Documentos e textos especiais

December 8, 2017 | Author: Anonymous | Category: N/A
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factor explicativo central de la evolución de la desigualdad de los hogares y por tanto, de la pobreza.”3. Hay indicador...

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Documentos e textos especiais A SEP NO FÓRUM SOCIAL MUNDIAL Nos dias 28, 29 e 30 de janeiro, durante o V Fórum Social Mundial em Porto Alegre, a SEP – Sociedade Brasileira de Economia Política – junto com o EDI – Economistas de Esquerda da Argentina –, organizaram três sessões para discutir os seguintes temas: “O papel da América Latina no contexto do capitalismo contemporâneo”, “Serão os novos governos na América Latina uma alternativa ao neoliberalismo? Os casos recentes do cone sul-americano” e “O imperialismo na América Latina”. Essas sessões foram realizadas tendo como expositores os seguintes convidados: Gérard Duménil (França), Eric Toussaint (Bélgica), Leda Maria Paulani (Brasil), Cláudio Katz (Argentina), Antonio Elias (Uruguai), Nildo Ouriques (Brasil), Arturo Huerta (México), Claudio Lara (Chile), Luís Bonilla (Venezuela) e Francisco Mieres (Venezuela). A seguir apresentamos um resumo do que foi apresentado pelos expositores durante as sessões. Infelizmente nem todos os convidados puderam atender ao pedido para a redação de uma síntese de sua exposição.

A AMÉRICA LATINA NA MUNDIALIZAÇÃO NEOLIBERAL. Gérard Duménil * A posição ocupada pela América Latina na mundialização neoliberal é bastante particular. Essa importância decorre de numerosos fatores, tanto econômicos quanto políticos. E a aposta nesta singularidade não decorre somente da compreensão da história recente, mas da apreciação das oportunidade de

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Pesquisador do CNRS e professor da Universidade de Paris X.

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mudança. Se existe uma região no mundo onde um cenário de desestabilização da ordem neoliberal seja possível conceber, é a América Latina. Inicialmente quero relembrar o que entendo por “neoliberalismo”, a nova fase na qual entrou o capitalismo na transição dos anos 1970 e 1980. Embora se trate de uma transformação complexa, pode-se observar na decisão do Federal Reserve estadunidense, ao final de 1979, de elevar as taxas de juros a não importa qual nível, pretensamente como exigência obrigatória na luta contra a inflação (não importando quais sejam as conseqüências, principalmente para os países endividados da periferia), uma data emblemática. Se existe uma ideologia neoliberal, o neoliberalismo é muito mais do que isso, ou seja, é uma fase do capitalismo, na qual as características de exploração desse modo de produção, inclusive em sua dimensão imperialista, encontraram uma nova radicalidade: disciplina do trabalho e de sua gestão em favor dos detentores dos capitais (credores e acionistas); livre circulação das mercadorias e dos capitais, quer dizer, globalização do terreno de caça do capital internacional. Se as sociedades multinacionais são os agentes dessa nova ordem mundial, esta responde às exigências das classes capitalistas, o que nós chamamos de “finança”, ou seja a fração superior dos proprietários do capital e suas instituições financeiras. Se, num primeiro nível, o poder desses proprietários, muito destacados das empresas, não saberia se afirmar sem a intermediação das instituições financeiras (bancos, banco central, fundos de todos os tipos), ele se exerce, num segundo nível, através do Estado. Essa é uma propriedade geral das sociedades de classe, não importando qual seja o compromisso derivado da democracia (de classe) e da violência própria das ditaduras. Eu vejo quatro razões para a centralidade da América Latina nesse mundo neoliberal: A primeira vítima da ordem neoliberal A maior parte dos países do sub-continente se engajaram em processos de crescimento sustentados, quaisquer que fossem as desigualdades. Isso teve início antes da Segunda Guerra mundial e continuou depois. Será que é preciso lembrar que a renda per capita da Argentina, ao final da guerra, era da ordem daquela da França? Algumas grandes cidades da América Latina, como Buenos Aires ou Montevidéu, são testemunhas desse passado. O modelo de substituição de importações conduziu a elevadas taxas de crescimento, cerca de 6% no México, por exemplo. O contraste com as décadas neoliberais é chocante. Com pouquíssimas exceções, as taxas de crescimento desabaram após 1982. À esta desaceleração

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se acrescentou uma perigosa instabilidade macroeconômica, quer dizer, a recorrência de graves recessões: de fato, de crises maiores (“tequila” no México, a crise argentina, etc.). Nesse mundo de livre circulação de capitais, toda e qualquer política macroeconômica tornou-se impossível. É certo que a imposição de taxas de câmbio elevadas permitiu acabar com a inflação e que gritos de vitória acompanharam a retomada do crescimento nos anos 1990. Mas essas trajetórias se revelaram insuportáveis no médio prazo. Esse novo curso é ainda mais agravado pelo processo de desindustrialização ou pela substituição de uma parte da indústria nacional, liquidada por uma concorrência insustentável, pela indústria “maquiladora”, com suas características bem conhecidas de extrema exploração e de ausência de integração ao tecido industrial nacional. Por toda parte, desigualdade e miséria para grandes parcelas da população. A isso se acrescenta a dívida externa, acumulada ao final dos anos 1970 em um contexto onde as taxas de juros reais eram nulas, e tornada impagável quando da alta dos juros. Uma segunda vaga de endividamento acompanha a abertura financeira dos anos 1990. As tarefas fundamentais do Estado em matéria de reforma agrária, de educação, de saúde foram sacrificadas face à sacrossanta obrigação de fazer frente aos compromissos com os credores, em detrimento das obrigações sociais mais elementares. A nova configuração imperial Se o neoliberalismo teve como principal objetivo a restauração do poder e da renda das classes capitalistas dos países do Centro, sobretudo dos Estados Unidos, esse objetivo não poderia ter sido atingido sem a colaboração das classes dominantes dos países da periferia. Mais uma vez, a América Latina, se bem que em diferentes graus segundo os países, é uma figura emblemática de tal configuração. As taxas de câmbio elevadas e a conversibilidade permitiram às classes afortunadas desses países de aplicarem seus capitais nos países do Centro, nos Estados Unidos em primeiro lugar: a famosa fuga de capitais. Este fenômeno foi mal dimensionado, mas pode-se observar que os rendimentos financeiros (principalmente dividendos e juros) proveniente do resto do mundo, destinado à América Latina, aumentaram fortemente ao longo dos anos 1990. Na Argentina, no final da década, eles representavam a metade dos fluxos da mesma natureza para o exterior, apesar desses últimos incluírem os juros da dívida. No Uruguai, os dois fluxos foram iguais no início dos anos 2000. Dessa forma, as burguesias dos diferentes países estão diretamente inseridas nesse circuito de exploração internacional. Indiretamente, elas se

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beneficiam do custo da dívida, que impõe tantas restrições aos seus próprios países. Por outro lado, pelo seu comportamento rentista (com exceção de algumas multinacionais), essas classes contribuem para o financiamento da economia estadunidense, onde o investimento pôde se restabelecer nos anos 1990, apesar da queda de sua poupança interna, graças à essa contribuição internacional. Neste mecanismo, a América Latina ocupa o segundo lugar, ficando atrás da Europa. Sem dúvida, em nenhum outro lugar, com a exceção possível dos países produtores de petróleo, essa integração das classes dominantes de cada país ao seio do grande sistema do imperialismo atingiu este grau, ainda que em uma posição subalterna. Em nenhum outro lugar o questionamento dessa ordem imperial neoliberal terá as mesmas conseqüências. Uma aposta central dentro da hegemonia estadunidense O imperialismo é uma característica estrutural permanente do capitalismo desde suas origens. Suas formas se modificam continuamente com as próprias transformações do capitalismo. Pode-se comparar, por exemplo, os impérios coloniais tradicionais e a fase imperialista contemporânea, de impérios ditos “informais”. O sistema imperialista deve ser entendido como uma pirâmide onde o mais avançado explora o menos avançado, utilizando a violência econômica “simples”, particularmente a abertura das fronteiras comerciais entre países com níveis de desenvolvimento muito desiguais, ou os métodos tradicionais de violência direta: corrupção, subversão e guerra. Uma característica da fase atual do imperialismo é a existência de uma potência hegemônica indiscutível: os Estados Unidos. Nisso, esta fase se diferencia profundamente da “belle époque” do imperialismo, aquela do início do século XX, onde se confrontavam os imperialismos francês, alemão, inglês, etc. O que os Estados Unidos mais temem é a dissolução dessa configuração em um mundo multipolar, como o que parecia se afirmar ao final dos anos 1970. Falava-se na época da “tríade”: Estados Unidos, Europa e Japão. O potencial deste último país diminuiu devido à crise em que se afundou após sua entrada na ordem neoliberal (o desmantelamento do modelo anterior, tão eficaz). O neoliberalismo fez a Europa sofrer bem mais que os Estados Unidos. Foi constituído um eixo atlântico que confere à Europa uma posição subordinada. A busca da integração da China na economia mundial, em suas modalidades atuais, quer dizer, fora do quadro do neoliberalismo (com um controle radical de seu comércio e do câmbio), poderia constituir uma ameaça,

