8. DETERMINANTES DA SAÚDE

8.1. Introdução Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) as doenças crónicas não transmissíveis constituem hoje a principal causa de morbilidade e mortalidade calculando-se, que em 2001 tenham contribuído com cerca de 75% da doença no contexto europeu. A incidência terá tendência a aumentar, estimando-se que em 2020 contribuam com cerca de 80% do total de doença expresso em DALYs (anos de vida perdidos ajustados para a incapacidade). Estas doenças são potencialmente preveníveis através de abordagens direccionadas para os factores modificáveis que as determinam, relacionados com estilos de vida, como o consumo de tabaco e álcool, os hábitos alimentares e o sedentarismo. Factores que são responsáveis por um elevado número de óbitos a nível mundial (Figura 99).

Fonte: OMS, 2003

Figura 99 – Número de óbitos em 2000 por factores de risco, mundial Nos países desenvolvidos os dez principais factores de risco, em percentagem do peso da doença expresso em DALYs, são: tabaco (12,2%), hipertensão (10,9%), bebidas alcoólicas (9,2%), valores elevados de colesterol (7,6%), excesso de peso (7,4%), baixa ingestão de vegetais (3,9%), sedentarismo (3,3%), drogas ilícitas (1,8%), sexo sem protecção (0,8%) e deficiência em ferro (0,8%) (22).

Num estudo caso-controlo de enfarte agudo do miocárdio, efectuado na cidade do Porto (23), estimou-se a percentagem de risco atribuível para alguns factores de risco. Verificou-se para o sexo masculino e feminino, respectivamente, que a distribuição da gordura corporal (relação cintura anca) contribuiu com 75,8% e 87,8%, o Índice de Massa Corporal com 43,3% e 28,2%, a actividade física com 37,7% e 37,8% e o consumo de tabaco com 45,8% e 8,8%. É de esperar que, se forem instituídas medidas efectivas para o controlo e prevenção destes factores de risco, poderá ser minimizada ou mesmo invertida a tendência crescente das doenças crónicas. As informações sobre os determinantes de saúde apresentadas neste documento tiveram como fonte o Inquérito Nacional de Saúde (INS) (7, 8) e diversos trabalhos desenhados com diversos objectivos. A população a que se referem pode não coincidir com a população da Região de Saúde do Norte. A amostra do INS é representativa para os NUT II definidos pelo INE. O Norte relativo ao estudo “A Saúde dos Adolescentes” (24, 25), embora englobe algumas escolas da Região de Saúde do Centro, é na sua maioria composto por escolas da Região de Saúde do Norte. Apesar destas diferenças, em ambos os estudos a maioria da população está integrada na Região de Saúde do Norte, pelo que será utilizada a denominação “região Norte” sempre que se apresentarem resultados da população do Norte por eles definido. Nos resultados de estudos que se referem a grupos populacionais mais específicos dentro da região Norte, a amostra a que se refere é descrita no início dos resultados.

8.2. Hábitos Tabágicos De acordo com o INS 1995/96 (7), e tendo considerado apenas a informação sobre o consumo de cigarros porque o consumo dos restantes tipos de tabaco foi muito pequeno, nos adultos da região Norte, a prevalência de fumadores foi 16,9% (2,3% ocasionais e 14,6% fumadores diários). O número de fumadores foi superior no sexo masculino (76,6% dos fumadores ocasionais e 85,7% dos fumadores diários). Nos jovens com idade inferior a 18 anos a prevalência de fumadores diários e ocasionais era semelhante, respectivamente, 1,6% e 1,5%, e tal como nos adultos, maior no sexo masculino (Quadro 48). No entanto, será de considerar a possibilidade de estes valores poderem estar subestimados devido à metodologia de recolha de informação, que é efectuada através de um questionário à família, o que pode condicionar alguns adolescentes fumadores a não referirem o consumo de tabaco. Quadro 48 – Número e prevalência de fumadores na região Norte, por grupos etários Idade (anos)

Ocasionalmente Homens

Mulheres

Diariamente Total n (%)

10 - 14 1 1 2 (0,2) (n=1123) 15 - 17 21 5 26 (3,5) (n=753*) 18 – 19 7 6 13 (2,5) (n=518) 20 – 24 25 10 35 (3,1) (n=1136) 25 – 34 57 21 78 (4,1) (n=1904) 35 – 44 48 17 65 (3,3) (n=1960) 45 – 54 25 5 30 (1,7) (n=1732) 55 – 64 26 3 29 (1,7) (n=1713) 65 – 74 15 3 18 (1,4) (n=1276) 75 7 ____ 7 (0,8) (n=855) * um elemento não tem informação para esta variável

