da BVS, apenas 7 (20%) figuram como divulgadores de produções sobre o tema. Entre eles, o Brasil aparece como importante pólo de produção científica, responsável pela divulgação de 19 (65,5%) artigos, através dos seguintes periódicos: Revista de Saúde Pública, Caderno de Saúde Pública, Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, Saúde e Sociedade, Jornal Brasileiro de Ginecologia, Revista Brasileira de Saúde Materno-Infantil. Dessa produção, 15 (79%) artigos versam sobre a realidade brasileira. Os outros 10 (34,5%) artigos, entre os 29 trabalhos analisados, foram divulgados por periódicos da Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica e México. Quanto à procedência dessas publicações, parece refletir o nível de estruturação e desenvolvimento dos programas de pós-graduação nesses países, assim como a consolidação de núcleos de pesquisa, pois, em geral, as revistas vinculam-se às instituições de ensino e assistência. Do ponto de vista do ator social contra quem a violência é dirigida, identificou-se basicamente duas classificações: uma segundo o recorte de gênero e outra segundo os grupos do ciclo vital. Observa-se que, mesmo quando os estudos se propõem a analisar a violência tendo a família como foco, prevalece na análise um desses dois recortes. Não foram encontrados artigos relacionados à classe social, etnia, grupos considerados especiais (deficientes físicos e mentais) ou relacionados a situações que, potencialmente, são geradoras de conflitos (doenças crônicas na família, gestação, drogas e alcoolismo). Em relação ao gênero, a mulher tem sido alvo de maior interesse dos estudos, comparecendo em 15 artigos11-25,. Esses estudos foram produzidos, em sua maioria, do meado para o final da década de 90, e tiveram como metodologia predominante análises quantitativas de caráter descritivo, evidenciando uma necessidade premente de tornar o problema visível. Os estudos que utilizaram métodos qualitativos tiveram por preocupação avaliar os serviços prestados a partir da perspectiva das próprias mulheres. O homem foi objeto de um único artigo26, produzidos no final da década de 90. O interesse desses trabalhos se concentrou nos agressores físicos e que estavam privados de liberdade, que
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foram abordados através de uma dinâmica de grupo terapêutico. Analisando o conteúdo dos estudos aqui considerados, observa-se uma tendência teóricoconceitual em direção ao enfoque interdisciplinar sobre violência doméstica, passando de uma percepção unilateral para aquela que adquire complexidade, à medida que relaciona os aspectos biológicos, psíquicos e sociais envolvidos na temática. Embora ainda minoritário, observou-se o surgimento de um outro enfoque dado à explicação da violência doméstica, em especial contra a mulher. Ele se manifesta através de uma abordagem universalista, a qual reconhece a violência como um fenômeno social estrutural, o que significa entender a violência como uma decorrência das relações ocorridas no interior da sociedade, as quais dão origem às iniqüidades e conseqüências como: a marginalização, o desemprego, a falta de educação e o autoritarismo que, ao estarem presentes na sociedade, potencializam e exacerbam conflitos e afetam a todos indistintamente e de forma peculiar a certos grupos mais vulneráveis17. Verificou-se que, apesar de a maioria dos artigos utilizar abordagens recentes que criticam o modelo biomédico, fragmentado em especialidades, não se encontram estudos que apresentem a diversificação do segmento feminino nos diversos contextos (raça/etnia, classe social, diferentes momentos do seu ciclo vital). Destacamos três artigos na área da saúde reprodutiva/sexualidade21,22,25; o primeiro descreve a percepção da mulher sobre o seu comportamento sexual após a agressão21; o segundo preocupa-se mais com a relação da violência e as condições de vida da criança ao nascer22; e o terceiro está voltado para a identificação da violência contra a mulher no pré-natal25. Os três artigos de revisão teórica registram basicamente em seu conteúdo os conceitos e as diferenças tênues entre três formas de violência: a doméstica, a de gênero e a intrafamiliar18,23,24. Nesse conjunto de trabalhos, constatam-se as desigualdades entre o poder masculino e o feminino, particularmente nas relações intrafamiliares, com a predominância do primeiro sobre o segundo, determinando as agressões físicas, morais, sexuais, psicológicas e culturais. Esses estudos também fornecem um panorama das dimensões da violência contra as mulheres no mundo, e as conseqüências dos abusos so-
bre a saúde. Neles, é unânime o registro das dificuldades dos profissionais de saúde em identificar e diagnosticar a violência, sendo indicadas estratégias de escuta sensível, registro de anamneses e redobrada atenção para sinais e sintomas sem causa específica. A classificação a partir de grupos do ciclo vital identifica crianças e adolescentes como os elementos da família que mais sofrem violência. A esses grupos específicos se dedicam 11 artigos27-37, Os idosos foram contemplados com apenas um artigo38. A ênfase dos textos que discutem a violência doméstica praticada contra crianças e adolescentes recai sobre a preocupação com a qualidade da atenção prestada pelos serviços, com especial destaque para a atuação dos profissionais de saúde. Nos trabalhos, são esboçados princípios norteadores tanto para a capacitação desses profissionais como para a organização dos serviços. Desse modo, um dos artigos discute a definição de um marco conceitual sobre a violência30, dois buscam a identificação das manifestações da violência e sua relação com a realidade social mais ampla28,29. Outros dois destacam a historicidade da problemática e a correlação da agressividade com a convivência com situações conflituosas no interior da família27,33. Os autores indicam também a premência de se tomar a família como o alvo de atuação, mas advertem para a necessidade de não se usar medidas de criminalização da família e/ou do agressor. Apontam para o necessário estabelecimento de uma rede de atuação, com serviços e instituições articulados entre si e a estrutura comunitária. Em menor proporção, encontram-se estudos que buscam identificar associação entre a ocorrência de violência doméstica e fatores preditivos ou desencadeadores. Em termos específicos, esses trabalhos propõem verificar a associação da agressividade de adolescentes com a presença de violência na família31,34-37. Dois estudos de revisão bibliográfica são seminais30,32. Um deles tem a preocupação de discutir teoricamente as implicações éticas da intervenção de profissionais da saúde na dinâmica familiar, levando em consideração sua responsabilidade na proteção dessas crianças30. O outro, sistematiza as diversas formas de violência contra a criança/adolescente, delineando a trajetória histórica, entrelaçada às dinâmicas socioculturais. Partem do entendimenR Enferm UERJ 2004; 12:192-8.
