DR! Revista
Nº 87 | 2015
Publicação do SIMESP Sindicato dos Médicos de São Paulo outubro/novembro/dezembro
A mulher médica Elas já são maioria nas faixas mais jovens entre os profissionais de medicina e a tendência é cada vez mais ganharem espaço. As médicas, porém, ainda enfrentam preconceitos e ganham menos
Informação
Novo padrão de comunicação
Especial
Subfinanciamento da saúde
Artigo
Mário Scheffer: “impeachment” do SUS
Merit Ptah (2.700 a.C.), cientista egípcia, considerada a primeira médica da história
Revista DR! • 1
Sumário
Nº 87 | 2015 outubro/novembro/dezembro
Páginas Verdes
Sustentabilidade
Horas Vagas
Saúde Brasileira
Lixo Eletrônico
Diário Imaginário
6
20
32
Ligia Bahia fala, entre
Menos poluição:
Contando histórias do
outros, sobre a não
descarte adequado dos
cotidiano, o médico Luiz
priorização da
produtos eletrônicos
Gustavo Omena faz
saúde nas agendas
é responsabilidade
sucesso com sua página
governamentais
de todos
no facebook
5 Editorial 10 Artigo 11 Tecnologia 12 Capa 36 Cultura
24 Especial
Subfinanciamento da Saúde
2 • Revista DR!
Revista DR! • 3
Editorial
Expediente
DIRETORIA Presidente Eder Gatti Fernandes
[email protected]
SECRETARIAS Geral Denize Ornelas P. S. de Oliveira Comunicação e Imprensa Gerson S. Salvador de Oliveira Administração Ederli M. A. Grimaldi de Carvalho Finanças Juliana Salles de Carvalho Assuntos Jurídicos Gerson Mazzucato Formação Sindical e Sindicalização Marly A. L. Alonso Mazzucato Relações do Trabalho José Erivalder Guimarães de Oliveira Relações Sindicais e Associativas Otelo Chino Júnior
DR! Revista
É imperativo qualificarmos o entendimento, o discurso e a prática Diretoria do Simesp
É com grande satisfação que com-
Essa revista deverá ser uma
partilhamos com nossos leitores o
praça em que nossa entidade pos-
EQUIPE DO JORNAL DO SIMESP
primeiro exemplar do novo proje-
sa se encontrar com os médicos
Diretor responsável Gerson S. Salvador de Oliveira Editora-chefe e redação Ivone Silva Reportagem e revisão Leonardo Gomes Nogueira Nádia Machado Fotos Osmar Bustos Relações-públicas Juliana Carla Ponceano Moreira Ilustração da capa Célio Luigi Redação e administração Rua Maria Paula, 78, 3° andar 01319-000 – SP Tel: (11) 3292-9147
[email protected] www.simesp.org.br
to da Revista DR!. Ele vai além de
e com a sociedade em geral; as-
mudanças gráficas, tem a ver com
sociações, movimentos e pessoas
o padrão de posicionamento da
que tenham interesse na área da
comunicação institucional adota-
saúde e nas questões relacionadas
do pelo Sindicato dos Médicos de
ao trabalho.
PROJETO GRÁFICO Med Idea - Design para médicos Rua Oscar Freire, 2189, Pinheiros São Paulo/SP 05409-011 Tel: (11) 99897-8787
[email protected] www.medidea.com.br Editor de Arte e diagramação Igor Bittencourt Todos os artigos publicados terão seus direitos resguardados pela revista DR! e só poderão ser publicados (parcial ou integralmente) com a autorização, por escrito, do Simesp. A responsabilidade por conceitos emitidos em artigos assinados é exclusiva de seus autores.
São Paulo.
É imperativo qualificarmos o
As entidades médicas, em ge-
entendimento, o discurso e a prá-
ral, vêm sofrendo com a pouca
tica, para que possamos melhorar
capacidade de intervirem nas po-
as condições de trabalho dos mé-
líticas públicas e fazerem frente
dicos e as condições de atendi-
às condições precárias de saúde
mento à saúde da população.
pública e às mudanças que o mer-
Aproveitamos para desejar um
cado tem imposto à Medicina nas
feliz Ano Novo, que tenhamos
últimas décadas.
disposição e coragem para cons-
É necessário elevar a com-
truirmos em 2016 um ano muito
preensão de políticas de saúde,
melhor. Contem conosco nessa
economia e meio ambiente para
jornada.
podermos qualificar nossas intervenções. Os discursos pré-fabricados não têm sido suficientes para explicarmos e muito menos interferirmos nos fenômenos que envolvem nossa prática.
4 • Revista DR!
Revista DR! • 5
Ligia Bahia Vinicius Andrade/Agência Kah/Abrasco
Páginas Verdes
“Saúde é moeda de troca para estabelecer bases políticas” > “Nesse momento, a viabilidade, a perspectiva de efetivação dos SUS é longínqua”, avalia Ligia Bahia
Ligia Bahia é autoridade quando o assunto é sistema de saúde brasileiro. Professora Associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (onde também se graduou), com mestrado e doutorado em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz, participou da histórica 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986), que formatou as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS). Nesta entrevista, por e-mail, a professora destaca que as conferências de saúde ainda podem desempenhar papel relevante desde que “não se restrinjam a ser arena para apresentação das realizações dos governos”. Ela também afirma que o médico se afastou da reforma sanitária brasileira e do SUS ao preservar os múltiplos vínculos empregatícios, contrariando a proposta inicial do movimento de manter carreiras públicas, com dedicação exclusiva. Especialista em saúde coletiva, com ênfase em políticas de saúde e planejamento, Ligia Bahia fala ainda sobre as relações entre o público e o privado; saúde suplementar; condições de trabalho e atuação da mídia nas coberturas do setor. Ivone Silva
6 • Revista DR!
2015 foi ano de conferências de saúde. Essa instância de discussão ainda tem peso efetivo, assim como aconteceu na 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986? Penso que sim. Mas é preciso compreender os limites e as potencialidades de fóruns participativos para nem jogar fora o bebê com a água do banho nem nutrir uma expectativa ilusória. Quando a 8ª Conferência foi realizada não havia eleições presidenciais. A luta pela redemocratização foi construída de baixo para cima, da sociedade para as então questionáveis instâncias de representação política (havia até senadores biônicos) e ao poder executivo. Muita água passou por baixo da ponte, certamente a democracia ainda que incipiente - conside-
rada por alguns como delegativa (ou seja, delega-se para os eleitos o poder de decisão) para outros de baixa intensidade e para muitos pouco efetiva em relação aos direitos concretos de cidadania - modificou os padrões de atuação dos movimentos sociais no Brasil. Conselhos de saúde e conferências foram literalmente institucionalizados. Essa institucionalização teve efeitos negativos? Ao contrário do enorme esforço e desprendimento para organizar a 8ª conferência - os delegados foram de ônibus financiados pelas entidades participantes e ficaram alojados em estádios -, atualmente a infraestrutura é inteiramente paga por órgãos governamentais, propiciando um padrão de hospeda-
gem e alimentação totalmente distinto do obtido pelo uso de recursos próprios. Esse processo de institucionalização, de formalização de entidades de participação social, tem claras consequências. O reconhecimento do direito legítimo pelo Estado da democracia direta, em um país desigual, no qual estar próximo individualmente aos centros de decisão, ainda que de maneira subordinada, é sinal de distinção e melhoria objetiva de qualidade de vida, é um enorme desafio à preservação de autonomia. Portanto, o processo de organização das Conferências de Saúde pode desempenhar um papel relevante desde que não se restrinjam a ser mais uma arena para apresentação das realizações dos governos. Não Revista DR! • 7
Páginas Verdes
Ligia Bahia
é fácil porque autoridades governamentais municipais, estaduais e nacionais tendem a instrumentalizar as conferências ao compreendê-las como espaços laudatórios às suas gestões e não como fóruns de debate sobre o futuro da saúde no Brasil. A inversão de sentido chega a tal ponto que a saúde propriamente dita quase desaparece da pauta. O que ganha destaque é por um lado um conjunto de bandeiras abstratas e, por outro, reinvindicações com forte teor sindical. São legítimas, mas reiterativas. Por que a sra. afirma que a reforma sanitária é um movimento sem médicos? O movimento médico teve uma contribuição essencial para a formulação da reforma sanitária brasileira e do SUS. Mas se
8 • Revista DR!
afastou quando propôs a preservação dos múltiplos vínculos no lugar do que era a proposta de organização de carreiras públicas, bem remuneradas e com dedicação exclusiva. Muitas entidades médicas continuaram e até intensificaram relações com as Unimeds. E no afã de denunciarem más condições de atendimento nos serviços públicos tornaram-se porta-vozes do caos no SUS. Embora, a maior parte dos serviços privados no Brasil não possua condições tecnológicas mínimas, nem pessoal em quantidade e qualidade adequados. Enquanto isso, sanitaristas e técnicos da saúde pública ralavam muito para tentar efetivar o SUS. Quais as implicações desse afastamento? Embora não proposital, esse afastamento deixou marcas. As exi-
gências seletivas dos médicos em relação aos serviços públicos passaram a ser encaradas como desapreço pelo SUS e parte dos médicos viram os sanitaristas como construtores de um sistema de saúde pobre para pobres. Os esforços de aproximação existiram, mas foram pontuais. A ponderação sobre o movimento da reforma sanitária sem médicos refere-se a um paradoxo: é impossível mudar o sistema de saúde sem a intensa participação dos médicos, ainda que seja previsível a existência de conflitos e tensões. O que se assistiu recentemente nos Estados Unidos foram discussões acirradas de entidades médicas sobre o denominado Obamacare, inclusive há divisão a favor ou contra entre profissionais generalistas e os que atuam nas emergências dos hospitais e especialistas. Depois de 27 anos de existência, como a sra. avalia o SUS? Nesse momento, a viabilidade, a perspectiva de efetivação do SUS é longínqua. Seria, no mínimo, equivocado afirmar que depois de 27 anos de construção falta só um pouco para termos um Sistema Único de Saúde universal e de qualidade. O que ocorreu é que o setor privado cresceu e o SUS ficou responsável pelas duas pontas da atenção: a básica e de alto custo.
Ou em outros termos também se tornou fragmentado. A nota dissonante é que o setor privado também não se constitui como alternativa para a atenção à saúde, sequer para os ricos. Suas coberturas são restritas e tem que ser complementadas pela iniciativa pública. A crise econômica afeta o SUS, mas também limita as margens de atuação das empresas privadas. A hora é de afirmar a importância do público e não do privado. No entanto, os discursos oficiais insistem na velha e falida concepção da articulação entre público e privado sem definição sobre quem é subordinado a quem. Como garantir saúde pública com o mínimo de qualidade? Existe uma crise política, um imenso descrédito na gestão pública agravado pela visibilidade da corrupção. O subfinanciamento do SUS e gestões caracterizadas por descontinuidade administrativa, nomeações político-partidárias para cargos técnicos, clientelismo e mau uso dos recursos são consequências do descaso, da não priorização da saúde nas agendas governamentais. Trata-se a saúde como uma moeda de troca para estabelecer bases políticas de apoio e não como área prioritária de política social. Até as burocra-
cias dos ministérios da área econômica são mais valorizadas do que as da saúde. Temos muitas dificuldades não apenas para “fixar” médicos e enfermeiros, mas também para preparar e manter equipes que compreendam e saibam aplicar conhecimentos epidemiológicos e de gestão e planejamento. As descontinuidades administrativas na saúde são permanentes e se reduzem a programas governamentais, impedindo que a Saúde se torne uma política de Estado.