Homens

Mulheres

Total n (%)

1

1

2 (0,2)

19

9

28 (3,7)

56

6

62 (12,0)

201

43

244 (21,5)

423

108

531 (27,9)

386

73

459 (23,4)

269

26

295 (17,0)

158

3

161 (9,4)

87

1

88 (6,9)

22

___

22 (2,6) Fonte: INS 95/96

Relativamente ao consumo médio de cigarros por dia por grupo etário, foi maior no grupo dos 45-54 anos (23,5 cigarros), seguida pelos indivíduos com idades compreendidas entre os 35-44 anos e os 55-64 anos, respectivamente, 22,2 e 22,5. Os homens foram os que referiram maior consumo diário de cigarros (Quadro 49).

Quadro 49 - Consumo médio de cigarros/dia na região Norte, por grupos etários Homens

Mulheres

Total

10 - 14 (n=1123)

5

4

4,5

15 - 17 (n=754)

13,3

10,3

12,4

15,1

9,5

14,5

20 - 24 (n=1136)

17,3

13,9

16,7

25 - 34 (n=1904)

20,5

13,4

19,1

35 - 44 (n=1960)

23,7

14,8

22,2

24,2

16,3

23,5

22,6

16,7

22,5

18,8

20,0

18,8

14,4

-----

14,4

Idade (anos)

18 - 19 (n=518)

45 - 54 (n=1732) 55 - 64 (n=1713) 65 - 74 (n=1276) 75 (n=855)

Fonte: INS 95/96

O Inquérito Nacional de Saúde (INS) foi de novo realizado em 1998/99 (8), o que permite avaliar a evolução dos hábitos tabágicos. No Norte, a prevalência de fumadores foi de 17,9% (30,2% nos homens e 6,8% nas mulheres). Relativamente aos dados de 95/96 a prevalência de fumadores ocasionais diminuiu de 2,3% para 2,0%, tendo aumentado a prevalência de fumadores diários de 14,6% para 15,9%. O grupo etário dos 25-34 anos foi o que apresentou a maior prevalência de fumadores diários em ambos os inquéritos. Contudo o INS 95/96 e 98/99 não apresentam os mesmos critérios para a definição de grupos etários. Por este motivo, não podemos comparar os dados dos adolescentes, só sendo possível agrupar os adultos a partir dos 24 anos. Assim, a prevalência de fumadores ocasionais e diários nos indivíduos com idade igual ou superior a 25 anos foi semelhante em ambos os inquéritos, 18,9% em 1995-96 e 19,4% em 1998-99, mas aumentou nos indivíduos com idade inferior a 25 anos, de 11,7% para 13,2% (Quadro 50).

Quadro 50 - Número de indivíduos que fumavam na região Norte, por grupos etários Idade (anos) 10 – 14 (n=986) 15 – 24 (n=2274) 25 – 34 (n=2121) 35 – 44 (n=2056) 45 – 54 (n=1935) 55 – 64 (n=1634) 65 – 74 (n=1364) 75 (n=950)

Ocasionalmente

Diariamente

Homens

Mulheres

Total n (%)

Homens

Mulheres

Total n (%)

1

__

1 (0,1)

__

1

1 (0,1)

44

24

68 (3,0)

272

88

360 (15,8)

40

19

59 (2,8)

483

153

636 (30,0)

37

21

58 (2,8)

423

99

522 (25,4)

29

12

41 (2,1)

270

39

309 (16,0)

18

4

22 (1,3)

151

11

162 (9,9)

9

1

10 (0,7)

94

3

97 (7,1)

8

3

11 (1,2)

24

1

25 (2,6) Fonte: INS 98/99

Na região Norte, o consumo de tabaco foi semelhante nos dois INS. O consumo médio de cigarros por dia foi 20,2 (14,0 nas mulheres e 21,2 nos homens) em 95/96 e 19,3 (13,8 nas mulheres e 20,6 nos homens) em 98/99. O consumo foi superior no sexo masculino em todos os grupos etários exceptuando o grupo etário dos 65-74 anos, 20,0 no sexo feminino e 18,8 no sexo masculino em 95/96, estes valores foram respectivamente 21,3 e 18,5 em 98/99 (Quadro 51). Quadro 51 - Consumo médio de cigarros/dia na região Norte, por grupos etários Idade (anos) 10 – 14 (n=986) 15 - 24 (n=2274) 25 - 34 (n=2121) 35 - 44 (n=2056) 45 - 54 (n=1935) 55 - 64 (n=1634) 65 - 74 (n=1364) > 74 (n=950)