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daí a importância da obtenção da entrada desse país na ordem neoliberal (bem avançada com a inserção na Organização Mundial do Comércio). Esta transformação capitalista neoliberal da China viria no bojo das taxas de crescimento desse país e o integraria no que chamei acima de “terreno de caça do capital internacional” O abrandamento da influência dos Estados Unidos sobre a América Latina colocaria em perigo a hegemonia estadunidense, e isso seria tanto maior quanto mais essa autonomia fosse acompanhada do estabelecimento de laços privilegiados entre a América Latina, a Europa e a Ásia. Tudo é mantido, e a América Latina permanece como o “quintal” do gigante estadunidense. Varrer primeiro sua casa, em frente de sua porta e depois seu pátio! 4) O peso da história Um último aspecto dessa posição central da América Latina na mundialização neoliberal diz respeito à sua tradição de luta e às experiência que ela é palco. Esta região do mundo foi marcada pelo desencadeamento de lutas sociais radicais, onde as resistências anti-imperialistas e anti-capitalistas atingiram níveis de desenvolvimento extraordinários. Notemos, de passagem, que o reconhecimento desse passado de exceção não diminui em nada o caráter glorioso das lutas anti-coloniais nos antigos impérios ou a resistência heróica do povo vietnamita. O fato da barbárie das ditaduras finalmente ter triunfado, só destaca a amplitude da ameaça que as classes dominantes e o imperialismo tiveram que enfrentar nesta região do mundo: guerrilhas, lutas urbanas, etc. A isso se acrescenta os combates dos povos autóctones, aculturados e espoliados de suas terras. Quaisquer que sejam as decepções, parece que os votos em favor de governos de esquerda e as lutas por todas as partes (na Argentina, na seqüência da crise, no Chiapas, na Bolívia, etc.) testemunham que a luta das classes dominadas podem sofrer derrotas, mas que serem vencidas continuará sendo impossível em um mundo de opressão. A América Latina é a vanguarda desse front de resistência. Evidentemente, os riscos são enormes. Onde e como começar? Quais caminhos? Uma pressão popular marcando os limites do insuportável; uma dose de nacionalismo do lado das classes dominantes, se ainda existem ou lá onde ainda exista; muito de solidariedade continental; a rejeição aos tratados ditos “de livre comércio”; um controle de câmbio frente às ameaças evidentes de novas crises, pois os desequilíbrios dos anos 1990 acumulam-se novamente nos anos 2000; o congelamento gradual da

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dívida, de qualquer modo impagável; etc. Uma trajetória complexa, portanto, talvez a única saída dentro de um mundo paralisado pela derrota dos povos.

O GOVERNO LULA É ALTERNATIVA AO NEOLIBERALISMO? * Leda Maria Paulani ** Para responder à pergunta desta mesa no que diz respeito ao Brasil e ao governo de Lula e do PT, será conveniente de antemão recuperar um pouco da história do neoliberalismo. Ela nos ajudará a fazer dele uma definição mais precisa, permitindo-nos assim responder de modo mais apropriado à questão em tela. O neoliberalismo é uma doutrina e uma coleção de práticas de política econômica. Relativamente ao liberalismo clássico, ele é: 1) mais estreito, pois restringe-se ao aspecto econômico da vida humana em sociedade; e 2) menos “iluminista”, porque depende mais de crença do que de razão. Vejamos como se chegou a isto. Logo após o final da Segunda Guerra Mundial, numa reunião convocada por Friedrich Hayek, um grupo de intelectuais conservadores (dentre eles Karl Popper, Milton Friedman, Von Mises, Lionel Robbins etc.), percebendo a avalanche keynesiana que se aproximava, da qual o New Deal tinha sido involuntariamente uma boa amostra, resolve partir para a ofensiva, visto que o ambiente que a largos passos ia se desenhando no mundo ocidental era completamente hostil (na visão deles) ao desenvolvimento de uma sociedade inteiramente organizada pelo mercado. É nessas circunstâncias que nasce o neoliberalismo. Seu objetivo era combater o keynesianismo e o solidarismo reinantes, fazendo com que o mundo voltasse a ser pautado por um capitalismo duro e livre de regras. O interessante, porém, é que não se traçou ali nenhum plano de pesquisa para que fosse academicamente robustecido o paradigma neoclássico. Contrariamente ao

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Resumo da comunicação feita pela autora na mesa “Os novos governos da América Latina são alternativa ao neoliberalismo? Os casos recentes no cone sul-americano”, organizada pela SEP e pelo EDI (Argentina) no V Fórum Social Mundial, ocorrido em Porto Alegre (RS), e apresentada em 29/1/2005. Coube-me ali refletir sobre o caso brasileiro.

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Professora do Departamento de Economia da FEA/USP e presidente da SEP

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keynesianismo, que criava um capitalismo tolhido e prisioneiro das limitações impostas pelo Estado, aquela corrente teórica, em princípio, demonstrava cientificamente os bons resultados produzidos pelo mercado, devendo, portanto, ser fortalecida para enfrentar a teoria keynesiana, que já dominava abertamente a academia. Ocorre que Hayek, o organizador da reunião, tinha sido justamente o crítico mais feroz dessa teoria, que, segundo ele, dava por resolvidos os problemas que ela deveria resolver. Seu maior incômodo com esse paradigma era de natureza metateórica: para ele o individualismo que lhe servia de base era um individualismo falso, em que, ao invés de singularidades, os indivíduos eram considerados como átomos de comportamento idêntico. Escaldado que estava do revés sofrido no famoso “debate sobre o cálculo socialista”, Hayek percebera que, tendo esse tipo de fundamento, a teoria neoclássica podia se transformar numa arma para demonstrar precisamente o contrário daquilo que ele defendia, ou seja, que o ótimo social podia ser conscientemente planejado. Isto posto, uma reação liberal ao mundo regulado que se estava construindo no pós-guerra tinha de ser tão-somente uma profissão de fé nas virtudes do mercado e em sua capacidade de preservar a liberdade dos indivíduos. Tratava-se, portanto, de afirmar essa doutrina, prescrevendo as medidas que deveriam ser tomadas para resgatar para o mercado o lugar que por direito lhe cabia e que, segundo seus advogados, estava sendo usurpado pelo Estado. Não é difícil imaginar do que constava esse menu: liberdade total para o mercado em todos os sentidos, fim de toda e qualquer limitação dessa liberdade imposta pelo Estado, redução do Estado ao mínimo indispensável para garantir a viabilidade das relações de mercado e controle absoluto sobre seus gastos. Mas o vento da história soprava contra essa meia dúzia de pregadores, de modo que suas idéias ficaram engavetadas por pelo menos três décadas. Nesse meio tempo, do ponto de vista metateórico, as idéias caminharam no sentido inverso do que Hayek pregava. Usando o mesmo individualismo atomista que caracteriza a economia neoclássica, discípulos de Milton Friedman (como Gary Becker) vão estender para outras esferas da vida social (como o amor, o casamento e o voto) os princípios comportamentais que se atribuem ao homo economicus, enquanto James Buchanan vai fazer a mesma coisa, considerando as relações que se desenrolam no âmbito do Estado (teoria da escolha pública). Em ambos os casos, assim como na doutrina de Hayek, trata-se com essas teorias de afastar qualquer possibilidade de organização social que não seja embasada na completa liberdade econômica e em sua suposta ordem meritocrática. De qualquer modo, é só em meados dos anos 70 que todas essas idéias vão encontrar uma base objetiva que permite sua germinação. REVISTA Soc. bras. Economia Política, Rio de Janeiro, nº 16, p. 85-117, junho 2005

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A grave crise enfrentada pelo capitalismo ao final dos anos de 1960, agravada pela crise do petróleo e dos insumos básicos, desemboca em recessão aberta em meados dos anos de 1970. Como o mundo já se encontrava num sistema monetário internacional puramente fiduciário, a investida da valorização financeira sobre a valorização produtiva, natural em momentos de crise como esse, pôde se desenvolver sem amarras e junto com ela a grita geral pela desregulamentação dos mercados, em particular dos mercados financeiros. Nesse movimento, a outra face da moeda foi a ofensiva contra o Estado, em especial no que tange à oferta de bens públicos e aos direitos dos trabalhadores. A crise e, por fim, a débâcle completa do assim chamado socialismo real vão completar o quadro em que viceja a pregação da doutrina neoliberal. Neste quadro, assumindo o governo federal um partido de esquerda, num país periférico como o Brasil, no início do século XXI, quais seriam as alternativas ao neoliberalismo? A adoção de políticas que tivessem por meta a reversão do processo de fragmentação social que está em curso há quase duas décadas, graças justamente à ascensão das práticas neoliberais e do espírito neoliberal que as acompanha, espírito do cada um por si, do individualismo exacerbado, da demonização do Estado e dos movimentos sociais, da esterilização da força política dos sindicatos e assim por diante, espírito que a política econômica objetiva em transformações concretas enquanto a mídia encarrega-se de difundi-lo como se se tratasse de uma coisa absolutamente natural. Em suma, para enfrentar esse movimento avassalador seria preciso investir em políticas que buscassem resultados objetivos, por exemplo, na redução da abissal desigualdade do país, mas que fizessem isso trazendo junto consigo uma revolução cultural e de valores que proscrevesse como indignos e inaceitáveis os valores individualistas e puramente mercantistas. E o que faz o governo Lula? Todas as providências que ele toma vão justamente no sentido contrário. E nesse contexto o que tem menos importância é a política econômica em si mesma, ou seja, se amanhã ou depois o board do Banco Central resolver que é necessário baixar os juros reais básicos e/ou a equipe do Ministério da Fazenda decidir que o superávit primário do governo pode ser menor do que 4,25% do PIB, nem por isso ele poderá ser considerado como não neoliberal. Muito mais do que pela ortodoxia na condução da política macroeconômica, o governo Lula é neoliberal principalmente por três razões que estão interligadas, mas que analisaremos separadamente. A primeira razão que faz do governo Lula um governo afinado com o neoliberalismo é justamente sua adesão sem peias ao processo de transformação do país em plataforma de valorização financeira internacional. A política