“O setor privado também não se constitui como alternativa para a atenção à saúde, sequer para os ricos” Com a mercantilização do setor, por meio dos planos privados, a saúde passou a ser secundária? Sem dúvida. A mercantilização é inerente a comercialização de planos de saúde. O pressuposto não é a necessidade de saúde e sim a capacidade direta ou indireta de pagamento. A dinâmica dos planos é a priorização mediante o maior pagamento e não a gravidade das condições clínicas. Atendimentos prolongados e muito caros tendem a ser transferidos para o SUS, que passa a funcionar como resse-
guro dos planos e não como o sistema de saúde para todos os brasileiros. Em hospitais que atendem planos privados e SUS, quando há agravamento das condições de saúde, é comum os cofres públicos arcarem com as despesas de pacientes que deram a entrada por meio de planos de saúde. Apesar de o SUS acabar arcando com os tratamentos mais complexos (e caros), o que se vê na mídia é uma imagem muito negativa do Sistema. Como a sra. avalia essa cobertura dos meios de comunicação? A mídia repercute uma imagem negativa do SUS que é muito disseminada na sociedade brasileira. Considero as coberturas da mídia comercial assimétricas porque raramente abordam problemas que ocorrem no setor privado. Ainda convivemos com situações como câmaras/gravações dentro de estabelecimentos públicos, focando pacientes em condições constrangedoras, como se a exposição pública da dor fosse trivial. O mesmo não ocorre nos serviços privados. A privacidade, a confidencialidade da relação médico-paciente são valores e práticas que ficam postergados em função dos escândalos sobre a precariedade do SUS. !
Revista DR! • 9
Saúde em Questão
Tecnologia
O “impeachment” do SUS Mário Scheffer Professor do Departamento de Medicina Preventiva
Aplicativos a serviço da saúde
da Faculdade de Medicina da USP
O governo errático, a recessão eco-
privado emplaca sua agenda.
conjunturais, há rupturas estru-
nômica, a direita conservadora
Agora abertos por lei ao capital
turais que poderão levar à uma
emersa e o golpe em marcha es-
estrangeiro, hospitais privados e
espécie de “impeachment” do
Neurocirurgião já participou da criação de 11 aplicativos que ajudam no diagnóstico correto e no tratamento adequado de doenças
traçalharam o Brasil em 2015, ano
filantrópicos ampliam a estratifi-
SUS, com a impugnação do regi-
em que o Sistema Único de Saúde
cação de redes e clientelas. Em ou-
me público, a cassação do direito
Leonardo Gomes Nogueira
(SUS) levou a pior.
tra frente, nova lei pode instituir
à saúde conquistado na Constitui-
plano de saúde compulsório para
ção, o impedimento da preserva-
empresas e trabalhadores.
ção dos valores positivos de um
O ajuste fiscal e o contingenciamento de R$ 13,4 bilhões do Ministério da Saúde no ano leva-
O escândalo da Hemobrás, que
riam serviços essenciais ao colap-
fez voar dinheiro pela janela, viu
so, produzindo mais filas, mais
nascer uma nova espécie: a dos sa-
sofrimento e mortes.
nitaristas corruptos.
sistema universal financiado publicamente. As deficiências do sistema de saúde brasileiro são motivo de
Estados e municípios reduzi-
Políticas setoriais foram lan-
inquietude social, porém as de-
ram convênios, atendimentos e
çadas às trevas: a de combate à
cisões sobre o futuro do SUS ocu-
internações, por causa da sangria
aids, abandonou seus componen-
pam espaço desinformado no
dos tributos relacionados à ativi-
tes de direitos humanos; a de saú-
debate público, como se viu na
dade econômica, que compõem
de mental foi entregue a um ex-di-
negação histérica a um imposto
fontes de custeio da saúde.
retor de manicômio; e a de saúde
redistributivo e democrático, ex-
Com impacto em 2016, a cons-
bucal passou a ser comandada por
clusivo para a saúde, nos moldes
titucionalização do subfinancia-
representante do mercado de pla-
da CPMF; ou na festiva Confe-
mento pela Emenda 86 vai impor
nos odontológicos privados.
rência Nacional de Saúde de 2015,
a subtração de recursos federais já insuficientes.
A demolição do SUS está aí: na hegemonia das organizações
reduzida a um ato de desagravo à presidente Dilma Rousseff.
Soará como estertor do SUS a
sociais na gestão, na diminuição
A privatização da saúde é pro-
manutenção da Desvinculação
de equipamentos e leitos públicos,
vável que se mantenha como op-
de Receitas da União (DRU) até
inclusive de UTI, no crescimen-
ção política predominante, o que
2023, combinada à utilização, pelo
to dos gastos privados com saúde
levará ao crescimento de um sis-
governo, de acordo com seus inte-
acima dos patamares de gastos
tema de saúde paralelo, segmenta-
resses, de até 30% das receitas de
públicos, nos incentivos fiscais e
do, excludente, caro e ineficiente.
contribuições sociais que deviam
regulatórios para a expansão do
Sem mobilização social mais
ser usadas em boa parte para a
mercado de planos de saúde, e
ampla a partir da rearticulação
saúde.
na delegação, ao setor privado, da
das forças que ainda restam em
formação de profissionais.
defesa do SUS não será possível
Em tempos de governo fraco e parlamento “vendido” o setor 10 • Revista DR!
Não são apenas circunstâncias
virar esse jogo.
Ter dor de cabeça é comum. Mas não é normal, ressalta a Sociedade Brasileira de Cefaleia. Algo tão corriqueiro que motivou o neurocirurgião Júlio Pereira a criar um aplicativo (App) para ajudar pacientes que sofrem desse mal a ter um registro preciso das suas crises e depois compartilhar esse histórico com o seu médico (auxiliando no diagnóstico correto da doença). “Eu sempre gostei muito de tecnologia”, diz o médico formado pela Universidade Federal da Bahia. Ele conta que o interesse por esses aplicativos começa, sobretudo, durante a sua residência na Santa Casa de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, entre os anos de 2008 e 2013. Desde então, ele participou da criação de 11 aplicativos médicos relacionados ao campo da neurocirurgia. Para usá-los, no entanto, é necessário ter um smartphone. Foi entre 2011 e 2012 que, em parceria com uma empresa de tecnologia de Campina Grande (PB), ele foi um dos criadores de dois aplica-
> “Eu sempre gostei muito de tecnologia”, diz o médico Júlio Pereira
tivos precursores: “Dor de Cabeça” e “Epilepsia”. Os nomes (bastante comuns) não foram um problema, afinal, na época, ainda existiam poucos aplicativos do tipo no país. O “Dor de Cabeça” é o mais usado, conta Pereira. Foram, até o momento, 103 mil downloads (60% dos quais a partir do Brasil e 40% fora). A maioria dos seus usuários, nos comentários e avaliações disponíveis na internet, o aprova. Ao menos na versão brasileira do App (já que ele é bilíngue; com versões em inglês e português). A ideia para o “Epilepsia” surgiu a partir da experiência do pai de um paciente, que gravou como eram as crises do filho (já que, muitas vezes, avalia o médico, é difícil descrever algo complexo e estressante como uma crise de epilepsia). Entre as funcionalidades desse aplicativo estão: cadastro dos medicamentos utilizados, alarme para lembrar o horário de tomar os remédios, a filmagem e o registro das crises. “A gente juntou tudo o que um
paciente de epilepsia precisa em um aplicativo”, garante. Para os pacientes, todos os aplicativos podem ser baixados de graça. Há outros, no entanto, dirigidos aos médicos e estudantes de medicina que são pagos. O neurocirurgião cita o “Craniotomia”, que oferece aos profissionais da área, entre outras coisas, noções básicas da anatomia da superfície encefálica.
App É um programa criado para desempenhar uma tarefa específica. Como ele possui uma aplicação particular (ou exclusiva), esse tipo de programa também ficou conhecido como “aplicativo” (derivado da palavra “aplicação”).
Revista DR! • 11
Capa
Atuação feminina
Com licença, esse lugar é nosso Elas serão a maioria entre os profissionais de medicina no Brasil em pouco mais de dez anos; já são maioria entre as faixas mais jovens (56,2% até 29 anos), mas ainda enfrentam preconceito, desde o processo de seleção para residência médica, quando disputam vagas para especialidades de predominância masculina, até o mercado de trabalho onde ganham, em média, menos do que os homens Nádia Machado
A 12 • Revista DR!
s mulheres são maioria
que embora seja uma profissão
entre os habitantes do
predominantemente masculina,
Brasil e nos cursos de ní-
já supera a quantidade de ho-
vel superior. No mercado de tra-
mens entre as faixas mais jovens
balho elas estão ganhando espaço
(56,2%), segundo o relatório, de
gradativamente, quase se igua-
2015, da pesquisa Demografia Mé-
lando ao número de homens ocu-
dica no Brasil), o que demonstra
pados. Essa transformação social
um processo de feminilização.
que aumenta o acesso das mulhe-
Na pesquisa anterior, reali-
res também reflete em mudanças
zada em 2013, há a projeção de
no perfil do médico brasileiro,
que elas serão a maioria em 2028,
zação das profissões é chave para
Determinantes históricos
imaginar o desmonte das políti-
A divisão de gênero no estudo da
cas e micropolíticas de poder que
medicina é analisada pelo médico
condenam homens e mulheres a
Joffre Marcondes de Rezende, no
determinados tipos de trabalho
artigo O machismo na história do
apenas por serem portadores de
ensino médico. “Era uma profissão
um determinado aparelho ana-
inadequada à mulher por razões
tômico-fisiológico diferente”, de-
de ordem moral. Quando muito
fende Silvia.
admitia-se a colaboração no cui-
Os tipos de trabalho determinados para homens e mulhe-
dado aos doentes como enfermeira”, escreveu o autor.
res, argumenta Juliana Salles,
Devido a essa construção so-
secretária de Finanças do Sin-
cial, as primeiras médicas que
dicato dos Médicos de São Paulo
se formaram, no final do sécu-
(Simesp), são resultado de uma
lo 19, tiveram dificuldade ou fo-
construção social patriarcal, que
ram impossibilitadas de atuar
faz distinção do papel da mulher
na área. Juliana Salles enfatiza
no âmbito da sociedade.
um dos casos citados no texto de
A médica sanitarista Lilia
Rezende: “Entre as primeiras mé-
ocupando 50,23% dos postos de
Blima Schraiber, professora da
dicas brasileiras estava Ermelin-
trabalho médico. Em 2050, a pers-
Faculdade de Medicina da USP
da Vasconcelos, que se dedicou
pectiva é de que serão quase 500
(FMUSP), que desenvolveu es-
à obstetrícia. Em sua formatura,
mil mulheres médicas no país,
tudos sobre a violência contra a
Ermelinda recebeu uma crônica
o que representará 55,66% (esse
mulher, segue a mesma linha de
do historiador Silvio Romero, sob
dado não foi atualizado em 2015).
pensamento e explica como essa
o título: Machona. O texto conti-
Esse fenômeno do aumen-
segmentação foi imposta. “A me-
nha as seguintes palavras: ‘Esteja
to quantitativo de mulheres no
dicina foi construída como uma
certa a doutora, que os seus pés
exercício de uma profissão é cha-
profissão que se vale da ciência. E
de machona não pisarão o meu
mado, por alguns estudiosos, de
a ciência era uma prática dos ho-
lar’. Tempos depois, Ermelinda
feminilização. É o caso da soció-
mens, porque eles podiam traba-
foi chamada para fazer o parto da
loga e professora da pós-gradua-
lhar fora, estudar e circular nos
mulher de Silvio Romero. Na oca-
ção do curso de Serviço Social, da
espaços públicos”, explicou a mé-
sião mostrou-lhe um recorte de
Universidade de Brasília (UNB),
dica durante debate realizado no
jornal que guardava consigo, com
Silvia Cristina Yannoulas. Ela
Simesp, em julho, sobre o tema
a referida crônica”, conta.
defende que os termos “femini-
Medicina: profissão feminina.
