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FATORES CRÍTICOS À COMPETITIVIDADE DA SOJA NO PARANÁ E NO MATO GROSSO Por: Carlos Eduardo Cruz Tavares1 São várias as cadeias produtivas que constit...
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FATORES CRÍTICOS À COMPETITIVIDADE DA SOJA NO PARANÁ E NO MATO GROSSO

Por: Carlos Eduardo Cruz Tavares1

São várias as cadeias produtivas que constituem o complexo agroalimentar, destacando-se entre elas, a da soja. A Fundação Getúlio Vargas, na publicação Conjuntura Econômica Agropecuária, estimou que a cadeia produtiva da soja participa por volta de 20% do PIB do agronegócio nacional, correspondendo a mais de US$ 35 bilhões no ano, demonstrando a importância econômica deste produto agrícola para o País. Quase 50% da colheita nacional estão nos estados do Mato Grosso

e

Paraná,

que

produziram

14,5

e

10,2

milhões

de

toneladas,

respectivamente. A cadeia produtiva da soja envolve as atividades de produção agrícola propriamente dita (lavoura, pecuária, extração de óleo vegetal) e aquelas relacionadas ao fornecimento de insumos nas ligações a montante. A partir das fazendas, a soja em grão segue por ferrovias, rodovias ou hidrovias, com destino a armazenagem, ou para sofrer algum tipo de processamento industrial ou para ser direcionada para exportação. Finalmente, o produto acabado segue para ser distribuído por diferentes modos de transporte para o cliente final. Avaliar o desempenho de cada agente faz com que possamos identificar fatores críticos que ocasionam a perda da competitividade da soja no estado do Paraná e do Mato Grosso. 1

Economista da Conab e Professor M.Sc. de Logística; [email protected]

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De um modo geral, analisando o sistema produtivo (fazenda), observa-se um avanço significativo na evolução de produtividade média dos principais Estados produtores nacionais, frente ao ocorrido nos EUA e na Argentina. Nos últimos 10 anos a produtividade no Mato Grosso chegou a alcançar 3.050Kg por hectares no ano de 2000/01, caindo para 2.900kg em 2002/03, em conseqüência de problemas climáticos. No Paraná, a produtividade chegou em torno de 3.000kg no período de 2000/01 e 2001/02. A província de Córdoba (Argentina) vem elevando sua produtividade a cada ano, contudo não consegue ultrapassar a do Mato Grosso e Paraná, que acontece também com o estado de Illino, nos Estados Unidos.

Figura 1

kg/ha

Evolução da Produtividade da Soja no Mato Grosso, Paraná, Illinois e Córdoba (Argentina)

3.100

Mato Grosso 2.900

Paraná 2.700 2.500

Illinois 2.300

Córdoba 2.100 1.900 1.700 1.500 93/94

94/95

95/96

96/97

97/98

98/99

99/00

00/01

01/02

02/03

03/04

Anos Fonte: CONAB., SAGPYA e USDA

No que tange à análise do desempenho do sistema produtivo, o destaque fica por conta do custo total de produção do Paraná, que é inferior quando comparado ao de Illinois, em torno de 28% (Tabela 1). No que se refere aos custos variáveis, estes são maiores no Brasil (Mato Grosso e Paraná), em conseqüência do uso intensivo de

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fertilizantes. Por outro lado, os custos de sementes dos Estados Unidos são maiores, em função do uso de sementes transgênicas. Contudo, os custos fixos americanos são muito superiores quando comparados aos brasileiros (Mato Grosso e Paraná). Basicamente, o custo da terra é o principal responsável por esse resultado.

Tabela 1

Desempenho do Sistema de Produção CUSTO DE PRODUÇÃO DA SOJA (US$/ha) SOJA CUSTOS VARIÁVEIS Semente Fertilizantes Produtos Químicos Máquinas Operacionais/Consertos Juros do Capital Assistência Técnica Outros Total dos Custos Variáveis CUSTOS FIXOS Depreciação de Máq. e Equipamentos Custo da Terra Taxas e Seguros Retorno do Investimento da Fazenda Total dos Custos Fixos Total dos Custos de Produção Produtividade por hectares em kg Total dos Custos por toneladas

USA Meio-Oeste 2003/04

Brasil Mato Grosso 2003

Brasil Paraná 2003

Argentina Pampa Úmida 2002

45,3 20,6 55,9 57,2 5,2 3,3 187,5

19,8 119,5 63,9 65,8 15,6 12,9 31,3 328,7

30,8 51,7 74,0 47,8 13,3 16,9 28,0 262,4

222,9

126,1 224,1 17,4 37,0 404,7 592,1 2910 203,5

156,6 7,8 4,4 24,5 193,3 521,9 3000 174,0

93,3 40,9 4,6 33,8 172,6 435,1 3000 145,0

47,2 155,3 51,2 253,6 476,5 3000 158,8

Fonte: CONAB - USDA

Para verificar a sustentabilidade do sistema produtivo, comparou-se a rentabilidade de diferentes regiões produtoras, de modo a conhecer o desempenho e a capacidade competitiva das propriedades do Paraná e Mato Grosso. Conforme visualizado na Tabela 2, a soja de Illinois consegue obter melhores preços de venda em relação ao Brasil, razão da elevada rentabilidade que se assemelha à do Paraná. No Mato Grosso, a rentabilidade dos produtores rurais é prejudicada pelo baixo preço da soja em razão da localização geográfica do Estado em relação às plataformas exportadoras. 3