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ortodoxa escolhida pelo governo tem na credibilidade junto aos mercados internacionais de capitais sua mais importante justificativa. Some-se a isso a elevada taxa real de juros que prevalece em nossa economia, a mais elevada do mundo (a segunda maior do mundo é a da Turquia, que é menor do que a metade da nossa), somem-se também as mudanças no mercado cambial com a conseqüente facilitação do envio de recursos ao exterior, some-se igualmente a nova Lei de Falências, que dá primazia aos créditos financeiros frente aos créditos trabalhistas, e some-se por fim o projeto, que ainda não foi abandonado, muito ao contrário, de autonomia operacional do Banco Central, e perceber-se-á do que estamos falando. A segunda razão que faz do governo Lula um governo neoliberal decorre de seu discurso de que só há uma política macroeconômica correta e cientificamente comprovada, que é a política de matiz ortodoxo levada à frente por sua equipe econômica desde o início do governo. Como do ponto de vista macro (leia-se de manipulação das variáveis da demanda agregada) não há escolha, sustenta-se que o crescimento virá do rearranjo das condições de oferta, leia-se, da política microeconômica, que consiste em “melhorar o ambiente de negócios”. Essa melhora não passa apenas pela defesa dos direitos dos credores que a nova Lei de Falências consagra (e que a Lei de Responsabilidade Fiscal já apontava como inescapável), e pela desregulamentação do mercado de trabalho (leia-se perda de direitos), que a nova lei trabalhista deve provocar; passa também pela abertura de novas e promissoras oportunidades de negócios como aquelas que serão trazidas pelo PPA e pela privatização do Instituto de Resseguros do Brasil e aquelas já trazidas pelo crescimento do mercado privado de aposentadorias e pensões decorrente da reforma da previdência, isso tudo sem contar a pressão para que o setor financeiro privado possa, também ele, negociar com a parte gorda do mercado de créditos dirigidos. A terceira mas não menos importante razão pela qual o governo Lula deve ser tachado de neoliberal encontra-se na assim chamada “política social”, que tem nas “políticas compensatórias de renda” seu principal esteio. Deixando de lado as questões menores relativas à maior ou menor competência em sua condução, o fato é que, ao contrário do que imagina inclusive parte da própria esquerda, tais políticas sancionam as fraturas sociais ao invés de promoverem a tão falada “inclusão” (não por acaso, o criador e maior defensor da idéia da renda mínima é justamente Milton Friedman). Fazer de projetos como o Fome Zero a base e o fundamento da política social do governo é ao mesmo tempo uma espécie de admissão de que, naquilo que importa, ou seja, na condução efetiva da vida material do país, a questão social está em último lugar (a

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política agrária, por exemplo, é pouco mais que uma farsa, não tendo até agora, ao contrário do que se esperava, enfrentado os grandes interesses latifundiários). Como correm hoje outros tempos que não permitem mais que o primeiro mandatário do país diga, como pôde tranqüilamente dizer Fernando Henrique, que o modelo “não é para os excluídos”, o governo Lula faz o Fome Zero enquanto desmantela os direitos dos trabalhadores para facilitar os negócios e anda na contramão do solidarismo e da universalização dos bens públicos para tornar o país um investment grade. Assim, consideradas em seu conjunto, as três razões acima não só não nos permitem de modo algum afirmar que o governo Lula promova qualquer tipo de enfrentamento, por diminuto que seja, ao neoliberalismo, como, ao contrário, nos obrigam a perceber o caráter completamente neoliberal de seu governo.

A OPÇÃO NEOLIBERAL DO GOVERNO LULA Nildo Ouriques * Eleito para operar um giro em direção oposta a da política neoliberal, o governo Lula manteve e aprofundou as políticas em curso durante os oito anos do governo de Fernando Henrique Cardoso. Os resultados econômicos, políticos e sociais desta opção estratégica marcarão profundamente a conjuntura dos próximos anos. De imediato, cancelam o PT e seu principal dirigente como alternativa de mudança no país, capaz de enfrentar e solucionar desde uma perspectiva dos “de baixo” os grandes dramas derivados do subdesenvolvimento e da dependência. Nesta perspectiva, pouco importa que as classes dominantes festejem a “boa conduta” do governo quando este recusa-se a enfrentar pela raiz a pobreza, a desigualdade racial e regional e a dependência, aceitando, pelo contrário, conferir “prioridade no combate a inflação” e as “reformas” preconizadas e impulsionadas pela aliança entre FMI e o grande empresariado nacional e internacional. Esta virada estratégica do que foi o principal partido de esquerda da América Latina e sua inscrição nas filas do neoliberalismo, abriu uma nova era de transformações no país que, em outros países do continente já possuem um perfil mais definido.

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Professor do departamento de economia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Coordenador do Observatório Latino-Americano (OLA-UFSC).

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Esta adesão a ordem dominante não constituiu uma novidade para muitos ativistas e militantes da esquerda brasileira e latino-americana. É claro que a “moderação” da corrente majoritária do PT já representava uma garantia para os donos do poder de que os “radicais” existentes na organização jamais poderiam realmente ganhar a hegemonia. Contudo, esta adesão explícita era possível por razoes menos aparentes e mais profundas ligadas a história da esquerda brasileira e do PT em particular. Talvez a menos explícita e mais grave, foi o desprezo que a direção do partido nutria pela teoria, especialmente a teoria marxista. Identificada freqüentemente como expressão de dogmatismo, o marxismo petista apenas defendia o direito de existência, mas nunca conseguiu mais do que conferir um aroma de esquerda para uma prática efetivamente colada a sociedade capitalista. E havia algo mas importante: parte das formulações de origem no marxismo eram perfeitamente compatíveis com um interpretação liberal da realidade brasileira de maneira que a conversão recente possui raízes intelectuais mais profundas e menos perceptíveis. Em poucas palavras: o radicalismo político do PT era conjuntural, rendendo tributo a sociologia paulista que sempre centrou seu combate na crítica ao “autoritarismo” do que direcionando seus canhões contra a dependência e o subdesenvolvimento. Por isso ouvíamos intelectuais e dirigentes partidários ufanar-se de nossa burguesia ao afirmar que o país era “moderno”, contudo, autoritário. Por esta razão, durante muitos anos estivemos submetidos a crítica liberal ao capitalismo dependente ao afirmar que sofríamos os efeitos perversos de uma “modernização conservadora”, como se fosse possível outra modernização cujos efeitos poderiam ser distintos e essencialmente melhores. Enfim, sem uma sólida formação intelectual que somente poderia ser produto do radicalismo teórico conquistado pela esquerda ocorrida na América Latina nas décadas de sessenta e setenta, o terreno para uma fácil conversão ao credo neoliberal estava dado. Registre-se a respeito, que a esquerda brasileira sempre foi a mais provinciana neste aspecto, a menos beneficiada pelos ares renovadores e fecundos daquele período. E a mais vulnerável as novidades do pensamento europeu sem requisitos anti-sistêmicos! As origens intelectuais desta rendição à ordem burguesa necessitam de um estudo mais amplo. Limito-me aqui apenas a indicá-lo como uma fronteira de debate essencial se pretendemos contribuir na lenta e árdua tarefa de reconstrução da esquerda brasileira. Mas esta tarefa não pode ser mais negligenciada. Por outro lado, não são poucas as transformações operadas na economia, no estado e no regime de classes na última década, de tal forma que estas

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mudanças afetaram também a esquerda que atualmente apoia o governo. A receita neoliberal prometia um “choque de capitalismo” cujos resultados seriam distintos daquela modernização conservadora que sempre desagradou da boca para fora tanto conservadores como liberais. Como num passe de mágica, hipóteses simplistas como “austeridade fiscal”, defesa da “moeda forte”, “equilíbrio orçamentário” passaram a ser defendidos como se não expressassem ideologias e interesses concretos. A aceitação do programa do FMI somente foi possível porque a burguesia brasileira perdeu força econômica como classe social e não lhe restou alternativa senão somar-se alegremente a dinâmica dos “juros escorchantes”, buscando nos rendimentos garantidos pelo endividamento externo e, depois de 1994, pelo endividamento interno, um lugar ao sol. Por esta razão, tanto Ermírio de Moraes como Olavo Setúbal sabem sobreviver acumulando nas duas esferas, a produtiva e a financeira. Neste sentido, a contradição mais relevante em termos de política econômica atualmente – aquela que distingue e, freqüentemente, opõem uma acumulação produtiva de outra predominantemente financeira – são úteis apenas para manter a hegemonia burguesa sobre as classes subalternas. Ora, os lucros acumulados durante 2004 quando a economia cresceu 5.2% permitindo lucros fantásticos tanto aos empresários como aos banqueiros, foram incapazes de tocar na superexploração da força de trabalho como o segredo da pirâmide. A produtividade do trabalho cresceu 6% como média nacional e as negociações salariais mal permitiram a reposição das perdas inflacionárias. Desde a época de Marx sabemos que a produtividade é um assunto que não incumbe aos trabalhadores. Por esta razão o ciclo do capital continua fechando fora, como alertou Ruy Mauro Marini na década de sessenta. Eis porque a burguesia brasileira e também o atual governo, aderiu ao canto da globalização com tanta facilidade, permitindo a venda de importantes estatais e abrindo seu mercado para a ação cada dia mais substancial das multinacionais. Não restou alternativa, nestas circunstâncias, que Lula viabilizasse o brado proferido por FHC ainda em seu segundo mandato: “exportar ou morrer”! Quando o governo comemorou a “conquista” de U$ 100 bilhões de dólares nas exportações não fazia mais que coroar o programa econômico inaugurado por FHC em 1994, sob a condução do FMI. Mas este festejo significa uma renúncia eloqüente a dinamização do mercado interno e, em conseqüência, a perpetuação da superexploraçao. Adeus proletariado! A propósito de despedidas, não por acaso o Brasil do governo Lula é agora beneficiado por outra fonte de equilíbrio do balanço de pagamentos originado na miséria e exploração das massas. No ano de 2004 entraram no país