Para Juliana Salles, com o
lização” e “feminização” são dis-
Lilia explica que à mulher era
triunfo da biologia e a ascensão
tintos, sendo o segundo referente
limitado apenas o espaço priva-
do poder médico no século 19 e
à transformação da profissão ao
do, ou seja, sua casa. “Um am-
mais tarde com o controle da na-
adquirir características femini-
biente que não possui regras, por
talidade, a mulher foi identifica-
nas. “Acreditamos que o estudo
isso é desvalorizado pela socieda-
da como segmento de atuação na
da feminização e da masculini-
de”, argumentou.
medicina: primeiramente, consRevista DR! • 13
Capa Atuação feminina
01 • Diana de Santana teve que lidar com a presença maciça de homens na residência em neurocirurgia 02 • Para Denize Ornelas, secretária-geral do Simesp, preconceito compromete direitos trabalhistas adquiridos pelas mulheres 03 • “Em pleno século 21, mulheres ainda são questionadas sobre planos pessoais”, critica Juliana Salles, secretária de Finanças do Sindicato
01
02
03
tituído na saúde da mulher, que
nham menos, cerca de 70% do que
quanto os homens, quando con-
profissionais da área de saúde. Ela
meiro ano da faculdade é reforça-
se tornou a área mais possível
é pago aos homens para a mesma
correntes às mesmas vagas, não
contou que a mãe de uma pacien-
do o discurso velado de que para
para as médicas atuarem naquele
função. “A própria divisão dos
são questionados de tais inten-
te, de uma colega infectologista,
serem cirurgiãs ou ortopedistas,
período. “Esse fato é importan-
cargos de chefia entre mulheres
ções”, rechaça a sindicalista.
disse recente e explicitamente: “É
elas precisam deixar de lado suas
te para entender a aceitação das
e homens indica claro desequilí-
A médica Diana Lara Pinto
por isso que eu acho que mulher
vidas pessoais, terem posturas
mulheres médicas, cada vez mais,
brio - se mais homens são chefes
de Santana nadou contra a maré
não deveria ser médica.”
masculinizadas e ainda se sub-
nos nichos reconhecidos pela so-
ganham mais gratificações e, con-
imposta há anos: fez residência
Das 53 especialidades médi-
ciedade como femininos. Porém
sequentemente, maiores salários,
em neurocirurgia, especialida-
cas apenas 15 têm mais mulheres
hoje, defendemos que não existe
forçando uma reprodução do pa-
de majoritariamente masculina.
que homens entre os médicos em
Por outro lado, Denize criti-
O termo sexo refere-se à dife-
especialidade
drão”, argumenta Diângeli Soa-
No período da especialização, no
exercício. “Os homens são maio-
ca teorias que defendem que a
rença biológica entre homem e
para homem ou mulher, a escolha
res, diretora do Simesp.
Hospital das Clínicas da FMUSP,
ria nos segmentos cirúrgicos e
maior presença de mulheres nas
mulher. Já o gênero, conforme
deve ser o desejo de cada pessoa,
Outra forma de segmentar as
teve que lidar com a presença ma-
nas urgências e emergências,
especialidades do cuidado seria
citado pela professora Lourdes
nunca imposta”, explica Juliana.
especialidades, segundo Juliana
ciça de homens - dos cerca de 30
como ortopedia”, explicou Mário
um benefício para o exercício de
Sexo ou gênero?
pré-determinada
meterem ao assédio moral e sexual”, enfatiza.
Salles, é a seleção para vaga de
residentes, apenas três eram mu-
Scheffer, coordenador da pesqui-
uma medicina mais humaniza-
go sobre A transversalidade de
Formação seletiva
residência, já que alguns precep-
lheres - o que não a impediu de
sa Demografia Médica e professor
da. “Confundem com frequência
gênero nas políticas públicas,
Lourdes Maria Bandeira, profes-
tores, durante as entrevistas, con-
seguir adiante.
da FMUSP, em debate realizado
os conceitos de materno e femi-
“é constitutivo das relações so-
sora titular do departamento de
sideram as pretensões das candi-
Diana, porém, reconhece que
no Simesp.
nino, capacidade de cuidado e
ciais baseadas nas diferenças
Sociologia da UNB, que foi secre-
datas quanto ao matrimônio e/ou
desde que começou a atuar no
A secretária-geral do Simesp,
abstração. Por consequência, di-
percebidas entre os sexos como
tária-executiva da Secretaria de
maternidade durante o período
mercado de trabalho jamais foi
Denize Ornelas, defende que é
recionam as mulheres para ati-
o conjunto de normas, valores,
Políticas para Mulheres da Pre-
de especialização como requisitos
alvo de preconceito pelo fato de
necessário contrapor a ideia do
vidades que pareceriam natural
costumes e práticas em que a
sidência da República (2012-2015),
limitantes à atuação profissional
ser mulher. “Por enquanto”, res-
senso comum que, por ser mu-
e desejado, propondo uma conci-
diferença biológica entre ho-
destaca que os homens também
em determinadas áreas. “Em ple-
salta. A neurocirurgiã disse, no
lher, a estudante está predisposta
liação entre a condição feminina
mens e mulheres é cultural-
tendem a procurar as especiali-
no século 21, mulheres ainda são
entanto, que quando isso acon-
a escolher determinadas especia-
e o exercício profissional”, analisa
mente significada”. Ou seja,
dades de maior prestígio e mais
questionadas sobre a vontade de
tece (pelas histórias que lhe são
lidades e analisar o papel social
e completa: “Isso se reflete no de-
gênero é a construção social
vantajosas do ponto de vista
ter filhos e planos pessoais, como
contadas), o preconceito contra
que a medicina, como instituição
bate dos direitos trabalhistas das
atribuída a cada um dos sexos.
econômico. O que levanta outra
se tal fato fosse interferir nega-
médicas parte de pacientes, acom-
historicamente masculina, repre-
mulheres que escolhem ser plan-
questão: as mulheres ainda ga-
tivamente na sua formação, en-
panhantes ou ainda de outros
senta nessa decisão. “Desde o pri-
tonistas ou emergencistas - áreas
Maria Bandeira, em seu arti-
14 • Revista DR!
Revista DR! • 15
Capa
Atuação feminina
vimento de maior presença das
Médicas ainda escutam coisas como “mulheres são fracas”
mulheres na prestação de serviço
Ivone Silva
Aleitamento Na medicina, também há um mo-
na área pública, mas nem todas desfrutam dos mesmos direitos. Na questão da licença-maternidade, por exemplo, há uma diferença importante para as mulheres contratadas pelas organizações sociais (OSs): enquanto as profissionais da administração direta têm direito a 180 dias para amamentar, as das OSs têm apenas 120 dias. “Independentemente se forem servidoras públicas (médicas, enfermeiras, > “À mulher era limitado apenas o espaço privado”, explica Lilia Blima. “Há um claro discurso em detrimento do aumento do número de mulheres na medicina”, diz Diângeli Soares
nas quais, frequentemente, são
nor flexibilidade para múltiplos
e histórica do ponto de vista dos
psicólogas etc) ou contratadas por organizações parceiras, não faz sentido que essas mulheres amamentem só quatro meses quando
minimizadas pelas próprias mu-
vínculos. O período coincide com
valores, que determinam que as
elas próprias dão a orientação so-
lheres. E se comprometem a re-
a ampliação da formação femini-
mulheres
bre o aleitamento exclusivo”, pon-
tornar precocemente da licença-
na na medicina, portanto, parece
responsáveis pela reprodução. “É
maternidade, por exemplo, como
lógico que elas estejam ocupando
como se o homem não tivesse seu
um mecanismo para se equiparar
esses empregos”, pondera.
A diretora do Simesp, Diânge-
inteiramente
dera Denize Ornelas. O Simesp está engajado na de-
papel nesse processo; e está an-
fesa da licença-maternidade de 180
corado pela legislação brasileira,
dias, pois acredita que trabalho e
Consequências no trabalho
que concede ao homem apenas
maternidade podem sim formar
A socióloga Lourdes avalia que
cinco dias de licença-paternida-
uma bela parceria. A qualidade de
às condições de trabalho masculinas”, destaca a médica.
sejam
li Soares, critica o discurso de que
o empregador do setor privado
as mulheres acabam tendo me-
dá preferência à contratação de
No serviço público (lê-se ad-
mentação exclusiva até o sexto mês,
nor carga horária trabalhada em
profissionais homens. “A empre-
ministração direta), apesar da
conforme preconizado pela Orga-
virtude das licenças e do menor
sa não quer ter faltas, não quer
mulher ter a garantia da licen-
nização Mundial da Saúde (OMS),
de”, critica.
vida do bebê, garantida pela ama-
número de vínculos. “É um claro
contratar alguém para cobrir a li-
ça-maternidade de 180 dias (60
pode e deve ser uma responsabili-
discurso em detrimento do au-
cença-maternidade”, completa. É
dias a mais que o garantido no
dade compartilhada por todos.
mento do número de mulheres na
o que constata pesquisa do Insti-
setor privado), existe um critério
Numa primeira iniciativa, o
medicina”, diz e completa: “Mas é
tuto Brasileiro de Geografia e Es-
de isonomia para a contratação,
Sindicato pressionou os órgãos
frágil a associação dessas questões
tatística (IBGE) sobre Mulher no
não fazendo assim distinção se é
públicos a cobrarem das organi-
ao gênero. Desde a década de 1970,
Mercado de Trabalho: das vagas
homem ou mulher no ingresso
zações sociais da Saúde adesão ao
a medicina vem passando por um
com carteira assinada no setor
por concurso público. Isso reflete
programa Empresa Cidadã, que
fenômeno de proletarização, o
privado, 59,6% são ocupadas por
no número de mulheres ocupa-
garante a licença-maternidade
que implica numa maior oferta de
homens, e dos postos sem carteira
das que atuam no setor público,
estendida para viabilizar o aleita-
postos de trabalho assalariados,
assinada, eles representam 59,5%.