Homens

Mulheres

Total

---

2,0

2,0

15,1

11,5

14,2

20

13,5

18,4

23

15,6

21,6

24,6

15,1

23,4

20,8

13,2

20,3

18,5

21,3

18,6

25,5

20,0

22,7 Fonte: INS 98/99

Segundo o estudo realizado em 1999/2000, à população da cidade do Porto (EPIPorto) com idade superior a 17 anos, a prevalência de fumadores no sexo masculino foi de 35,0% e no sexo feminino de 18,0%. O número médio de cigarros fumados por dia foi de 21,2 nos homens e 19,6 nas mulheres (26). O estudo “A Saúde dos Adolescentes Portugueses”, da Faculdade de Motricidade Humana avaliou as atitudes e comportamentos de saúde dos jovens portugueses, em idade escolar. Este estudo foi realizado em 1998 (24) e em 2002 (25), e foram inquiridos alunos dos 6º, 8º e 10º anos de escolaridade de escolas públicas de Portugal Continental. Em 1998 foram inquiridos 6903 alunos e 6131 em 2002. De acordo com o estudo realizado em 1998, a proporção de jovens que já experimentaram tabaco foi no total nacional de 30,9% (28,6% nas raparigas e 33,6% nos rapazes). Os alunos da região Norte, comparados com os das outras regiões, referem mais frequentemente que nunca experimentaram fumar ou fumam menos. Verificou-se ser superior a proporção de indivíduos que escolheram a opção “não fumo” e menor a proporção que escolheu a opção “todos os dias”. Segundo os dados do mesmo estudo realizado em 2002, a proporção de jovens que já experimentaram tabaco a nível nacional aumentou para 37,1%, (36,4% nas raparigas e 37,8% nos rapazes). Na região Norte a proporção de jovens que já experimentaram fumar tabaco foi 36,2% e referiram que não fumavam habitualmente 80,4% dos jovens. O “Inquérito de Saúde dos Adolescentes na Escola” (ISAE) (27) foi promovido pelos Ministérios da Educação e da Saúde em 2002, com o objectivo de conhecer alguns

determinantes fundamentais

para a

saúde

nomeadamente,

atitudes,

comportamentos, ambientes e estilos de vida de jovens de Portugal Continental, entre os 11 e os 19 anos. Foi recolhida informação através de questionários autoadministrados a aproximadamente 9500 alunos que frequentavam os 7º, 9º e 12º anos de escolas públicas, sendo 2695 alunos da região Norte. Nesta avaliação a prevalência de fumadores a nível nacional foi de 18,9% e na região Norte foi de 21,1%, superior no sexo masculino (22,3% vs.19,9%). O número de cigarros fumado por dia foi superior no sexo masculino, 13,4% fumavam menos de 5 cigarros por dia; 43,3% entre 5 e 10; 34,1% entre 11 e 20 e 9,1% mais de 20 cigarros por dia. Nas raparigas estes valores foram respectivamente 26,5%, 43,4%, 25,9% e 4,2%. Como seria de esperar a prevalência de fumadores aumenta com a idade, particularmente no consumo diário e no sexo masculino (Quadro 52).

Quadro 52 – Prevalência de consumo de tabaco na região Norte, por grupo etário e sexo Não

Às vezes

Diariamente

Idade (anos)

Rapazes n (%)

Raparigas n (%)

Rapazes n (%)

Raparigas n (%)

Rapazes n (%)

Raparigas n (%)

11 a 13

326 (93,1)

313 (94,3)

13 (3,7)

13 (3,9)

11 (3,1)

6 (1,8)

14 a 16

418 (78,0)

439 (77,3)

58 (10,8)

55 (9,7)

60 (11,2)

74 (13,0)

17 a 19

255 (64,2)

366 (73,8)

50 (12,6)

45 (9,1)

92 (23,2)

86 (17,3)