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quase U$ 6 bilhões de dólares oriundos das remessas de imigrantes que não encontram neste mercado permanentemente deprimido condições de reprodução. Já são milhões de brasileiros que buscam nos Estados Unidos, na Europa e no Japão as condições mínimas para sustentar suas famílias submetendo-se a condições terríveis de exploração, pois na grande maioria dos casos atuam na condição de “ilegais” e, por esta razão, não podem defender adequadamente seus direitos. Os banqueiros e industriais possuem, portanto, razoes para festejar o êxito do governo Lula. Foi Fernão Bracher, um banqueiro, a propósito, quem expressou de maneira clara sua alegria com a eleição de Lula: “Para o Brasil, abriu-se uma situação completamente nova, assumiu o poder a social democracia. Com a social democracia, vive-se perfeitamente, talvez até melhor do que sem ela” (FSP, 11/04/2005). Há tantas declarações aparentemente surpreendentes em apoio ao governo que é normal supor que o governo Lula terá outros 4 anos, conquistando facilmente a reeleição. Contudo, o Brasil acompanha o pêndulo latino-americano que demonstra inclinar-se á esquerda, ainda que com vacilações e programa confuso. É verdade também que o tempo das transformações brasileiras apresenta particularidades: em geral, somos mais lentos que os demais países da região. Os eurocêntricos logo afirmam que nosso futuro poder ser melhor observado a partir da Itália ou da Espanha, esquecendo que não podemos reproduzir nem de longe, a experiência européia. Estamos invariavelmente ligados a dinâmica da América Latina. É importante também observar que o governo Lula como possível expressão de um projeto social democrata é mais que uma tragédia. Trata-se de uma farsa! Ora, na Europa a social democracia também sucumbiu as exigências do capital e também entrou com força no programa das reformas (previdência, leis trabalhistas, imigrações, etc), cancelando nos países centrais quaisquer ilusões sobre ganhos materiais em uma época de profunda transformação da dinâmica do capital. Precisamente nesta época de transformação ou transição como querem alguns, é que a periferia do sistema é chamada a colaborar transferindo recursos para o centro, que seriam indispensáveis para a solução da questão nacional dos países dependentes. Não foi por acaso que o governo atual reformou a Previdência Social com mais profundidade do que pretendiam os tucanos que permaneceram no poder por quase uma década. O fortalecimento dos fundos de pensões permite calar por algum tempo uma parte dos trabalhadores, mas mesmo estes logo descobrirão que os papéis, garantidos pelas mais altas taxas de juros do mundo, não passam de papel. E não podemos esquecer que a maioria dos trabalhadores brasileiros atua no chamado merca-

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do informal. As conquistas sociais históricas estão se dissipando rapidamente sob os auspícios de um governo que nasceu para fortalecê-las. No entanto, o júbilo burguês tem data marcada para terminar. O governo de Lula se sustenta porque não enfrentou nenhuma crise de magnitude. Um governo que não apostou na radicalização da consciência e da organização das maiorias, fica refém do programa das elites e a cada dia observa crescer a desconfiança popular no presidente. Esta combinação é explosiva, especialmente se consideramos que as contradições imanentes no programa econômico levam, cedo ou tarde, a colapsos que implicam em empobrecimento dos pobres e mais benesses para os poderosos. A América Latina esta repleta de exemplos e, embora com ritmo próprio, o Brasil já esta inscrito nesta dinâmica. Quanto tempo ainda as classes dominantes poderão usufruir das garantias dadas pela legitimidade histórica construída ao longo de muitos combates pelo atual governo? A eclosão das crises latino-americanas permite afirmar que o tempo se acelera e que o programa neoliberal perdeu capacidade de sedução sobre as massas e de soldar alianças entre os “de cima”. No Brasil, o governo Lula aferrou-se ao credo da austeridade fiscal porque as privatizações já não são mais possíveis e os capitais, como sempre, mantém seu apetite voltado para os países centrais. Sem o recurso das privatizações o governo se sustenta na aliança entre banqueiros, empresários, exportadores e sindicalistas que servem aos fundos de pensão. O consórcio depende da capacidade de endividamento do estado, razão pela qual nossa dívida pública já ameaça a chegar na casa do trilhão sob a condução do ex-líder metalúrgico. O limite do endividamento, por sua vez, depende do humor das maiorias em aceitar a austeridade como um princípio que necessariamente colapsa os sistemas de saúde, arruína o ensino público e é incapaz de garantir a segurança nas grandes cidades. A resistência aparece de forma clara no protesto ainda tímido de prefeitos e governadores que já se manifestam contra a Lei de Responsabilidade Fiscal ou pedem seu relaxamento. A desigualdade de renda, racial e regional aprofundou-se na última década. Quando, por uma razão qualquer, as maiorias percebem que o programa deve ser substituído, não saberão distinguir o governo atual do anterior. A social democracia tucana tenta buscar diferenças, mas o único que consegue é afirmar que são mais competentes na gestão do mesmo programa. O governo, por seu lado, limita-se a dizer que a herança maldita esta finalmente sendo superada sem os erros de condução dos antigos gestores. É este o terreno em que, em outros países latino-americanos, nasceu um grito mais que popular aos nossos desavisados ouvidos: que se vayan todos!!!

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CENTROIZQUIERDA, NACIONALISMO Y SOCIALISMO Claudio Katz * El ascenso de varios gobiernos de centroizquierda refleja el fracaso económico, el retroceso político y el rechazo popular al neoliberalismo. Pero cada proceso expresa realidades distintas. Lula asumió sin fisuras institucionales en un marco de recesión y desmovilización social. Kirchner arribó al concluir el descalabro político creado por una depresión rodeada de sublevaciones. Tabaré sigue el modelo político del PT en un cuadro económico semejante a la Argentina y ensayos similares enfrentan en Bolivia con la amenaza de balcanización. El nacionalismo de Chavez es sustancialmente distinto porque se apoya en la ventaja petrolera para desplazar a los viejos partidos, hacer reformas y confrontar con la derecha. Además, estrecha relaciones con Cuba y encabeza una fuerte polarización político-social. Su proyecto del ALBA no es compartido por la centroizquierda, porque las clases dominantes de cada país tienen mayores negocios con las metrópolis que con sus vecinos. La constitución de Petrosur choca con la privatización del petróleo en el Cono Sur y al Bansur le falta un club de deudores. Es incorrecto considerar que Lula y Kirchner encabezan “gobiernos en disputa”. Arbitran entre grupos capitalistas con modelos de ortodoxia socioliberal o heterodoxia excluyente en desmedro de los intereses populares. Tanto el PT como el peronismo han perdido su originalidad contestataria. En Venezuela la disyuntiva es radicalizar o congelar el proceso bolivariano. Ciertos enfoques sugieren que el imperialismo norteamericano es invencible e ignoran que su hegemonía no es un dato nuevo para la región. Tampoco registran los efectos contradictorios de la desaparición de la URSS y tienden a evaluar la correlación de fuerzas considerando más las relaciones entre los gobiernos que la lucha social. La izquierda puede retomar el legado de los 70 si reconstituye su proyecto socialista. Las dificultades no derivan de la adversidad externa sino de las políticas implementadas en cada país. Es vital comprender porqué los proyectos de capitalismo regional autónomo son menos viables que en el pasado. La

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Professor da Universidade de Buenos Aires e membro do EDI.

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batalla por conquistas a escala local debe formar parte de una propuesta antiimperialista radical.

UN GOBIERNO EN DISPUTA Antonio Elías * La crisis económica y su correlato de pobreza y exclusión debilitaron el “sentido común” neoliberal, lo que contribuyó al triunfo electoral de una coalición de fuerzas sociales y políticas opositoras al modelo que se aplica en el país desde los setenta. Múltiples expectativas se han generado pero aún no es posible discernir cuál es la profundidad y viabilidad de sus propuestas de cambio. El nuevo gobierno debe responder, con mayor o menor énfasis, a las deudas externa y social. En el marco institucional, las finanzas públicas y la política presupuestal se reflejan las presiones de los organismos multilaterales de crédito y de la creciente masa de pobres y excluidos. Las nuevas autoridades fueron electas bajo un programa más o menos laxo y existen en su seno concepciones político ideológicas y estrategias de desarrollo relativamente diferentes. Las polémicas acerca del modelo a aplicar y las pugnas por las designaciones así lo demuestran. Existen, esquematizando, dos tendencias: una, que exige equilibrios fiscales, estabilidad macroeconómica y de las reglas de juego, apostando a la inversión privada nacional y extranjera que permitiría un proceso de crecimiento que sustentaría los proyectos de sociales, propuesta que se identifica a si misma con los gobiernos de Brasil y Chile. La otra plantea una nueva estrategia de desarrollo productivo para superar una crisis estructural de larga data a través de procesos de participación creciente de las organizaciones sociales y de cambios culturales e institucionales que fortalezcan el papel del Estado como orientador del proceso económico. La predominancia de una u otra posición dependerá de múltiples factores, entre los cuales se destacan los niveles de conciencia y organización de la sociedad. La crisis es estructural La sociedad uruguaya y el Estado no han encontrado caminos para superar una crisis estructural de inserción internacional y de desarrollo productivo de larga data. *

Professor da Universidade da República do Uruguai.