22,6%, enquanto os homens são
mento materno exclusivo durante
com carga horária de 20 a 40 ho-
A professora atribui o ma-
pouco mais de 10%, segundo da-
180 dias.
ras semanais, o que permite me-
chismo a uma construção social
16 • Revista DR!
Especialista em cirurgia-geral
vaga na cirurgia-geral de um
e endoscopia digestiva, a mé-
serviço público, foi afrontada
dica Roberta Tsuboi Rodrigues
por um dos chefes de serviço
contou à revista DR! um pouco
que duvidou da sua capacida-
da sua experiência em uma
de para passar na prova. E dis-
área ainda considerada mas-
se ainda: ‘se caso ela obtivesse
culina. Para ela, o meio médico
a nota, era para ter ciência
é em si machista, mesmo que,
de que não gostavam de mu-
algumas vezes, de forma vela-
lher naquele serviço, porque,
da. “Percebemos isso desde a
segundo ele, mulheres não
faculdade”, diz.
aguentam, são fracas e ela te-
Apesar de estarem conquis-
ria de provar todos os dias que
tando espaço na medicina,
era melhor que os homens
ainda são minoria em todas as
que estavam lá’. Isso não a as-
especialidades cirúrgicas, in-
sustou, ao contrário, Roberta
clusive na cirurgia-geral, que
passou na prova e assumiu a
tem apenas 18,4% de mulheres.
função.
A urologia é a área com menor
Na
residência,
metade
participação feminina (1,86%).
do serviço era composto por
Os dados são da pesquisa De-
mulheres. “Foram dois anos
mografia Médica no Brasil, di-
importantes, de muito apren-
vulgada no início de dezembro.
dizado, éramos empoderadas
Contrariando as estatísti-
- nunca aceitamos essas colo-
cas, Roberta escolheu a cirur-
cações dos homens e ninguém
gia-geral. A partir daí passou a
precisou mostrar essa capaci-
sentir certo preconceito, sendo
dade pra ninguém, era natu-
sempre questionada se real-
ral, fazíamos nosso serviço e,
mente era aquilo o que gosta-
obviamente, era tão bem feito
ria de fazer. “O interessante é
quanto o de qualquer residen-
que as pessoas relacionam isso
te homem”, destaca.
ao fato de a mulher constituir
O preconceito e o machis-
família, ser mãe etc. E não tem
mo ainda persistem, são pra-
nada a ver, porque a constitui-
ticados por chefias, colegas
ção familiar tem o arranjo que
de profissão e pacientes - que
a família escolher”, diz.
ainda perguntam onde está o
A médica também passou
médico. “Por isso, é importante
por situações constrangedoras
nos colocarmos como mulher
quando, ao concorrer por uma
e feminista”, conclui. !
dos do IBGE. Revista DR! • 17
Crônica Célio Luigi
Eu e a Medicina
Das vidas que salvamos Pedro Henrique de Moraes Cellia é especialista em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina da USP e residente em Cardiologia no Instituto do Coração – Incor
C
resci em um berço médico. Meu pai é médi-
motivos que nos movem, as razões que deveriam
justos. Uma vez cuidadores somos seres especiais.
co. Meu pai sempre sonhou que eu seguisse
nos mover. Hoje entendo que não podemos “salvar
Talvez exista sim algo divino em ser cuidador, do
seu legado e, mesmo que se policiasse para
vidas”, ou pelo menos raramente o faremos. “Salvar
mesmo modo que em ser mãe ou ser amor.
não transparecer seu desejo, fazia de mim um mé-
vidas” é algo raro na vida de um médico, é preci-
Não quero com isso parecer simplista e minimi-
dico em potencial... aos poucos. Entrei em um cen-
so humildade para reconhecer. No que consta em
zar o compromisso humano que envolve a medici-
tro cirúrgico antes mesmo do meu ensino médio.
meus parcos domínios do conhecimento, 100% das
na, é preciso estar apto para ser médico. É preciso
Sempre acreditei que existia um ar divino na me-
pessoas morrem ao longo de uma vida. Apesar de
estar preparado. Conheço inúmeros exemplos de
dicina, como um toque de Deus; como gostam de
todo avanço da indústria farmacêutica, dos méto-
bons cuidadores despreparados e de médicos com
dizer: medicina é um sacerdócio! Fechava os olhos
dos diagnósticos e técnicas cirúrgicas, apesar de
uma bagagem vasta mas desinteressados em cui-
e imaginava as vidas que salvaria quando fosse mé-
nossos esforços como médicos, o curso final da vida
dar; acredito que ambos são deletérios ao ser hu-
dico...
de todo ser humano não foi alterado.
mano tão importante que chamamos de paciente.
Alguns dias já se passaram desde minha for-
Mas podemos sim ser inesquecíveis na vida de
Ser cuidador nos difere dos não cuidadores; isso
matura e muita coisa mudou - para melhor. Hoje
alguém; podemos ser cruciais em suas vidas, pode-
envolve escutar, esperar, fazer-se presente, conside-
sou mais apaixonado pelo que faço, sofro de um
mos ser importantes. Para isso descobri, após me
rar valores contrários aos seus, saber ouvir, saber
amor realista, não tenho ilusões vagas. Hoje sou
formar, o peso da palavra cuidar. Cuidar é a essên-
calar, saber dizer sim e saber dizer não. Ser cuida-
mais médico do que ontem. Aprendi com o tempo o
cia do que fazemos de bem e do que deveríamos ter
dor exige humildade de reconhecer erros e estar
humanismo que envolve a palavra medicina, o hu-
feito quando fraquejamos. Uma vez cuidadores so-
presente para repará-los. Ser cuidador envolve,
manismo que envolve a relação entre o médico e o
mos hábeis para ajudar e assim fazer a diferença.
antes de mais nada, se importar com o ser huma-
paciente. Aprendi que somos feitos de carne, osso,
Quando nos empenhamos em cuidar entendemos
no. No exercício de cuidar somos mais eficientes
respeito e consideração ao próximo.
melhor nossos pacientes e suas enfermidades, so-
em curar, mais hábeis em amenizar o sofrimento
mos mais precisos e eficientes, mais humanos e
alheio. Cuidar nos salva enquanto médicos.
Consigo enxergar com muito mais clareza os 18 • Revista DR!
Revista DR! • 19
Sustentabilidade
O lixo real do mundo virtual Lixo eletrônico pode chegar a 50 milhões de toneladas em 2017, segundo informações da ONU
Nádia Machado > O descarte indevido agride o meio ambiente e a saúde. Resíduos podem (e devem) ser reaproveitados
O
crescimento da indústria
responsáveis por esse número. A
de resíduo pode resultar em sé-
antibióticos entrarem em contato
nários tinham todo aquele mate-
de eletrônicos está geran-
ONU já havia dado o alerta sobre
rios prejuízos ao meio ambiente.
com esses metais pode-se tornar
rial para descartar, imagine toda
do um sério problema
a seriedade do problema em 2010.
“O solo contaminado com grande
mais difíceis de combatê-los.
a comunidade da universidade e
ao meio ambiente, por causa do
Na época, o levantamento de-
concentração de metais pesados
descarte inadequado dos resíduos
monstrou que os brasileiros são os
(chumbo, mercúrio etc) perde a
Reúso
dos participantes do projeto André
que se tornam obsoletos (por apre-
que mais produzem lixo eletrôni-
usabilidade, não pode se plantar
A preocupação com os riscos do
Rangel, hoje técnico de manuten-
sentar defeitos ou pela troca para
co, por pessoa, entre os mercados
nem viver nesses locais”, explica o
descarte indevido incentivou um
ção do Cedir.
uma tecnologia mais avançada).
emergentes: são cerca de meio
professor Mario Julio Avila-Cam-
grupo de funcionários da Univer-
Os materiais entregues no local
Estudo do Programa da Organiza-
quilo anualmente. Supera até a
pos, do departamento de Micro-
sidade São Paulo (USP) a realizar
passam por uma triagem. São se-
ção das Nações Unidas para o Meio
China, que tem descarte per capi-
biologia, do Instituto de Ciências
uma atividade para recolher peças
parados em dois grupos: o que dá
Ambiente, apresentado em maio
ta de 230 gramas.
Biomédicas da USP.
de informática no dia do meio am-
para reaproveitar e o que não tem
deste ano, estima que, em 2017, será
Além do grande volume, outro
Segundo o professor, os riscos
biente, 5 de junho. O ano era 2009.
mais jeito e deve ser encaminhado
atingida a marca de 50 milhões de
sério problema é a forma como ele
para o ser humano ocorrem se o
Em apenas um dia, com o envolvi-
para reciclagem. O departamento
toneladas de lixo ele-
é descartado. Apenas 10% de todo o
contato (com alta concentração
mento de cerca de 200 trabalhado-
conta com técnicos de manuten-
trônico no mundo.
lixo eletrônico produzido no mun-
desses metais pesados) for pro-
res da universidade, juntaram cer-
ção de informática para fazer os
Brasileiros são os que mais produzem lixo eletrônico entre os mercados emergentes 20 • Revista DR!
do entorno”, indagou na época um
O mesmo estudo
do é descartado de forma correta.
longado, causando sérios danos à
ca de 5 toneladas de lixo eletrônico.
consertos. Após recuperados, esses
diz que, atualmente,
Os outros 90% são jogados junto ao
saúde, atingindo, principalmen-
Seis meses depois a iniciativa
equipamentos são doados para es-
são cerca de 41 milhões
lixo comum ou comercializados
te, fígado, rins e sistema nervoso.
deu origem ao Centro de Descarte
colas, ONG’s etc. Até o final do pri-
de toneladas e o Bra-
de forma ilegal.