Tabela 2

Rentabilidade da Fazenda Localidade Illinois - EUA Mato Grosso - BRA Paraná -BRA Cordoba - ARG

Em US$/t Preço de Venda Custo de Produção Margem Bruta 342,0 203,5 40% 213,0 174,0 18% 238,0 145,0 39% 244,0 158,8 34%

Fonte: Conab, Usda e Sagpya

A produtividade e o custo de produção das fazendas nacionais demonstram que a soja cultivada, principalmente no Paraná, consegue ter uma competitividade superior em relação à norte-americana. Praticamente é igual a rentabilidade de Illinos-EUA e Paraná-BRA. A soja plantada no Mato Grosso demonstra ótimo desempenho, mas por necessitar de grande movimentação, apresenta menor valor de venda. Com intuito de conhecer a sustentabilidade da cadeia produtiva da soja paranaense e matogrossense, foram identificados os custos do fluxo da zona de produção até o consumidor. Este trabalho possibilitou verificar, ainda, a atratividade da cadeia em relação às concorrentes. Existem certos corredores na cadeia agroindustrial da soja, onde se encadeiam: a produção, o processamento e a comercialização, que são considerados muito importantes para a formação de preço no mercado. O Mato Grosso, localizado na região do cerrado, maior estado produtor de soja do país, escoa a maior parte da sua produção pelo corredor de exportação que passa pelos portos de Santos-SP e Paranaguá-PR, com destino a Rotterdan/HOL. Ressalta-se que este mesmo corredor serve ainda para escoar a produção de soja do Paraná. Com o crescimento da produção nas novas fronteiras agrícolas, dispostas no cerrado, interior do país, e que já chega a ser maior do que a das regiões tradicionais, fica patente que está havendo um deslocamento dos capitais destinados ao cultivo da soja para o interior do país, fazendo com que o fluxo de produtos entre 4

as novas fronteiras e as plataformas exportadoras seja intensificado com a necessidade de um apoio de infra-estrutura para movimentação destes grãos. Principalmente pela localização do estado do Mato Grosso, observa-se que os custos de logística referentes às despesas de transporte são extremamente elevados quando comparados as dos Estados Unidos e Argentina, fazendo com que o produto perca sua competitividade a cada movimentação realizada (Tabela 3). O modo rodoviário, tradicionalmente empregado pela falta de outro modo de deslocamento mais eficiente para grandes distâncias, faz com que os produtos matogrossenses perca todo o ganho obtido no sistema produtivo, com a utilização de tecnologia moderna e baixo custo da terra.

Tabela 3

Comparativo da Sustentabilidade das Cadeias Em US$/t EUA (Illinois) Custo de produção 203.5 Frete ao porto 26,0 Despesas porto 3.0 21.4 Transporte marítimo (13.0) Prêmio Custo Total 240.9

Mato Grosso (Sorriso) 174.0 47.0 5.3 23.4

Paraná 145.0 17.0 5.3 23.4

Argentina (Pampa) 158.8 13.4 3.0 25.4

80.0

80.0

58.0

329.7

270.7

258.6

(C. Mourão)

Valor: US$ 1 = R$ 3

Fonte: Conab, Sagpya e Marship Agencies

Por outro lado, no Paraná, os produtores de soja, mesmo utilizando o modo rodoviário para escoar grande parte da sua produção até o porto de Paranaguá, conseguem obter um custo de transporte semelhante ao norte-americano ocorre pois a distância média entre as fazendas e o porto possibilita uma economicidade com o 5

deslocamento sendo realizado por via rodoviária, conforme observado nas Tabela 4.

Tabela 4 Matriz de Transporte da Soja no Brasil, Argentina e EUA, e Distâncias Médias Econômicas para Definição do Modo de Transporte Em % Brasil

Argentina

EUA

Hidrovia

5

2

61

Ferrovia

28

16

23

Rodovia

67

82

16

Distância média Ao Porto

900 a 1000 km

250 a 300 km

1000 km

Fonte: Asnec

Contudo, os produtores do Paraná perdem competitividade quando o produto chega ao porto de Paranaguá. Prêmios negativos estão sendo exercidos, em razão das complicadas operações portuárias relacionadas a: recepção, estocagem, expedição de produtos e atracamento de navios. Os portos de Paranaguá, Santos e Rio Grande são atualmente responsáveis por 57% das exportações do grão soja (11,4 milhões de toneladas) e por 66% das exportações do farelo de soja (10,8 milhões de toneladas). Ao se agregar os dados de ambos os porto, o quantitativo de soja e farelo exportados chega a 61% das exportações totais. Se for agregado o óleo de soja e os outros derivados de soja, conclui-se que mais de 50% da produção nacional, com destino ao mercado internacional, utiliza-se da plataforma exportadora desses dois portos (Tabela 5). Cabe esclarecer que existem no Brasil pouco mais de vinte portos marítimos em operação.