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Los sectores dominantes ubicaron las causas profundas del estancamiento productivo en la transferencia de recursos del sector exportador hacia los sectores protegidos y como respuesta imponen (dictadura militar mediante) un modelo extrovertido, extremista en su preferencia por el mercado y en el cuestionamiento de la acción colectiva a través del Estado. Intentan excluir lo político, porque provoca acciones voluntarias que inciden negativamente en el orden “natural” del mercado, omitiendo que los procesos sociales son siempre históricos. Represión mediante se procesaron importantes transformaciones institucionales, que se concretaron en una ley de inversiones extranjeras y una disminución generalizada y progresiva de las restricciones a las importaciones con el fin de generar una reconversión industrial para reemplazar la industria sustitutiva de importaciones por actividades de exportación. Mientras que la liberalización comercial tuvo marchas y contramarchas, la apertura y la desregulación financiera se aplicaron en forma decidida: admisión del dólar como unidad de cuenta para los contratos internos; libre movilidad de capitales y de divisas; instalación de la banca off-shore. La prosecución del libre mercado generó lo contrario a la sustitución de importaciones: el ingreso de bienes del exterior. El mercado externo, a su vez, no asumió su papel como impulsor fundamental del crecimiento. La crisis económica de 1999-2002 tuvo como causas fundamentales las devaluaciones de sus principales socios comerciales y la incapacidad de la conducción económica para adaptarse a la nueva situación regional. Se deterioraron las finanzas públicas, aumentó del riesgo-país, se debilitó el sistema bancario y se perdió la confianza en la banca oficial. Se produjo una enorme fuga de capitales a mediados de 2002 – se retiraron el 46% de los depósitos en dólares del sistema bancario – y el costo fiscal de la crisis, por concepto de asistencia a instituciones afectadas por la “corrida”, fue superior al 10% del producto. La deuda bruta del sector público se triplicó: pasó de 34% en 1998 a 93% del PBI en 2002, como consecuencia de los persistentes déficits fiscales y de su financiamiento con endeudamiento. Los cuatro años de crisis determinaron un gran deterioro de las principales variables macroeconómicas: Ingreso Bruto Nacional (-19,7%), PBI (-17,5), consumo (-20,2), inversión (-50,9), exportaciones (-,19,8), importaciones (37,3), inflación (31,7), déficit fiscal promedio (4,3). Como en crisis anteriores, la expulsión de ciudadanos fue una “válvula de escape” para los problemas de la sociedad uruguaya.

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Dicha crisis, al igual que la de 1982, muestra que: a) “la aplicación de modelos de estabilización basados en ‘anclas cambiarias’, con sobrevaluación de la moneda, déficit fiscal y en cuenta corriente, y dependencia creciente del financiamiento interno y externo, generan una fase de crecimiento acelerado que luego, ante el cambio de las condiciones de financiamiento, da lugar a una crisis múltiple (de balanza de pagos, bancaria, de financiamiento del sector público y del sector real)”; b) “una economía pequeña como la uruguaya, que requiere crecer hacia fuera, no puede tener niveles de tipo de cambio real desalineados de los de sus principales socios comerciales”1 La reactivación iniciada en 2003 se basa en una mejora sustancial de la competitividad externa consecuencia de la pronunciada devaluación del 2002, la baja inflación posterior y la apreciación de la moneda de los socios comerciales de la región y de Europa. Comenzó, sin embargo, el año pasado un nuevo proceso de fortalecimiento de la moneda nacional que afecta la competitividad precio de las exportaciones y favorece las importaciones con su consiguiente efecto negativo sobre el mercado interno (la competitividad global del país cayo 13% en los últimos doce meses). El canje de la deuda externa pública (mayo 2003) que alejó el default (postergando los pagos por amortizaciones y aumentando los costos por intereses) sustentó una estabilización de las variables macroeconómicas y una relativa recuperación de la confianza en el sistema financiero: cayó el “riesgo país” y la tasa de interés, crecieron los depósitos bancarios; se mantuvo, sin embargo, la extrema debilidad del sistema financiero – los depósitos en su inmensa mayoría siguen siendo a corto plazo y en moneda extranjera – y la fragilidad de las finanzas públicas. El déficit fiscal del Gobierno Central ascendió a 4,6 % y 2,1% del PBI, en 2003 y 2004 respectivamente. Esta situación deficitaria tiene larga data, sólo en 1991 y 1992 hubo un pequeño superávit fiscal. El FMI exige un superávit fiscal primario de 4% del PBI: la dirección del nuevo equipo económico propone el 3,5%. En ambos casos lograr dichos superávit requiere impulsar una ley presupuestal sumamente restrictiva que no dará respuesta a la deuda social. Las dificultades para el nuevo gobierno están, además, en la rigidez del gasto público y en la composición del mismo; en 2004 los gastos no discrecionales fueron el 57% del total (36% de asistencia a la seguridad social y 21% de intereses de deuda) y los discrecionales, 43% del total (18% remuneraciones, 16% otros gastos de funcionamiento, 3% transferencias y sólo 6% inversiones).

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Entre la deuda pública y la deuda social La deuda del Sector Público es impagable, debe U$S 13.428 millones, el PBI de 2004. En los próximos cinco años, período del nuevo gobierno, se concentran pagos por U$S 6.552 millones en amortizaciones y U$S 2.567 millones en intereses, 49% y 43%, respectivamente, del total de compromisos de deuda. En 2005 y 2006 el Sector Público No Financiero debería pagar por intereses U$S 717 millones y U$S 576 respectivamente (24% y 19% del presupuesto del Gobierno Central), lo cual impediría que se comience a pagar, a través del presupuesto público, la enorme deuda socia. Debe considerarse, como muestra, que en 2004 se pagaron por intereses más de lo pagado en un año a todos los trabajadores del Gobierno Central (112%). El problema de la deuda vuelve a ser fundamental como en los años 80. La deuda social debería ser una prioridad nacional, dentro de este concepto se pueden incluir: las necesidades básicas insatisfechas de la población; el deterioro de la capacidad y calidad de los servicios públicos; la incapacidad del país para generar empleo adecuado a todos los que lo necesitan; la parte del presupuesto público asignado que no fue ejecutado (U$S 300 millones anuales en promedio en los últimos cinco años). La pobreza excede las carencias materiales imponiendo restricciones de los derechos humanos y ciudadanos; las personas que viven en esa situación (41% en 2003) son vulnerables social y económicamente. Esto es más grave ya que afecta fundamentalmente a los niños y adolescentes, 61% de los menores de dieciocho años, y como contrapartida solamente son pobres el 10% de las personas en la tercera edad y el 38% de los adultos.2 Estudios realizados demuestran, a su vez, que: “El aumento de la desigualdad obedece principalmente al mal desempeño del mercado de trabajo en los 90. Tanto el aumento del desempleo como el aumento de la desigualdad salarial se trasladó a los hogares (...) La situación del mercado de trabajo es un factor explicativo central de la evolución de la desigualdad de los hogares y por tanto, de la pobreza.”3 Hay indicadores rotundos: a) el salario real, se redujo 23% de 1998 a 2004; b) el desempleo creció de 10,1% en 1998 a 16,9% en el 2003, si bien descendió en 2004 a 12,1%; c) los ocupados con problemas de empleo pasaron de 20,3% a 44,6%; d) continuó aumentando la brecha entre el producto por habitante y el salario real, el crecimiento del PBI en 2003 y 2004 no se reflejó en el salario real que se redujo 12,4% y 0,4%, respectivamente.

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“Durante la recesión 1999-2003 se deteriora la calidad del empleo por el aumento del subempleo y del empleo no registrado, que acompañan el aumento del desempleo, de la emigración, de la pobreza y de la exclusión”4, según demuestra un estudio del Instituto de Economía. El 40% de la población económicamente activa no tiene cobertura de seguridad social, considerando los trabajadores que deberían ser cotizantes del BPS y no lo son y los desempleados que no cobran la prestación del seguro de desempleo.5 Los desafíos y los márgenes de maniobra de un gobierno en disputa El modelo económico neoliberal, los shocks externos y las carencias de la conducción económica han afectado fuertemente al aparato productivo, en particular al sector manufacturero – bajos niveles de inversión, retraso tecnológico, pérdida de mercados externos, desaparición y desestructuración de empresas y productores –, lo que ha tenido consecuencias muy negativas en los niveles de empleo, distribución del ingreso y, consecuentemente, en el aumento de la segmentación y la exclusión social. Se ha reducido la capacidad del Estado a través de ajustes fiscales y desajustes fiscales permanentes, la desregulación de mercados, la privatización parcial de empresas estatales y el entramado clientelista y los niveles de corrupción de aquellos sectores del bloque en el poder que realizan sus intereses a través del Estado. Son múltiples, por tanto, los desafíos económicos del gobierno electo, entre los que destacan: a) Comenzar a pagar la enorme deuda social (que no se agota con el plan de emergencia), que implica mejorar sustancialmente la capacidad del Estado, el cual con transparencia absoluta debería impulsar procesos de participación social efectivos. b) Impulsar una estrategia de desarrollo superadora de la causa principal de la deuda social: la baja calidad de las condiciones de trabajo; c) Renegociar la deuda pública externa e interna a fin de liberar recursos para atender a través del presupuesto público las demandas sociales e impulsar el desarrollo productivo. d) Mantener un tipo de cambio competitivo que sostenga el crecimiento exportador y la estabilidad macroeconómica.