Outro problema apontado é que
e Reúso de Resíduos de Informáti-
meiro semestre deste ano, quase 2
se microrganismos resistentes a
ca (Cedir). “Se apenas esses funcio-
mil itens já haviam sido doados.
sil é um dos grandes
O descarte indevido desse tipo
Revista DR! • 21
História Marina Bustos
Sustentabilidade
120 anos na saga da Academia de Medicina de São Paulo Helio Begliomni Membro da Academia de Medicina de São Paulo; urologista do Hospital do Servidor Público Estadual e do Imuvi; e associado ao Simesp
> André Rangel, técnico de manutenção, explica que o Cedir recebe, por mês, entre 5 a 10 toneladas de material eletrônico
A augusta Academia Nacional de
tuto Histórico e Geográfico de São
sa da classe, tais como o Conselho
Medicina caminha com solidez
Paulo (1894) e fundador da cadei-
Regional de Medicina do Estado
inquebrantável para seu bicen-
ra nº 3 da egrégia Academia Pau-
de São Paulo, a Associação Pau-
tenário de fundação. Contudo,
lista de Letras (1909).
lista de Medicina, o Sindicato dos
pouquíssimas são as entidades
Nestes 120 anos de atuação
Médicos de São Paulo, o Conselho
médicas brasileiras que tenham
ininterrupta da Academia de Me-
Federal de Medicina e a Associa-
Atualmente, o espaço de 450
Rangel cita ainda outro exem-
ultrapassado uma centúria de
dicina de São Paulo (1895-2015):
ção Médica Brasileira. Ademais,
metros quadrados recebe entre
plo de consumo desenfreado, a
existência ininterrupta. Dentre
houve 87 presidentes e 98 man-
muitos de seus membros igual-
5 e 10 toneladas de lixo eletrôni-
grande quantidade de troca de
elas têm-se a Sociedade de Me-
datos, tradicionalmente anuais,
mente se destacaram ou se desta-
co por mês, entre materiais de
monitores e televisores que pos-
dicina de Pernambuco, fundada
que, a partir de Virgílio Alves de
cam como escritores, pensadores
informática e telecomunicações.
suem tubo de imagem por uma
em 1841, e a Sociedade de Medi-
Carvalho Pinto (1967-1968), 65º
e intelectuais de escol, pois tam-
Os resíduos vêm das unidades da
tecnologia mais avançada como:
Cedir
cina e Cirurgia do Rio de Janeiro,
presidente, se tornaram bienais.
bém pertenceram ou fazem parte
USP capital, de alunos, professo-
plasma, LCD, LED, entre outros.
Recolhe apenas lixo eletrônico
fundada em 1886.
res, funcionários e da sociedade
“Cada monitor tem em média
de informática e telefonia. Não
em geral. “Não aceitamos resídu-
sete quilos de chumbo nos tu-
os de empresas porque parte do
bos”, alerta.
descarte precisa de tratamento
Onde descartar
Ao longo de sua profícua exis-
de renomadas entidades cientí-
Nesse contexto deve ser evi-
tência, a Academia de Medicina
ficas internacionais, assim como
aceita materiais de empresas.
denciada e exaltada, particular-
de São Paulo tem albergado des-
de silogeus literários e culturais,
De segunda a sexta, das 8h às
mente neste ano em que comemo-
de o seu nascedouro ilustres es-
que lhes conferiram significati-
12h e das 14h às 17h. Av. pro-
ra seu 120º aniversário, a insigne
culápios que se destacaram no
vas honrarias e homenagens.
especial - como baterias, pilhas,
Processo de reciclagem
fessor Almeida Prado – Cidade
Academia de Medicina de São
exercício da profissão; que atua-
Esse inestimável e multiforme
tubos de monitores - para a des-
Os equipamentos doados rece-
Universitária – Butantã – SP
Paulo, surgida como Sociedade de
ram ou que atuam como cientis-
cabedal curricular – ético, cientí-
contaminação, e esse processo é
bem um número de identifica-
(Prédio da Prefeitura da USP).
Medicina e Cirurgia de São Paulo,
tas, pesquisadores e professores
fico, histórico, educacional, cul-
pago para uma empresa especia-
ção do próprio Cedir, para con-
11 3091-8237 e 3091-8238
em 7 de março de 1895. Seu funda-
universitários ou em hospitais
tural, intelectual e profissional,
lizada”, explica Rangel.
trole do ciclo de vida útil dos
dor e primeiro presidente foi Luiz
de ensino; que dirigiram ou di-
dificilmente passível de se reu-
Pereira Barreto (1840-1923), reno-
rigem
especializados,
nir em quaisquer entidades da
mado médico, político, filósofo e
hospitais e faculdades, ou que
classe, tem-se constituído secu-
cafeicultor. Natural de Resende
governaram universidades; que
larmente – sem dúvida alguma!!!
O técnico atribui a grande
eletrônicos. O que não tem con-
quantidade de lixo eletrônico ao
serto pode tomar diferentes ru-
crescimento do poder de consu-
mos. Os toners e cartuchos, por
mo das pessoas. “Quando alguém
exemplo, são devolvidos aos fa-
Outros pontos de coleta Ecobraz lixoeletronico.org.br
serviços
(RJ) e graduado na Faculdade de
desempenharam ou desempe-
– no maior patrimônio da Aca-
Sucata eletrônica sucataeletronica.com.br
Medicina de Bruxelas, Bélgica,
nham os mais diversos cargos e
demia de Medicina de São Paulo.
em 1865, radicou-se na capital
funções governamentais; que in-
Afortunadamente,
Cidadão Eco cidadaoeco.com.br
bandeirante após sua afamada
tegraram ou que integram com
similar e de rico lastro também
atuação na cidade de Jacareí (SP).
destaque inúmeras sociedades de
se encontra na honorável Acade-
compra um aparelho celular,
bricantes. As peças que possuem
em pouco menos de seis meses é
metais que podem contaminar
lançada no mercado uma versão
são enviadas para empresas es-
mais avançada e ele faz a troca,
pecializadas que fazem a des-
mesmo estando em perfeito esta-
contaminação e o descarte ade-
Aliás, Luiz Pereira Barreto foi
especialidades; que dignificaram
mia Nacional de Medicina e em
do de uso”, argumenta.
quado dos produtos.
também sócio fundador do Insti-
ou dignificam entidades de defe-
sodalícios congêneres!
22 • Revista DR!
patrimônio
Revista DR! • 23
Especial
Subfinancimento
Como vai a nossa saúde... Financeira? Com menos dinheiro para a saúde, governos garantem que a área não será prejudicada. Conheça a realidade de alguns dos principais hospitais de São Paulo
Leonardo Gomes Nogueira e Nádia Machado > Cortes nos orçamentos agravam uma situação que já é difícil. Subfinanciamento compromete atendimento
Tempos difíceis não virão, pois já
que o efetivamente gasto no ano
to 61.131, em 25 de fevereiro). Na
ção que já é difícil. Pois o inves-
chado por quase um dia e foi rea-
chegaram. Escreveu o economis-
passado.
ocasião, o governador disse que a
timento feito pelo Brasil na área,
berto após a chegada de insumos
ta Francisco R. Funcia, consultor
Em 2014, segundo a Contro-
saúde não seria prejudicada, mas
em termos percentuais do Produ-
e a liberação, por parte do gover-
do Conselho Nacional de Saúde,
ladoria-Geral da União, o valor
o decreto estabelece a redução
to Interno Bruto (PIB), é abaixo do
no estadual, de recursos da ordem
em artigo no qual avalia os im-
das despesas com saúde ficou em
em 5% das despesas com custeio
de países que adotam um sistema
de R$ 3 milhões.
pactos do chamado ajuste fiscal
R$ 93,85 bilhões. A conta, ainda
da pasta. “No total, os dois cortes
de saúde semelhante (público e
Iniciou-se, a partir daí, um
no financiamento das ações e
de acordo com o órgão do gover-
resultaram na redução de R$ 1,6
universal). É o chamado subfi-
jogo de “empurra-empurra” entre
serviços públicos de saúde.
no federal, inclui gastos diretos e
bilhão da saúde estadual”, afirma
nanciamento.
a Secretaria Estadual e o Minis-
transferências de recursos para
Eder Gatti, presidente do Simesp.
Desde o começo do ano, o governo federal cortou cerca de 13
estados e municípios.
bilhões de reais do orçamento
24 • Revista DR!
tério da Saúde. Na época, o então Reflexo
ministro Arthur Chioro apresen-
Secretaria de Estado da Saúde não
E qual o reflexo disso na saúde da
tou dados informando que o go-
A assessoria de imprensa da
do Ministério da Saúde previs-
Em São Paulo
confirmou qual foi o valor redu-
maior cidade do país? A revista
verno paulista teria deixado de
to para 2015. Em 22 de maio, foi
Os paulistas também enfrentam
zido, mas argumentou, por meio
DR! apurou a situação de alguns
transferir cerca de R$ 70 milhões
anunciado R$ 11,77 bilhões a me-
seu próprio ajuste. Em janeiro,
de nota, que o “contingenciamen-
dos principais hospitais de São
à Santa Casa. A administração
nos para as despesas do minis-
o Governo do Estado de São Pau-
to do orçamento previsto trata-se
Paulo. “A maioria deles recebe
paulista, por sua vez, disse ter fei-
tério. No mês de julho, um corte
lo divulgou o congelamento de
de medida prudencial, adotada a
verbas de diversas fontes”, infor-
to os repasses corretamente.
adicional de mais 1,17 bilhão.
R$ 6,6 bilhões do orçamento pre-
partir da perspectiva de menor
ma Eder Gatti, presidente do Sin-
No início do mês de agosto, o
De 103 bilhões de reais pre-
visto para custeio e investimen-
arrecadação e que na medida em
dicato dos Médicos de São Paulo.
provedor da instituição, José Luiz
vistos no começo do ano, agora
tos, estabelecido no decreto 61.061.
que a arrecadação avança, os re-
Esse é o caso da Santa Casa de Mi-
Setúbal, disse (por e-mail) à nossa
restam R$ 89 bilhões no caixa do
Um mês depois, o governador
cursos contingenciados são libe-
sericórdia de São Paulo.
reportagem que havia conseguido
Ministério da Saúde. Os dados
Geraldo Alckmin ainda impôs
são do Ministério do Planeja-
um corte adicional de cerca de
mento. Esse valor já é menor do
R$ 2 bilhões (por meio do decre-
Os sinais da crise apareceram
identificar que a Santa Casa acu-
De modo geral, os cortes, pro-
em julho de 2014, quando o pron-
mulava cerca de R$ 616 milhões
vavelmente, agravarão uma situa-
to-socorro da instituição ficou fe-
em dívidas; parte disso, R$ 275
rados”.
Revista DR! • 25
Especial Subfinancimento
milhões, com instituições finan-
Apesar de ter uma forma de finan-
Emílio Ribas
11 dias, foi motivada pelas cres-
Arthur Chioro negou que tenha
De acordo com dados da
ceiras. O restante são débitos com
ciamento diferenciada, por meio
No século 19, a varíola. No final do
centes dificuldades nas condições
ocorrido redução no orçamento
Controladoria-Geral da União,
dessa unidade, que é o hospital
o governo federal teria repas-
funcionários, fornecedores e go-
de contribuição compulsória de 2%
20, a Aids. Desde 1880, ainda que
de trabalho e aprendizagem. Na
verno. “Infelizmente a Santa Casa
sobre o salário dos trabalhadores
com outro nome, o Instituto de In-
época, de acordo com os grevistas,
universitário da Universidade Fe-
sado, até 16 de dezembro de 2015
estava parada há 10 meses, sem
estaduais, o Hospital do Servidor
fectologia Emílio Ribas se especiali-
os problemas decorriam da dimi-
deral de São Paulo (Unifesp).
(quando foi feita a consulta),
nada disso negociado”, argumenta.
Público Estadual (HSPE) também
zou em tratar portadores de doen-
nuição de verbas para a manuten-
ças infectocontagiosas.
ção do hospital.
No começo de outubro, a insti-
passa por crise.