Fonte: ISAE 2002

Verificou-se que a proporção de alunos nas categorias de maior consumo (>10 cigarros diários) era maior nos rapazes (Quadro 53). Quadro 53 – Proporção de fumadores na região Norte por categoria de número de cigarros fumado por dia, por grupo etário e sexo Idade (anos)

11 a 13

14 a 16

17 a 19

Nº de Cigarros

Rapazes

Raparigas

n (%)

n (%)

20 20

5 (8,3) 13 (13,8) 36 (38,3) 36 (38,3) 9 (9,6)

5 (6,7) 19 (22,1) 43 (50,0) 23 (26,7) 1 (1,2)

20

Total n (%)

10 (7,5) 32 (17,8) 79 (43,9) 59 (32,8) 10 (5,5) Fonte: ISAE 2002

Prevalência semelhante foi encontrada em 2000, em 732 alunos matriculados em escolas do Porto, do 9º ao 12º ano de escolaridade, a prevalência de fumadores regulares foi de 20,9%. Fumavam entre 6 e 10 cigarros por dia 8,7% dos alunos e 5,6% fumava mais de 10 (28). Dados de 1996/97 referentes a alunos do 7º, 8º e 9º ano de escolaridade, cuja média (desvio padrão) de idades era 13,9 (1,1) anos, que frequentavam escolas do

concelho de Vila Real apresentam uma prevalência de 12,3%, maior nos rapazes (15,5%) do que nas raparigas (9,1%) (29). O estudo EPITeen (30), realizado pelo Serviço de Higiene e Epidemiologia da Faculdade de Medicina do Porto, avaliou 2161 adolescentes de 13 anos (nascidos no ano de 1990 e que no ano lectivo 2003/2004 estavam matriculados em escolas públicas e privadas da cidade do Porto). Dos alunos avaliados já experimentaram fumar cerca de 20%, sendo a proporção mais elevada nas raparigas do que nos rapazes (22,4% e 17,1%) (Figura 100).

Hábitos Tabágicos

25% 20%

22,4% 17,1% Feminino

15%

Masculino 10% 5%

2,0% 1,5%

2,0%

0,4%

0% já experimentou mas fuma mas não todos não fuma os dias

fuma pelo menos 1 cigarro/dia

Fonte: EPITeen 2004

Figura 100 - Hábitos tabágicos em adolescentes de 13 anos do Porto

Neste estudo, foram as raparigas que referiram fumar com maior frequência: fumavam mas não todos os dias 2,0% vs. 1,5% dos rapazes e 1,3% das raparigas fumavam pelo menos um cigarro por dia, enquanto nos rapazes eram apenas 0,4%. A média (desvio padrão) de idade com que os adolescentes iniciaram o hábito foi de 12,1 (0,8) anos para as raparigas e de 11,4 (1,7) anos para os rapazes. Pelos resultados descritos nestes trabalhos, verifica-se que a prevalência de fumadores, especialmente no sexo feminino, tende a aumentar. Para definição da intervenção no âmbito da promoção da saúde, nomeadamente para o combate a este crescente da prevalência de fumadores, é essencial o conhecimento das razões que levam ao consumo de tabaco. No estudo EPITeen a razão mais referida para experimentar fumar foi a curiosidade (45,6% nos rapazes e 48,4% nas raparigas), ter amigos que fumam foi referida por 13,6%. O estudo ISAE avalia a razão para fumar

entre os fumadores diários, e as razões mais referidas foram o hábito (20,4%) e ser viciado (16,4%), tendo ainda 16,4% referido fazê-lo por prazer.

8.3. Consumo de Bebidas Alcoólicas O Inquérito Nacional de Saúde avalia o consumo de bebidas alcoólicas nos 12 meses que antecederam a avaliação. Das bebidas avaliadas o vinho e a cerveja representam a maior fatia do consumo, por isso optou-se por apresentar apenas estes consumos discriminados por grupos etários. As classes escolhidas para apresentação dos resultados do inquérito não permitem obter informações pormenorizadas sobre a quantificação do consumo, pois a categoria de frequência mais elevada é “várias vezes por semana”, por isso optou-se por apresentar apenas os dados sobre a prevalência do consumo. Na região Norte, de acordo com os dados do INS em 1995-96, a prevalência de indivíduos que consumia bebidas alcoólicas foi superior nos homens (66,9% vs. 46,9%). Considerando apenas a população adulta a prevalência foi 85,1% nos homens e 72,3% nas mulheres. Nos adolescentes (