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e) Modificar la institucionalidad económica – creada en treinta años de neoliberalismo –, para favorecer el desarrollo del mercado interno y de actores sociales fundamentales como los trabajadores. Evaluar las probabilidades de que se superen esos desafíos y se satisfagan las demandas sociales hace necesario considerar algunos aspectos políticos claves: – Accede al gobierno, no al poder, una fuerza política policlasista que incluye en su base social a trabajadores, capas medias y sectores de la burguesía nacional. – En lo ideológico el triunfo del FA no se produce por un corrimiento a la izquierda de la ciudadanía, sólo un 33% de los votantes se define como de izquierda o centro izquierda.6 – El cambio esencial es un corrimiento de la propuesta programática hacia el centro lo que se refleja en la sucesiva ampliación de las alianzas. Como consecuencia, en el seno del gobierno electo, y en la fuerza política, se expresan intereses socioeconómicos contrapuestos que no permiten afirmar, a priori, si el nuevo gobierno será una alternativa al neoliberalismo. Se inicia un proceso signado por la contradicción latente entre una tendencia que se expresa en la dirección de la conducción económica – la cual tiene propuestas de política macroeconómicas más cercanas a la continuidad del modelo neoliberal que a una ruptura con dicho modelo –, y otras posiciones, como las del PIT-CNT, que apuestan a cambios importantes en la forma de organización del proceso económico jerarquizando el papel del Estado, los trabajadores y la sociedad en la aplicación de una estrategia de desarrollo productivo con énfasis en el fomento de la producción nacional, las pequeñas y medianas empresas y el cooperativismo, lo que exige cambios importantes en las reglas de juego y en la política económica. 7 No puede haber una estrategia alternativa de desarrollo en el marco de las instituciones (reglas de juego) creadas por el neoliberalismo: la búsqueda de cambios institucionales, tanto para crear “compuertas” a la globalización, como para acotar los daños que provocan los actuales derechos de propiedad, deberían ser aspectos prioritarios de la agenda económica. En el superávit fiscal primario que se acuerde como meta con el FMI y en la prioridad que tengan, en el presupuesto nacional, la deuda externa o la deuda social se estará reflejando el predominio de una u otra concepción. El estrecho margen de maniobra económico financiero provocará la agudización de la contradicción que significa mejorar sustancialmente la capacidad de negociación de los trabajadores – defensa de los fueros sindicales,

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aplicación de los consejos de salarios, ley de negociación colectiva y puesta en marcha del Consejo de Economía Nacional – y tratar de aplicar, a la vez, políticas económicas que no difieran significativamente de las que han predominado en los últimos años. La disyuntiva del nuevo gobierno es aceptar, más allá de los “discursos y los gestos”, las premisas del modelo dominante o elegir un camino independiente, lo cual implicará necesariamente un cambio de modelo, básicamente un nuevo marco institucional y una estrategia de desarrollo productivo que atienda a la justicia social y a la profundización democrática. La hegemonía del proceso está en cuestión, en disputa, dependerá de los niveles de conciencia y organización de la sociedad, en general, y de los trabajadores, en particular, el camino que recorrerá el Uruguay. Notas 1

“Diagnóstico de la situación actual del país y lineamientos de salida a la crisis”; Comisión de la Facultad de Ciencias Económicas y Administración, 2003.

2

Amarante, Verónica; Arim, Rodrigo y Vigorito, Andrea; “Pobreza, red de protección social y situación de la infancia en Uruguay”, Doc. del BID, diciembre de 2004.

3

Vigorito, Andrea, “Pobreza urbana en Uruguay. La medición de la pobreza”, Brecha, 02/07/ 2004.

4

Notaro, Jorge, “La calidad del empleo en Uruguay 1984-2003”, Instituto de Economía, Versión preliminar, 2005.

5

“Noticias Buenas y de las otras”, Nro. 36, setiembre de 2004.

6

Equipos-Mori, “Claves electorales”, octubre de 2004; www.equpos.com.uy.

7

Ver el programa aprobado en el VIII Congreso del PIT-CNT, octubre de 2004.

EL IMPERIALISMO EN AMÉRICA LATINA Arturo Huerta G. * Las políticas de expansión del gran capital internacional El capital internacional en la perspectiva de extender su dominio y proteger el valor de su capital, impone políticas de apertura comercial (libre movilidad de mercancías, tratados de libre comercio) y de liberalización financiera (libre

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Professor da Universidade Nacional Autônoma do México.

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movilidad de capitales). Las políticas de apertura comercial nos colocan en desventaja competitiva frente a los productos importados que son de mejor calidad y de mejores precios, por lo que los productos y productores nacionales pasan a ser desplazados por las importaciones, lo que descapitaliza la esfera productiva e incrementa el déficit de comercio exterior. Por lo tanto, las economías ven deterioradas las condiciones productivas, financieras y macroeconómicas para su crecimiento, y para estabilizar sus monedas, por lo que pasan a depender de la entrada de capitales para tal efecto. Fue por esto que los países latinoamericanos procedieron a la liberalización financiera, para a través de permitir el libre movimiento de capitales, estimular el flujo de éstos hacia sus países para poder encarar el financiamiento del déficit externo, como para promover el crecimiento económico. Sin embargo, la internacionalización de los mercados de capitales exige condiciones de estabilidad monetaria a fin de evitar prácticas especulativas. Al no tener los países latinoamericanos bases productivas y macroeconómicas para ello, privilegian políticas monetarias y fiscales restrictivas, a fin de disminuir la demanda y la presión de ésta sobre precios y sobre el tipo de cambio. En estas políticas se ubica la autonomía de los bancos centrales, desvinculando así a los gobiernos del manejo soberano de la política monetaria, perdiendo el control sobre su moneda y por ende del financiamiento de su déficit fiscal. Los gobiernos se ven obligados a trabajar con disciplina fiscal (ajustar sus gastos al nivel de sus ingresos) a fin de no presionar sobre precios, sobre el sector externo, sobre el tipo de cambio, como sobre la oferta monetaria. Al perder manejo de la política monetaria, los gobiernos se financian con impuestos, con deuda y vendiendo activos y empresas, y tienen que ajustar sus gastos al nivel de sus ingresos. Tales mecanismos de financiamiento son limitados. Los impuestos están en función del ingreso nacional, por lo que al privilegiarse políticas fiscales restrictivas, se contrae la generación de ingreso y ello disminuye la captación tributaria. Por su parte, la venta de empresas públicas es un proceso finito, que se termina mas temprano que tarde, por lo que el proceso seguido de venta de activos para pagar pasivos y así sanear las financias públicas, se agota. Y en relación a la deuda, el problema es que se ha caído en una alta relación de endeudamiento, debido a que el costo de ésta (es decir, la tasa de interés) crece en mayor proporción que los ingresos públicos, por lo que dicha alta relación de endeudamiento manda señales negativas que obligan al gobierno a tratar de restringir su demanda por crédito. El problema es que han caído en una situación donde gastan menos, pero a pesar de ello su deuda crece. Lo importante a enfatizar es que al dejar de tener el control de la

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moneda, la política fiscal deja de ser un instrumento para el crecimiento económico, y las economías se condenan a políticas fiscales restrictivas y por lo tanto al estancamiento. En la perspectiva de conformar baja inflación y estabilidad de la moneda, los países latinoamericanos dejan de tener política para el crecimiento, y además amplían el proceso de privatización y extranjerización de las economías para promover entrada de capitales, para así incrementar reservas internacionales y contribuir a la estabilidad del tipo de cambio. De tal forma, se estabiliza la moneda a costa de disminuir al participación del Estado en la economía, de sacrificar el crecimiento económico y de acelerar el proceso de privatización y extranjerización de las economías latinoamericanas. Los gobiernos se subordinan al capital financiero internacional, y si no lo hacen, dicho capital especula, sale de las economías y las desestabiliza, por lo que los gobiernos prefieren seguir las reglas del juego impuestas por dicho capital y los organismos financieros internacionales. Las políticas monetarias y fiscales restrictivas, conjuntamente con la estabilidad del tipo de cambio (el cual termina apreciado, es decir abaratando al dólar), atentan sobre el crecimiento del mercado interno, por lo que las economías pasan a depender de factores externos, es decir, del comportamiento de las exportaciones, como de la entrada de capitales. Problemas y características que se derivan del proceso de globalización Destrucción de la capacidad productiva.

La apertura comercial, conjuntamente con la política de dólar barato (apreciación del tipo de cambio) han afectado la esfera productiva, dado que ello atenta sobre la competitividad de la producción nacional, así como sobre los niveles de rentabilidad de dicho sector, lo que lleva a rompimientos de la cadena productiva y a que se tenga altos niveles de endeudamiento para sortear sus problemas financieros, así como bajos niveles de inversión. La balanza de comercio exterior se ve presionada por el mayor crecimiento de importaciones respecto a exportaciones, lo que presiona sobre el tipo de cambio y actúa en detrimento de la dinámica de producción interna, colocando a la economía en dependencia creciente de entrada de capitales, tanto para financiar dicho déficit, como para mantener estable el tipo de cambio. El rompimiento de cadenas productivas, conjuntamente con la menor inversión en dicho sector, lo coloca

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en mayor desventaja competitiva, lo que redunda en mayor déficit comercial, en menores ganancias y en mayor vulnerabilidad en torno al comportamiento de exportaciones, como de la entrada de capitales Afecta las condiciones financieras para el crecimiento

Las economías dejan de tener condiciones financieras para el crecimiento. Las empresas enfrentan bajas ganancias por su falta de competitividad, como por la caída del mercado interno derivado de la política fiscal restrictiva. Ello, junto con la política monetaria de alta tasa de interés, y la disminución de la disponibilidad crediticia (debido a la falta de capacidad de pago), restringen el crecimiento de la inversión y de la actividad económica. Aumento de las presiones sobre las finanzas públicas y el sector externo.