Hoje o Hospital São Paulo é
mais de R$ 145 milhões para a
administrado pela organização
SPDM gerir o hospital. Em 2014,
tuição iniciou um processo de de-
De acordo com os trabalhado-
No começo deste século, profis-
Os cortes feitos pelos governos
social Associação Paulista para
segundo a mesma fonte, esse
missão que já afetou 1.397 traba-
res, o atendimento foi compro-
sionais de saúde relatam a falta de
federal e estadual, ainda de acor-
Desenvolvimento da Medicina
valor ultrapassou 105 milhões
lhadores, dos quais 184 médicos.
metido por conta de uma reforma
insumos, paralisações de trabalha-
do com os grevistas, teriam sido
(SPDM). Em sua página na inter-
de reais.
estrutural inacabada, que fechou
dores terceirizados da limpeza (por
de, respectivamente, 40% e 10% do
net, o hospital diz estar trabalhan-
Entramos em contato com a
HU-USP e HC
cerca de 180 leitos causando a dimi-
atraso de salários) e transtornos
valor inicialmente previsto.
do, nos últimos dois anos, “acima
assessoria de imprensa do hos-
A Universidade de São Paulo
nuição do número de cirurgias, in-
causados por uma ambiciosa obra
da sua capacidade financeira”.
pital. E não obtivemos resposta.
(USP) é responsável por 92% do
ternações e consultas. Por meio de
de 100 milhões de reais iniciada
financiamento do Hospital Uni-
em 2013. De acordo com Eder Gatti,
Em julho, o ainda ministro
Por um novo pacto federativo
O investimento feito pelo Brasil na Saúde, em termos percentuais do PIB, é abaixo do de países que adotam sistema de saúde semelhante
presidente do Simesp, metade dos
(sugestão que não foi recomen-
nota, a assessoria de imprensa do
pelo subfinanciamento. Em outras
Ele, em suma, propõe um
dada nem mesmo pela comissão
Instituto de Assistência Médica ao
áreas, porém, o Estado é ausente,
novo arranjo entre os entes fe-
montada pelo reitor para anali-
Servidor Público Estadual (Iamspe)
investe menos, como por exemplo,
derativos: municípios, estados
sar a proposta).
alega que, apesar dos leitos bloque-
em vigilância em saúde. A dengue
e governo federal. “Onde os três
versitário (HU). E devido à crise financeira da instituição, a partir do segundo semestre de 2014, o reitor Marco Antonio Zago propôs desvincular o hospital da universidade e transferi-lo para a Secretaria Estadual da Saúde
leitos do instituto está fechada por causa da reforma.
(sem um novo ente federativo)
de Pública, explica o que seria essa regionalização da distribuição do dinheiro: “Você não
“A principal ação de saúde do Es-
distribui entre estados, união e
tado de São Paulo é a manutenção
município, mas entre regiões de
de hospitais regionais ou de alta
saúde baseado no tipo serviço
complexidade, hoje prejudicada
ou demanda que ela tenha”.
Desde então, houve a redução
ados temporariamente, não houve
não nos deixa negar”, avalia Gatti e
aportam recursos, em um me-
de 213 funcionários do HU devido
redução do número de leitos do
continua: “Ele está ausente em seu
canismo de financiamento re-
ao plano de demissão voluntária
instituto de forma geral porque
papel de articulador. O repasse fi-
gional, avaliando demandas e
(PDV); 31 médicos pediram de-
foram contratados leitos em nove
nanceiro para os municípios é res-
regulando a oferta entre si na-
missão, 18 deles pelo PDV, acar-
hospitais da capital e do ABC.
trito. O Estado deveria ser o grande
retando na queda do número de
Há ainda problemas relaciona-
articulador entre os municípios,
dos à falta de medicamentos essen-
auxiliando-os em suas políticas de
profissionais,
ciais e insumos cirúrgicos. “Nosso
saúde”, critica.
foram bloqueados 20% dos leitos
maior interesse é que os problemas
A reportagem da revista DR! en-
de internação e 40% dos leitos
sejam resolvidos para que possa-
trou em contato com a assessoria
da UTI”, afirma Gerson Salvador,
mos prestar atendimento adequa-
de imprensa do Instituto Emílio Ri-
diretor do Simesp e vice-diretor
do”, expressa Rodrigo Ferrarese,
bas, subordinado ao governo pau-
clínico do hospital universitário.
representante dos médicos resi-
Salvador também informa que
dentes do hospital. De acordo com a
houve corte de recursos do Hos-
atendimentos.
quela região”, defende. Cada re> Paulo Fernando Capucci: “novos arranjos poderiam ter impacto positivo no SUS”
gião, explica, teria entre 500 mil a um milhão de habitantes (de-
O gestor em saúde Paulo Fer-
Para o ex-secretário da saúde
nando Capucci, mestre em ad-
de Guarulhos (entre 2005 e 2008),
Um novo pacto federativo
ministração pública e governo
é necessário que os governos dos
sem a necessidade da criação de
pela Fundação Getúlio Vargas,
três níveis firmem uma espécie
mais um ente federativo, res-
avalia que novos arranjos, ain-
de novo pacto federativo com base
salta. A ideia, diz Capucci, não é
lista, mas não obteve resposta.
da que com o mesmo volume de
em dois princípios fundamentais:
criar mais uma estrutura buro-
recursos, poderiam ter um im-
a regionalização do financiamen-
crática, mas garantir a melhor
assessoria de imprensa da institui-
Hospital São Paulo
pacto positivo no atendimento
to e a regulação, de fato, da oferta.
destinação do dinheiro e dos
pital das Clínicas da Faculdade
ção, os estoques de insumos aten-
No final de junho, os residentes
ao cidadão que procura o Siste-
Capucci, que é um dos direto-
insumos e recursos humanos
de Medicina da USP na ordem
dem adequadamente a demanda
do Hospital São Paulo paralisaram
de 20%.
de todos os serviços do HSPE.
suas atividades. A greve, que durou
“Com
menos
26 • Revista DR!
ma Único de Saúde (SUS).
res da Associação Paulista de Saú-
pendendo do local do país).
disponíveis. !
Revista DR! • 27
Novos Conceitos
Comunicação ampliada Uma série de mudanças está sen-
Sindicato. A TV Simesp está de
Simesp+
do promovida pela diretoria do
cara nova. Com matérias mais di-
Como forma de atender às necessi-
Sindicato para agilizar a presta-
nâmicas para esclarecer de forma
dades dos médicos, facilitando seu
ção de serviço e beneficiar o mé-
simples e clara as pautas em que
cotidiano e ofertando bons negó-
dico. O Simesp Relacionamento foi
a entidade está envolvida e sin-
cios, o Sindicato lançou o Simesp+,
implantado como um novo con-
tetizar os eventos realizados pelo
programa de benefícios que conce-
ceito de atendimento que deve
Sindicato.
de descontos exclusivos nas aquisi-
aprimorar a gestão da informa-
A revista DR! também passa
ção, dinamizando a comunicação
por transformações conceituais,
O Simesp+ busca, cotidiana-
geral com a categoria.
ções de serviços e produtos.
ganhando identidade visual mais
mente, parcerias com empresas
O departamento, criado espe-
moderna e conteúdo editorial
reconhecidas no mercado, dos
cialmente para acolher ligações
ampliado, com inclusão de novas
mais variados segmentos, que ofe-
e dúvidas do associado, tem como
seções. O Sindicato lançou ain-
recem capacitação profissional,
palavra-chave a integração, pois
da o Jornal do Simesp, publicação
investimentos, seguros, opções de
cabe a ele centralizar e fornecer
voltada, especialmente, para di-
lazer, além de descontos em ele-
aos médicos as informações pro-
vulgar as demandas e ações sin-
troeletrônicos, artigos esportivos,
vindas de todos os departamentos
dicais. “Embora indissociáveis, o
livraria, floricultura, entre outros.
e orientar soluções.
objetivo principal do jornal é tra-
Alguns benefícios são também ex-
No propósito de qualificar o
tar de fatos, o da revista é tratar de
tensivos aos dependentes dos mé-
diálogo com a categoria, os canais
ideias, e ambos potencializarem a
dicos associados.
de comunicação da entidade fo-
principal orientação desta Casa:
Acesse simesp.org.br/simesp+,
ram expandidos por meio da
ser um organismo facilitador da
faça o login usando CRM e senha,
modernizaçao do site, facebook e
defesa do médico e seu trabalho”,
e conheça, em detalhes, todos os
do Simesp Debate, que tem acon-
explica Gerson Salvador, secretá-
benefícios oferecidos por nossos
tecido regularmente na sede do
rio de Comunicação do Sindicato.
parceiros. É rápido e fácil.
28 • Revista DR!
Revista DR! • 29
Simesp por dentro
Simesp esclarece Associada
Campanha Salarial 2015
Preservação histórica
Todos os anos, o Simesp negocia com os representantes patronais o reajuste salarial para os médicos do setor privado. O objetivo é, além de garantir a correção inflacionária, que os médicos tenham aumento salarial. Entenda o processo da Campanha Salarial:
Helena Barbosa Lugão Dermatologista associada ao Simesp
Engajada no movimento médico desde a residência, à frente da Associação dos Médicos Residentes de Ribeirão Preto (Amererp), em 2010-2011, a dermatologista Helena Barbosa Lugão, associou-se ao Simesp, em junho do ano passado, durante o evento de posse da diretoria da nova gestão (2014> Carta Sindical emitida em 1941 reconhece oficialmente o Simesp
O documento mais antigo preser-
ciedade de Medicina e Cirurgia de
vado pelo Simesp é a Carta Sindi-
São Paulo - a primeira sociedade
cal, emitida em 1941 pelo Minis-
médica paulista, fundada em 1895,
tério do Trabalho. Ela reconhece
e transformada em Academia de
oficialmente o Sindicato dos Mé-
Medicina de São Paulo, no ano de
dicos de São Paulo como represen-
1954 (leia artigo sobre a história da
tante legítimo dos médicos.
Academia na pág. 23).
A fundação do Sindicato, em 28
Até 1946 o Sindicato estava cir-
de fevereiro de 1929, foi registrada
cunscrito ao município de São
na terceira edição da Revista São
Paulo. Somente em 1970 torna-se
Paulo Médico, de março de 1929. O
uma entidade estadual (excluindo
periódico relacionava o nome dos
vários municípios por já contarem
médicos fundadores da entidade.
com sindicatos médicos).
Sem sede, à época da fundação,
A Carta Sindical e a Revista São
as reuniões da comissão executi-
Paulo Médico são documentos que
va do Simesp eram realizadas na
resistiram ao tempo e ajudaram a
Santa Casa (um dos fundadores,
reconstruir a história do Simesp,
Synesio Rangel Pestana, era dire-
já que há escassez de fontes do-
tor clínico do hospital); enquanto
cumentais sindicais brasileiras, o
as reuniões ordinárias, abertas
que dificulta a organização e in-
aos filiados, realizavam-se na So-
terpretação de vestígios históricos.
30 • Revista DR!
“
O Sindicato realiza assembleia com os médicos para ouvir as reivindicações da categoria e, assim, formular a pauta que será enviada ao sindicato patronal.