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Tabela 5

Principais Plataformas Portuárias na Exportação de Soja e Farelo Portos de Origem Paranaguá Santos Rio Grande Vitória São Luis São Francisco do Sul Manaus Ilhéus Outros Total

Quantidade em mil toneladas Grãos Farelo Total 5.734 5.911 11.645 5.700 3.017 8.717 3.731 1.825 5.556 1.650 1.341 2.990 890 890 846 604 1.450 796 201 997 704 704 544 0,05 544 19.890 13.602 33.493

Acumulada (%) 35% 61% 77% 86% 89% 93% 96% 98% 100% 100%

Fonte: MDIC - Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior

Com o crescimento da produção de milho e do trigo, e com uma política econômica nacional direcionada ao modelo exportador, verifica-se que há uma tendência forte de um maior deslocamento de produtos agrícolas para os portos de Paranaguá e Santos. Portanto, o próprio avanço das fronteiras agrícolas e a falta de alternativas de roteiros para o escoamento da soja, do milho e agora do trigo, produtos agrícolas plantados em novas áreas do cerrado, levarão maiores quantitativos, principalmente para o porto de Paranaguá (Figura 2, que poderá se tornar um gargalo para as exportações, prejudicando até mesmo os produtores do Paraná, que escoam sua produção tradicionalmente por aquele porto. A falta de infra-estrutura de apoio ao deslocamento dos grãos vai concentrar a movimentação pelo modo rodoviário, congestionando as estradas no período de colheita e de exportação. O problema do transporte das safras, portanto, deve ser entendido como um conjunto de ineficiências sistêmicas que prejudica a

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competitividade dos produtos brasileiros, premissa esta que vem ganhando ampla aceitação. Figura 2

A Expansão da Soja no Cerrado e o Fluxo de Exportação

AP

RR

MA

AM

CE

PA PI

AC

RO

PE AL SE

TO

MT

RN PB

BA GO DF

Gargalo em Paranaguá pode prejudicar a competitividade da soja paranaense

MG

MS SP

ES

RJ

PR SC RS

Porto Paranaguá

Crescimento de 12% ao ano, resulta 74 milhões de toneladas em 3 anos dobrando as remessas por Paranaguá

Região do Cerrado

Para a elevação do diferencial competitivo em relação à países produtores, o Brasil possui vantagens comparativas extraordinárias na produção de grãos e alimentos, que são permanentemente prejudicadas pelos elevados custos de logística, considerando os estágios de manuseio, transporte e armazenagem dos produtos entre a fonte de matéria-prima e o cliente final. Em que pese o somatório da produção nacional e das importações de grãos situar-se em patamar semelhante ao da capacidade estática de armazenamento no País, a localização dos armazéns e a expansão da fronteira agrícola, dentre outros fatores, têm gerado a falta de espaço para o recebimento da safra em vários locais.

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Como conseqüência, ocorrem as demoras na colheita, há uma maior necessidade de transporte de produtos nas regiões onde existe escassez de espaço para guarda da safra (situação do Mato Grosso) que tem que ser destinada de imediato para exportação ocasionando a formação de filas nos armazéns portuários. Nesse processo de ganho de competitividade sistêmica no Brasil, verificaramse importantes transformações, tanto “dentro da porteira” – a exemplo de incorporação de novas áreas de cerrado mais produtivas e inovações tecnológicas – quanto fora dela, por exemplo, com o desenvolvimento de rotas alternativas de escoamento de grãos para a safra produzida no interior do país, possível com a implementação das vias e de portos hidroviários, construção de ferrovias, e recuperação e asfaltamento de estradas federais, que poderão proporcionar destinar a safra do cerrado através de novos caminhos, desobstruindo os portos de Santos e Paranaguá, condições estas que proporcionarão aumento da competitividade da soja. Assim, somente com investimentos em infra-estrutura de suporte operacional para a logística dos grãos, principalmente com uma formulação mais viável de privatização, por intermédio da alteração da forma de proporcionar a concessão dos sistemas de transporte (ferroviário, hidroviário e rodoviário), com incentivo à instalação de unidades armazenadoras nas fazendas e com a implementação das vias e dos serviços portuários nas hidrovias do interior do país, será afastado o perigo de um gargalo nos portos, principalmente, de Paranaguá, promovendo maiores ganhos de competitividade à agropecuária paranaense e matogrossense, onde o complexo soja será o grande beneficiado.

Brasília, 15 de julho de 2004

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