La disciplina de las finanzas públicas al reducir el gasto e inversión, disminuye la demanda y atenta sobre la infraestructura y el crecimiento de la productividad, por lo que frena la actividad económica. Ello atenta sobre el saneamiento fiscal dado que restringe la capitación tributaria, y acentúa los problemas de insolvencia, que al desestabilizar al sector bancario, obligan al gobierno a rescatarlo, lo que termina incrementando la deuda pública, la que a su vez presiona sobre las finanzas públicas. Por su parte el sector externo enfrenta presiones, tanto por el déficit de comercio exterior, como por las obligaciones crecientes que se derivan del capital externo ubicado en la economía. Tanto las presiones sobre las finanzas públicas, como las que enfrenta el sector externo, actúan como obstáculo al crecimiento económico, ya que obligan al predominio de políticas de restricción del gasto público y alzas de la tasa de interés, para disminuir presiones sobre tales sectores. Mas que corregir dichos desequilibrios, estos aumentan, dado el efecto que el alza de la tasa de interés tiene sobre el aumento de la carga del servicio de la deuda, como sobre la atracción de capitales y la consecuente apreciación cambiaria, lo que mantiene las presiones sobre la balanza comercial. Asimismo, la disminución del gasto e inversión pública, contrae la actividad económica y con ello los ingresos tributarios y afecta las propias finanzas públicas, y además, afecta el crecimiento de la capacidad productiva y la productividad, lo que atenta sobre la competitividad y sobre la balanza de comercio exterior, lo que coloca a la economía en contexto de mayor vulnerabilidad externa en torno al comportamiento de la entrada de capitales.

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Pérdida de control de los sectores estratégicos y del manejo soberano de la política económica.

Al depender en forma creciente de la entrada de capitales, la economía tiene que acentuar la venta de activos al capital internacional e instrumentar una política económica dirigida a crear condiciones de confianza y rentabilidad a favor de éste. Es decir, le incrementa su esfera de influencia. El problema de ello, es que se cae en un círculo vicioso, ya que la política a favor del capital financiero internacional, nos condena a la disciplina fiscal, a la estabilidad (apreciación) de la moneda, y por lo tanto a un contexto de estancamiento, a baja dinámica de acumulación y a presiones permanentes sobre las finanzas públicas y sobre el sector externo y a seguir dependiendo de la entrada de capitales. No hay motor interno y externo para el crecimiento

Las políticas de estabilidad monetaria, al sustentarse en la restricción monetaria y fiscal, lleva a las economías a restringir su mercado interno y a depender de factores externos para su crecimiento. De ahí que la dinámica de muchas economías dependa del comportamiento de la economía de Estados Unidos, como de otras economías en crecimiento que demanden productos latinoamericanos. Junto a ello está el papel que desempeñan los flujos de capital, los que son esenciales para financiar el déficit externo, como para estabilizar la moneda y alcanzar cierto crecimiento. Sin embargo, tales factores externos no generan una dinámica sostenida, dado el bajo valor agregado nacional de las exportaciones realizadas, y porque además, los flujos de capital no incrementan la capacidad productiva, debido a que en su gran mayoría son para adquirir empresas y activos nacionales ya existentes, significando ello un cambio patrimonial. Las economías latinoamericanas caen un contexto de alta vulnerabilidad en torno al comportamiento de las exportaciones y de la entrada de capitales. Las exportaciones manufactureras realizadas por muchos países del área, no pueden constituirse en motor del crecimiento, dado que se caracterizan por su bajo valor agregado nacional, y además tienden a perder dinamismo, debido a la presencia creciente de China en el mercado mundial y sobre todo en Estados Unidos, el cual es el mercado al cual se dirigen muchos productos latinoamericanos. Estos países se ven impedidos a tener políticas anti-cíclicas e impulsar un motor interno de crecimiento, debido a que el contexto de globa-

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lización y sus requerimientos de entrada de capitales les obliga a trabajar con políticas monetarias y fiscales restrictivas Se incrementan los problemas del subdesarrollo

Los países latinoamericanos pasan a tener menos esfera productiva y menos condiciones financieras para el crecimiento, y además, no cuentan con políticas macroeconómicas para generar un crecimiento endógeno. Su sector productivo enfrenta menores ganancias, está descapitalizado y con altos niveles de endeudamiento que le dificultan incrementar la inversión y mejorar su competitividad. Tal situación, no lo hace ser sujeto de crédito, por lo que menos posibilidad hay para su crecimiento. De ahí la participación creciente del sector comercio y servicios en el PIB, situación que se traduce en menor crecimiento económico, mayor desempleo y economía informal. Al enfrentar presiones crecientes sobre el sector externo, tales economías pasan a depender de la entrada de capitales, lo que les obliga ajustarse a las condiciones de estabilidad y confianza que exige dicho capital, impidiéndoles ello tener política monetaria, cambiaria y fiscal para el crecimiento, por lo que al condenarse a contextos de estancamiento, se profundizan los problemas del subdesarrollo.

LIBERALIZACIÓN Y SUBORDINACIÓN DE LOS SERVICIOS PÚBLICOS A LA LÓGICA DEL CAPITAL EN LOS PAÍSES DEL CONO SUR Claudio Lara Cortés * La liberalización de los servicios públicos impuesta en los países del Cono Sur del continente (Argentina, Brasil y Chile) durante los últimos quince años significó transitar de manera muy acelerada desde un sistema estatal a uno sometido a la lógica del capital, donde la electricidad, el teléfono, el gas y ahora el agua potable se privatizan. Esta ofensiva sobre los servicios públicos sirvió para potenciar un vasto proceso de acumulación por desposesión, que no sólo atrae enormes flujos de capital extranjero sobreacumulado, sino que *

Economista chileno, director de la revista Economía Crítica y Desarrollo. Profesor universitario e investigador de la Universidad ARCIS. Miembro de la Red de Economía Mundial (REDEM) e investigador del Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales (CLACSO).

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además implica reemplazar la subsunción formal por la subsunción real de los servicios y de sus procesos de trabajo al capital. Precisamente sobre estos dos fenómenos, y las barreras que generan a su propio desarrollo, quisiéramos concentrarnos en esta presentación. Privatización y acumulación por desposesión Alineados tras los postulados del neoliberalismo, los gobiernos del Cono Sur deciden preparar las condiciones propicias para atraer al capital privado a los servicios públicos. Para ello recurren de manera directa (dictadura militar en Chile) o indirecta (facultades extraordinarias en Argentina y Brasil) a los poderes políticos y coercitivos del mismo Estado, sin dejar por ello de impulsar maniobras puntuales de legitimación (el capital privado como “salvador” de las empresas estatales y ofrecimiento de paquetes minoritarios de acciones a los trabajadores). En base a ello, desarrollarán un “trabajo sucio” estratégico, imponiendo drásticas reducciones en los planteles de personal con el fin de devaluar aún más la fuerza de trabajo y decretando elevados incrementos en las tarifas (sobre todo para los usuarios residenciales). Al mismo tiempo se lleva a cabo la reorganización o fragmentación de las actividades industriales de los servicios. Aunque su propósito declarado era la introducción de la competencia en ciertos segmentos (en la generación eléctrica, por ejemplo), esta reorganización se veía como necesaria para crear oportunidades de negocios al alcance de capitales locales o de funcionarios públicos. También había que facilitar la inversión de capitales foráneos, para lo cual se introducen normas que posibilitan la conversión de deuda externa en capital y se suscriben diversos acuerdos de Promoción y Protección de Inversiones (APPI). Luego el mismo programa privatizador contemplará una metodología y una serie de modalidades que fueron diseñadas con el único propósito de tornar mucho más atractiva la futura transferencia de las empresas estatales. En los tres países este programa supuso no sólo discriminar en varias ocasiones contra inversores potenciales y favorecer a otros, como lo muestra la venta de ENTel o el escándalo de “Telegate”; sino que también conceder una gran variedad de garantías y “subsidios ocultos” a los “adjudicatarios”: subvaloración de activos, incremento arbitrario de las tarifas de los servicios, absorción de deudas de las empresas en vías de privatización, créditos estatales con tasas preferenciales, despido masivo de trabajadores, licencias con carácter de exclusividad, la entrega de licencias gratuitas en telecomunicaciones o, inclu-

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so, la privatización del propio recurso natural agua (derechos de agua), como en Chile. Todas estas modalidades que asume la privatización, promovidas desde las alturas del mismo Estado, son resultados de prácticas depredadoras y fraudulentas propias de la acumulación “primitiva” u “originaria”, pero como se trata de un proceso actual y que se halla vigente, sería más apropiado hablar, siguiendo a David Harvey, de “acumulación por desposesión”. Por lo demás, el mismo Estado aparece en todas las situaciones promoviendo la forma de propiedad que deben asumir las nuevas firmas. En rigor, los adjudicatarios de las privatizaciones ya tenían “nombre y apellido” antes de implementarse la transferencia de las empresas. Fue así como un número importante de empresas transnacionales (operadores), en asociación con grupos económicos locales y bancos extranjeros y/o locales, logró apropiarse de las empresas públicas; excepto de las empresas eléctricas en Chile, que por algunos años fueron dominadas por un conglomerado de ex funcionarios públicos, pero que en 1997 fueron adquiridas por Endesa España en una operación conocida como el “escándalo del siglo”. La supeditación de los servicios públicos y de sus procesos de trabajo a la lógica del capital. Con posterioridad a la privatización se modifican sustancialmente los procesos laborales. Es decir, con la privatización el capital privado se apodera de un proceso de trabajo pre-existente para situarlo bajo su dominio y revolucionarlo en función de su valorización y de la producción capitalista en general. Desde este momento primará de manera absoluta el criterio de rentabilidad, la ganancia por la ganancia. Los anteriores procesos de trabajo de las empresas estatales mostraban por lo general un marcado retraso tecnológico; mientras la mayoría de los países industrializados imponían una rápida desregulación y desarrollaban una continúa innovación tecnológica en todos los servicios, notoriamente en las telecomunicaciones. De esta forma, los servicios básicos de nuestros países se prestaban todavía a la introducción acelerada de nuevas técnicas productivas y modos de organización, que hicieran posible la subsunción real al capital y la obtención de altas tasas de ganancia. Con ese fin la atención de las estrategias de gestión de las empresas privatizadas se concentrará primordialmente en promover tanto la subcontratación y la incorporación a gran escala de nuevas tecnologías como la adecuación e intensificación del uso de la fuerza de trabajo. Es así como, con respecto a lo primero, un número creciente de tareas que antiguamente eran desempeñadas