Entre os itens solicitados estão o direito a cinco dias abonados para congressos, reajuste
2017). “Conheci alguns dos no-
do vale-refeição, definição de
vos integrantes da diretoria do
percentual para adicional de
Simesp durante a greve de res-
hora noturna, direito a licen-
identes”, lembra.
ça-maternidade de 180 dias, entre outros.
Helena conta que já tinha
Após receber a pauta de reivindi-
a intenção de se associar ao
cação, o Sindicato patronal envia
Simesp. “Entendo que apenas
uma contraproposta.
uma entidade sindical pode
Nesse momento é muito im-
lutar contra a precarização
portante a participação da
do trabalho médico, por isso
categoria, se o reajuste ofe-
aproveitei a oportunidade da
recido não for satisfatório, o
posse para me sindicalizar”,
melhor caminho para rever-
relata a médica que conhece
ter o quadro é a mobilização
de perto os problemas da falta
dos médicos. Outra opção é a
de vínculo formal trabalhista.
A data-base dos médicos é 1º de se-
“Atualmente, atendo somente
negociação sob a mediação do
tembro. Quando a negociação se
pelo SUS em Unidades Bási-
estende, os médicos têm direito
Ministério do Trabalho e Em-
cas de Saúde em Sertãozinho e Batatais – cidades vizinhas a Ribeirão Preto (interior paulis-
a receber retroativamente a diferença do reajuste.
prego, o que pode ser moroso.
A campanha salarial beneficia os médicos do setor privado e àqueles que trabalham para o SUS,
“
Memória
por meio de organizações sociais,
ta), onde vivo –, mas não pos-
em UBS, Saúde da Família, AMA,
suo relação trabalhista com
AME, UPA, OS, hospitais, ambula-
nenhum dos municípios”.
tórios e Santas Casas.
Revista DR! • 31
Horas Vagas
Diário imaginário “Meu olhar, com certeza, acabou me aproximando muito mais do paciente”, diz o médico que relata, em tom ficcional, dificuldades da profissão Leonardo Gomes Nogueira
D
eus nos Acuda é um mu-
que acontecesse esse boom, mas
nicípio que só existe na
a gente nunca está preparado
cabeça do médico Luiz
pra ele. Você não está preparado
Gustavo Omena. Mas foi por meio
pra isso”, admite. “Eu não sabia o
dessa cidade imaginária que ele
poder que a internet tinha”, con-
acredita ter transformado (para
fessa. “Foi uma coisa estrondosa”,
melhor) o relacionamento com os
relata em vídeo disponibilizado,
seus pacientes da vida real.
na mesma internet, em fevereiro
há cerca de um ano e meio em
ra em medicina, em dezembro de
de 2014.
Campinas, no interior de São Pau-
2010, ele já tinha planos de publi-
O médico conta que a escri-
Em 9 de julho de 2012, o médi-
tem uma única loja em Maceió.
co criou uma página no Facebook,
“A partir do momento em que
lo. Local onde é residente em psi-
car um livro reunindo experiên-
ta serviu, em um primeiro mo-
intitulada “Diário de Um Planto-
você se dispõe a escrever sobre al-
quiatria. O médico fictício criado
cias de um médico recém-forma-
mento, para “desestressar” e lhe
nista”, contando histórias do seu
guma coisa, você tem que ter uma
por ele, o Dr. Greg, completou três
do. Logo, lembra Omena, a dura e
ajudou a “suportar o peso” do dia
cotidiano “dentro e fora de uma
observação mais aguçada”, avalia
anos de vida em julho deste ano.
fascinante realidade de um plan-
a dia do trabalho em uma emer-
sala de emergência” (como diz a
o médico formado, em 2010, pela
Em 2013, em um programa de tele-
tonista se impôs.
gência de um pronto-socorro. “As
própria página). Hoje ela já alcan-
Universidade Federal de Alagoas.
visão, ele relata como foi o nasci-
ça 61 mil curtidas.
“Meu olhar, com certeza, acabou
mento desse personagem.
Ele conta, em um vídeo no Youtube, que o boom aconteceu
me aproximando muito mais do paciente”, acredita.
coisas ficaram mais leves a partir “Desestressar”
daí”, diz Omena.
“O Dr. Greg é um jovem plan-
“E daí eu comecei a colecionar
E qual o perfil dos leitores da
tonista que sai da faculdade cheio
algumas histórias. Nasceu dessa
página “Diário de Um Plantonis-
poucos meses após a sua criação.
“Esse olhar pra mim ficou
de esperança e se depara com um
maneira. Eu colecionando causos
ta”? Na sua maioria, explica o au-
Mais exatamente: em 18 de outu-
como lição. Essa transformação
sistema completamente desestru-
de plantões antes de publicar no
tor, são “jovens médicos” com ida-
bro de 2012. Data na qual se come-
que eu sofri ao longo desse tempo,
turado, com carência de medica-
Facebook”, conta. Pouco mais de
des entre 25 e 30 anos. “E também
mora o Dia do Médico.
de um olhar mais lúdico. Foi algo
mentos, com falta de vagas nas
um ano após a criação da página,
estudantes de medicina que estão
Tudo por causa de um texto
muito positivo”, avalia Omena.
emergências, com uma grande
ele publicou o livro de mesmo
curiosos com o que acontece na
no qual desabafava: “Sou médico,
Ele diz que, desde então, passou
demanda da população”, contou.
nome (reunindo os textos mais
prática”, ressalta.
mas eu não sei de tudo. Também
a enxergar não apenas “as adver-
“Então isso gera na gente uma ne-
populares da rede social e alguns
não posso resolver todos os seus
sidades, os problemas da saúde
cessidade de gritar ao mundo e foi
inéditos).
problemas. Eu sou médico, mas
e tantas outras questões que a
isso que eu fiz e tô fazendo isso no
O livro, com o subtítulo “Cau-
ressalta que a privacidade e a in-
acima de tudo, eu sou ser huma-
gente enfrenta no dia a dia, como
Diário de Um Plantonista”, acres-
sos & Acasos de Dr. Greg”, pode ser
timidade dos seus pacientes são
no.” O texto, que pode ser encon-
também a beleza de cada um e a
centou na mesma ocasião.
comprado nas seguintes livrarias:
preservadas. Ele não revela nomes
trado na íntegra no Facebook, já
singularidade de cada paciente.”
Luiz Gustavo Omena diz que
Cultura, Saraiva e Viva. As duas
e nem os lugares nos quais essas
O médico de 30 anos, nascido
gosta de escrever desde criança.
primeiras possuem lojas em di-
histórias aconteceram. Isso real-
na capital alagoana Maceió, mora
E conta que após a sua formatu-
versos estados do país. A última
mente seria um Deus nos Acuda.
recebeu mais de 20 mil curtidas. “De certa maneira eu queria 32 • Revista DR!
> “Diário de Um Plantonista”, página criada pelo médico alagoano Luiz Gustavo Omena, já alcançou 61 mil curtidas e virou livro
Luiz Gustavo Omena, fiel ao juramento prestado ao se formar,
Revista DR! • 33
Literatura
Formação
Escolas Médicas Privadas: O fruto maldito do Mais Médicos
Bile Negra revela questões existenciais
Diângeli Soares Médica da Estratégia de Saúde da Família e diretora do Simesp
Nádia Machado
“Como descrever a angústia? Como explicá-la a alguém?”.
de Medicina da USP (FMUSP), onde desenvolveu estudos
Essa foi a indagação que motivou o psiquiatra Alexandre
sobre o estigma das doenças mentais. Fez residência mé-
Loch a escrever o romance Bile Negra. O livro conta a his-
dica em psiquiatria no Instituto de Psiquiatria do Hospital
tória do jovem Iago, recém-chegado à cidade grande, que
das Clínicas da FMUSP, em 2004.
expõe, em sessões de terapia, seus conflitos interiores e sentimentos mais íntimos.
Loch sempre foi leitor assíduo de grandes obras literárias, o que o influenciou a escrever e a inserir o hábito
A obra leva o leitor a uma reflexão pessoal, abordando
em sua rotina. O médico escolheu trabalhar as questões
questões existenciais. “Apesar de ser um personagem fic-
da mente humana por meio de um romance para torná-lo
tício, as pessoas dizem que se identificam com a história e
mais acessível à variada gama de leitores. “Havia duas
aplicam na própria vida”, conta o médico e completa: “En-
formas pra eu passar meu conhecimento: em texto aca-
tendendo ser a angústia um sentimento universal e ineren-
dêmico ou por meio de um romance, escolhi a segunda
te ao ser humano, faz nascer assim Bile Negra”.
opção”, conta.
De acordo com o autor, o título do livro é uma referência
Ele relata que já tinha alguns textos escritos, mas nada
à teoria grega, de Hipócrates, que viveu no século 5 a.C.,
concreto. “Quando terminei meu mestrado retomei minhas
na qual diz que o corpo humano é composto de quatro hu-
anotações. Em apenas oito meses a obra estava concluí-
mores (sangue, fleuma, bílis amarela e bílis negra). Segun-
da”. O livro está disponível em grandes livrarias, na versão
do essa hipótese, os distúrbios do corpo são decorrentes
física e e-book. E o psiquiatra não parou por aí: na ocasião,
do desequilíbrio entre esses humores.
da entrevista para a reportagem da revista DR! Loch adian-
O paulistano Alexandre Loch é doutor pela Faculdade
34 • Revista DR!
tou que havia concluído mais um livro.
Há dois anos a medicina brasilei-
no Nordeste, São Paulo e Minas
dantes se viram forçados a tranca-
ra vive sob a égide da Lei 12.871 de
Gerais ainda comportam um
rem suas matrículas.
2013, a Lei do Mais Médicos. Alvo
terço do total de escolas médicas
A privatização do direito de
de muito debate em seu caráter
do Brasil e seguem no mapa da
ser médico e a promoção de um
mais imediato - de prover médi-
expansão.
perfil elitizado para este profis-
cos em áreas desassistidas -, a lei
Sob o pretexto de ampliar o
sional são fruto de um continuum
impõe ao contexto atual ações
acesso à saúde, a política educa-
na agenda política brasileira,
que incluem desde a publicação
cional do Mais Médicos atenta
que une os governos tucanos e
de novas diretrizes curriculares
contra outro direito fundamental:
petistas em um abraço de mais
até a expansão dos programas
a educação. Bordão muito propa-
de 50 anos entre Estado e capital
de Residência Médica. Há, entre-
gandeado nos primeiros anos do
privado. Desde a ditadura mili-
tanto, uma medida que promete
governo Lula, a promessa de que
tar, o ensino público é preterido
deixar um fruto maldito para o
“o filho do pedreiro também vai
em função do ensino privado
futuro do nosso país: a privatiza-
virar doutor”, progressivamente
e a presença do capital estran-
ção da formação médica no Brasil
se afasta da realidade. Exemplo
geiro na educação é crescente. O
por meio da expansão prioritária
claro disso é a situação do Fies.
clima político de esvaziamento
de escolas pagas.