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to de que esse tipo de violência é também uma expressão da violência estrutural32. Neste último, analisa-se as condições educacionais, o trabalho infantil, a institucionalização de jovens e o poder da mídia na conformação de valores entre jovens. A autora sistematiza também as diversas formas de violência no interior da família, na saúde e a violência infanto-juvenil. Encontrou-se um único artigo que aborda a violência focalizando a instituição família37. Ele analisa a iniciativa governamental na busca de parcerias intersetoriais (jurídicas, de saúde, casa de abrigos e outros) como possibilidade de prevenção e eliminação da violência intrafamiliar. Mesmo tendo o intuito de sistematizar e identificar parceiros para a erradicação da violência, com uma abordagem interdisciplinar e intersetorial, o texto não consegue fugir do mesmo recorte dos outros trabalhos que distinguem os tradicionais grupos sociais específicos de mulheres, crianças, adolescentes e adultos.
deficientes físicos. Nesse entendimento, há carência também de investigações que aprofundem a compreensão das relações interpessoais e de certas situações geradoras de estresse e conflitos, como a deficiência física; a presença de pessoas portadoras de doenças crônicas; o consumo de drogas e a gestação. Considera-se que devem ser privilegiadas abordagens interdisciplinares baseadas, principalmente, no corpo conceitual das ciências sociais, constituindo-se em estudos que ultrapassem a descrição do problema. Finalmente, identifica-se a necessidade de maior incentivo às produções acadêmicas, possivelmente através da inserção da temática na formação dos profissionais, principalmente daqueles da área da saúde. Espera-se que esse panorama possa oferecer aos profissionais dos serviços e aos pesquisadores subsídios mais concretos para futuras análises e intervenções na área, pois, sendo um tema relativamente novo, muitos são os caminhos a percorrer em busca de novos conhecimentos e soluções.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
Não há mais dúvida de que a violência
doméstica é um assunto prioritário e que muito precisa ser aprofundado. O presente estudo permitiu uma aproximação diagnóstica da produção científica sobre essa temática nesses últimos 11 anos. Além disso, tornou possível uma reflexão sobre a evolução dos pensamentos, as linhas teóricas da produção do conhecimento nessa área, com a identificação de algumas tendências, perspectivas e lacunas a serem melhor exploradas pelos pesquisadores. Como tendência a ser destacada, encontrase a produção crescente, em processo de ampliação temática. Nesse ponto, o Brasil destaca-se como um importante centro de divulgação da produção científica na área. Constatou-se também, principalmente na segunda metade da década, evolução na elaboração científica, com a produção de estudos quantitativos analíticos, qualitativos e interdisciplinares, caracterizando um aspecto positivo na construção e no avanço do conhecimento. Analisa-se ainda a existência de lacunas a serem exploradas e aprofundadas pelos estudos científicos como, por exemplo, a necessidade de trabalhos que incluam todos os elementos da família, contextualizando os aspectos socioeconômicos e históricos. Ou seja, além das mulheres e das crianças/ adolescentes, também privilegiem idosos, homens e p.196 •
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PRODUCCIÓN CIENTÍFICA
SOBRE
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DE LA
SALUD PÚBLICA
RESUMEN: La violencia es reconocida como un problema de salud pública y, en una estructura social con características históricamente patriarcales, la violencia doméstica constituye una forma especial de expresión de ese fenómeno. Se buscó describir críticamente, desde la óptica de salud pública, la producción científica de los últimos 11años en América Latina y Caribe sobre violencia doméstica, considerando tendencias conceptuales, de clasificaciones y de metodologías utilizadas. Se trata de una investigación bibliográfica, que incluye las actividades básicas de identificación, recolección y clasificación de trabajos encontrados a través de consulta a la Biblioteca Virtual de Salud Pública. Los resultados muestran que la producción científica sobre violencia doméstica viene incrementándose gradualmente en los últimos años. Cerca de 73% de los artículos fueron publicados a partir de 1995; 40% de los estudios son epidemiológicos descriptivos, seguidos de revisiones teóricas (23%) y de evaluaciones de servicios (16%). El tipo de violencia doméstica más investigado fue la cometida contra la mujer (56%) y niño (36%). Palabras Clave: Niño; mujer; salud de la familia; salud pública; violencia doméstica.
Recebido em: 18.02.2004 Aprovado em: 30.07.2004
Notas *
Doutoranda em Saúde da Criança e da Mulher do Instituto Fernandes Figueiras/FIOCRUZ Doutoranda da Escola Nacional de Saúde Pública/FIOCRUZ *** Doutora em Ciências da Saúde - CLAVES/FIOCRUZ **
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