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por las compañías estatales con personal propio pasa ahora a manos de nuevas firmas externas especializadas (tareas de instalación y mantenimiento, de extensión y desarrollo del servicio, de administración de las redes y de gestión del material informático). Al mismo tiempo, se produce una significativa incorporación de tecnologías de última generación, sobre todo en el sector de telecomunicaciones, dado el carácter sistémico que asume aquí este fenómeno (la masiva digitalización del parque de centrales, por ejemplo). Sin embargo, ese progreso tecnológico no ha tenido la misma fuerza en el sector eléctrico o de agua potable. Por su parte, se trata de ajustar el tamaño de la fuerza de trabajo a estos nuevos requerimientos organizativos y técnicos, pero también a la prolongación de la duración de la jornada de trabajo. En otras palabras, en un contexto de debilitamiento generalizado del sindicalismo, había que continuar reduciendo las plantas laborales (los famosos “planes de desvinculación”). Asimismo, las estrategias de gestión imponen la reducción de las pausas, la polivalencia funcional y el crecimiento de la rotación de tareas, o sea, un uso mucho más intenso de la fuerza de trabajo existente. Todo esto redundará en un incremento espectacular de la productividad, esto es, de la producción de plusvalía. Por lo demás, tales transformaciones no sólo revolucionaron las relaciones entre los diversos agentes de la producción de servicios (nueva relación salarial y contractual) sino que también el carácter del propio trabajo. Puesto que la técnica productiva es una técnica nueva introducida por el capital transnacional, ya no es la antigua, los trabajadores quedan subsumidos al instrumento en el sentido material de la palabra y pasan a conformar una capacidad de trabajo socialmente combinada. Tenemos así que “más y más funciones de la capacidad de trabajo se incluyen en el concepto inmediato de trabajo productivo, y sus agentes en el concepto de trabajadores productivos”. Dicha transformación conlleva un continuo aumento de la escala del proceso laboral. Es mayor que la que se verificaba antes de que el capital interviniera, cuando el suministro de los servicios se desarrollaba dentro de límites sectoriales y nacionales dados. Esta compulsión estaría detrás de la larga expansión registrada por los servicios privatizados en los tres países, incluso a una tasa más elevada que el conjunto de la economía, poniendo de manifiesto el rápido incremento de la cobertura, sobre todo durante el primer período (de concesión). Lo mismo podría decirse de la expansión que llevaron a cabo ciertas empresas más allá de las fronteras nacionales (como el caso de la chilena Enersis) o de la construcción de gaseoductos e interconexiones internacionales.

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Esta ampliación del proceso productivo obliga a las empresas, según sea el caso, a que tengan una mirada del sector o de los diversos sectores en los cuales operan (nacional o transnacional) y que deben incorporar la correspondiente “coerción estructural” y el “disciplinamiento” de los trabajadores, como una política deliberada para elevar el desempleo. Con ello se busca ejercer una presión a la baja sobre los salarios sectoriales y abrir nuevas oportunidades de inversión rentable para el capital en la misma rama industrial. No obstante, el propio proceso expansivo irá generando las barreras que obstaculizarán su posterior desarrollo. Concentración, regulación y barreras a la expansión de los servicios La forma que asume el proceso de liberalización y privatización de los servicios condicionará no sólo las estructuras de mercados y las eventuales posibilidades de introducir la competencia, sino que también la propia regulación. La tendencia predominante en todos los países del Cono Sur no es hacia la competencia sino hacia la monopolización y oligopolización. De hecho, las empresas de telecomunicaciones aprovecharon el largo período de exclusividad (operando monopólicamente) para integrar sus actividades tanto vertical como horizontalmente, consolidando así sus posiciones dominantes en el mercado ampliado de telecomunicaciones. A su vez, en el mercado de generación eléctrica, aunque la legislación de estos países presupone la competencia, sus respectivas estructuras son claramente oligopólicas. Incluso ciertas empresas transnacionales de la energía (en Brasil) han dado los primeros pasos para que la oligopolización de este mercado alcance dimensiones sub-regionales. Casi todas las empresas tienen un muy alto poder de negociación sobre el organismo regulador del sector, el que se ve acrecentado por el monopolio que ostentan sobre la información y por la “captura” de las instituciones que están por sobre los entes sectoriales. Esa “captura” se manifiesta, sobretodo, en la “fijación” de los precios (considerada como la función más importante de la regulación económica). Ello a pesar que el régimen tarifario presente mecanismos que aseguran “precios razonables” a todas las empresas. (el “price-cap” en Argentina o el de “costos marginales/empresa modelo” en Chile), incluyendo cláusulas en casi todos los casos que permiten ajustes periódicos de las tarifas (indexación flexible). Estos mecanismos pretenden garantizar a las empresas un nulo grado de exposición a cambios en las condiciones de contexto y/o

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preservar (cuando no acrecentar) sus ganancias extraordinarias. Todavía más, varios de estos mecanismos posibilitan imputar al ámbito regulado costos que pertenecen a otros negocios, o bien, transferir artificialmente utilidades a empresas relacionadas que proveen servicios a las empresas reguladas. No es de extrañar, entonces, que los precios de todos los servicios mercantilizados se hayan visto incrementados en el largo plazo después de las privatizaciones. Incluso, en muchas ocasiones éstos han crecido más que el índice general de precios de las economías y las tarifas residenciales lo han hecho más que las comerciales e industriales. Esto se traduce en un subsidio casi permanente de los consumidores domiciliarios al consumidor industrial y comercial, ahondando todavía más la profunda desigualdad del ingreso que impera en nuestros países. Claramente, los mayores precios se han convertido en una de las principales limitantes al acceso a la electricidad, telefonía y, sobre todo, al agua potable. Estas alzas han coincidido con la persistencia de altos niveles de pobreza en el Cono Sur (incluso con incrementos en Argentina) y con mercados laborales cada vez más precarizados. El mismo despido masivo de trabajadores de los servicios públicos aportará al declive del “empleo público” y al incremento de la tasa general de desempleo y, con ello a la crisis del “empleo formal”. Por lo demás, los precios de los servicios públicos han aumentado durante los últimos años de crisis mucho más que los salarios medios y que los salarios mínimos. Como consecuencia, millones de personas no tienen el “poder adquisitivo” suficiente para “consumir” o acceder de manera regular a los servicios básicos, siendo relegados a un “sub-consumo” o a un consumo “ilegal”, o condenados simplemente a la exclusión. Las mismas empresas prestadoras de servicios han formalizado el “sub-consumo” y la “exclusión”, ya que cuentan ahora con las atribuciones legales para cortar un servicio por falta de pago, incluyendo el agua potable. La eliminación o reducción de los subsidios estatales a la demanda no hacen más que agravar esta situación. Por otra parte, el aumento persistente de las tarifas no se ha correspondido con un mejoramiento de la calidad en el suministro de los servicios mercantilizados. Incluso, en algunos casos hay un claro empeoramiento de ella, como en el sector eléctrico, donde los tres países han sufrido severas crisis sectoriales y son recurrentes los cortes y los bruscos cambios de voltaje. En otros, la mayor cobertura y las mejoras en calidad (telecomunicaciones) han tenido un costo alto, ya que las “ganancias de eficiencia” no fueron totalmente transferidas a los usuarios residenciales y comerciales, mediante disminuciones reales en el costo del servicio. Dicho en otras palabras, no es el

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conjunto de la sociedad el que se beneficia de estas ganancias sino tan solo un reducido grupo de monopolios y oligopolios privados bajo la forma de “ganancias extraordinarias”. En síntesis, en medio de la crisis, el ciclo expansivo de los servicios privatizados comienza a chocar con las barreras que surgen de una demanda cada vez más segmentada. El acceso de los consumidores a los servicios esenciales pareciera haber alcanzado un límite estructural, colocando así en cuestión uno de los objetivos de las reformas liberalizadoras, esto es, la universalización de los servicios. Con ello también se coloca en cuestión un derecho humano y un derecho de los consumidores. Esta es la otra cara del proceso de “acumulación por desposesión”. El par mayor pobreza y servicios caros, se ha convertido en un infernal circulo vicioso cada vez más difícil de romper para millones de latinoamericanos. No sólo eso, las elevadas tarifas que cobran las empresas privatizadas provocan un gran impacto negativo sobre el funcionamiento del conjunto de la economía, afectando especialmente la competitividad de las pequeñas y medianas empresas. En consecuencia, las fluctuaciones ciclicas son más marcadas y atentan contra cualquier expansión ordenada de los servicios básicos en el largo plazo. En definitiva, la crisis hizo más evidente que nunca la incompatibilidad entre el afán de lucro privado y el bien común. Cuando el precio, la calidad y la extensión de los servicios se subordinan completamente a la lógica de la ganancia del capital, pierden los usuarios y pierde la sociedad.

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