Programa de concessão de bol-
ideológico e desmobilização dos
Na última década, o número
sas, criado ainda no governo Fer-
coletivos organizados, contribui
de escolas médicas privadas qua-
nando Henrique Cardoso, o Fies
para a perpetuação desta agenda
se triplicou – de 64 cursos em 2003
impôs às instituições de ensino
conservadora. Assim como as or-
para 154 em 2015. Só este número
superior um teto de 6,4% de rea-
ganizações sociais e os planos de
já é superior ao do total de escolas
juste de mensalidades, como pré-
saúde, a privatização do ensino é
de medicina no primeiro ano do
requisito para cadastro junto ao
tida hoje como um mal necessá-
governo Lula e a taxa de cresci-
programa. Dependentes do finan-
rio e irreversível, dentro de um
mento no privado em muito su-
ciamento público, diversas insti-
modelo de Estado que se exime
pera a do setor público.
tuições resolveram burlar a regra.
de suas responsabilidades e faz
O ensino privado, aliás, não é
Ao declararem para o Ministério
mal uso dos impostos do cidadão.
só pago. É muito bem pago. O va-
da Educação um determinado va-
Cabe a todos que se manifestam
lor pode variar entre R$ 5 mil a
lor de mensalidade, passaram a
por um Brasil melhor e que an-
mais de R$ 11 mil. O ensino mé-
cobrar dos estudantes um boleto
seiam, também, por um governo
dico segue caro e concentrado. A
extra relativo a sua expectativa de
melhor, a clareza do tipo de Esta-
despeito da expansão observada
lucro. Neste processo muitos estu-
do que defendem. Revista DR! • 35
Cultura
“Podem haver novos arranjos dentro da coleção. O museu expõe parte da sua coleção, outra parte está em reserva técnica. Por vezes, tem algum rearranjo dentro da exposição de longa duração”, ressalta. Essa coleção, que fica no térreo
O Museu da Casa dos Brasileiros
O
do museu, reúne preciosidades
certas e, possivelmente, boas lem-
priado para o uso em uma época
branças. “Muitas vezes o que a
de viagens longas, inclementes e,
gente tem é uma memória afetiva
geralmente, inóspitas.
acervo do Museu da Casa
como o banco Bandeirante (sécu-
Brasileira (MCB) poderá
lo 19), com um funcional e resis-
trazer, ao seu visitante,
tente formato em “x”, muito apro-
em relação aos objetos expostos”,
O belo e ritualístico banco
diz Filipe Bezerra, coordenador de
Trumai, usado desde tempos ime-
comunicação do MCB.
moriais por algumas das nações
De fato, o acervo tem alguns objetos, como cadeiras e cômo-
Museu da cidade de São Paulo reúne peças que são familiares para muitos dos seus visitantes, pois resgata e preserva antigos e novos jeitos de morar Leonardo Gomes Nogueira • Fotos: Osmar Bustos
das antigas, que poderão trazer recordações de mobiliários mais ou menos comuns em outra época. Não se surpreenda se, durante uma visita, a sua ou mesmo a casa de algum parente vier à mente. A coleção do MCB reúne uma seleção de móveis e objetos varia-
indígenas brasileiras, é outro
Pelo viés da arquitetura e do design, museu busca o resgate e a preservação da memória da moradia brasileira
dos usados em casas brasileiras
exemplo. A peça do museu, de
desde o século 17. Trata-se de uma
2007, assim como os demais ban-
exposição, como explica Bezerra,
cos do tipo, é esculpida em único
de “longa duração” e não “perma-
pedaço de madeira.
nente” (corrigindo termo usado,
A coleção ainda reúne peças
até aquela ocasião, por esse que
importantes do design nacional,
vos escreve).
como a cadeira Girafa (1987), de Lina Bo Bardi, Marcelo Ferraz e Marcelo Suzuki, e a poltrona
Atualmente o Museu da Casa Brasileira possui 400 peças. Das quais, em média, um terço se encontra exposta ao público. “Tudo isso é matéria prima para que se criem novas exposições”, diz Filipe Bezerra. O coordenador de comunicação do MCB explicou que a política da instituição, por ora, não se foca em adquirir novas obras, mas em restaurar e catalogar o acervo existente (já que algumas peças estão emprestadas para outras instituições). “O Museu da Casa Brasileira tem uma preocupação com questões da cultura material da casa brasileira e também da arquitetura e do design”, explica Filipe Bezerra. Por isso, desde o ano de 1986, o museu realiza o Prêmio Design MCB, que é dividido em dois momentos: o Concurso do Cartaz seguido da premiação dos produtos e trabalhos escritos. Entre julho e agosto, o MCB recebe criações (protótipos ou em produção) em categorias que abrangem o design de produto e a produção teórica em arquitetura e design.
Mole (1957), de Sergio Rodrigues, que também faz parte da coleção permanente do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque.
36 • Revista DR!
Revista DR! • 37
Cultura
Memória da moradia
mecanismo de atração de públi-
Fiel a um dos seus princípios (o de
co”, garante Bezerra.
resgatar e preservar a memória
O museu, que é público, de
da moradia brasileira, pelo viés
propriedade da Secretaria da Cul-
da arquitetura e design), o museu
tura do Governo do Estado de São
também promove o projeto Casas
Paulo, é atualmente gerido por
do Brasil. A iniciativa, que já teve
uma organização social da área
seis edições, tem como objetivo
de cultura. Em 2014, segundo rela-
fazer um inventário das manei-
tório de atividades disponível na
ras de morar do brasileiro com
página do próprio museu, o total
exposições e publicações. Inclusi-
de recursos do contrato de gestão
ve daqueles privados, por ora, da
foi de R$ 8,5 milhões.
sua liberdade de morar onde quiser ou puder. Uma das pu-
além da receita estatal, o contrato
um pouco dessa história. As peças
Peças, para usar e apreciar, estão
blicações, de 2014,
permite que o museu faça parce-
ficam na antiga biblioteca da casa
visíveis para quem se aventurar
e
resulta-
rias (usando o espaço, por exem-
do ex-prefeito de São Paulo (entre
pelo local que reúne cerca de 200
ria em exposi-
plo, para a realização de eventos
1934 e 1938) e antigo morador Fá-
espécies de plantas e árvores.
ção no começo
corporativos nos dias em fica fe-
bio da Silva Prado.
do ano seguinte
chado ao público). Outra fonte de
O espaço reúne utensílios usa-
radeira de Hugo França. Desig-
diz respeito ao
receita é o restaurante Santinho
dos pelo casal Crespi-Prado em seu
ner que, desde o final da década
cotidiano
que paga ao administrador pelo
opulento cotidiano, além de pe-
de 1980, transforma madeira que
A Cozinha da Casa
uso de um espaço.
ças decorativas como o Torso de
seria descartada em bancos, ca-
O restaurante do Museu da
que
dos do
Um dos destaques é a namo-
01 • Op-Art: mostra temporária de ilusão ótica ocupou parte do MCB entre abril e maio deste ano 02 • Cobra de arame e tecido é destaque no jardim 03 • Fachada da mansão neoclássica que hoje abriga o museu
Mulher (1930), de Victor Brecheret
deiras, mesas e outros. É possível
Casa Brasileira, o Santinho,
sídio que foi de-
O Museu da Casa foi casa
(1894-1955). “O projeto arquitetôni-
ver, em outros locais de São Pau-
funciona no local desde abril
sativado em 2002.
O imponente edifício do MCB,
co, desenhado por Wladimir Alves
lo (como Parque do Ibirapuera e
de 2013. Uma parte do estabe-
“Sobrevivências
localizado na Avenida Brigadeiro
de Souza, remete às linhas do Pa-
Largo do Arouche), algumas das
lecimento avança, como uma
– Uma exposição
Faria Lima quase na esquina com
lácio Imperial de Petrópolis (RJ)”,
suas peças esculpidas em imensos
espécie de deck, sobre o jardim.
sobre vivências –
a Cidade Jardim, reduto nobre da
informa o site da instituição. De
troncos de árvores mortas.
Carandiru”, que
capital paulista, foi, por 18 anos,
fato, há uma inegável semelhan-
ficou em cartaz
residência do casal Fábio da Silva
ça aristocrática.
Carandiru,
pre-
O nome (Santinho) remete
Outro destaque do jardim é
ao grupo Capim Santo, res-
uma cobra enorme, de mentira, é
ponsável pela administração
claro, feita de arame e tecido. Cria-
e, claro, cozinha do lugar. O
O Jardim
ção da artista Marcia Benevento
Capim Santo, que nasceu na
truída entre 1942 e 1945, foi doada,
Na parte externa do museu, há
para o Dia das Crianças de 2014 e
década de 80 em Trancoso, no
No ano passado, de acordo com
em 1968, para a Fundação Padre
uma área verde de 6 mil metros
que, desde então, permanece no
litoral sul do estado da Bahia,
Filipe Bezerra, 150 mil pessoas vi-
Anchieta que, por sua vez, cedeu o
quadrados. O lugar também é
jardim. Com uma ressalva: “De vez
hoje possui quatro unidades
sitaram o local. Desde 2012, quin-
prédio em comodato à Secretaria
usado, eventual ou permanente-
em quando ela muda de lugar”,
na capital paulista.
zenalmente, o museu fica aberto
da Cultura.
mente, como uma área expositiva.
brinca Filipe Bezerra.
até maio passado, reuniu utensílios criados, de forma improvisada, pelos presos.
até às 22h (nos demais dias, as portas são fechadas às 18h).
38 • Revista DR!
03
ção, Filipe Bezerra, ressalta que
“moradores”
01
02
O coordenador de comunica-
Prado e Renata Crespi Prado. A mansão neoclássica, cons-
O museu, criado em 1970 com o nome de Museu do Mobiliário
Serviço
A expectativa, com o horário
Artístico e Histórico Brasileiro,
Museu da Casa Brasileira: De terça a domingo, das 10h às 18h. Av. Brigadeiro Faria Lima, 2705, São Paulo. Ingressos: R$ 6
estendido, é que mais gente fre-
ganharia a sua sede definitiva em
e R$ 3 (meia-entrada). Gratuito aos sábados, domingos e feriados. Nos demais dias, maiores de 60 e crianças com até 10
quente o lugar (são as chamadas
1972. A Coleção Crespi-Prado, no
“Aberturas Noturnas”). “Um bom
primeiro andar do museu, conta
anos não pagam. Acesso para pessoas com deficiência. Restaurante Santinho: Informações e reservas: 11 3032-2277 !
Revista DR! • 39
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Olhares
Fernando de Noronha “Assim que me formei na faculdade, comecei a trabalhar no prontosocorro de Fernando de Noronha. Lá dei os primeiros plantões da minha vida e com o dinheiro que ganhei comprei minha primeira câmera fotográfica de verdade. Foi um período incrível, muito produtivo, tanto no trabalho quanto nos momentos de ócio.” Luiz Perez dermatologista
> O olhar do médico Luiz Perez: Cacimba do Padre, Fernando de Noronha (PE), 2011
Seu olhar pode ser publicado nas próximas edições da DR!, envie sua foto para
[email protected]
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